A pergunta é como a primeira causa pode ser temporal? Ela não pode pois está sujeita à causalidade
Não, a pergunta é aquela mesma, "como a primeira causa pode ser atemporal"? