Psicologia Analí­tica e O Senhor dos Anéis

Escrito por Fábio Bettega
Neste conjunto de textos do psicólogo Rangel Roberto M. Fabrete temos uma interessante análise da obra de Tolkien (enfoque nos filmes) sob uma ótica diferente, a da psicologia analítica. Neste primeiro texto trazemos a apresentação do autor, introdução, importantes conceitos básicos de psicologia analítica e a primeira parte da análise. Aproveitem os textos!
 
 

Introdução e Apresentação

Olá! Meu nome é Rangel Roberto M. Fabrete. Tenho 26 anos, moro em São Paulo (SP) e assim como todos os que visitam Valinor, sou um apaixonado pela obra de Tolkien. Sou psicólogo, e sempre fui alguém interessado em símbolos, mitos e lendas. Durante a faculdade, entrei em contato com a teoria de Carl Gustav Jung, a Psicologia Analítica,  popularmente denominada de psicologia “junguiana”. A teoria de Jung me fascinou, pois enfatiza a questão de como os símbolos exercem influência direta na sua relação com o homem, ao longo da história da humanidade.
Do tempo das cavernas, até os nossos dias de Internet, os símbolos continuam agindo livremente na sociedade. Ao analisarmos e interpretarmos os símbolos, na verdade estamos analisando e interpretando quem nós somos realmente, em todos os aspectos. A mitologia, os contos, as lendas e as religiões, são os territórios de pesquisa para todo aquele interessado em descobrir mais sobre si mesmo.Tolkien ao escrever O Senhor dos Anéis, criou todo um universo mitológico, que conta não só a estória da Terra Média, mas a história psicológica passada e atual, de toda a humanidade.

Mediante a um Universo tão completo e rico em símbolos como a trilogia do Anel, senti-me quase como que “obrigado”, a empregar minha atenção e dedicação a fazer um trabalho de análise da obra. A tarefa caso fosse feita com base nos livros, ficaria um tanto extensa e cansativa de ser realizada e apreciada por qualquer leitor. Decidi então analisar os filmes feitos por Peter Jackson. Sei que muitos fãs torceram o nariz para os filmes, porém acredito que analisar os filmes seria algo mais certo a ser feito, caso eu realmente desejasse prestar tal tributo.

O resultado está aqui no site, ainda falta a análise de O Retorno do Rei, em breve ela estará concluída, e assim poderá ser publicada.
Juntamente com as análises, há um texto com conceitos da Psicologia Analítica, a leitura deste texto irá facilitar bastante o entendimento das mesmas, pois emprego tais termos nos textos. Qualquer dúvida, pergunta ou curiosidade, pode ser enviada para o meu e-mail: rangelfabrete@gmail.com

Um grande abraço!

Rangel Roberto M.Fabrete – Psicólogo, C.R.P 06/ 77.328 

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Conceitos da Psicologia Analítica (*)
(*) Estes são alguns conceitos básicos. Para maiores informações sobre Psicologia Analítica, Jung sua vida e obra: www.symbolon.com.br

Anima: "A anima é um fator da maior importância na psicologia do homem, sempre que são mobilizando as suas emoções e afetos. Ela intensifica, exagera, falseia e mitologiza todas as relações emocionais com a profissão e pessoas de ambos os sexos. As teias da fantasia a ela subjacentes são obra sua. Quando a anima é constelada mais intensamente ela abranda o caráter do homem, tornando-o excessivamente sensível, irritável, de humor instável, ciumento, vaidoso e desajustado. Ele vive num estado de mal-estar consigo mesmo e o irradia a toda volta. Às vezes, a relação do homem com uma mulher que capturou sua anima revela a existência da síndrome." – Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo, C.G.Jung, parag.144, pg.82

Animus: "A função natural do animus (como a da anima) consiste em estabelecer uma relação entre a consciência individual e o inconsciente coletivo. Analogamente, a persona representa uma zona intermediária entre a consciência do eu e os objetos do mundo exterior. O animus e a anima deveriam funcionar como uma ponte ou pórtico, conduzindo às imagens do inconsciente coletivo, assim como a persona representa uma ponte para o mundo. Todas as manifestações arquetípicas, e portanto também o animus e a anima, têm um negativo e um positivo. Um aspecto primitivo e um diferenciado.

Em sua primeira forma inconsciente, o animus é uma instância que engendra opiniões espontâneas, involuntárias, exercendo uma influência dominante sobre a vida emocional da mulher; a anima é, por outro lado, uma instância que engendra sentimentos espontâneos que exercem uma influência sobre o entendimento do homem, nele provocando distorções. ("Ela virou-lhe a cabeça"). O animus é projetado particularmente em personalidades "espirituais" e toda espécie de "heróis" (inclusive tenores, artistas, esportistas, etc.). A anima se apodera facilmente do elemento que na mulher é inconscientemente vazio, frígido, desamparado, incapaz de relação, obscuro e equívoco… No decurso do processo de individuação, a alma se associa à consciência do eu e possui, pois, um índice feminino no homem e masculino na mulher." – Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pgs. 351 e 352

Arquétipo: "As imagens primordiais são as formas mais antigas e universais da imaginação humana. São simultaneamente sentimento e pensamento." – psicologia do Inconsciente, C.G.Jung,pg.58

"O conceito de arquétipo (…) deriva da observação reiterada de que os mitos e os contos da literatura universal encerram temas bem definidos que reaparecem sempre e por toda parte. Encontramos esses mesmos temas nas fantasias, nos sonhos, nas idéias delirantes e ilusões dos indivíduos que vivem atualmente. A essas imagens e correspondências típicas, denomino representações arquetípicas. Quanto mais nítidas, mais são acompanhadas de tonalidades afetivas vívidas… Elas nos impressionam, nos influenciam, nos fascinam. Têm sua origem no arquétipo que, em si mesmo, escapa à representação, forma preexistente e inconsciente que parece fazer parte da estrutura psíquica herdada, e pode, portanto, manifestar-se espontaneamente sempre e por toda parte.

É muito comum o mal-entendido de considerar o arquétipo como algo que possui conteúdo determinado; em outros termos, faz-se dele uma espécie de ´representação´ inconsciente, se assim se pode dizer. É necessário sublinhar o fato de que os arquétipos não têm conteúdo determinado; eles só são determinados em sua forma e assim mesmo em grau limitado. Uma imagem primordial só tem um conteúdo determinado a partir do momento em que se torna consciente e é, portanto, preenchida pelo material da experiência consciente. Poder-se-ia talvez comparar sua forma ao sistema axial de um cristal que prefigura, de algum modo, a estrutura cristalina na água-mãe, se bem que não tenha por si mesmo qualquer existência material. Esta só se verifica quando os íons e moléculas se agrupam de uma determinada maneira. O arquétipo em si mesmo é vazio; é um elemento puramente formal, apenas uma facultas praeformandi (´possibilidade de preformação´), forma de representação dada a priori. As representações não são herdadas, apenas suas formas o são. Assim consideradas, correspondem exatamente aos instintos que, por seu lado, também só são determinados em sua forma." – Memórias sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pg.352

Consciência: "Por consciência entendo a referência dos conteúdos psíquicos ao eu (v.eu) enquanto assim for entendida pelo eu. Referências ao eu, enquanto não entendidas como tais pelo eu, são inconscientes (v.).A consciência é a função ou atividade que mantém a relação dos conteúdos psíquicos com o eu.Consciência não é a mesma coisa que psique,pois a psique representa o conjunto de todos os conteúdos psíquicos; estes não estão todos necessariamente vinculados ao eu,isto é, relacionados de tal forma com o eu que lhes caiba a qualidade de conscientes. Existe uma boa quantidade de complexos psíquicos que não estão necessariamente vinculados ao eu". – Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pg.353

Eu/Ego: "Entendo o "eu" como um complexo de representações que constitui para mim o centro de meu campo de consciência e que me parece ter grande continuidade e identidade consigo mesmo.
Por isso, falo também do complexo do eu.

