O Rei em Amarelo: Epílogo
Quase nada se publicou na imprensa manauara a respeito do desaparecimento do coronel Mascarenhas, a não que ele teria viajado para “um longo cruzeiro pela Europa e África”. Mas a censura não conseguiu coibir tablóides como o
Notícias do Igarapé de mencionar em artigos esparsos sobre o carro do magnata da borracha, encontrado batido em uma rua menor da cidade, e aquilo que havia dentro dele, algo cuja visão provocara ondas de pânico nos que correram para tentar ajudar os possíveis acidentados. Boatos de envolvimento do coronel e do líder da trupe de teatro com cultos demoníacos se espalharam por todas as casas, mas como toda informação sem provas, acabou sendo esquecida depois de algum tempo.
Com o desaparecimento do grupo de teatro, a peça teve que ser cancelada, para total desgosto e prejuízo político do presidente do estado. Celebridades e autoridades convidadas, muitas delas já a caminho da Europa, tiveram que ser avisadas de última hora e não ficaram nada satisfeitas com a ridícula situação de chegar ao meio da Floresta Amazônica para nada. Junto com a decadência do comércio do látex, esse fato faria com que quase nenhum evento de vulto voltasse a ser organizado em Manaós por anos e anos e que poucos aceitassem cruzar o Atlântico correndo o risco de um novo fiasco.
Uma semana depois de internado, distante do efeito da mbaë-ú e do maldito Sinal Amarelo, Marcopolo Santon, o diretor do Teatro Amazonas, recebeu alta do hospício do Dr. Meganha. Marcopolo, abalado com todos os horrores pelo qual passara, decidiu então pedir demissão de seu cargo e se exilar no Rio de Janeiro antes de uma viagem para sua amada França, de onde nunca mais voltou.
Pietro e Nagato foram liberados da cadeia dois dias depois graças à intervenção do bispo da cidade, já que o italiano na verdade era um agente da antiga Inquisição. Pietro conseguiu com a Igreja que o japonês também fosse solto, o que levaria muito mais tempo até que o distante governo japonês se manifestasse em favor de seu súdito. Assim que se viram em liberdade, os dois investigadores procuraram sem sucesso pelo paradeiro dos outros colegas, descobrindo no porto o carro de Jerome estacionado e vindo a saber que os três haviam embarcado num pequeno navio que subira o rio Negro com destino desconhecido. O desaparecimento dos amigos era um sinal que algo de muito ruim lhes acontecera, mas Pietro e Nagato pelo menos sabiam que eles haviam cumprido de alguma forma a missão, já que a peça havia sido cancelada e os rumores davam conta da morte de Valtrop e do coronel. Poucos dias depois ambos embarcaram rumo ao Velho Continente desejando nunca mais por os pés na Amazônia.
O barqueiro contratado pelo trio aguardou por eles no embarcadouro incendiado até duas horas após o combinado. Depois disso, rumou para Manaós, onde entregou o cartão de Jimmy ao cônsul britânico e recebeu sua recompensa. As bagagens do repórter, como ele pedira, foram despachadas para Londres, onde ele próprio nunca chegaria, entrando para a listagem de cidadãos britânicos desaparecidos em solo estrangeiro.
A estrela Aldebaran brilhava forte no céu noturno daquele mesmo dia em que o horror fora destruído qando vultos humanóides disformes saíram da floresta na direção da casa de fazenda arrasada pelo fogo. Eram alguns Maku que chegaram para a rapinagem do que sobrara. Houve uma grande cerimônia naquela madrugada, já que eles carregaram para a tribo a máscara pálida e uma placa de ouro com a representação do Jurupari Negro.
E não faltou carne para os guerreiros, que se fartaram com os pedaços estraçalhados dos três homens que ali tinham encontrado a morte. Levaram ainda aquelas
duas crianças encontradas dentro de uma das pequenas casas que rodeavam a fazenda,
que teriam seus belos olhos saboreados pelos feiticeiros antes que estes as degolassem em
honra d’Aquele que ainda aguarda sob as águas do lago o regresso do Rei.
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FIM DA AVENTURA O REI EM AMARELO
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