[...]A pena de morte não se apoia, assim, em nenhum direito. É uma guerra declarada a um cidadão pela nação, que julga a destruição desse cidadão necessária ou útil. Se eu provar, porém, que a morte não é útil nem necessária, terei ganho a causa da humanidade.[...]
O rigor do castigo causa menos efeito sobre o espírito humano do que a duração da pena, porque a nossa sensibilidade é mais fácil e mais constantemente afetada por uma impressão ligeira, mas freqüente, do que por um abalo violento, mas passageiro. Todo ser sensível está submetido ao império do hábito; e, como é este que ensina o homem a falar, a andar, a satisfazer suas necessidades, é também ele que grava no coração do homem as idéias de moral por impressões repetidas.[...]
Assim, pois, a escravidão perpétua, substituindo a pena de morte, tem todo o rigor necessário para afastar do crime o espírito mais determinado. Digo mais: encara-se muitas vezes a morte de modo tranqüilo e firme, uns por fanatismo, outros por essa vaidade que nos acompanha mesmo além do túmulo. Alguns, desesperados, fatigados da vida, vêem na morte um meio de se livrar da miséria. Mas, o fanatismo e a vaidade desaparecem nas cadeias, sob os golpes, em meio às barras de ferro. O desespero não lhes põe fim aos males, mas os começa.[...]
A vantagem da pena da escravidão para a sociedade é que amedronta mais aquele que a testemunha do que quem a sofre, porque o primeiro considera a soma de todos os momentos infelizes, ao passo que o segundo se alheia de suas penas futuras, pelo sentimento da infelicidade presente.[...]
Que se deve pensar ao ver o sábio magistrado e os ministros sagrados da justiça fazer arrastar um culpado à morte, com cerimônia, com tranqüilidade, com indiferença? E, enquanto o infeliz espera o golpe fatal, por entre convulsões e angústias, o juiz que acaba de o condenar deixa friamente o tribunal para ir provar em paz as doçuras e os prazeres da vida, e talvez louvar-se, com secreta complacência, pela autoridade que acaba de exercer. Não será o caso de dizer que essas leis são apenas a máscara da tirania, que essas formalidades cruéis e refletidas da justiça são simplesmente um pretexto para imolar-nos com mais confiança, como vítimas sacrificadas ao despotismo insaciável?