O complexo do eu é tanto um conteúdo quanto uma condição da consciência (v.), pois um elemento psíquico me é consciente enquanto estiver relacionado com o complexo do eu. Enquanto o eu for apenas o centro do meu campo consciente, não é idêntico ao todo de minha psique, mas apenas um complexo entre outros complexos.

Por isso distingo entre eu e si-mesmo. O eu é o sujeito apenas de minha consciência, mas o si-mesmo é o sujeito do meu todo, também da psique inconsciente. dentro dele o eu.
O si-mesmo gosta de aparecer na fantasia inconsciente como

Neste sentido o si-mesmo seria uma grandeza (ideal) que encerraria personalidade superior ou ideal, assim como, por exemplo, o Fausto de GOETHE, e o Zaratustra, de NIETZSCHE…"

"…Por amor à idealidade, os traços arcaicos do si-mesmo foram apresentados como distintos do si-mesmo "superior": em GOETHE, na forma de Mefisto; em SPITTELER na forma de Epimeteu; na psicologia, como o demônio ou o anticristo; em NIETZSCHE, Zaratustra descobre sua sombra no "mais feio dos homens"." – Tipos Psicológicos, C.G.Jung, pgs. 401,402 e 406.

 

Extroversão: "O extrovertido orienta-se pelo que é objetivamente dado, dirige a sua atenção para o mundo externo de fatos, coisas e pessoas. Aprecia a ação e expressa-se melhor falando do que escrevendo, gosta mais ouvir do que ler. Caracteriza-se por uma certa impulsividade diante do mundo, precisa experimentar as coisas e situações. Gosta de movimento e mudanças constantes, pode ser agressivo e agir impensadamente.Gosta de arriscar e sempre tem uma resposta imediata para qualquer situação."– Questionário de Avaliação Tipológica/Manual, José Jorge de Morais Zacharias, pg.12

 

Funções psíquicas: São 4 as funções psíquicas. Porém, mesmo tendo as quatro funções, acabamos por utilizar e desenvolver uma função mais do que as outras três, negligenciando assim o nosso crescimento e amadurecimento psicológico. Estas são as funções psíquicas:

"- Intuição: O intuitivo parte do que está percebendo no momento, mas esta não é sua preocupação. Está mais interessado nos significados, nas relações e nas possibilidades futuras inerentes ao que está percebendo. Observa o todo e não as particularidades de uma situação, as linhas de direção ou idéias gerais subjacentes aos detalhes aparentes e ordenados. Busca novas soluções, novas estratégias para os problemas, e tende a farejar possibilidades e a ter atitudes imprevisíveis. Prefere planejar do que executar e torna-se muito útil quando é necessário avaliar uma situação sem dados suficientes.

Sensação: O sensitivo confia em seus órgãos dos sentidos para compreender objetivamente uma situação. Está mais interessado no aqui e agora, no dado imediato e real. Prefere trabalhar com dados reais e objetivos sendo assim prático e realista. Sua impressão do mundo não é influenciada pela imaginação. Observa os detalhes e não se prende à visão geral do todo. Tem facilidade para lidar com objetos e máquinas que exijam precisão e cuidados. Gosta de manter as coisas funcionando, prefere executar do que planejar e necessita de dados concretos para avaliar uma situação.

Pensamento: O reflexivo está atento à causalidade lógica de seus atos e dos eventos. Inclui na sua avaliação os prós e os contras de uma mesma situação e busca um padrão objetivo da verdade. Gosta da organização e da lógica, baseando sempre seu julgamento em padrões universais e coerentes, ao invés de valores pessoais. Voltado para a razão, muitas vezes mostra-se frio em seus julgamentos, porém consegue uma análise isenta de julgamentos pessoais e de significado geral.

Sentimento: O sentimento, para , não deve ser confundido com a emoção, mas está ligado à dimensão valorativa das pessoas e coisas; um valor pessoal e não geral como o pensamento. O sentimento toma decisões com base em seus próprios valores pessoais (ou de outras pessoas), mesmo que estas decisões não tenham lógica e objetividade alguma. Sempre vai levar em conta o que sente (valor) em relação a algo como, também os sentimentos dos outros; assim as idiossincrasias humanas são respeitadas. Voltado para as relações pessoais mostra-se receptivo e bom para lidar com pessoas. Tem forte atração pela história e pelas tradições." Questionário de Avaliação Tipológica/Manual, José Jorge de Morais Zacharias, pgs.12, 13 e 14

 

Inconsciente Coletivo: "Chamamos este último de inconsciente coletivo, porque é desligado do inconsciente pessoal e por ser totalmente universal; e também porque seus conteúdos podem ser encontrados em toda parte, o que obviamente não é o caso dos conteúdos pessoais.
Afora as recordações pessoais, existem em cada indivíduo as grandes imagens "primordiais", como forma designadas acertadamente por Jacob Burckhardt, ou seja, a aptidão hereditária da imaginação humana de ser como era nos primórdios. Essa hereditariedade explica o fenômeno, no fundo surpreendente, de alguns temas e motivos de lendas se repetirem no mundo inteiro de formas idênticas, além de explicar por que os nossos doentes mentais podem reproduzir exatamente as mesmas imagens e associações que conhecemos dos textos antigos." – Psicologia do Inconsciente, C.G.Jung, pg.58

 


Inconsciente pessoal
: "O inconsciente pessoal contém lembranças perdidas, reprimidas (propositalmente esquecidas), evocações dolorosas, percepções que, por assim dizer, não ultrapassaram o limiar da consciência (subliminais), isto é, percepções dos sentidos que por falta de intensidade não atingiram a consciência e conteúdos que ainda não amadureceram para a consciência. Corresponde à figura da sombra, que freqüentemente aparece nos sonhos." – Psicologia do Inconsciente, C.G.Jung, pg.58



Individuação
: "Uso a palavra “individuação” para designar um processo pelo qual um ser torna-se um “individuum” psicológico, isto é, uma unidade autônoma e indivisível, uma totalidade.
A individuação significa tender a tornar-se um ser realmente individual; na medida em que entendemos por individualidade a forma de nossa unicidade, a mais íntima, nossa unicidade última e irrevogável; trata-se da realização de seu Si-mesmo, no que tem de mais pessoal, e de mais rebelde a toda comparação. Poder-se-ia, pois, traduzir a palavra “individuação” por “realização de si mesmo”, “realização do Si-mesmo”.

Constato continuamente que o processo de individuação é confundido com a tomada de consciência do eu, identificando-se, portanto, este último com o Si-mesmo, e daí resultando uma desesperadora confusão de conceitos. A individuação não passaria, então, de egocentrismo e auto-erotismo. O Si-mesmo, no entanto, compreende infinitamente mais do que um simples eu… A individuação não exclui o universo, ela o inclui." Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pg.355

 

Introversão
: "O introvertido orienta-se por fatores subjetivos, dirige a sua atenção para o mundo interior de impressões acerca do mundo. É introspectivo e aprecia mais a companhia de livros do que das pessoas. Caracteriza-se por uma certa hesitação diante da ação necessária, tende à reflexão e a refletir antes de agir. Normalmente controlado e retraído, exceto quando em companhia de pessoas intímas. Está mais voltado para atividades solitárias e que se processam em seu interior; prefere compreender a realidade antes de posicionar-se nela."
Questionário de Avaliação Tipológica/Manual, José Jorge de Morais Zacharias, pgs.11 e 12


Neurose
: "Estado de desunião consigo mesmo, causado pela oposição entre as necessidades instintivas e as exigências da cultura, entre os caprichos infantis e a vontade de adaptação, entre os deveres individuais e coletivos.A neurose é um sinal de alarme que o induz a procurar um processo de cura pessoal.


