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[L] [Valanice] [Disque 777 para Deus]

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Excluído a pedido
[Valanice] [Disque 777 para Deus]

Taí, pessoal! Um textinho básico meu! Tá certo que eutô "lutrando" ela faz tempo, mas aí está o produto final!





Sam voltava do bar. Estava bastante alcoolizado. Voltava para casa sozinho, à pé, às duas e quinze da manhã, quando percebeu que teria de passar pelo ponto dos táxis. Pensou que, se tivesse dinheiro, tomaria um táxi até em casa, porque estava com as pernas moles e enxergava o mundo balançando, a cada passo vacilante que dava. Sentia-se um cinegrafista amador filmando um tiroteio, as imagens chacoalhando e dando tonturas. Ficou bastante chateado quando constatou que não havia nenhum carro no ponto, esquecendo-se por um momento de que não tinha um puto no bolso naquela hora.
Ninguém na rua. Nenhum carro, nem ônibus, nada perturbava a paz daquela avenida morta. Em seus pensamentos, Sam comparava a avenida a uma grande serpente cinza-chumbo, marcada a ferro com listras amarelas sinuosas. Pensamentos embriagados.
Perdido em delírios semelhantes, Sam foi sacudido pelo ruído irritante do telefone do ponto de táxi. Os toques ritmados não cessavam. Sam foi andando; teve um arrepio, uma sensação de que aquilo era uma sirene apocalíptica chamando o mundo para o fim. Estranhamente, o telefone não parou de tocar...toques demais, pensou ele. Aproximava-se da cabine e sentiu um desejo irresistível de atender, de interromper aquela coisa chata do inferno que o assustava estranhamente.
Chegou mais perto, olhou para um lado e para outro e tirou o fone do gancho.
- Alô?
- Alô, quem fala?
- Meu nome é Sam. Olha, aqui no ponto não tem nenhum tá...
- É com você mesmo que eu quero falar, Sam.
- ...
- Aqui é Deus.
- Rá! E eu sou o Diabo. Muito prazer. Agora tchau.
- É sério, Sam. Não zombe do poder divino. Eu sei de tudo e sabia que você passaria por este ponto de táxi agora, às duas e quinze da madrugada do dia 23 de janeiro de 1999.
- Olha, cara, eu tô chapado, vou pra casa, essa conversa tá fican...
- Ainda não acabei de falar e é muita falta de respeito interromper a fala de Deus, Sam. Eu sabia que você passaria por aqui e julguei ser este o melhor momento para termos uma conversa muito séria.
- Mas escuta, erh...ahn...senhor Deus, será que não dá pra conversar outra hora? Sei lá, a gente combina alguma coisa, eu tô com fome, quero ir pra cas...
- Sam!!!
- Que é?
- Isso é sério.
- Tá.
- Tem que ser agora. Você nunca vai à igreja e nem pensa em mim antes de dormir. De que jeito poderíamos conversar? Assim fica mais fácil.
- Eu não acredito!
- Então, senhor Sam, está me dizendo que não crê na existência de uma entidade superior que tudo criou e que rege os destin..
- Não, eu não acredito que eu tô aqui conversando com um maluco no meio da madrugada nesse frio e ainda não desliguei o telefone.
- SAM!
- Tô brincando.
- Preste atenção! Eu sou Deus e liguei pra você porque precisamos conversar.
- Tá bom. Mas não pode ser amanhã...
- Mas que diabos! Sam, eu vou te falar uma coisa que vai te fazer acreditar. Não é verdade que você tem uma mancha marrom nas...ahn...nádegas?
- Tenho, mas não é preciso ser Deus pra saber disso...O dono do bar também sabe. Minhas calças sempre caem quando eu bebo demais. Outra.
- Sua mãe batia em você com uma bengala quando você era pequeno.
- Você conhece minha mãe e ela te contou. Aliás, ela conta essa história pra todo mundo. Outra.
- Você cometia atos libidinosos pensando em sua tia... ahn...gostosona, quando ainda era um garoto terrivelmente impuro.
- ...
- E então?
- Olha, cara, isso tá ficando sem graça.
- Ahhh!!! Agora crês, pecador!! Te peguei!
- ...e é muito feio ficar entrando na cabeça das pessoas e lendo o que elas pensam, isso é invasão de privacidade!
- Acredita ou não, Sam?
- Sei lá. Isso não tá acontecendo, cara, eu tô chapado e quando eu acordar amanhã eu vou pensar “puxa, que sonho estranho”.
- Sam, eu sou Deus.
- Achei.
- Achou o quê?
- Alguém que bebe mais que eu. Agora dá licença que eu tenho que desligar. Vou continuar esse sonho na minha cama.
- SAM, SE VOCÊ NÃO ME ESCUTAR EU TE MATO!!
- ...
- Ouviu?
- Tá legal. Então fala. Se você é Deus, tenha piedade de mim e seja rápido.
- Bem, o que eu quero te dizer é o seguinte: estou muito descontente com o seu comportamento e resolvi te aplicar um corretivo. Sua vida está ótima e você não está dando o devido valor.
- Como assim, não dou valor? Claro que eu dou valor. Eu tenho a mulher que eu amo, trabalho no que eu gosto, tenho meus amigos, que mais eu poderia querer? Claro que eu dou valor! Você tá falando besteira, cara, desculpa aí, mas é besteira.
- Não, Sam.
- Não?
- Ouça bem. Eu conheço sua vida de cabo a rabo e sei o quanto você sofreu antes de conseguir tudo isso.
- Nem me fale.
- Nenhuma menina chegava perto de você...
- E só porque eu era meio magrelão...
- Meio não é bem o termo...
- Tá. Esquálido. Seja feita vossa vontade.
- Seus empregos eram chatos e desestimulantes.
- É.
- E agora você tem uma garota que te ama muito e um emprego no qual você pode desenvolver sua criatividade.
- Bem que eu disse pra Sally: “Deus anda muito bonzinho ultimamente...”
- Pois é. Resolvi te dar uma chance, mas acho que fiz bobagem. Devia ter te deixado camelar mais um pouco.
- Mais ainda? Vai ser malvado assim no inferno, hein, ô divindade!
- Vou fingir que não escutei essa blasfêmia grosseira. Pois bem: o caso é que você não reconhece!
