Cheguei meio atrasada na discussão, mas queria comentar assim mesmo esse post da Paulinha. Num outro post entro melhor na questão estatal.
Paulinha disse:
Sinceramente, não acredito que exista no mundo, uma única pessoa que seja a favor do aborto, ninguém é a favor do aborto - aborto é algo triste e definitivo.
No entanto, existem pessoas que são a favor da descriminalização do aborto. É pessoal, íntimo e o Estado não precisa interferir em todas as decisões que os cidadãos tomam.
Tirando a última frase, que explicarei mais adiante, concordo com vc.
Paulinha disse:
Por que um feto, que pode nem ser viável tem mais direitos que uma mulher adulta? Por que a mulher não pode tomar decisões sobre seu próprio corpo? Por que a mulher não pode decidir o melhor momento para viver essa maternidade?
É aqui que eu começo a me questionar, Paulinha...
Eu fico pensando o reverso: por que uma mulher adulta tem mais direitos do que um feto? Quem decide essa escala valorativa? Quais as referências e quais têm mais peso?
Outro ponto: gravidez é também, mas não só, uma questão de "escolha sobre seu próprio corpo", até porque não é só o seu corpo que está envolvido. Tem outro, dentro de você. E tem o pai da criança, que tem tanto direito ao filho quanto você, mas que por um acaso da natureza (ninguém decide se vai nascer com X ou Y) não tem a possibilidade de fazê-lo crescer dentro de si. Por que o homem não pode escolher o melhor momento para viver sua paternidade? É complexo, muito complexo.
Paulinha disse:
Acredito que quando uma mulher aborta voluntariamente ela o faz por total desespero - seja pelo momento inadequado, pelo medo da reação da família, pelo medo de não conseguir alimentar e cuidar do bebê ou por se ver totalmente sozinha e confusa. Ela não o faz porque é bacaninha abortar. Quem conhece alguma menina que depois de fazer um aborto disse assim: Hum, que delícia, quero fazer isso outra vez... ?..., não consigo acreditar que a legalização irá tornar isso uma prática simples, fácil e costumeira. A decisão continuará sendo difícil de ser tomada. E a mulher é que depois terá que lidar emocionalmente e psicologicamente com suas atitudes.
Concordo. E é por isso que continuo me questionando, com muita sinceridade e temor. Acontece que, a partir do momento em que a gnt descobre uma gravidez, já era, tudo muda irreversivelmente, com ou sem aborto, com ou sem desejo pela criança, com ou sem apoio do homem. Não sei porque nunca vivi isso, mas imagino que
qualquer das opções tomadas terá um elevadíssimo custo para a mulher, para a criança e para o pai. Entendam, não estou dizendo que gravidez é algo ruim, mas se o aborto é cogitado, é porque nesse caso, bom não está sendo. Aliás, está sendo péssimo, e o motivo, talvez, mas só talvez, seja indiferente. No caso em que qualquer decisão terá um custo elevado e sacrificial (literal ou metaforicamente), eu, por meus princípios éticos (e nem to falando de religião, vejam só), sou a favor da defesa do indefeso, que nesse caso é o feto.
Sim, poderíamos fazer aquelas perguntas cretinas (sem nenhuma referência pessoal a ninguém, ok?): vai deixar nascer pra morrer de fome ou pra qualquer-outro-blablabla-de-cunho-social? A morte é inevitável pra qualquer um, feto ou adulto. O sofrimento idem. Não quero condenar nenhuma criança inocente à desgraça iminente, mas conheço pelo menos 10 pessoas que seriam dignas de serem abortadas segundo esses padrões cretinos, mas hoje têm gratidão pela oportunidade que suas mães lhes deram de estarem vivos. Alguns reconhecem que a mãe sacrificou-se para não sacrificá-los, e isso fez um elo lindíssimo entre eles. Outros apenas são gratos e fica por isso mesmo. Mas a questão não é essa. O caso é analisar quem merece proteção, a mãe ou a criança. E se não há quem defenda o mais fraco, que se criem mecanismos para regular os mais fortes. Só por isso sou favorável a intervenção estatal nesse assunto. Criminalização é a melhor forma? Não sei. Acho que o dano sofrido pela mulher já é pena suficiente, ela não precisa de cadeia. (To lembrando de O Estrangeiro. Ia fazer uma piadinha mas não é conveniente). Uma possibilidade seria levar imediatamente uma mulher nessa situação delicada para um centro de apoio, onde recebesse todo tipo de orientação possível e intensiva (social, financeira, espiritual, profissional, psicológica etc.), para que o desespero desse lugar à consciência já que a decisão é grave e o tempo é curto. Mas ainda não consigo pensar em nada melhor que isso.
Paulinha disse:
Quem é homem não entende completamente o que é ser mulher, o que é ganhar bonequinhas para brincar de alimentar e ninar desde antes de aprender a falar - os meninos ganham bolas e carrinhos, são criados para a liberdade, já as meninas são criadas para a maternidade.
Paulinha, tenho minhas considerações nesse caso. É, eu também ganhei minhas bonecas e adorava bricar com elas. Mas todo dia no recreio jogava bola com os meninos, brincava de bolinha de gude, de He-Man e She-Ra, enfim. Seu argumento poderia ser válido em outra época, não? Pensa só, hoje a gente tem liberdade de questionar nossos pais, nossos rumos, de escolher não casar aos 17 e de tomar anticoncepcional e usar camisinha. Ainda que nos criem pra maternidade, antes de chegarmos na 6ª série já temos formação e observação suficientes para evitar um filho e pra começar a ponderar se é esse mesmo o centro da nossa vida (o que não é um centro inferior de forma alguma. Aliás, acho lindo quem pensa em ter uma carreira de sucesso pra dar boas condições de vida para os filhos, acho admirável quem tem como foco principal amar outra pessoa como ama a si mesmo). Nossa cultura, nesse ponto, está se abrindo consideravelmente, admitamos.
Paulinha disse:
Acredito que a maioria das meninas que um dia optaram por abortar, caso tenham oportunidade, tentarão ter um filho, e irão amá-lo e educá-lo.
O primeiro direito da criança é o de ser desejada.
Não acho. O primeiro direito da criança é viver. Ainda que seus pais não a desejem, ela pode ser desejada por seus avós, por pais adotivos, por um irmão. Por um desconhecido que a encontre e decida amá-la e respeitá-la. Se ainda assim ninguém a quiser, ela tem o direito de crescer e se fazer querida. É preferível a morte ao abandono? Não sei. Meu pai foi abandonado pela mãe dele. E se tornou um homem incrível. Ele se diz feliz, e suas atitudes confirmam suas palavras. É complicado saber se a aniquilação é melhor que a existência sofrida, nenhum de nós sabe o que é o não-ser, porque todos somos. Esse é um debate filosófico para o qual não tenho bases.
Enfim, é isso. Tá mal expresso, meio sentimentalista, grande demais, mas tem lá sua relevância.