C.G.Jung: "A perturbação psíquica de uma neurose e a própria neurose podem ser concebidas como um ato frustrado de adaptação. Esta formulação corresponde à opinião de Freud, para quem a neurose constitui, num certo sentido, uma tentativa de autocura."

"A neurose é sempre o substituto de um sofrimento legítimo." – Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pgs.356 e 357


Quatérnio: "C.G.Jung: "O quatérnio é um arquétipo, por assim dizer, universal. Constitui o pressuposto lógico de todo julgamento da totalidade. Tal julgamento pressupõe um aspecto quádruplo. Por exemplo: para descrever a totalidade do horizonte, designamos os quatro pontos cardeais. Há sempre quatro elementos, quatro qualidades primeiras, quatro cores, quatro castas na Índia, quatro vias de desenvolvimento espiritual no budismo. Por este motivo também existem quatro aspectos psicológicos na orientação psíquica.Para orientar-nos, necessitamos de uma função que constate que algo é (sensação); uma segunda função, que estabeleça o que é (pensamento); uma terceira função, que decida se isso nos convém ou não, e se desejamos aceitá-lo ou não (sentimento); e uma quarta função que indique de onde isso provém e para onde vai (intuição). Além disso nada há a dizer… O ideal da totalidade é o círculo ou a esfera (v. mandala). Mas sua visão mínima natural é o quadrado. "Um quatérnio tem, às vezes a estrutura 3+1, no sentido de que um dos termos ocupa uma posição excepcional, ou possui uma natureza diferente da dos outros. (Por exemplo, três dos símbolos dos evangelistas são animais e o quarto é um anjo.) Quando o "quarto" elemento se acrescenta aos outros três, surge então o "Um", símbolo de totalidade. Na psicologia analítica, ocorre que a "função inferior" (isto é, aquela que não está à disposição consciente da pessoa), encarna o "quarto". Sua integração na consciência é uma das tarefas  mais importantes do processo de individuação." – Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pgs.357 e 358



Self/Si-mesmo/Totalidade
: É o arquétipo central da ordem, da totalidade do homem, representado simbolicamente pelo círculo, pelo quadrado, pelo quatérnio, pela criança, pela mandala, etc.
"O si-mesmo é o centro e também a circunferência completa que compreende ao mesmo tempo o consciente e o inconsciente: é o centro dessa totalidade do si-mesmo. O si-mesmo é também a meta da vida, pois é a expressão mais completa dessas combinações do destino que se chama: indivíduo."
Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pg.358



Sombra
: "A parte inferior da personalidade. Soma de todos os elementos psíquicos pessoais e coletivos que, incompatíveis com a forma de vida conscientemente escolhida, não foram vividos e se unem ao inconsciente, formando uma personalidade parcial, relativamente autônoma, com tendências opostas às do consciente. A sombra se comporta de maneira compensatória em relação à consciência. Sua ação pode ser tanto positiva como negativa. No sonho, a sombra tem freqüentemente o mesmo sexo que o sonhador. Enquanto elemento do inconsciente pessoal, a sombra procede do eu: enquanto arquétipo do "eterno antagonista", procede do inconsciente coletivo."


A Sombra personifica o que o indivíduo recusa conhecer ou admitir e que, no entanto, sempre se impõe a ele, direta ou indiretamente, tais como os traços inferiores do caráter ou outras tendências incompatíveis."


"A sombra é… aquela personalidade oculta, recalcada, freqüentemente inferior e carregada de culpabilidade, cujas ramificações extremas remontam ao reino de nossos ancestrais animalescos, englobando também todo o aspecto histórico do inconsciente… Se, antes era admitindo que a sombra humana representasse a fonte de todo o mal, agora é possível, olhando mais acuradamente, descobrir que o homem inconsciente, precisamente a sombra, não é composto apenas de tendências moralmente repreensíveis, mas também de um certo número de boas qualidades, instintos normais, reações apropriadas, percepções realistas, impulsos criadores, etc."

Memórias, Sonhos e Reflexões, C.G.Jung, pg.359 e 360
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{mospagebreak title=A Sociedade do Anel, Parte 1}

ANÁLISE DO FILME: "O Senhor dos Anéis / A Sociedade do Anel"; PARTE 1

A NOVA ERA

O filme começa com a narrativa de como foram criados certos anéis, e posteriormente distribuídos os mesmos a líderes de três raças diferentes, tais anéis deveriam servir ao propósito da vontade de governar com paz e inteligência os reinos de cada raça. Foram distribuídos: 3 anéis aos elfos, 7 anéis aos anões mineradores e 9 anéis aos homens. Mas o Um Anel estava em oculto no poder de Sauron, que forjou os anéis partilhados e forjara para si o Um Anel. O Um Anel controlava todos os outros anéis e seus portadores, levando os à sua própria destruição. E tal destruição chegou ao seu clímax com a batalha travada  do exército de homens e elfos contra o exército de Sauron.

Os números dos anéis são interessantes, pois expressam um falso significado, quando analisados separadamente, pois o 3 exprime uma ordem intelectual e espiritual, a triunidade do ser a conjunção do 1 e do 2, a Trindade cristã por exemplo. Ao analisar o três deixando de lado o contexto do Um Anel, certamente poderia se pensar numa ordenação, em um governo de equilíbrio por meio dos três anéis confiados aos elfos. Os 7 representam a conclusão do mundo e a plenitude dos tempos, criação do mundo no livro de Gênesis como exemplo. Os sete anéis enfim trariam um governo de plenitude à raça dos anéis, se formos pensar apenas no 7 e deixar o Um em oculto. E os 9 anéis entregues aos homens vem simbolizar a medida das gestações das buscas proveitosas, o coroamento dos esforços, o término de uma criação, o término de um ciclo e o início de um novo. Finalmente os homens iriam desfrutar de um novo governo mediante ao contexto isolado do 9, mais uma vez não nos atendo ao Um.

As três raças possuem 19 anéis (3+7+9), as três raças desconhecem a existência do Um Anel, que permanece aonde deseja estar, trabalhando em oculto. O problema de Sauron e do Um Anel simbolizam o problema da neurose. O Um está em oculto, Sauron trabalha em oculto na sombra, a consciência é enganada pela sua percepção de um governo melhor, quando na verdade caminha para sua própria destruição. Sauron simboliza o arquétipo da vontade de poder, permanecendo em oculto na sombra, um complexo autônomo, que pode trabalhar livremente em um Ego "preso" em sua visão unilateral de mundo.

Quando o Um Anel é inserido no contexto dos 19 anéis, surge a verdade. Pois agora temos a totalidade do problema, a quaternidade do problema da "Divisão dos Anéis" está resolvida; 3 anéis aos elfos + 7 anéis aos anões + 9 anéis aos homens + 1 o Um anel de Sauron = 20 anéis. O 20 altera todo o pressuposto do prognóstico anteriormente dado aos governos por seus respectivos anéis dado às três raças, pois o 20 simboliza o número do homem, o homem tem 20 dedos, 4 x 5= 20, se somarmos: 4 + 5 = 9, teremos o número de anéis recebidos pelos homens. O 9 simboliza o fim de um ciclo e o início de um novo, isto é claro e explicitado na obra pois é o fim da era dos elfos na Terra Média, e o início da era dos homens na Terra Média e sendo 20 o número dos anéis, 20 também é o número do homem. No Hinduísmo a duração e o fim de cada era cósmica é de 432.000 anos,ou seja 4+3+2=9.

