Mavericco disse:
Você ter abordado o alfabeto... Bacana. Isso me faz lembrar que a Biblioteca de Babel, a meu ver, não pode ser vista como uma alegoria do universo, pois ela é incompleta.... Um número limitado de símbolos alfabéticos, o que faz com que ela se limite...
A quantidade de símbolos alfabéticos não traz nenhum limite. Em primeiro lugar, todo o conhecimento pode ser expresso em formato binário,
.Penny Lane. disse:
Mas o grande problema é que também todas as variações possíveis das partes inacabadas estarão lá e se torna impossível separar aquilo que o autor teria escrito daquilo que não seria dele. Ainda mais, quando se pensa que também estariam na Biblioteca inúmeros volumes de crítica literária e de história da literatura, cada qual defendendo que uma dessas possíveis variações é a verdadeira.
É verdade. Borges comenta a busca frustrada de determinadas obras... como saberíamos que o catálogo dos livros é realmente O catálogo? Ou o livro que possui toda a nossa história, nosso futuro... existem milhares deles com variações de apenas umas poucas frases...por isso eu retirei o "poderíamos encontrar".
Imagina sei lá, algum livro de física ou quimica... uma fórmula trocada poderia ser um desastre. Ou um livro que possui um mistério que se resolve em poucas frases, as variações podem residir justamente nessas poucas letras... pouca variação já poderia prejudicar demais o entendimento.
Imagina se todo o conhecimento que as pessoas do conto têm partem de regras falsas e contraditórias de um dos livros da biblioteca... isso já aconteceu no nosso próprio mundo. Acreditava-se que conjuntos podiam ser elementos de outros conjuntos. Imaginemos então um conjunto A que contém todos os conjuntos que não contêm a si mesmos.
Se A não contém a si mesmo, então A está dentro de A... logo A contém a si mesmo!
Se A contém a si mesmo, então A está entre os conjuntos que não contém a si mesmos...
Talvez Frege (foi Frege mesmo?) fizesse parte de uma conspiração Tlöniana para nos enganar... rs.
Aliás, se a nossa matemática for consistente nós nunca poderemos provar isso formalmente e sequer sabemos se ela é consistente, se bem me lembro do que já pesquisei sobre isso. "Deus existe porque a matemática é consistente, mas o Diabo também, porque não podemos provar este fato"... isso sai totalmente fora do escopo do conto, mas pra quem quiser saber algo, google sobre teorema da incompletude de Gödel. Aliás, por que eu estou falando isso aqui? oO
Enfim... já estamos enrolados aqui com nosso próprios livros e ciências... imagina com essa quantidade de livros falsos.
Encontraríamos também os livros escritos por .Penny Lanne., inclusive sua popular análise da relação entre a Biblioteca de Babel de Borges e a música de David Bowie.
Genial
As possibilidades dessa quase infinitude da Biblioteca são tão fascinantes que descobri um livro só sobre seus desdobramentos: The Unimaginable Mathematics of Borges' Library of Babel, à venda na Amazon para os mais fanáticos fãs do escritor argentino.
Aaaaahhhh! Isso é uma conspiração para que leiamos o GEB:
[...] Written in the vein of Douglas R. Hofstadter's Pulitzer Prize-winning Gödel, Escher, Bach, this original and imaginative book sheds light on one of Borges' most complex, richly layered works. [...]
Quanto ao Universo... realmente, posso ter viajado. Quem sabe a Biblioteca não representa somente o nosso mundo? Talvez eu tenha pensado nisso devido à sua imensidão...
Também me lembrei de Almotassim, e de Ruínas Circulares e de todas essas voltas que não acabam...
Talvez o que dê margem a uma discussão nova aqui seja que nós, seres humanos, somos limitados e, em frente a algo de grandeza infinita, temos que nos recriar infinitas vezes para que consigamos abranger a infinitude.
