Independente da questão celibatária, eu sigo a Tradição da Igreja que sempre afirmou que Cristo viveu celibatário e morreu virgem. O resto é apocrificidades sem relação na Tradição. Se não foi preservado pela Igreja, não é Tradição. E se não é parte da Tradição, é falso. É clara essa opinião: desviasse um tiquinho da Tradição e meu cristianismo viraria pó. Morreria em força vital e viraria academicismo.
Falando de celibato agora.
A Igreja NUNCA obrigou os padres ao celibato, nem mesmo aos bispos.
O que ocorreu foi uma valorização da vida monástica e, portanto, celibatária como uma OPÇÃO, desde os tempos de são Basílio Magno, no Oriente, e são Bento de Núrsia, no Ocidente. E antes disso tivéramos tradições cenobíticas e eremíticas, os chamados Padres do deserto, que pelo menos desde o século II viviam em comunidades ou isolados no deserto em extrema ascese, de comida, bebida, roupas, bens materias e no celibato. Dado esse importante papel espiritual concedido aos monges, foi entre eles que surgiram as maiores estrelas da Ortodoxia, os grandes Padres dos concílios ecumênicos e célebres hierarcas, famosos nas polêmicas e teologia, e também na santidade de vida e exemplo de espiritualidade, deificação viva. Homens que entregaram tudo: títulos políticos, propriedades, bens, família e a oportunidade de terem uma família carnal, para gerarem, como verdadeiros Pais espirituais, verdadeiras famílias espirituais, milhares de filhos espirituais. Foram os grandes campeões da Ortodoxia, martelos dos hereges, os defensores da pureza e da santidade da doutrina ortodoxa face aos cismáticos e heresiarcas de todos os tempos, principalmente a partir dos tempos de são Constantino, mas mesmo antes.
Isso eu coloco aqui pra sublinhar a linha que une o monasticismo com sua valorização da vida casta e virginal (entre outras formas de ascese e sacrifício espiritual) como luzes espirituais, isto é, pra demonstrar o imenso valor da castidade para TODOS os cristãos com a Tradição doutrinária e dogmática da Igreja. Embora a realidade seja menos santa que o modelo queridos pelos Padres, a verdade é que a castidade é para todos: sexualidade vivida castamente dentro do casamento, de resto, castidade para não-casados e viúvos, e para as luzes espirituais, os monges e monjas. Eis o valor espiritual do celibato.
Condena o celibato monástico quem ignora sua importância espiritual para a Igreja, no nível moral-espiritual, e ético. Como exemplo de moralidade a ser seguida em todos os pontos da vida em sociedade: sem moralismo, o sentido do pecar e pedir perdão, e se esforçar na ascese para auto-conhecimento e auto-aperfeiçoamento, o monasticismo ergueu a Igreja, a formou e fez frutificar uma cultura belíssima e espiritualmente impecável, e também foi o coração do Império Bizantino. Não me engano quanto a isso. Bizâncio dos imperadores é, antes, a Bizâncio dos monges.
Voltando ao celibato sacerdotal, este foi instituído, obrigatoriamente, apenas pela Igreja romana (Ocidental e latina) após o cisma de 1054, como uma forma de conter a imoralidade dentre seu clero naqueles tempos corruptos e bárbaros. Gerou muitos santos esse celibato obrigatório, santos latinos. Mas também gerou muita perda de forças-vivas no sentido de negar ao Ocidente pais espirituais que pudessem aconselhar concretamente seus filhos, no tocante à vida conjugal. ESSA crítica ao celibato eu concordo e até endosso. Porque é uma crítica à
obrigatoriedade do celibato, e não ao celibato em si. Separemos as coisas, portanto.