E foi por conta do homem que o Um Anel não fora destruído, o ego obstinado (Isildur) não dera ouvidos à voz do Inconsciente (Elrond), e acabou sucumbindo. O Um Anel então ficou adormecido no fundo de um lago por 2.500 anos (uma referência clara aos conteúdos imersos no Inconsciente) e na posse de Sméagol/Gollum, por mais 500 anos até que Bilbo viesse se apossar do mesmo. E o anel ficou também em posse de Bilbo por 60 anos, na antiga Mesopotâmia eram utilizados dois sistemas de medições numéricas : a decimal e a sexagesimal. A medida sexagesimal era baseada no soss (60), e até hoje utilizamos esta medida numérica; 60 segundos totalizam um minuto, 60 minutos totalizam uma hora, 360 graus um círculo. O ano mesopotâmico constava de 360 dias, a morte e ressurreição de um ano então constavam de 360 dias. Bem, se olharmos para esta totalidade de anos:
2.500 anos (Um Anel no fundo do lago)
+ 500 anos (Um Anel  na posse de Sméagol/Gollum)
+ 60 anos (Um Anel na posse de Bilbo)
= 3.060 anos

E com esta quantidade de anos podemos inferir algumas coisas:

  • Sauron teria necessitado de 3060 anos para recuperar seu poder.
  • 3+6=9, Sauron  recupera suas forças na era dos homens .
  • 20 número do homem, 3 foram as etapas de anos diferenciadas no processo de morte e ressureição de Um Anel/Sauron (1. fundo do lago, 2. posse de Sméagol/Gollum e 3. posse de Bilbo), assim sendo: 60 totalidade sexagesimal / 3 etapas = 20 era do homem.
  • 60 anos na posse de Bilbo, 60 minutos = 1 hora. Enfim chega: "A hora certa do despertar do Um Anel/Sauron."Chegada é a era dos homens, e aqueles que um dia foram homens e hoje são espectros, também são 9. Os nazgûl tem um papel de suma importância para Frodo, conforme vamos ver agora. 

 

O Ritual de Iniciação


Se pensarmos sobre quem era Frodo e quem passou a ser Frodo pós a jornada do Anel, teremos um grande exemplo do que é um ego entregue ao processo de individuação. Uma das narrativas do filme diz o seguinte: "E os hobbits governarão o destino de todos." Na divisão dos anéis, os hobbits foram a única raça a não receber anel algum, os hobbits, da quaternidade das raças foi a raça desprezada, a menor raça, aquela tida com pouco ou sem valor. Mais uma vez a simbolização da neurose aparece expressa, 3 raças receberam atenção e foram reconhecidas como sendo parte da totalidade (Terra Média), 1 raça fora dissociada mesmo fazendo parte do contexto. E assim dependendo do grau de valor e ou importância ao Inconsciente por parte do ego, ele aparecerá expresso em símbolos de tamanhos opostos, certamente como vivemos em uma sociedade onde o ego tem a falsa impressão de estar "no comando do todo", o Inconsciente em certas representações aparece como alguém pequeno.

Tal como  Frodo, e raça dos hobbits, O Grilo-Falante (Pinóquio), erroneamente denominado de "a consciência de Pinóquio", os Umpa-Lumpas, personagens que criam os chocolates da fábrica de Willie Wonka no filme "A Fantástica Fábrica de Chocolates", e exortam as crianças que desrespeitam as regras da fábrica. (Obs: Odiei a versão nova de Tim Burton, prefiro a versão antiga com Gene Wilder e os Umpa-Lumpas laranjas de cabelos verdes). E na Alquimia temos o centro, o alvo, o objetivo de todo alquimista na Idade Média, a lápis phiposophorum e assim libertar o Homúnculo que vive dentro da mesma. O Homúnculo aliás, clamou por séculos até ser libertado "pós Idade das Trevas", embora hoje em dia o mesmo parece ter sido aprisionado novamente, e o redentor clama àqueles que necessitam de salvação e não o sabem. Basta olharmos para o "culto ao materialismo" em que vivemos, e a degradação e ou desprezo dos valores espirituais em nossa sociedade.

Mas retomando o problema de Frodo, um hobbit pacato que nunca havia saído do Condado que nunca sequer havia segurado uma espada, passa em um "estalar de dedos" a ter de salvar toda a Terra Média. "Fácil" não??? Eis o nosso "Hobbitúnculo", mas nada é fácil na jornada do processo de individuação, é necessário que se abra mão de certas coisas das quais já estamos acostumados a ter, e acomodados em viver de determinadas maneiras e isso sempre provoca algum desconforto, alguma dor. E por que não até a própria "morte"? Frodo precisava "morrer", antes de iniciar sua jornada, e foi o que aconteceu, quando o mesmo é atingido pela lâmina do naszgûl, faz parte do ritual de iniciação do herói o auto-sacrifício, morre uma velha natureza, nasce uma nova natureza. A cena do filme evidencia o aspecto do ritual de iniciação, de sacrifício, pois Frodo se encontra na torre de vigia, um local semelhante ao velho círculo de pedras do Stonehenge na Inglaterra, uma mandala de pedras empilhadas onde eram feitos rituais de sacrifícios humanos.
Este texto é bem explicativo sobre a importância do papel do ritual de iniciação:

Moyers: E a mensagem das cavernas?
Campbell: A mensagem das cavernas é sobre uma relação entre o tempo e os poderes eternos, que de algum modo deve ser experimentada ali.

Moyers: Para que eram usadas essas cavernas?

Campbell: A especulação dos investigadores diz que elas tinham a ver com a iniciação dos meninos à caçada. Os meninos aprendiam não somente a caçar, mas a respeitar os animais, que rituais executar, e, em suas próprias vidas, como deixar de ser menino para ser homem. As caçadas você sabe, eram extremamente perigosas. Essas cavernas eram os primitivos santuários dos ritos masculinos, onde os meninos deixavam de ser os filhos das suas mães para se tornarem os filhos dos seus pais.

Moyers: O que me aconteceria se eu fosse uma criança e participasse de um desses ritos?

Campbell: Bem, não sabemos o que eles faziam nas cavernas, mas sabemos o que fazem os aborígenes da Austrália. Pois bem, quando o menino começa a ficar desobediente, um belo dia os homens chegam, e estão nus, exceto por umas esteiras de penas brancas, de ave, que eles grudaram na pele usando o próprio sangue como cola. Eles dançam e soltam mugidos de boi, que são vozes de espíritos, e os homens chegam ali como espíritos. O menino tentará proteger-se junto à mãe, e ela fingirá que está tentando protegê-lo. Mas os homens simplesmente o tomam. Como você vê, a partir desse instante, a mãe deixa de ser útil. Você não pode voltar à Mãe, você está em outro campo. Então os meninos são levados para fora, para o chão sagrado dos homens, e submetidos a duras experiências – circuncisão, subincisão, beber sangue humano, e assim por diante. Assim como tinham bebido o leite materno, quando crianças, agora bebem o sangue dos homens. Vão ser transformados em homens.


Enquanto isso se dá, encenam-se episódios mitológicos, dos grandes mitos. Eles são instruídos na mitologia da tribo. Então no final, são levados de volta à aldeia, e a menina com a qual cada um casará já foi escolhida. O menino retorna agora, como homem. Ele foi arrancado da infância, seu corpo foi marcado de cicatrizes, a circuncisão e a subincisão foram cumpridas. Agora ele tem o corpo de um homem. Não há como voltar à infância, depois de um espetáculo desses…"
CAMPBELL, Joseph. "O PODER DO MITO", pg.85.

E Frodo fora "circuncidado no coração", em meio aos gritos dos espíritos (nazgûl) e a cicatriz pemaneceu, evidenciando que aquele Frodo do Condado estava morto, nascia agora, Frodo da Terra Média. Interessante notar que os espectros não podem ser mortos por homens, mas os mesmos temem o fogo, o Fogo do Espírito. João Batista batizava com água, mas Jesus veio para batizar com fogo, Heracles derrotou a Hidra queimando com fogo os pescoços que tinham as cabeças cortadas, pescoço queimado, não nasciam mais as cabeças, a malignidade era extirpada de vez pela iluminação do Espírito.

