Eles roubaram a minha idéia de entrevistar, mas deixa, a Playboy ainda não tem uma Meia pergunta.
10 perguntas para Hugh Laurie na Playboy
1. Quando as pessoas começaram a dizer: “Ei, não te conheço de algum lugar?”
Na segunda temporada começaram a me encarar na rua, de verdade. No início de canto de olho, reconhecendo vagamente. De repente, você compreende que o telefone celular e a câmera digital mudaram a natureza do que significa estar em público. Não é com os paparazzi que você tem de se preocupar, é com todo mundo.
2. E agora você está chegando ao centésimo episódio, fazendo de House um dos casos mais curiosos de sucesso na TV. Como encara isso?
Ah, meu Deus... Um sucesso cósmico é algo que me escapa totalmente. Sou muito desconfiado das coisas boas demais. Acho que é parte da minha superstição, gerar dor para obter a ilusão do alívio. É o meu modus operandi. Não estou dizendo que rejeito o sucesso, mas, com honestidade, simplesmente não sei como lidar com ele. É um velho sentimento: assim que você consegue a coisa que perseguiu a vida toda, aquele grau razoável de segurança, você começa a se debater, a duvidar. É por isso que me sinto desconfortável sempre que jornalistas fazem listas. O melhor! O mais doidão! Não me sinto digno de lista nenhuma. Listas são para gente alegre e radiante. Listas são para gente em programas grandes e vistosos como Lost, Desperate Housewives, Heroes. Sou mais áspero e resmungão do que alegre e radiante.
3. O sucesso da série não melhorou essa sensação?
Na verdade não. Acho que ser temperamental é parte da minha natureza, mas, olhando para trás, estou muito menos temperamental e deprimido hoje do que aos 25 anos. Gradualmente, fui me suavizando. Estava provavelmente deprimido o tempo todo naquela época. Hoje, é mais ocasional.
4. O que mudou?
É cansativo ficar tão ensimesmado e sombrio, e é difícil para os outros. Meu temperamento provavelmente tem um efeito maior sobre os outros – as pessoas com quem vivo e trabalho – do que sobre mim. Ninguém gosta de ficar perto de alguém que fica lamentando seu destino o tempo todo, e eu não queria ser essa pessoa. Também sei o que me tira de dentro de mim quando fico deprimido: exercício físico, fazer alguma coisa. Pendurar quadros, algo assim. Ou talvez pegar uma escova de dentes e limpar os aros da minha moto.
5. E os antidepressivos?
Tem sido uma resposta, sim. Eu tentei, e eles ajudaram. Provavelmente são bons para o meu trabalho, porque ajudam com a autoconfiança, e autoconfiança é um pré-requisito para qualquer esforço bem-sucedido. Mas, como eu disse, desconfio quando as coisas começam a parecer muito fáceis ou confortáveis, logo, eles também não são uma solução perfeita.
6. Foi muito importante para você conquistar um espaço nos Estados Unidos?
De jeito nenhum. Com o devido respeito, na Inglaterra há um elemento de traição em sair para exercer a profissão em outro país. É meio mal-visto. Houve duas situações exemplares nessa questão: Peter Cook e Dudley Moore. Ambos eram fantasticamente talentosos, mas Peter ficou em Londres e Dudley foi embora. Por ter ido embora, e por morar na gloriosa Califórnia, Moore foi acusado de ter feito um pacto com o diabo que envolvia louras bonitas, praias ensolaradas e Ferraris. Peter manteve o temperamento ligeiramente chuvoso que reverenciamos na Inglaterra. Moore foi percebido como um traidor.