- Claro que eu reconheço!
- Não o suficiente.
- ...
- Sam?
- Han?
- Você ainda tá aí?
- Fazer o quê, né...
- Resumindo: game over pra você.
- Opa! Peralá. Calma aí. O que você quer dizer com isso?
- Finish.
- Dá pra ser mais claro?
- Acabou, Sam.
- Vou morrer?
- Não ainda.
- Então, que raios vai acontecer?
- Vai voltar no tempo.
- VOLTAR NO TEMPO?!!!
- É. Vai voltar há alguns meses atrás, quando ainda estava na mer...ahn...na pior.
- Cê tá brincando, cara. Só pode ser.
- Não, Sam, é minha decisão final.
- Mas por quê?!
- Já expliquei.
- PELO AMOR DE DEUS, CARA!!!! Não faça isso comigo!!!
- It’s too late!
- ...e ainda fica me tirando em inglês, isso é o cu da barata!!
- Sam, RESPEITO!!!
- ...tá, tá, desculpa, desculpa, é o fim da picada, mas olha, Deus, não faça isso comigo, eu não posso perder a Sally!
- Não vai doer nada. Você nem vai se lembrar que viveu com a Sally, que arrumou um emprego genial...Terá que conquistar tudo de novo.
- Mas eu vou encontrar a Sally?
- Vai. Tudo igualzinho. As circunstâncias serão as mesmas e tudo acontecerá da mesma forma. Vocês dirão as mesmas coisas, e irão aos mesmo lugares. É como se eu voltasse a fita, entende?
- E no que isso vai me ajudar? Por acaso eu vou me transformar num cristão melhor com essa palhaçada toda?
- Você vai manter um pouco da consciência do que ouviu aqui hoje. E uma voz irá soprar em seu ouvido quando o prazo se esgotar, e você dará mais valor ao que te aconteceu.
- Estou me sentindo um idiota. Só pode ser brincadeira.
- Saaaam...
- Tudo bem. OK. Eu encaro. Tava muito bom pra ser verdade, mesmo.
- Nietzsche, aquele bandido, escreveu que se um dia um demônio te dissesse que você teria que viver sua vida inteirinha novamente, cada instante horrível e cada alegria, sem chance de mudar nada, você amaldiçoaria o demônio ou acharia maravilhoso viver tudo de novo? O que você acha, Sam?
- Eu acho uma merda ter que passar pelos sofrimentos de novo. E é isso que você está fazendo comigo!
- Não, Sam, é diferente, acredite.
- Lá, lári, lá, lá, não estou ouvindo nada, lá, lá lá...
- Dá pra prestar atenção? É a sua vida, e não a minha.
- Mas tudo de novo? Falta de amor, raiva do mundo, um emprego miserável, sem a Sally...ai, ai, isso vai dar merda...
- Você não vai perder a Sally. Pense nos bons momentos.
- Mas que droga, tá tudo certo, PRA QUÊ isso??? Eu reconheço sua bondade fantástica para com este pobre diabo que vos fala, então, que porra de reconhecimento você ainda quer que eu tenha?
- Foi bom pra você, Sam?
- Hã?
- Foi bom pra você?
- ...
- Sam, não seja burro e me responda se foi bom pra você este último mês.
- Ah, o que você acha? É óbvio. Você me ouviu reclamando de alguma coisa, por acaso?
- Ufa! É um pena que eu seja Deus e não possa apelar pra mim mesmo nessa hora. Ter a responsabilidade total sobre os atos de pessoas como você me estressa, sabe?
- Problema seu. Ninguém mandou querer fazer tudo sozinho.
- Será que dava pra me respeitar um pouco?
- Tá legal, cara. E então? O que eu faço agora? Vai, você é o mestre do jogo...Vou escrever um livro de RPG. É muita piração.
- Você é um perdido, Sam.
- Eu sei.
- Mas vai se emendar. Pelo menos vai me agradecer por isso no final.
- Tá, cara. Obrigado por nada.
- SAM!
- Obrigado por tudo. Foi bom, eu fui feliz, agora acabe com a alegria do coitado aqui. Valeu mesmo. Sério. A Sally foi maravilhosa e eu adorava meu emprego. Enfim, se der bosta, pelo menos aconteceu alguma coisa que fez valer a minha vida.
- Legal. Era isso que eu queria ouvir. Tenha uma boa noite.
- Mas...o que eu faço agora? Deus? DEEEUS!!!
- Tchau, Sam. Você me cansa.
- Não tô entendendo mais nada...
- Vai pra casa. Tudo bem. Não vou mais voltar a fita, certo? Tudo bem pra você?
- Ué, mas...
- Você me agradeceu. Meio empurrado, é verdade, mas pelo menos eu consegui arrancar um “muito obrigado” dessa sua boca podre. Te dei um susto e tanto, hein, meu velho? Ha-ha! Não perdi a forma! O fato é que você finalmente reconheceu a importância do que te aconteceu neste último mês e como eu fui misericordioso com sua alma atormentada. Na hora do desespero, tudo é possível. A Sally está te esperando amanhã cedo, você tem que dormir. Vai descansar, Sam.
- Mas nem vai rolar tudo de novo?
- Não, Sam. Pense nessa conversa como um trote, tá?
- UM TROTE?!!
- Mais ou menos. Já está amanhecendo, Sam. É melhor você ir pra casa.
- Tanto imbecil por aí e você tinha que escolher justo quem pra passar trote... Olha aqui, Deus, essa foi a pior que você me aprontou!! Depois disso, vou ter que renegar a fé cristã!
- Não se atreva! Olha que a fita volta, hein? E com trechos apagados!
- Não, cara! Tudo bem. Serei uma boa ovelha a partir de agora. Prometo agradecer sempre que alguma coisa boa acontecer e nunca mais vou praguejar contr...
- Mentir é pecado, Sam!
- Tá. Valeu falar com você. Tchau, hein? Apareça no bar pra gente tomar uma, hehehe...
- Adeus, Sam. A gente se encontra no dia do Juízo.
- Falando em Juízo Final, quando vai ser isso, hein...?
- Click!
Sam colocou o fone no gancho devagar, bestificado. Os primeiros passarinhos do dia já cantavam e ele sem entender absolutamente nada. Eu delirei, pensou. Nada aconteceu. Começou a caminhar, as pernas meio entorpecidas pelo tempo em que ficou de pé no telefone, falando com...Deus? Loucura.
“Nunca mais atendo telefone quando estiver bêbado”, pensou. E seguiu, coração leve, andando sobre a cobra cinza-chumbo, marcada de amarelo em toda sua extensão.
 