As Sociedades

Abordada já a questão do 9, não se faz necessário maiores explicações do significado do mesmo no contexto da obra. Para termos uma sociedade são necessários 9 membros, e este é o tema que dá título a esta primeira parte da obra. Todo símbolo tem sua dualidade, assim como há a Sociedade do Anel, formada pelos 4 hobbits + 2 homens + 1 elfo + 1 anão + 1 mago = 9, há também o oposto desta sociedade. A sombra dela é sociedade composta dos 9 espectros, reis bruxos.
Dentro da Sociedade do Anel,há suas subdivisões:

  • A quaternidade dos hobbits: Frodo (função pensamento) X Sam (função sentimento) / Pippin (função intuição) X Merry (função sensação)
  • A tríade: Aragorn, Legolas e Gimli.
  • O par de opostos: Gandalf X Boromir.


Desta forma temos uma totalidade expressa pela quaternidade dos hobbits, porém a tríade composta demonstra que algo está faltando, ou seja a destruição do Um Anel. E o par de opostos entre Gandalf e Boromir nos remete aos irmãos Castor e Pólux, um mortal o outro imortal, os dois ladrões ao lado de Cristo na cruz, um desce à mansão dos mortos e o outro sobe para o paraíso, da mesma maneira como Cristo desce à mansão dos mortos e sobe aos céus posteriormente. Boromir morre, Gandalf morre e ressurge.

Esta subdivisão em 3 partes da sociedade nos remete mais uma vez ao número de duração e término de uma era cósmica, 432.000 anos. Pois, 4 hobbits + 3 + 2 opostos = 9 A Sociedade do Anel.

{mospagebreak title=A Sociedade do Anel, Parte 2}

ANÁLISE DO FILME "O Senhor dos Anéis / A Sociedade do Anel"; PARTE 2
MORIA , MOÏRAS E MORIÁ


Começa a jornada da Sociedade do Anel. Como todo início de jornada, pressupõe-se um período de preparação para se enfrentar os obstáculos da longa estrada da individuação. E tal período durou 40 dias  de viagem  pelas montanhas sombrias, número de dias este que remete ao período de  transformação, vide as  referências bíblicas, tal como o povo hebreu no deserto, Elias em sua caminhada e Cristo em seu jejum no deserto.

Em meio a este período de preparação, Gandalf era o mais cauteloso, provavelmente pelo fato de o Velho Sábio, ter a visão e o discernimento a respeito do futuro da Sociedade, e principalmente o seu individualmente. O Velho mesmo sendo rico na intuição, ainda temia seu futuro, sua demanda interna e sua transcendência. Gandalf e os outros logo percebem que não estão sozinhos. Pois os corvos, espiões de Saruman, os observam e vão ao encontro de seu senhor relatar. Gandalf estava temeroso quanto a sua segurança e a de seus amigos, tentou conduzir o grupo por um caminho onde não fosse necessário passar pelas Minas de Moria.

O mago cinzento temia  confrontar a obscuridade de um tempo muito antigo, e fez o possível para não irem na direção das Minas dos anões. Mas quando o ego se rebela contra a soberania do Inconsciente, este se utiliza dos recursos os quais bem entender para colocar a consciência em seu devido lugar; o caminho doloroso porém glorificador da individuação. Vejo aqui a soberania do Inconsciente frente a consciência, indiscutivelmente.

Saruman, a sombra de Gandalf, vem pertubar os planos obstinados do ego. E provoca uma avalanche na montanha, impedindo a Sociedade de progredir rumo a sua derrota. Pois o grupo estava tomando o rumo no qual não passaria por Moria, e se o grupo não iria passar por Moria, não iria ultrapassar importantes obstáculos necessários do processo de individuação.

Ao chegar na frente do portão das Minas, Pippin começa a jogar pedras na água. Eis um gesto simbólico de acordar as forças das profundezas, ocultas em todos nós. Tanto que o mesmo é repreendido na mesma hora: "Não perturbe a água!". Um polvo gigante sai da água e avança contra a Sociedade, um prenúncio do que estava por acontecer com o velho mago.

Passada a ameaça aparente, todos entram nas Minas. Sentam-se para descansara um pouco e um interessante e importante diálogo ocorre entre Gandalf e Frodo. O velho mago conta que os anões de  Moria cavaram profundamente em busca de riquezas. E por conta disto, acordaram o Mal. Fica clara aqui,a ganância dos anões. Os anões foram vítimas de sua própria ganância, foram destruídos por ela. Quando o ego se distancia dos objetivos propostos pelo Inconsciente, acaba por cair nas garras hostis e destrutivas  do mesmo, no caso aqui simbolizado pelos orcs e pelo Balrog, responsáveis pela destruição dos anões.

Cinzento conta que o Gollum está seguindo o grupo há 3 dias. Ele diz a Frodo que Gollum ama e odeia o anel. Frodo diz que foi uma pena Bilbo não ter matado Gollum quando pode. Gandalf responde: "Pena? Foi a pena que segurou a mão de Bilbo. Consegue entender isto? Muitos que vivem merecem morrer. E muitos que morrem merecem viver. A piedade de Bilbo pode governar o destino de muitos. Bilbo foi destinado a encontrar o Anel, e você destinado a carregar o Anel. Gollum ainda tem um papel a cumprir."

Toda esta fala de Gandalf é muito importante, pois fala  a respeito de destino. E de como Bilbo e Gollum, ambos estavam destinados a cumprirem seus papéis, em toda  a obra de Eru. Ou seja, como todos estamos predestinados pelo Inconsciente a cumprir nossos objetivos.

O nome de local onde  a Sociedade se encontra agora,não poderia ser mais sugestivo, Moria. Tal nome  têm uma grande semelhança com o termo Moira, mais precisamente Moiras. Não sei se foi intencional da parte de Tolkien ter dado o nome Moria, pela semelhança com o termo Moiras, ao local onde se localiza as Minas dos anões. Os acontecimentos dentro das minas e anteriores a chegada do grupo, deixam clara a ação das Moiras, trabalhando nas ocorrências das sincronicidades.

"…A palavra  grega moîra provém do verbo meíresthai, obter ou ter em partilha, obter por sorte, repartir, donde Moîra é parte, lote, quinhão, aquilo que a cada um coube por sorte, o destino. Associada a Moîra tem-se, como seu sinônimo, nos poemas homéricos, a voz arcado-cipriota, um dos dialetos usados pela  poeta Aîsa. Note-se logo o gênero feminino de ambos os termos, o que remete à idéia de fiar, ocupação própria da mulher: o destino simbolicamente é "fiado" para cada um. De outro lado Moîra e Aîsa aparecem no singular e só uma vez na Ilíada, XXIV, 49, a primeira surge no plural.


O destino jamais foi personificado e, em conseqüência, Moîra e Aîsa não foram antropomorfizadas:  pairam soberanas acima dos deuses e dos homens, sem terem sido elevadas à categoria de divindades distintas. A Moîra, o destino, em tese, é fixo, imutável, não podendo ser alterado nem pelos próprios deuses. Há, no entanto os que fazem sérias restrições a esta afirmação e caem no extremo oposto: ´Aos olhos de Homero, Moîra confunde-se com a vontade dos deuses, sobretudo de Zeus. É bem verdade que em alguns passos dos poemas homéricos parece existir realmente uma interdependência, uma identificação da Moîra com Zeus, como nesta fala de Licáon a Aquiles:

'E a MOÎRA fatídica, mais uma vez, me colocou em tuas mãos: parece que sou odiado por ZEUS pai, que novamente me entregou a ti…'


…As Moîras são a personificação do destino individual, da "parcela" que toca a cada um neste mundo. Originariamente, cada ser humano tinha a sua moîra, a saber, "sua parte, seu quinhão" de vida, de felicidade, de desgraça…
…Impessoal e inflexível a Moîra é a projeção de uma lei que nem mesmo os deuses podem transgredir, sem colocar em perigo a ordem universal…

Essa Moîra, sobretudo após as epopéias homéricas, se projetou em três Moîras: Cloto, Láquesis e Átropos, tendo cada uma função específica, de acordo com sua etimologia:

CLOTO, em grego (Klothô com o aberto), do verbo (klóthein), fiar, significando, pois, Cloto, a que fia, a fiandeira. Na realidade, Cloto segura o fuso e vai puxando o fio da vida.