A idéia de um lugar com todos os livros possíveis é fascinante, mas eu sei perfeitamente que jamais vou conseguir ler tudo o que eu quero ler nessa vida... imagina estando numa biblioteca dessas! Acho que enlouqueceria... pensando bem, a idéia não me parece mais tão maravilhosa, rs.
Manu? Você está acessando a Biblioteca de Babel, onde esse post foi criado pela Manu, e não nos contou? ._.
Boa
Você ter abordado o alfabeto... Bacana. Isso me faz lembrar que a Biblioteca de Babel, a meu ver, não pode ser vista como uma alegoria do universo, pois ela é incompleta.... Um número limitado de símbolos alfabéticos, o que faz com que ela se limite... Claro que a maioria das línguas sofre romanização; mas... E se existisse um símbolo insubstituível, "irromanizável"? É a pequena distância que separa uma reta exponencial do eixo das coordenadas ou das absissas...
É como o Tataran falou, podemos representar com as nossas letras todo o conhecimento... se nos depararmos com algo que não conhecíamos, podemos dar um nome a isso isando as nossas próprias letras e descrevendo essa coisa nova com essas mesmas letras. (credo, que frase mal feita...)
---
Toda vez que vocês começam a procurar relações entre os contos, um nó se forma no meu cérebro ._.
Manu M. disse:
Tataran disse:
.Penny Lane. disse:
Para compensar minha ausência, vou dar o pontapé inicial pra discussão da semana... desculpem se ficou meio superficial, vamos esperar a discussão começar pra ver no que dá.
Eu adoro esse conto! Acho que a idéia por si só já é fascinante pra qualquer leitor: uma Biblioteca que contém todos os livros possíveis e imagináveis...
Penny, seu post não tem nada de superficial. Em verdade, também compartilho de seu fascínio por este conto. Creio que todo leitor deve sentir uma atração mística pela idéia de uma biblioteca infinita em extensão e conteúdo. :biblio:
De verdade, esse conto me fez sentir falta de ar. Tanta infinitude só ressalta minha finita existência, conhecimento e capacidade de absorção. Eu seria infeliz numa biblioteca dessas. Só pra esse livro de Borges (na tentativa de absorvê-lo ao máximo) eu gasto mais tempo lendo os comentários e pensando sobre livro/nossos posts do que lendo os contos propriamente ditos... Imagine se eu tivesse todos os livros do mundo, com suas análises e críticas? Putz, eu desistia da vida. Lembrei até de um TED Talk que assisti que o homem disse (em outros termos) que nossa felicidade é inversamente proporcional à nossa gama de opções...
Tataran disse:
Essa é a natureza atroz dessa biblioteca infinita: toda a informação relevante está contida ali, mas ela se encontra misturada com tudo que é falso e sem sentido de tal forma que não é possível separá-la. Somos esmagados por montanhas de informação e conhecimento sem que tenhamos os meios para processar esse conteúdo e extrair dele a "verdade".
Vc sintetizou meus feelings, Tataran (meus dedos sempre escrevem Tartaran, haha)
Eu já me sinto assim com a Internet às vezes. De certa forma, isso me lembra aquele
quadrinho Huxley x Orwell, fico muito existencialista com isso. Penso nos bibliotecários do conto e naquele tão famoso emprego do futuro, dos "curadores de informação" - que na teoria do jornalismo tem o nome específico de gatekeepers. Deve ser uma coisa de louco, um inferno. Distinguir e destacar o que realmente importa (e eu não sou pós-moderna a ponto de dizer que tudo é questão de referência porque uma cadeira é uma cadeira e isso não depende de ponto de vista, ainda que vc desvritue seu uso) nesse excesso infinito deve ser angustiante, e no fim das contas, tudo é relegado à irrelevância, vira nada, a pura vanidade em flor bem no meio da eternidade. Esse conto alimentou muito mais minhas angústias que meu cérebro, desculpem, rs.
