Capítulo 33 – Uma xícara de chá – Por Melkor
Diogo está debruçado na sacada da sua nova casa, na Itália. As pessoas passam por baixo dele sem se preocupar. Os pássaros estão pousados ali num canto sem se preocupar. Ele não se preocupa. Ninguém se preocupa com ele. Não há carinho, amor, cartas secretas, juras loucas, telefonemas de madrugada. Nada.
Ele não quer estar ali, longe do Brasil. Mas Magda... A libidinosa, quando descobriu, fez questão de passar um tempo com Diogo – sozinhos – para consertar seu casamento. Nesse meio tempo (alguns meses já tinham passado com o vento) eles viveram em uma constante lua de mel regada de presentes, passeios românticos e sexo. Muito sexo.
Mas Diogo não está feliz. Ele odeia a sua mulher. Os dias para ele eram perda de tempo... E a cada dia que passava, era um dia sem Tâmara. Sua vida acabando, ela lá longe...
Sua barba ainda estava por fazer. Sua calça por costurar. Seu chinelo por achar. Sentia-se sujo, velho, maltrapilho. O céu estava escuro, com cara de chuva. Ele tinha alguma coisa horrível presa na garganta, uma vontade de gritar...
A porta lá embaixo bate. Ele olha para seu reflexo no espelho oval do guarda-roupa. Suspira. Joga seu corpo já morto na cama, vê a poeira subir. Fica vendo o pó danças nos braços de luz que entram pelas venezianas... Seu quarto mais parece um sótão abandonado!
Magda está conversando. Sua risada suína irrita Diogo. A risada de Tâmara era tão doce... Praticamente pode ouvi-la...
Tâmara está sentada no sofá, olhando para Magda, que não para de falar. Ela tinha um plano: entrar na casa com uma arma (que estava escondida na cesta de flores), seqüestrar seu amante e fugir. Fugir para qualquer lugar. Um dia teriam que voltar, tinham seus filhos, seus conjugues... Mas... Um dia!
Quando viu Magda, no entanto, tão viva, tão alegre, naquela casa, na Itália... Sempre fora seu sonho morar na Itália... Ela estudara arte italiana quando jovem. Sonhava em ver a Capela Sistina, os museus, a Torre de Pisa... Sonhos.
Então, fraquejou. Fingiu ter olhar perdido, sentiu uma tontura forjada e disse, trêmula:
- Minha casa... Não sei... onde... é minha... Casa!
- O que? – Magda estava impaciente.
- Casa... – Tâmara, mesmo que arrependida, estava decidida a levar a farsa até o final e depois ir embora, sem falar com ele. Estava desgostosa com a situação.
- Moça, não estou entendendo... Non parlo Italliano!
- Sua burra, estou falando em português?
- O que? – Magda ofendeu-se
- Casa... – Tâmara passou os dedos agitados na batente da porta, olhando para dentro da sala – Posso casa?
- Pode casa?
- Casa! Casa! – começou a correr e pulou no sofá!
- Ei, Diogo! Diogo... – ela começou a gritar.
- Não! – Tâmara disse, aflita – Não Diogo! Sofá! Sim... Sofá!
- Está bem – Magda ficou de repente sóbria – Sofá.
- Sim. Eu estou perdida. Desculpe-me. Agora estou mais calma – Tâmara disse, pausadamente – Acontece que preciso de algum lugar para dormir enquanto não acho minha casa.
- Ah, pobrezinha – Magda ajoelhou-se no chão – Se eu não estivesse em lua de mel com meu Deus Grego...
- Eu não atrapalho – disse ela, surpresa consigo mesma, tentando esconder sua raiva – Por favor...
- Ah – Magda mordeu os lábios – Não sei.
- Por favor! – Tâmara implorou. Vendo, porém, a cara de Magda, começou a rir. Não conseguia acreditar no tamanho da burrice dela! Não reconhecera Tâmara, sua antiga vizinha!
- Ah – Magda também começou a rir – Está bem. Você é uma moça engraçada e parece ser boazinha. Você sabe lavar louça?
- Claro que sim.
- Então fique. Agora, deixe lhe apresentar meu marido. Diogo, desça aqui! Diogo! DIOGO!
- Fala, Magda – Diogo desceu, virando os olhos.
- ... – Tâmara engoliu seco. Seu coração estava explodindo de emoção. Ele estava tão sexy, barba mal feita, roupa rasgada... Parecia um pintor italiano... Ah, que delícia!
- O que? – ele assustou-se – O que... Mas... Magda, eu não...
- Essa moça está perdida, então vamos hospeda-la aqui por alguns dias. Não vamos, querido?
- Eu... Quer dizer... Como? – ele respirou, tentando controlar o riso. Ela estava angelical. Voluptuosamente angelical, toda provocativa. Sua roupinha branca rendada, a cesta de flores, o cabelo no rabo de cavalo, as unhas rosas... Aquela imagem o deixava louco - Está bem.
- Que ótimo! – Magda disse – Viu! Está tudo certo, então!
- Ahn, mô, vou subir pro meu quarto, ok? Estou um pouco... indisposto! – Diogo disse e correu escada acima.
Tâmara ficou um bom tempo ainda conversando com Magda. Agora o relógio marca oito horas e ela não agüenta mais de saudades, de amor, de tesão. Magda vê o horário, se assusta e diz que precisa sair. Pega sua bolsa e sobe para despedir-se de Diogo. Tâmara fica sozinha na sala.
Diogo está deitado na cama. Ele ficou ali, rindo e chorando. Não acreditava que aquilo tinha acontecido. Sua vida era irreal... De qualquer forma, está extremamente feliz, mais que isso! Está excitado como um adolescente esperando a primeira transa.
Magda entra pela porta, apressada, e diz que vai ter que ir ao cabeleireiro e depois desce. Diogo fica paralisado. Não sabe o que fazer. A porta bate, Magda já foi. Alguém começa a subir as escadas...
Então ela aparece na sua porta, enrolando o cabelo, envergonhada e encabulada. Ele fica de pé. Nenhum dos dois querem barreira alguma entre eles, nenhuma daquelas bobeiras de casais bem resolvidos. Eles não são bem resolvidos. Querem só se amar.
Ele a abraça forte, beijando seu pescoço. Ela morde o lóbulo da orelha dele. Ele sente o corpo dela com o seu. Vai surgindo entre eles uma coisa que ninguém vai separar até que Magda chegue. Talvez nem assim.