Cantona
Tudo é História
Lembro da primeira vez que li Pergunte ao Pó. Fui seduzido pela introdução de Paulo Leminski e pelo prefácio de Charles Bukowski (- Não me chame de filho da puta! Eu sou Bandini, Arturo Bandini!). Terminado o livro, quis ser escritor. Cheguei até a tentar redações mais rebuscadas, mas o boletim deixou claro que o talento era deficitário. Consigo rabiscar algumas coisas pra cair no agrado da morena, mas é só.
Hoje, terminei a releitura. Não me deu aquela comichão pra iniciar uma carreira literária, como antigamente. Mas veio um querer absurdo pela vida, não a hipócrita do comercial de margarina, mas a verdadeira, cheia de falhas e arestas nas quais a gente se corta. Veio uma vontade “de entrar em contato com a matéria bruta da vida”, de ser um Arturo Bandini e desejar uma Camilla Lopez como se deseja uma Brahma depois do desgosto.
Mais: deixei de acreditar no honesto, naqueles que trazem certa candura no olhar e uma bondade sem interesse no coração. Deixei de acreditar no coroinha da igreja, por exemplo. Agora, só acredito em Arturo Bandini, o sonhador da imaginação galopante, o santo e pecador, capaz do maior ato de coragem e da maior prova de covardia, o “amigo do homem e da besta”. O anti-herói.
A estória, em linhas gerais: Arturo, descendente de italianos, saiu do Colorado com o desejo de se tornar um grande escritor. Vai parar na Los Angeles dos anos 30, ainda sob os efeitos da quebra da Bolsa em 29. Duro, sem inspiração, vai perambulando pelas ruas poeirentas da cidade, entrando em contato com aqueles que vivem à margem da sociedade, ora os reconhecendo como irmãos de sofrimento, ora os desprezando, numa reação que podemos classificar como inconsciente: uma espécie de reparação íntima pelo preconceito que sofreu por ser pobre e filho de imigrantes. Com Camilla Lopez, garçonete de um café, esse tipo de relação é mais nítida – ao mesmo tempo em que a idolatra e deseja, ele a ofende e descarta. Conhece Vera, uma mulher misteriosa e, a partir desse encontro, somado ao terremoto em Long Beach, Bandini parece adquirir outra compreensão das coisas e pessoas que o cercam, embora com algumas naturais recaídas. Surge a inspiração para o livro e seu relacionamento com Camilla ganha novos contornos.
É preciso ler. Recomendo, não como crítico literário, mas como um leitor que gostaria de tomar um trago com Bandini, Arturo Bandini.
Momento Fanfarrão (no bom sentido): Hellfrick, vizinho de Arturo, viciado em gim e carne. A parte em que os dois, famintos, partem à procura de um bife (...grosso assim. Grelhado. Um monte de manteiga por cima...) é, de certo modo, cômica:
- Agora vou lhe dar uma lição de açougueiro, garoto.
Há o filme, também. Mas é tosco. Ninguém vai chegar à obra pelo filme. Nele, a única coisa que se salva é a bela Salma Hayek, no papel de Camilla Lopez (ah, se eu fosse nobre...).
Há braços!
Hoje, terminei a releitura. Não me deu aquela comichão pra iniciar uma carreira literária, como antigamente. Mas veio um querer absurdo pela vida, não a hipócrita do comercial de margarina, mas a verdadeira, cheia de falhas e arestas nas quais a gente se corta. Veio uma vontade “de entrar em contato com a matéria bruta da vida”, de ser um Arturo Bandini e desejar uma Camilla Lopez como se deseja uma Brahma depois do desgosto.
Mais: deixei de acreditar no honesto, naqueles que trazem certa candura no olhar e uma bondade sem interesse no coração. Deixei de acreditar no coroinha da igreja, por exemplo. Agora, só acredito em Arturo Bandini, o sonhador da imaginação galopante, o santo e pecador, capaz do maior ato de coragem e da maior prova de covardia, o “amigo do homem e da besta”. O anti-herói.
A estória, em linhas gerais: Arturo, descendente de italianos, saiu do Colorado com o desejo de se tornar um grande escritor. Vai parar na Los Angeles dos anos 30, ainda sob os efeitos da quebra da Bolsa em 29. Duro, sem inspiração, vai perambulando pelas ruas poeirentas da cidade, entrando em contato com aqueles que vivem à margem da sociedade, ora os reconhecendo como irmãos de sofrimento, ora os desprezando, numa reação que podemos classificar como inconsciente: uma espécie de reparação íntima pelo preconceito que sofreu por ser pobre e filho de imigrantes. Com Camilla Lopez, garçonete de um café, esse tipo de relação é mais nítida – ao mesmo tempo em que a idolatra e deseja, ele a ofende e descarta. Conhece Vera, uma mulher misteriosa e, a partir desse encontro, somado ao terremoto em Long Beach, Bandini parece adquirir outra compreensão das coisas e pessoas que o cercam, embora com algumas naturais recaídas. Surge a inspiração para o livro e seu relacionamento com Camilla ganha novos contornos.
É preciso ler. Recomendo, não como crítico literário, mas como um leitor que gostaria de tomar um trago com Bandini, Arturo Bandini.
Momento Fanfarrão (no bom sentido): Hellfrick, vizinho de Arturo, viciado em gim e carne. A parte em que os dois, famintos, partem à procura de um bife (...grosso assim. Grelhado. Um monte de manteiga por cima...) é, de certo modo, cômica:
- Agora vou lhe dar uma lição de açougueiro, garoto.
Há o filme, também. Mas é tosco. Ninguém vai chegar à obra pelo filme. Nele, a única coisa que se salva é a bela Salma Hayek, no papel de Camilla Lopez (ah, se eu fosse nobre...).
Há braços!