No Oriente, o sacerdócio casado se manteve, firme e forte, e sempre foi a opção-padrão para seleção de presbíteros (padres) e diáconos de paróquias, que aconselhariam seus filhos espirituais e paroquianos, mostrando como deve ser o casamento cristão, casto e cordato, feliz, sacramental, espiritualizado, de comunhão. Com os diáconos casados, Roma manteve algo dessa mentalidade, mas nada que se comparasse à grande santidade e influência dos padres casados na Ortodoxia. Sem hipocrisia. Só se impedia o casamento dos padres viúvos, seu divórcio, e que se casassem após a ordenação.
Por outro lado, a vida cenobítica e eremítica sempre foi preservada e floresceu no Oriente. Se no Ocidente, o celibato obrigatório dos padres tornava-os indistinguíveis dos monges e irmãos frades, no Oriente, havia uma clara diferença entre os padres paroquiais e os monges em seus monastérios, em suas vidas celibatárias, ascéticas, isoladas ou em comunidade, mas sempre... eis o papel do monge: sempre MORTOS para o mundo, para o mundo do casamento, das glórias terrenas, do dinheiro, das posses e heranças, dos filhos e esposas, enfim, mortos para as paixões e vicissitudes desse mundo passageiro, concentrados em deificar-se, em conquistar o céu, o reino de Deus, e, como pais espirituais em mosteiros, aconselhar, pelas sendas que desbravaram, seus filhos, mesmo casados, em como se libertar das paixões e alcançar a theosis, a deificação.
Por isso, e não só por, apesar das recaídas e dúvidas, ter escolhido esse caminho pra mim, acho as críticas ao celibato de tão mal-gosto. Sério, me aborrecem. Enchem o saco mesmo. Enche o saco ver como as pessoas não só são incapazes de manter suas patas racionalistas e mexeriqueiras longes das tradições e símbolos que consideramos sagrados por quase vinte séculos, e ficam inventando essas histórias, relações, teorias, genealogias. Mas temos uma novidade: olha, nós não condenamos o casamento, nem o sexo. Jamais! O sexo é um hino de celebração do amor entre os esposos, amor icônico, ou seja, ícone (imagem) do Amor divino, uma das energias de Deus, um dos Seus 'traços'. A condenação do amor sexual é típica de Agostinho e sua doutrina misógina do pecado original, nunca aceita no Oriente, mas canonizada no Ocidente que até hoje vê a sexualidade como algo demoníaco e antinatural. Nada mais longe da verdade! Compreendida dentro do casamento, comunhão sacramental de amor, o sexo é divino! Mesmo!
Portanto, se Jesus se casou em vez de se mostrar um irrepreensível modelo para os monges (cantamos 'Jesus, doçura dos Monges' no Akathistos), ele se mostra um modelo para os casados, diria até para ambos.
Pra mim essas coisas são mais tentativas de se humanizar Jesus para tentar, assim humanizado, enfiar essas patas nele logo e fazer mais acrobacias com essa patetice de 'Jesus histórico', que nada mais é que uma forma de diminuí-lo para compreendê-lo. Mal sabem, pobres estudiosos, que (falo aqui como cristão ortodoxo) Cristo não faz o MENOR sentido se não for compreendido como os cristãos primitivos e ortodoxos (desculpa aí, não existe diferença entre os dois, mas não MESMO!) o entendia, isto é, como Deus! Então, retire a Divindade de Cristo e tente brincar com o que resta. Não resta nada, e nem faz sentido. Dizer que ele se casou e mesmo teve filhos (o que a Tradição jamais afirmou), também, não o torna menos Deus, só o torna mais humano, e não há equação, por mais que 'aumentem' sua humanidade, toda a vida e doutrina do Cristo só faz sentido inserido no quadro de Sua Divindade. Nossa, isso pra mim é tão óbvio! Não quero obrigar ninguém a crer nisso, só indicar que não adianta ficar fazendo esses malabarismos com o 'Jesus histórico', isso em nada afeta a fé. Só de gente com fé pequena.
