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Num dia qualquer

Vail Martins

Usuário
Não lembro da onde vinha. Esqueci. Lembro bem que vinha devagar, sem pressa. Havia sido um dia bem quente e brilhante. O sol amarelado das cinco da tarde me ofuscava mesmo quando fechava os olhos. Tudo era brilhante por baixo das pálpebras. Na minha bicicleta azul deslizava devagar.
Vários meninos passaram correndo por mim, quase me desequilibrando. Gritavam eufóricos. Chegaram na ponte e debruçaram no beiral de onde, olhando para baixo, gritavam e apontavam. Outras pessoas estavam na amurada da ponte.
Desci da bicicleta e procurei ao que toda aquela gente estava vendo.
Seguindo a corrente, uma mulher de uns vinte e poucos anos nadava suavemente no rio.
Ela, meio que flutuando, nadava de costas. Olhava fixamente para o céu, como se ela também, assim como aquela gente toda, seguisse algo. As pessoas a ela, debruçadas na ponte ou andando pelas margens, e ela a alguma coisa num ponto indefinido no céu.
O rio como todos da região, de águas negras, mas limpas, e os cabelos negros dela se confundiam com ele. Ela vestia uma saia raiada que a fazia parecer mais uma folha das muitas que desciam o rio nesta época do ano.
Na ponte do lado norte havia muita gente que também observava a mulher se afastar pra então ou ir embora, cuidar da vida, ou a seguiam pela margem enquanto ela nadava calma e prazerosamente.
Não parecia estar correndo perigo, tanto que a ninguém ocorreu ligar para a policia ou os bombeiros. Ela também não pediu ajuda, ao contrário, ignorou a toda aquela multidão como se a atrapalhasse. Mas eu precisava chegar perto, saber quem ela era ou porque estava fazendo aquilo. Encostei minha bicicleta na amurada e, com algum esforço, agarrei numa escada cimentada no pilar da ponte e desci até quase a água.
As pessoas dividiram sua atenção, se perguntando se eu seria capaz de salvá-la.
Ela se aproximou devagar, enquanto meu coração acelerava.
Quando chegou perto vi seu rosto e lhe estendi a mão: “Segure por favor!”
Ela apenas olhou para mim e me deu um sorriso educado, mas não fez menção de segurar a minha mão. Estendi novamente:
“Por favor!”
Desta vez ela nem mesmo me olhou, não me viu, assim como não via a ninguém ali. Continuou nadando despreocupada enquanto sumia na escuridão da ponte.
Permaneci alguns segundos com a mão estendida, sem acreditar que ela realmente não a segurou. Sua aproximação tão demorada, eternamente longa e angustiante, culminou numa passagem de bem menos de um segundo.
As pessoas agora corriam para o outro lado da ponte para vê-la sair da escuridão e continuar seu caminho.
Subi novamente até a ponte. As pessoas e a mulher se afastavam. Fiquei só. Eu e minha bicicleta, silenciosos.
Nunca mais aquela ponte para mim foi a mesma, nunca mais passei despreocupado, nem calmamente por ela. As águas, hoje não tão limpas assim, estão ainda mais negras.
Me pergunto se ver a mulher de novo terei coragem de me atirar à água e segui-la para onde quer que seja que ela for.

Este texto foi inspirado numa das fotos do Desafio "Quanto vale uma imagem?" postado pelo Palazo. Dê uma passadinha lá. http://www.meiapalavra.com.br/showthread.php?tid=3745&page=1
 

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