LÁQUESIS, em grego (Lákhesis), do verbo (lankhánein), em sentido lato, sortear, a sorteadora: a tarefa de Láquesis é enrolar o fio da vida e sortear o nome de quem deve morrer.

ÀTROPOS, em grego (Átropos) de a (a , "alfa privativo"), não, e o verbo (trépein), voltar, quer dizer, Átropos é a que não volta atrás, a inflexível. Sua função é cortar o fio da vida…"
<b>MITOLOGIA GREGA VOL.I</b>; Junito de Souza Brandão; pgs.140,141,230,231

Gimli que anteriormente descrevera da hospitalidade de seu povo e de seu primo Bahlin ,encontra restos mortais de um anão e lamenta a morte do primo. Aliás o nome Bahlin (não sei a grafia correta) traz uma referência ao baalim. E baalins são os seguidores do deus Baal. No Antigo Testamento há referências bíblicas sobre este deus opositor a Javeh. Estas são algumas referências : Juízes 2;13 – 1 Reis 19;18  – 2 Reis 10;19

O nome do primo de Gimli traz um sentido de alguém, ou um povo provavelmente que seguia a um deus instintivo e primitivo, tal como Baal do Antigo Testamento, no caso aqui o Balrog seria este deus. Balrog personifica a ganância auto-destruidora dos anões. Gandalf se refere ao Balrog como um demônio do mundo antigo, logo mundo antigo, logo Antigo Testamento (Baal). Os anões de Moria foram um povo que viveram aprisionados pelas garra destrutivas e hostis do Inconsciente. E assim como Pippin perturbou as profundezas no lago, o ato simbólico de confrontação com o que está oculto na sombra se repete, desta vez em um poço. Uma batalha ocorre entre a Sociedade, orcs e um troll.

Em seguida o grupo foge dos orcs e encontram o antigo demônio, deus dos anões. Mas na verdade este é mais um dos desígnios abençoadores do Inconsciente. Gandalf compreende que sua hora chegou, é a hora do sacrifício. E aqui há mais uma semelhança no nome do local onde estão situadas as Minas dos Anões. Moriá é o nome da terra onde se localizava o monte onde Javeh ordenou que Abraão sacrificasse seu filho Isaque. Abraão teria de abrir mão de seu filho, teria de abrir mão do desejo egoístico que certamente não teria nenhum prazer em sacrificar seu filho. Embora Abraão não tenha sacrificado seu filho no Monte Moriá, ele sacrificou seu próprio ego, ouvindo a voz do Inconsciente. (Gênesis 22; 1-19.)
 
Abraão em Moriá sacrificou seu ego. Gandalf em Moria sacrificou seu ego também. É tempo de confrontar sua sombra, embora ele diga em vão: "Volte para a sombra!" Mas não é o conteúdo hostil que deve descer as profundezas das trevas novamente, e sim Gandalf quem deve realizar a catábase. O mago se rende, sabe do propósito transformador que tal experiência lhe proporcionará. Já o resto da Sociedade, não entende os propósitos de Eru, tanto que o velho sábio em uma postura de altivez, digna de tal arquétipo, diz a Frodo: "Corram seus tolos!" Tolos? Sim, pois não entendem a visão e o propósito da totalidade do Self.

O grupo lamenta e seguem  para o refúgio revitalizador da Floresta de Lórien, o reino da Dama da Floresta. A Grande Mãe da Terra Média, a anima de Frodo; Galadriel. Em Galadriel vemos a dualidade da anima, quando a mesma é testada, e passa pelo teste. O grupo recebe presentes dos elfos; as capas, as cordas e a luz de Elendil entregue a Frodo: "Que haja uma luz para você no escuro quando todas as outras se apagarem."


A Sociedade parte de Lórien. Boromir sucumbe frente ao desejo de poder. Antes de morrer porém, consegue se redimir, seu papel está cumprido na jornada. Boromir fora destinado a dispersar os hobbits. Tal dispersão teve o objetivo de encaminhar Merry e Pippin aos Ents e Frodo e Sam até Mordor. Mais um vez vemos a atuação das Moîras. Talvez uma frase de Gandalf sintetize bem o que ocorreu desta segunda parte em diante, até o fim  da jornada: "Assim como todos os que testemunham tempos como este, mas não cabe a eles decidir. O que nos cabe é decidir o que fazer com o tempo que nos é dado."


Salmos 139; 16: "os teus olhos viram o meu corpo ainda informe. Todos os dias que foram ordenados para mim, no teu livro foram escritos quando nenhum deles havia ainda."

BIBLIOGRAFIA:


BRANDÃO, Junito de Sousa . Mitologia Grega / Vol. 1. Petrópolis. Vozes. 11ª ed. 1997.

CHEVALIER, J & GHEERBRANT, Dicionário de Símbolos. 14ª ed. Rio de Janeiro. José Olympio. 1999.

Textos da Bíblia Sagrada :

Gênesis 22; 1–19.

Juízes 2; 13.

1 Reis 19; 18.

2 Reis 10; 19.

Salmos 139; 16.

 

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ANÁLISE DO FILME "O SENHOR DOS ANÉIS / AS DUAS TORRES"

A IMPORTÂNCIA  DA SOMBRA


O filme começa com Frodo e Sam  caminhando em círculos,sem sair do local onde estavam, passando pelos mesmos lugares  e não obtendo êxito em sua jornada rumo a Mordor .
Justamente porque ambos representam uma verdade unilateral do Self, ambos são funções racionais: Frodo (pensamento) e Sam (sentimento).
Falta a Frodo e Sam , a  complementação das funções irracionais, a sensação e a intuição personificadas em  Smeagol (sensação) / Gollum (intuição).

"… "Ars totum requirit hominem!" (a Arte requer o homem inteiro!), exclama  um velho alquimista. Justamente é este "homo totus" que se procura.
O esforço do médico, bem como a busca do paciente, persegue esse "homem total" oculto e ainda não manifesto, que é  também o homem mais amplo e futuro.
No entanto, o caminho correto que leva à totalidade é infelizmente feito de desvios e extravios do destino. Trata-se da "longissima via", que não é uma reta, mas uma linha que serpenteia, unindo os opostos à maneira do caduceu, senda cujos meandros labirínticos não nos poupam do terror. Nesta via ocorrem as experiências que se consideram de "difícil acesso". Poderíamos dizer que elas são inacessíveis por serem dispendiosas, uma vez que exigem de nós o que mais tememos, isto é, a totalidade…"
PSICOLOGIA E ALQUIMIA, C.G.JUNG, pg.20.

Sim, o caminho correto que leva a meta da individuação é feito de desvios e extravios do destino.
Frodo e  Sam continuariam em desvios e extravios de caminho, caso não tivessem encontrado o seu lado oposto em Sméagol / Gollum.


Pois são justamente tais funções irracionais, perceptivas que podem guia-los por caminhos escondidos e ocultos que levam até "O Portão Negro", as funções de julgamento racionais desconhecem tais caminhos.


O sentimento (Sam) pode até querer desprezar aspectos repulsivos (Sméagol / Gollum) em relação a si próprio, mas o pensamento é capaz de conviver com tais aspectos,pois entende que os mesmos são necessários em prol do objetivo da totalidade:

"Sam (sentimento): Por que não o atamos e o deixamos para trás ?
 
Frodo (pensamento): Talvez ele mereça morrer, mas agora que o vejo tenho pena dele.
"


E assim como a pena segurou a mão de Bilbo, e governou o destino de muitos, a mesma situação se repete com Frodo . Frodo afirma que sem Sam ele não teria conseguido chegar tão longe, mas não conseguiria de forma alguma completar sua jornada sem  Gollum.
Mas aí, para se admitir isso, é necessário um esforço muito grande por parte da consciência em reconhecer a suma importância da sombra.