Tataran disse:
Não acho que a Biblioteca de Babel seja uma alegoria para o Universo, mas, como sempre, é muito difícil não ver influências da física nas idéias de Borges.
Seria uma referência direta às enciclopédias e seus significados nesse conto? Essa biblioteca não seria exatamente uma enciclopédia exponenciada, uma enciclopédia ao quadrado?
Tataran disse:
.Penny Lane. disse:
Aliás, uma coisa que me intriga, será que mais alguém além de nós lê esse tópico? Despertamos a curiosidade de ler Borges em mais alguém? rs. (eu quando gosto de algum livro fico louca pra comentar com outra pessoa, fazer com que mais gente leia, discuta comigo... mas não conheço muita gente com quem possa fazer isso...)
Tem, pelo menos, um amigo meu que não é inscrito no forum que está acompanhando silenciosamente a discussão.
A Kika disse que também acompanha, hehe
Tataran disse:
o alfabeto permite não só expressar um idioma (ou alguns idiomas) específicos, mas, com a implicação do raciocínio de Borges, todo o conhecimento, falso e verdadeiro, que possa ser produzido pelo homem ou por qualquer outro ser inteligente.
Enfim, o alfabeto deixa de ser só um meio de representação da linguagem humana para se tornar uma linguagem, não mundial, mas de todo o universo.
Mavericco' disse:
Isso me faz lembrar que a Biblioteca de Babel, a meu ver, não pode ser vista como uma alegoria do universo, pois ela é incompleta.... Um número limitado de símbolos alfabéticos, o que faz com que ela se limite... Claro que a maioria das línguas sofre romanização; mas... E se existisse um símbolo insubstituível, "irromanizável"?
Tataran, que lindeza esse seu comentário...! Realmente, levando pro lado contemplativo da coisa, não é admirável que exista algo que possa traduzir (por isso mesmo, de forma limitada mas altamente eficiente) todo nosso conhecimento, e que permita a multiplicação de saberes através do diálogo?
Mavericco, eu interpretei esse "alfabeto" do Tataran como sendo algo mais amplo, seja o alfabeto, sejam ideogramas, até pinturas rupestres, quem sabe...
To zoando.
Mas agora (já que o povo desse tópico não tem preguiça de ler), deixa eu acrescentar uma coisa nada a ver que tem tudo a ver, rs. A escrita é uma coisinha linda mas muito ordinária. Ou abominável, né, sr. Borges. Porque os nossos pensamentos são representações do mundo real, a grosso modo (e explico mais adiante) como no quadro do Magritte. E quando a gnt escreve, ou mesmo fala, essa já é uma representação da representação. É como uma blusa que retrata o quadro. Agora entendo porque Pessoa diz que já há metafísica bastante em não pensar em nada. Se a gnt prestar atenção, tudo, absolutamente tudo o que pensamos é pra tentar compreender e organizar em nossa mente o que é o mundo real, até conceitos filosóficos altamente abstratos, ou física (que no meu limitado entender são só idiomas diferentes, mas a mesma coisa em si), tudo mesmo, é pra que nossa limitação seja minimizada diante da grandeza que é o real. Não pensar em nada seria experimentar o real em primeira mão, sem representações. Haja metafísica.
Bom gente, eu não saco nada de filosofia, mas acho lindo esses espantos que a fazem nascer dentro de nós. =)
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[quote='Kelvin]
Penny seu post de início da Biblioteca não teve nada de superficial! Pelo contrário, muito interessante o paralelo com o romance do livro assassino (pena que o li emprestado e não dá pra pesquisar aqui)... Quanto a mais alguém lendo o tópico, também tenho um amigo que está de
voyeur nesse tópico .... Só não sei quanto tempo ele vai conseguir se segurar para não dar um palpite
.