Me senti na pele de um bêbado conversando com Deus...
Muito engraçado!
A única coisa é que eu liguei 777 e Deus não atendeu...
 
Putz... fantastico!!!!

Bem criativo, engracado, e ate realista!

Eu bem que podia ligar pra Deus.... tem umas coisinhas que precisamos acertar... :wink:
 
Nightcrawler disse:
A única coisa é que eu liguei 777 e Deus não atendeu...

Hehehe! Usei 777 por que, segundo as simbologias da bíblia, o número 7 é a perfeição (Deus), e um número qualquer repetido três vezes é a afirmação absoluta.
 
Eu gostei muito dessa estória, Valanice, parabéns.
Rápida, simples mas divertida. Tá mais para uma grande crônica de comédia, mas com aquele toque "moral da história".
 
Eu tenho que reviver esse texto da Valanice! É muito muito bom! Uma crônica de comédia e tanto! Rapaz, leiam! :mrgreen:
 
Esse texto é bem antigo... Eu fiz um por agora que fico com cara de plágio. Em muitos aspectos é parecido com esse, e eu nem sequer tinha lido esse. No fundo, estou justificando que escrevi sem copiar texto algum :lol: , mas é pq em alguns pontos ficou tão parecido que pode dar a entender.
 
Sabe aquele texto do Jô da rosquinha????? Meu muito estilo, uma conversa de lesados, mas naum estou dizendo q seja parecido, pq vc escreveu uma historia muito boa e bem original!!!! Vc escreve muito bem....
 
Eu achei que era o seu texto, Minas, quando eu vi esse... Mas eu sei que você não copiou nada. =)

Valanice, ficou estupendo! Gostei mesmo, muito... Simples, prático e com uma mensagem linda. O ultimo paragrafo então, nem comento.

Parabéns mesmo. =)

Eu fiquei totalmente triste quando pensei em viver tudo de novo. É horrível. =)
 
Puxa, parabéns Valanice! Está tudo perfeito: O texto, as palavras, o tema, o seu avatar (que é muito fofo XD), enfim... tudo! :clap:
 

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