MEDUSELD


Aragorn, Legolas e Gimli seguiam o rastro de Merry e Pippin. Porém, os três se deparam com Éomer e seus homens que haviam sido banidos por Gríma do reino de Rohan.
Na noite anterior os rohirins entraram em confronto com os orcs que detinham a posse de Merry e Pippin, tal acontecimento possibilitou a fuga dos hobbits para a Floresta de Fangorn.
Seguindo os rastros deixados por Merry e Pippin, os três valentes adentram a Velha Floresta onde se encontram com Gandalf inesperadamente.
Gandalf lhes conta que :

"Por fogo, água, desde a caverna mais profunda, até o monte mais alto lutei contra o Balrog de Morgoth"

E o texto bíblico conta que:

Isaías 43,2: "Quando passares pelas águas, estarei contigo, e quando passares pelos rios, eles não te submergirão. Quando passares pelo fogo, não te queimarás,nem a chama arderá em ti."


Nesta fala de Gandalf, encontra-se a representação do Self, Gandalf atingiu a totalidade.
A conjunção de opostos está completa em Gandalf o Branco, é na virada da maré que ele retorna aos que precisam de sua ajuda, sua missão não está completa .

Os quatro agora se dirigem a Rohan, pois o rei Théoden se encontra sob a influência de Gríma Língua de Cobra. Então podemos ver que, a consciência fora tomada pelos aspectos obscuros do Inconsciente, a luz não se encontra no Ego de Théoden, mas na sombra.
Gríma personifica as forças destrutivas do Inconsciente, a estória não nos conta sobre a personalidade de Theóden anterior a possessão do arquétipo maligno na consciência do rei dos rohirrins, porém é muito provável que o mesmo adotava uma postura orgulhosa e onipotente, sempre buscando mais poder, até que a atitude compensatória do inconsciente transformou Théoden em um simples fantoche. Caso contrário teria sido muito difícil ocorrer tal cisão conforme o acontecido.O rei se tornou cego, rígido e petrificado diante dos desígnios e ordens de Gríma.


O nome do palácio dourado do rei de Rohan tem um nome sugestivo, que parece transmitir um significado tanto da cegueira do momento vigente, como também de sua cura e libertação no futuro.


Ao separar o termo desta forma, Medus – eld, encontramos um significado no presente e no futuro da neurose de toda Rohan.
O termo Medus, nos remete ao mito de Medusa, personagem a qual todo aquele que olhasse para ela se petrificava.


Théoden  se tranfromou em uma estátua de pedra, sem individualidade alguma ao olhar para os conselhos de Língua de Cobra. Este texto explicará melhor a tragédia do Rei Theóden:

"Górgonas

Três irmãs, três monstros, cabeça aureolada de serpentes enfurecidas, presas de javali saindo dos lábios, mãos de bronze, e asas de ouro: Medusa, Euríale, Esteno.
Simbolizam o inimigo a abater. As deformações monstruosas da psique são devidas às forças pervertidas dos três impulsos: sociabilidade, sexualidade, espiritualidade.
Euríale seria  a perversão sexual, Esteno a perversão social; Medusa simbolizaria o princípio desses impulsos: o espiritual e evolutivo, mas pervertido em estagnação vaidosa.
Só se pode combater a culpabilidade originada da exaltação vaidosa dos desejos com um esforço no sentido de realizar a justa medida, a harmonia.
É isso que simboliza quando  as Górgonas ou as Erínias perseguem alguém, à entrada no templo de Apolo, deus da harmonia, como num refúgio.
Quem via a cabeça da Medusa ficava petrificado. Não seria por refletir a Górgona a imagem de uma culpa pessoal? Mas o reconhecimento da falta, no contexto de um justo conhecimento de si mesmo, pode também perverter-se em exasperação doentia, em escrúpulos paralisantes de consciência.
Paul Diel observa com profundidade: 'A confissão pode ser – o é quase sempre – uma forma específica da exaltação imaginativa: um remorso exagerado. O exagero da culpa inibe o esforço reparador. Só serve ao culpado para refletir vaidosamente na complexidade,imaginada única e de profundeza excepcional,da sua vidas subconsciente…
Não basta descobrir a culpa. É preciso suportar a visão dela de maneira objetiva, nem exaltada nem inibida (sem exagera-la ou minimiza-la). A própria confissão deve estar isenta de excesso de vaidade e de culpabilidade… A Medusa simboliza a imagem deformada do eu… que petrifica de horror ao invés de esclarecer na medida justa' (DIES, 93-97 ).
" DICIONÁRIO DE SÍMBOLOS, JEAN CHEVALIER / ALAIN GHEERBRANT, pg.476.

E quanto ao termo eld, ele trás uma referência com a palavra inglesa Elder:

ELDER <'elde>, s. Ancião; antepassado; dignitário; chefe de uma tribo; oficial superior em algumas igrejas protestantes; (bot) sabugueiro. a . comp. de old, mais velho .

É bem claro sobre quem seja o Ancião da estória, Gandalf. Ele é justamente o oposto de Theóden. O rei está cego e petrificado, nas sombras. Gandalf é o Branco, o que ilumina e trás a visão. O termo Meduseld seria então uma referência a cegueira e imobilização de Theóden (Medusa), juntamente com a iluminação e transformação que Gandalf ( Elder) trás à consciência nublada e obscurecida.


O termo Meduseld  encerra em si próprio o início e o fim da estória em "As Duas Torres", pois o termo expressa como uma consciência nublada, indiferente em relação a seus próprios problemas e desafios e sem esperanças (povo de Rohan / Ents) personificado por Théoden, passa a ter uma visão ampliada quando recebe a cura de sua cegueira pela relação restaurada com o inconsciente (Gandalf / Merry e Pippin).

A luz de Gandalf descendo a montanha cegou os orcs, que logo foram derrotados. Gandalf simboliza o arquétipo do Self, o homem total emana "luz própria", e por onde passa transforma os que estão ao seu redor.


"A transformação espiritual da humanidade ocorre de maneira vagarosa e imperceptível, através de passos mínimos no decorrer de milênios e não é acelerada ou retardada por nenhum tipo de processo racional de reflexão e, muito menos, efetivada numa mesma geração. Todavia, o que está a nosso alcance é a transformação dos indivíduos singulares, os quais dispõem da possibilidade de influenciar outros indivíduos igualmente sensatos de seu meio mais próximo e, às vezes, do meio mais distante.
Não me refiro aqui a uma persuasão ou pregação, mas apenas ao fato da experiência de que aquele que alcançou uma compreensão de suas próprias ações e, desse modo teve acesso ao inconsciente, exerce, mesmo sem querer, uma influência sobre o seu meio.

O aprofundamento e ampliação da consciência produz os efeitos que os primitivos chamam de "mana". O mana é uma influência involuntária sobre o inconsciente de outros, uma espécie de prestígio inconsciente, e seu efeito dura enquanto não for perturbado pela intenção consciente." PRESENTE E FUTURO, C. G. JUNG, pg. 50.

O DIQUE SE ROMPE


Os orcs levavam consigo Merry e Pippin, pois a única informação que Mordor e Isengard tinham era de que  o Um Anel estava com um hobbit. O objetivo de Sauron e Saruman era obter o Um Anel, e desta forma a ordem era levar o hobbit vivo para concretizar tal meta.
Mas o que os orcs desconheciam, era que na verdade estavam ajudando os pequenos hobbits,levando-os mais próximos de Fangorn .

Da mesma forma Gríma também ajudou os hobbits ao expulsar Éomer e seus cavaleiros de Rohan. Pois fora no momento do combate dos rohirrins contra os orcs que Merry e Pipin conseguiram fugir rumo a Floresta Velha. E as Moiras continuaram seu trabalho :


Romanos 8,28: "Sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus,daqueles que são chamados segundo o seu propósito."