Jesus ensinou sim que o celibato é uma opção válida e muito apreciada por Deus como um caminho ascético, de retirada do mundo, não 'obrigatório pra se salvar' (isso nem Roma nunca afirmou), nem 'obrigatório aos sacerdotes' (Roma, oi), mas sim, 'apreciável' a Deus, daí, os bispos serem escolhidos dentre os monges, pelo grande prestígio deles, desde a época dos Grandes Concílios. Jesus sugeriu o celibato, nunca o impôs. Roma deveria se lembrar disso. Mas Jesus o recomendou. Disso deveríamos todos nos lembrar.
Concluindo, sabe o que mais me aborrece nessas críticas ao celibato? É que não se criticam as condições históricas, sociais e culturais em que se deu, no contexto autocrático e impositor da obrigatoriedade, mas se condena TODO celibato. Todo celibato livremente praticado é atacado como anacronismo, prática retrógrada e supersticiosa (!), um preconceito contra o sexo e o instinto, contra o próprio casamento (!!), como uma ignorância fanática e impraticável nos dias de hoje (!!!). São críticas tão toscas, desculpa, gente, não consigo entender como se tem uma noção tão deturpada de algo que, mesmo no Ocidente, foi a alma do catolicismo.
Seria a obrigatoriedade que incomoda? Não será a existência de um possível modo de vida que condena o mundo moderno? Afinal, esse mundo moderno vive ensinando seus dogmas absolutos também não? Relativismo moral? 'Se tens desejo, vai satisfazê-lo', 'O instinto existe, não podemos negá-lo', 'Se tenho vontade de dar ou comer qualquer um, vou e faço e afirmo que todos devem fazer o mesmo, porque é natural'. Ou seja, no fundo, no fundo, todas essas críticas são, além da incompreensão da castidade conjugal e virginal e do celibato enquanto opção livre pelo monasticismo em suas valorações espirituais e religiosas, são também um grande medo de que essas opções livres continuem se mostrando como uma alternativa à libertinagem pós-moderna, aos dogmas e axiomas dessa pós-modernidade sem identidade, sem passado e tradição, sem referencial e moral, essa época bestial que coloca como dogma que todos devemos nos comportar 'naturalmente', como animais, já que, he, não somos mais que animais racionais, então, pensemos e nas horas vagas, vamos esquecer moralidade e tomar banho de lascívia e afirmar isso como dogma e obrigar toda a mentalidade social e intelectual a aceitar essa bestialidade como dogma.
Mas não sou hipócrita. Eu mesmo cometo minhas imoralidadezinhas aqui e ali, depois vou me confessar e vou me emendando, aos poucos. O celibato só torna tudo muito mais difícil, não me tornou mais 'santo'. E ninguém aqui me verá censurando uma pessoa por seu comportamento. Isso nunca faço. Só farei se algum dia alguém, na minha indignidade, me considerar o suficiente pra vir me pedir aconselhamento, digamos, na minha cela, no mosteiro. Aí sim.
O que acho errado e ridículo são essas críticas que vem querer que as religiões joguem suas tradições morais no lixo porque o Ocidente pós-moderno criou o dogma da imoralidade como algo a ser seguido obrigatoriamente por todos, do cafetão ao Papa.
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Eu também estou (apesar da piadinha no final do primeiro post do tópico), pra mim se ele tiver sido mesmo casado, ter tido uma esposa, não diminui nem um pouco seu valor, até porque como a Arringa disse pra pessoa ser completa espiritualmente precisa se relacionar com alguém do sexo oposto.
Não digo que 'precise', mas nada muda, conforme você disse.
Agora... quem disse que só posso me relacionar com o sexo oposto através do sexo? Somos seres humanos ou coelhos? pqp
Eu tenho várias amigas aqui na Vali. Quer dizer que são todas pessoas que eu potencialmente comeria, porque isso é 'natural'? Nessa última parte, não concordo.
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Mas to falando sério.
Eu preferia uma história de doação de amor mais HUMANA.
Oi, sou Paganus, um E.T.