7. Você se preocupa com o que as pessoas na Inglaterra dizem a seu respeito hoje?
Na verdade não, mas isso porque minha vida ainda está na Inglaterra, muito embora eu tenha uma casa em Los Angeles. Teria sido diferente se eu tivesse deslocado toda a minha família para cá, mas meus filhos vão à escola e à universidade lá, e minha mulher ainda mora lá. Acho que tenho muito da veia presbiteriana de meus pais para poder gozar dos frutos do meu trabalho e ceder completamente ao que fez Dudley sucumbir. Na verdade, sempre gostei de Los Angeles. Em parte tem a ver com o que as pessoas dizem que você deve esperar da cidade. As pessoas diziam, “Los Angeles é o pior lugar de todos. Você vai enlouquecer. Não vai durar um mês. Vai perder a cabeça, é tudo muito superficial.” Bem, eu sou superficial, logo, combina muito comigo. Por exemplo, eu gosto de carros e motos esportivas, e não há lugar melhor no mundo para essas coisas.
8. Por falar em motos, você é aquele cara que passa a 100 quilômetros por hora na pista expressa enquanto estamos presos no congestionamento?
Talvez. Você é o cara que fica falando no celular dentro do SUV de quatro toneladas? Quer dizer, já houve momentos em que fiquei imaginando como eu iria morrer. Ver alguma loura oxigenada passando delineador a 80 quilômetros por hora no jipinho dela, sem a menor noção das forças envolvidas no controle do carro, das suas possibilidades e limitações! Sem noção alguma! É absolutamente incrível para mim... Passo por um acidente em Los Angeles pelo menos duas vezes por semana. Em Londres – e não estou dizendo que fazemos as coisas melhor por lá – eu diria que isso só acontece umas duas vezes por ano. Aqui as pessoas simplesmente aceleram para cima uns dos outros, quase como se fosse um esporte. É como um fliperama gigante. Dias secos e ensolarados, sem trânsito, e algum carro sempre vai parar no teto de alguém. Não acho que o problema sejam os Estados Unidos. Acho que isso se limita a Los Angeles, mas torna a ida ao trabalho mais interessante.
9. Sem fazer disso uma lista, quais são os seus episódios preferidos de House?
Há coisas boas em muitos, mas, pensando em episódios completos, acho que “Três Histórias” é o melhor – muito ambicioso, e muito bem-sucedido, dentro do possível. É o episodio em que House dá três palestras, e cada uma tem uma história diferente sobre o sofrimento humano – em particular a dor nas pernas, que é a doença dele. É a história do que aconteceu com a perna dele, e é contada com muita compaixão e criatividade. Os roteiristas da série, brilhantes, encontraram um jeito de costurar as três histórias, envolver o elenco inteiro e criar uma seqüência de fantasia com Carmen Electra jogando golfe. Não dá para pedir mais em um único episódio.
Outro que vem à minha mente é também um dos primeiros que fizemos, chamado “Autópsia”, escrito por Larry Kaplow. Refinadíssimo. É sobre uma garotinha que sofre de um tumor no cérebro, e todo mundo no hospital canta louvores a ela o tempo todo, como se ela fosse um anjinho corajoso. Mas House comete a blasfêmia absoluta de duvidar da sua bravura. Não se pode fazer isso, especialmente na TV, e especialmente com crianças. Pessoas que sofrem de câncer são santificadas. Mas, como House é House, ele mostra de maneira chocante, mas indiscutível, que ninguém pode ser mais corajoso do que todo mundo. Se todos forem heróis, a palavra perde o sentido. Adoro House por ser capaz de dizer coisas assim. É muito libertador ir contra o convencional, mesmo na condição de um ator recitando falas. House vai mais fundo, e começa a duvidar de que aquela bravura seja realmente dela, diz que pode ser um sintoma, talvez um tumor afetando sua personalidade. Mas o mais brilhante de tudo é que, no fim, ele está errado!
10. Mas House nunca erra.
Exatamente. Mas ele está errado. E isso o obriga a admitir que há qualidades eternas e virtudes indiscutíveis, como a bravura. São momentos como esses – ou como outros nessa temporada, em que House revela quão vulnerável e sozinho ele está, a ponto de mandar um detetive seguir Wilson, seu único amigo de verdade – são momentos como esses que dão vida ao personagem. Mas, honestamente, só vi cerca de 10 dos 100 episódios que fizemos, logo, provavelmente, não sou o melhor juiz.