"Saruman também desejava apossar-se do Anel, para uso próprio, ou pelo menos capturar alguns hobbits para seus propósitos malignos.
Então, agindo em conjunto, nossos inimigos só conseguiram trazer Merry e Pippin, numa velocidade espantosa, e no momento certo, até Fangorn, para onde eles nunca teriam vindo de outra forma!"
O SENHOR DOS ANÉIS: AS DUAS TORRES, J. R. R . TOLKIEN, pg. 95

Merry e Pippin são encontrados por Barbávore, o pastor dos Ents, antes de entrarem na Floresta, os hobbits comentavam sobre os Ents, que teriam ganho vida por conta de alguma coisa na água do rio.
Os Ents sempre foram um povo pacífico e não muito sociáveis, não se relacionavam com as outras raças. Eram dissociados do que acontecia na Terra Média, sem preocupações, sem problemas, totalmente apáticos em relação a grande guerra que estava acontecendo.
Porém os Ents não eram dissociados apenas em relação ao que acontecia na Terra Média, eram dissociados também em relação a si mesmos.
Barbávore racionaliza sua atitude e a de seu povo:

"Não estou do lado ninguém, porque ninguém está do meu lado."

Mas o propósito de Merry e Pippin em estar na Floresta, começaria a dar certo. Barbávore convoca os ents para um entebate, uma reunião dos ents, algo não muito comum de ocorrer. A língua entês também é um idioma que se leva muito tempo para se dizer algo, quando utilizada para uma conversa .
E o diálogo também só é feito quando vale a pena, ou seja o povo ent é um povo que reprime a função sentimento, priorizando a função pensamento.
A postura extremamente racional da consciência dos Ents aparece nesta fala de Barbávore:

"Os ents não podem deter esta tempestade. Devemos agüentar os acontecimentos como sempre fizemos. Esta guerra não é nossa."

Mas o dique estava por se romper, não o dique do rio Isen, o rompimento do dique de Isen na verdade só irá ser ocorrer casso o dique do rio do Inconsciente se rompa e inunde a consciência dos ents.
"Não foi em vão que os jovens hobbits vieram conosco, mesmo que tenha sido apenas para o bem de Boromir. Mas esse não é o único papel deles. Foram trazidos a Fangorn e a chegada deles foi como a queda de pequenas pedras que iniciam uma avalanche nas montanhas. Neste momento em que estamos conversando, ouço os primeiros estrondos. Será melhor para Saruman não ser pego fora de casa quando a represa explodir."
O SENHOR DOS ANÉIS: AS DUAS TORRES, J. R. R. TOLKIEN, pg. 93-4

Esta é a missão dos hobbits, complementar as funções racionais caracterizadas nos Ents. Merry personifica a função sensação, Pippin personifica a função intuição. Ambos representam as funções perceptivas irracionais, funções estas que até então faltavam a Barbávore e seu povo.

Pippin (intuição) pede para o velho Ent levá-los ao sul, para Isengard, onde está o rio Isen, onde será rompido o dique do inconsciente. Barbávore (pensamento) não entende o pedido do pequeno, mas  atende a demanda :

"Sempre eu gostei de ir ao sul. De certa forma, é como descer colina abaixo"


Esta é a catábase de Barbávore, sua descida ao sul, ao inconsciente. Lá o ent encontrará a função sentimento, que será a grande responsável pela marcha dos Ents rumo a Isengard. O dique do inconsciente se rompeu inundando as consciências antes frias e racionais, agora os Ents marcham inflamados pelos sentimentos trazidos à tona pelo inconsciente. O discurso de Barbávore agora é outro, pois ouve o rompimento da represa do inconsciente no momento em que vê (sensação) seus amigos ents mortos:

"Tenho que me ocupar de Isengard esta noite com rodas e pedras. Os ents partem para a guerra. É provável que encontremos nosso fim. Que seja a última marcha dos ents."

"O velho Ent agora pegou os Hobbits de volta, e colocou-os sobre os ombros outra vez, e assim eles foram orgulhosos à frente do grupo que cantava, com os corações palpitando e as cabeças erguidas. Embora tivessem tido expectativas de que alguma coisa ocorresse eventualmente, ficaram chocados com a mudança que ocorrera ao Ents. Parecia abrupta como o estouro de uma correnteza há muito tempo estancada por um dique." O SENHOR DOS ANÉIS: AS DUAS TORRES, J. R. R. TOLKIEN, pg. 83

O Rio antes represado, agora corre livre pelos Ents. Por conta deste rompimento os Ents libertam o rio Isen, este passa levando embora toda sujeira, transformando tudo por onde passa.

Ezequiel 47, 1-12:

1. DEPOIS disto me fez voltar à porta da casa, e eis que saíam águas por debaixo do umbral da casa para o oriente; porque a face da casa dava para o oriente, e as águas desciam de debaixo, desde o lado direito da casa, ao sul do altar.

2. E ele me fez sair pelo caminho da porta do norte, e me fez dar uma volta pelo caminho de fora, até à porta exterior, pelo caminho que dá para o oriente e eis que corriam as águas do lado direito.

3. E saiu aquele homem para o oriente, tendo na mão um cordel de medir; e mediu mil côvados, e me fez passar pelas águas, águas que me davam pelos artelhos.

4. E mediu mais mil côvados, e me fez passar pelas águas, águas que me davam pelos joelhos; e outra vez mediu mil, e me fez passar pelas águas que me davam pelos lombos.

5. E mediu mais mil, e era um rio, que eu não podia atravessar, porque as águas eram profundas, águas que se deviam passar a nado, rio pelo qual não se podia passar.

6. E disse-me: Viste isto, filho do homem? Então levou-me, e me fez voltar para a margem do rio.

7. E, tendo eu voltado, eis que à margem do rio havia uma grande abundância de árvores, de um e de outro lado.

8. Então disse-me: Estas águas saem para a região oriental, e descem ao deserto, e entram no mar; e, sendo levadas ao mar, as águas tornar-se-ão saudáveis.

9. E será que toda a criatura vivente que passar por onde quer que entrarem estes rios viverá; e haverá muitíssimo peixe, porque lá chegarão estas águas, e serão saudáveis, e viverá tudo por onde quer que entrar este rio.

10. Será também que os pescadores estarão em pé junto dele; desde Engedi até En-Eglaim haverá lugar para estender as redes; o seu peixe, segundo a sua espécie, será como o peixe do mar grande, em multidão excessiva.

11. Mas os seus charcos e os seus pântanos não tornar-se-ão saudáveis; serão deixados para sal.

12. E junto ao rio, à sua margem, de um e de outro lado, nascerá toda a sorte de árvore que dá fruto para se comer; não cairá a sua folha, nem acabará o seu fruto; nos seus meses produzirá novos frutos, porque as suas águas saem do santuário; e o seu fruto servirá de comida e a sua folha de remédio.

BIBLIOGRAFIA:

CHEVALIER, J & GHEERBRANT, Dicionário de Símbolos . 14ª ed. Rio de Janeiro . José Olympio . 1999

SERPA, Oswaldo, Dicionário Escolar/Inglês-Português/Português-Inglês. 6ª ed. Rio de Janeiro.Fename. 1957.
TOLKIEN, J.R.R, O Senhor dos Anéis/As Duas Torres. 2ª ed. São Paulo. Martins Fontes. 2001 .

JUNG, C.G., Presente e Futuro. 4ª ed. Petrópolis. Vozes. 1999.

JUNG, C.G., Psicologia e Alquimia .2ª ed. Petrópolis. Vozes. 1994.

Textos da Bíblia Sagrada :

Ezequiel 47; 1-12.

Isaías 43; 2.

Romanos 8; 28.

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Lariza

Falta a análise do filme ” O Hobbit : Uma jornada inesperada”

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