Eu também acho um erro limitar aos acadêmicos, principalmente porque tem muito conflito de ego nas instituições, mas prefiro restringir àqueles que tem conhecimento teórico sobre o assunto para emitir uma opinião com mais propriedade sobre os livros.
Penso que é uma questão do profissional que você busca pra coisas específicas. Se teu carro quebra, ou você quer uma opinião bem construída sobre o assunto, você vai procurar ou alguém que entende muito de mecânica, ou um mecânico que trabalha há anos nisso, não vai perguntar pra sua avó, por exemplo.
Assim como, se você quiser fazer uma boa faxina na casa e não sabe que produto utilizar, ou quer fazer aquela comidinha gostosa fodona, a autoridade que você vai buscar é a sua avó, que há anos entende disso, ou então um estudado no assunto sobre produtos de limpeza ou gastronomia.
A questão aqui é que quando se resenha apenas como um leitor, você se limita ao seu gosto particular e mesquinho. É a inundação eminente do grande mar que é a literatura que o leitor acaba se sujeitando como Bloom diz no Angústia da Influência.
Além disso, a maioria dos leitores comuns (que são a imensa maioria dos resenhistas de blogs) não entende uma poesia bem construída como, por exemplo, Maçã do Manuel Bandeira:
Por um lado te vejo como um seio murcho
Pelo outro como um ventre de cujo umbigo pende ainda o cordão placentário
És vermelha como o amor divino.
Dentro de ti em pequenas pevides
Palpita a vida prodigiosa
Infinitamente
E quedas tão simples
Ao lado de um talher
Num quarto pobre de hotel.
Ou então esse poema, chamado Os Príncipes:
Tudo é inexistente, disseram os príncipes deitados na areia.
E veio o grande pálio aberto e se estendeu sobre o céu sem manchas.
Destroços, ruínas, podridões ameaçavam desabar.
E veio o lírio boiando brando e manso.
O mar ficou alto e agressivo,
Os barqueiros cantaram remando.
E tudo se encaminhou implacavelmente para a noite mais próxima.
Tudo é inexistente, disseram os príncipes deitados na areia;
Ninguém atingirá a última noite,
Porque virão sempre outras noites
E os mesmos pássaros ficarão espalmados no ar.
Mas os barqueiros tinham sêde
E correram com os príncipes.
Mas os barqueiros tinham fome e mataram os príncipes.
O lírio veio boiando docemente
E era a filha do rei
E era a única irmã dos príncipes mortos.
E o lírio ficou no sangue dos mortos como a gota de orvalho na rosa nascida.
Os barqueiros ficaram escravos do lírio
E o seguem de joelhos chorando no deserto.
Poesia é o maior grau de elaboração linguística que existe. Dessa forma, alguém que não entende poesia (ou não se sensibiliza com uma que seja), não está realmente apto a escrever sobre qualquer coisa literária.
Esse lance de absolutamente tudo ser de qualidade é justamente porque a imensa maioria não consegue fazer uma crítica, pois se baseia apenas na pouca experiência de leitor para escrever.
Como eu disse, a maioria se baseia nas experiências do Ensino Médio ou em fontes mais duvidosas como o gosto pessoal. Isso acaba caindo em declarações como essa de que Madame Bovary não é nada mais que um bom estudo sobre a sociedade e passa longe de ser obra de arte. Quando que é bem o contrário disso.
Como eu já falei diversas vezes em diversos lugares, o estudo da Arte é objetivo (por mais subjetivo que seja) já faz algum tempo, por isso é necessário um bocado de experiência pra se elaborar uma resenha decente.
Como eu já disse: ou você estuda alguns anos a fio em alguma universidade, ou você estuda por conta própria e vá ler a maioria dos clássicos literários.
Saber o enredo da maioria dos livros clássicos não lhe garante a experiência da obra porque a maioria desconhece técnicas narrativas, metrificação e coisas parecidas empregadas em sua composição.
Se a obra de arte, para ser criada, tem necessidade de elaboração contínua e incansável, por que os textos sobre elas não devem ter o mesmo nível de estudo?
Qualquer um pode palpitar e mostrar seus gostos, mas só os mais estudados podem estabelecer uma boa relação de causa e consequência relacionados dentro da obra.