imported_Wilson
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A ENDEMONINHADA
Sendo a curta história de uma bruxa e seu filho bastardo
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[align=justify]Eu nasci na vila de St. Exupéry, no ano cristão de 1216. Morri nas florestas de Baudés, no solo sagrado do meu povo, pro lado de leste da vila, com dezenove anos de vida em terra. Meu pai eu não sei quem foi: minha mãe foi atacada por um bandoleiro, de grupo de bárbaros que invadiram a cidade alguma vez, fazendo como eles fazem, levando as coisas de todo mundo, ateando fogo nos telhados, matando homem e menino e cachorro e destroçando as mulheres, tanto mesmo as menininhas, como era minha mãe, e os filhos se formavam do avesso, porque não era natural, e morriam eles e as mães. Eu não morri. De vez em quando minha mãe vem me assombrar, de ódio, por eu ter nascido e ela morrido. A Mãe Baba diz que eu matei minha mãe e tudo o que uma pessoa mata fica com ela, o fogo azul que ninguém vê, dentro da cabeça, sussurrando coisa ruim, e o fantasma fica com a pessoa até que ela também morra, e então eles passam para outra pessoa e para outra e para outra, e quando não tiver mais espaço para os mortos, o mundo chegará ao final, e esqueletos andarão sobre a terra com espadas e foices. É a sina de todos os que morrem, vagar pelo mundo esperando que tudo acabe. Eu consigo ver minha barriga, destripada com minhas partes do lado de fora, tudo bem vermelho, e eu penso que não é diferente dos bodes. E minha cabeça dói e meus braços doem e minha xana e meu cú doem e eu não sinto minha perna e eu não consigo levantar minha cabeça para ver se ela ainda está lá. Mas eu estou morta porque eu posso ver minha mãe deitada no chão e um homem em cima dela batendo em sua cara com uma pedra e metendo dentro das pernas dela. O homem começa a uivar e se levanta e ninguém vem ajudar minha mãe, com a cara toda inchada e partida, sangrando e cuspindo os dentes para fora da boca. Ao mesmo tempo eu estou lá dentro dela, chorando porque vou matar minha mãe. E agora eu estou nascendo, é tudo pegajoso, e eu olho para baixo e vejo minhas pernas escorregando pelo túnel vermelho e apertado de paredes vivas que estão tentando me sufocar, mas tem alguém puxando meus pés e quando eu saio do buraco aos arranhões e chutes, estou lambuzada de sangue, e lambuzada de sangue, deitada na grama, eu tenho meu primeiro filho. Ele tem um par de chifres, e é vermelho e seu choro é mesmo que choro de bicho, que quando nasce, mata a própria mãe.[/align]
A ENDEMONINHADA
Sendo a curta história de uma bruxa e seu filho bastardo
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[align=justify]Eu nasci na vila de St. Exupéry, no ano cristão de 1216. Morri nas florestas de Baudés, no solo sagrado do meu povo, pro lado de leste da vila, com dezenove anos de vida em terra. Meu pai eu não sei quem foi: minha mãe foi atacada por um bandoleiro, de grupo de bárbaros que invadiram a cidade alguma vez, fazendo como eles fazem, levando as coisas de todo mundo, ateando fogo nos telhados, matando homem e menino e cachorro e destroçando as mulheres, tanto mesmo as menininhas, como era minha mãe, e os filhos se formavam do avesso, porque não era natural, e morriam eles e as mães. Eu não morri. De vez em quando minha mãe vem me assombrar, de ódio, por eu ter nascido e ela morrido. A Mãe Baba diz que eu matei minha mãe e tudo o que uma pessoa mata fica com ela, o fogo azul que ninguém vê, dentro da cabeça, sussurrando coisa ruim, e o fantasma fica com a pessoa até que ela também morra, e então eles passam para outra pessoa e para outra e para outra, e quando não tiver mais espaço para os mortos, o mundo chegará ao final, e esqueletos andarão sobre a terra com espadas e foices. É a sina de todos os que morrem, vagar pelo mundo esperando que tudo acabe. Eu consigo ver minha barriga, destripada com minhas partes do lado de fora, tudo bem vermelho, e eu penso que não é diferente dos bodes. E minha cabeça dói e meus braços doem e minha xana e meu cú doem e eu não sinto minha perna e eu não consigo levantar minha cabeça para ver se ela ainda está lá. Mas eu estou morta porque eu posso ver minha mãe deitada no chão e um homem em cima dela batendo em sua cara com uma pedra e metendo dentro das pernas dela. O homem começa a uivar e se levanta e ninguém vem ajudar minha mãe, com a cara toda inchada e partida, sangrando e cuspindo os dentes para fora da boca. Ao mesmo tempo eu estou lá dentro dela, chorando porque vou matar minha mãe. E agora eu estou nascendo, é tudo pegajoso, e eu olho para baixo e vejo minhas pernas escorregando pelo túnel vermelho e apertado de paredes vivas que estão tentando me sufocar, mas tem alguém puxando meus pés e quando eu saio do buraco aos arranhões e chutes, estou lambuzada de sangue, e lambuzada de sangue, deitada na grama, eu tenho meu primeiro filho. Ele tem um par de chifres, e é vermelho e seu choro é mesmo que choro de bicho, que quando nasce, mata a própria mãe.[/align]