Blogo do PVC. Pra variar, ótima análise (é para os corneteiros do Mano):
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Trinta anos de crises na seleção com algo em comum: recomeço da estaca zero
Volte no tempo e entenda por que a seleção brasileira vive tantas crises. A cada dois, três anos no máximo, discussões sobre as razões de maus resultados. O desgaste põe em risco bons técnicos, bons jogadores, sempre apontados como responsáveis por não fazer o Brasil render o que pode – ou deve.
A razão disso é óbvia, embora nos custe entender: o Brasil está sempre começando um novo trabalho, sem nem fio condutor que ligue ao anterior.
Dunga saiu e, com ele, toda a comissão técnica.
Antes saiu Parreira, sem deixar herança para o sucessor.
E antes Felipão, que não tinha nada a ver com Parreira.
Quando se diz que Mano Menezes constrói seus times à base de posicionamento, aqui não há crítica. É o estilo do treinador – bom técnico, diga-se. O ponto é entender como ele trabalha e dar a ele condições de funcionar a seu modo. Se ele é o escolhido, deve receber tempo e organização para montar seu time a seu estilo.
Para isso, o melhor é herdar uma filosofia que mude aos poucos, de técnico a técnico.
Não com rupturas seguidas. Abaixo, um pequeno histórico de trinta anos de Seleção Brasileira. Veja como as crises sempre acontecem quando um novo trabalho começa:
1979 – Cláudio Coutinho deixa a seleção depois de ser eliminado na Copa América pelo Paraguai. A crise vinha acompanhada do fim da CBD e início da CBF. A ruptura era inevitável.
1980 – Telê Santana foi escolhido por Giulite Coutinho. O presidente da CBF representava a ruptura com Heleno Nunes e os governos militares. Havia boa vontade com Giulite e, consequentemente, com Telê. Mesmo assim, esboço de crise com a derrota para a União Soviética no Maracanã. Era o segundo jogo de Telê.
1983 – Até cair no Sarriá para a Itália, seleção vivia em paz. Parreira assumiu o lugar de Telê. Não tinha nada a ver com o antecessor. Estreou com vitória sobre o Chile, por 3 x 2. No terceiro jogo, em excursão à Europa, empate com Gales. Crise! Como empatamos com o País de Gales!? Até o final do ano, 5 vitórias, 7 empates, duas derrotas. Mais crises ao ver cair tabu de 13 anos sem derrotas para a Argentina e com o vice-campeonato da Copa América.
1985 – Edu assumiu o lugar de Parreira em 1984 e ficou só três jogos. Evaristo assumiu em 1985 e teve mais seis partidas. Telê voltou após duas vitórias, dois empates, duas derrotas e crise profunda. Dizia-se que jogadores como Bebeto, Casagrande e Mozer não tinham estofo para a seleção. O Brasil perdeu do Peru em Brasília e Evaristo caiu com derrota para o Chile: 2 x 1 em Santiago.
1986 – Telê recomeçou com derrotas para Alemanha e Hungria, na Europa. Em dois jogos, cinco gols sofridos, nenhum marcado. O Brasil não é mais aquele, olha a cara dele...
1987 – Carlos Alberto Silva é o técnico na Copa América da Argentina. Já tinha perdido da Irlanda, em Dublin, quando caiu contra o Chile: 0 x 4 em Córdoba. Ele não caiu. O Brasil perguntava e a revista France Football ecoava, com capa com o título: “Qual é o seu futuro, Brasil?”
1989 – Em quatro anos, quatro técnicos, com a chegada de Sebastião Lazaroni. O Brasil perde em Copenhague: 0 x 4 para a Dinamarca. Lazaroni escala três zagueiros e começa a Copa América no Brasil sob vaias. A única ligação entre os quatro treinadores – Evaristo, Telê, Carlos Alberto Silva e Lazaroni – eram as críticas.
1991 – Lazaroni ganhou a Copa América de 1989, mas perdeu a Copa da Itália. Falcão assumiu seu lugar. Na Copa América do Chile, vitória suada contra a Bolívia, empate com Uruguai, derrota para a Colômbia e classificação para a segunda fase com gol de Luís Henrique no último minuto. No saldo de gols, o Brasil eliminou o Equador. Falcão pensava futebol de forma oposta a Lazaroni. O trabalho começava do zero. O vice-campeonato da Copa América não serviu para poupar Falcão dos maus resultados da primeira fase. O diagnóstico: jogadores como Cafu não podiam jogar na seleção brasileira.
1993 – Parreira reassumiu em 1991. Nenhuma ligação com Falcão. Os amistosos apagaram a crise, mas a eliminação na Copa América do Equador e a derrota para a Bolívia, em La Paz, fizeram com que ela voltasse. Pense bem: de novo, três técnicos em três anos. Não podia dar certo. Deu!
O Brasil foi campeão do mundo e Zagallo assumiu em 1994. Nesse caso, havia ligação entre uma seleção e outra.
O Brasil perdeu jogos, foi vice da Copa América de 1995 nos pênaltis, contra o Uruguai, mas desapareceram os argumentos definitivos como “Fora Técnico” ou “Fulano não pode jogar na seleção.”
1999 – Luxemburgo não iniciou seu trabalho com crise, que só veio no ano seguinte, em meio às denúncias sobre sua vida pessoal.
2000 – Luxemburgo cai pelos maus resultados na Olimpíada e pelas denúncias sobre sua vida pessoal. Leão não tinha nada a ver com Luxemburgo. Ruptura de um trabalho para o outro deu em fiasco do novo técnico. Com Leão, 3 vitórias, 4 empates, 3 derrotas.
2001 – Felipão assume. De novo, ele não tinha nada a ver com Leão. O terceiro técnico em dois anos. O trabalho muda, os resultados não. Derrota para o Uruguai, nas Eliminatórias, eliminação na Copa América da Colômbia contra Honduras. Juan pagou o preço, Roque Júnior não podia ser jogador de seleção. Carlos Alberto Torres deu entrevista à rádio Jovem Pan profetizando o apocalipse: o futebol brasileiro tinha perdido seu caminho.
No ano seguinte, campeão mundial com Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho.
2003 – Novo recomeço. Parreira abandona os três zagueiros, volta ao 4-4-2, com muita posse de bola. Não houve crise, nesse caso. A não ser no fim do trabalho, em 2006.
2007 – Dunga dirige o time na Copa América, onde chega após onze amistosos. Derrota para o México e mau futebol na primeira fase faz produz novos comentários apocalípticos: “Daniel Alves não pode jogar na Seleção!” Houve mais crises, com derrotas para Paraguai e Venezuela. Nada tão grave quanto no início do trabalho.
2011 – Mano assume e empata com a Venezuela, estreia na Copa América da Argentina após oito partidas. Por que só empatamos com os venezuelanos?
Existse alguma ligação entre o novo trabalho e os anteriores?
Não, nenhuma! Culpa do técnico ou de quem organiza a seleção?
A segunda alternativa é melhor.
Fonte:
http://espn.estadao.com.br/pauloviniciuscoelho