Quanto ao fascínio por bibliotecas, também compartilho o fascínio seu e do Tataran. Aliás, acho que todo bom leitor o compartilha. Por coincidência, haja vista a citação do Borges da
Anatomy of Melancholy fui consultar o exemplar que li e olha a frase que encontrei grifada sobre a Bodleyan library (http://www.bodleian.ox.ac.uk/bodley) :
King James, 1605, when he came to see aour University of Oxford, and amongst other edifices now went to view that famous library, renewed by Sir Thomas Bodley, in imitation of Alexander, at his departure brake out into that noble speech, if I were not a king, I would be a university man: "and if it were so that I must be a prisoner, if I might have my wish, I would desire to have no other prison than that library, and to be chained together with so many good authors et mortuis magistris". So sweet is the delight of study, the more learning they have (as he that hath a dropsy, the more he drinks the thirstier he is) the more they covet to learn, harsh at first learning is radices amarae but fructus dulces, according to that of Isocrates , pleasant at last, the longer they live, the more they are enamoured to the Muses
Não deu tempo de ler todo o capítulo para ver o contexto da epígrafe mas vou olhar depois. Aliás, tem uma frase do Carl Sagan que fala (ou dá a entender, não me lembro bem) que a diferença do homem pros outros animais é o fato de poder se valer de uma memória secundária (=livros), além daquela constante no seu DNA (está no livro Cosmos).
Muito interessante o livro indicado pelo Tataran
. Acabei colocando na minha shopping list.
Quanto as teoria das bolhas citadas pelo Mavericco, a primeira referência que vi está no livro do Allan Guth (The Infationary Universe, editado pela Basic Books em 1997), no qual o inventor da Teoria do Universo Inflacionário descreve o que chama de Pocket universes (universos dentro de universos que explodiriam que nem bolhas de sabão em novos Big Bangs). Já li em algum lugar também que pela tese recente no sentido de impossibilidade da singularidade, a matéria dos buracos negros poderia redundar na criação de outro Universo, mas acho que isso ainda está muito especulativo :sim:.
Já pelo que entendi do post do Tataran as teorias citadas por ele estão mais próximas da idéia do Big Crunch, corrspondente à idéia de que a aceleração da expansão do Universo vai se reverter com a força gravitacional preponderando sobre o que os físicos atualmente chamam de energia escura, iniciando uma contração do Universo que fará que este se concentre novamente em um ponto infinitesimal como teria sido antes do Big Bang. A idéia do Universo Cíclico seria um Big Crunch seguido de um Big Bang e assim sucessivamente, como nas cosmogonias hindus (em que o Universo é criado e destruído sucessivamente em ciclos). Essa idéia se contraporia ao Big Rip, no qual a expansão acelerada venceria a gravidade com a espansão de toda a matéria que acabaria por romper até mesmo os átomos (uma espécie de dissolução).
Muito interessante também no post do Mavericco e a comparação entre a chance de ganhar na loteria e a chance de achar algum livro :sim:.
Quanto à menção da Penny às proposições indecídiveis da teoria dos conjuntos e à incompletude de Godel, para quem não se aventurar a enfrentar GEB, indico o livro da Rebecca Goldstein cujo título é Incompletude- A prova e o paradoxo de Kurt Godel, da Coleção Grandes Descobertas, Companhia das Letras. Além de tentar explicar de forma simplificada a incompletude, a autora dá de brinde uma ótima biografia do companheiro de caminhadas de Albert Einstein.
Por fim, muito interessante o quadrinho da Manu (Winston vs Savage) e o comentário sobre as gamas de opções. Acho que é por isso que demoro séculos para trocar de computador ou de televisão....
Agora, uma espécie de biblioteca de Babel não seria a internet ? Falo isso porque nem sempre o livro que encontramos na internet corresponde igualzinho à edição que temos (quem se aventurar a fazer a comparação vai encontrar várias diferenças que superam, e muito, a dos chamados erros tipográficos).
Como o post já está grande, minha prometida citação da entrevista do Borges fica para o próximo post. Vou ver se pesquiso também a origem da frase mencionada pela Penny.
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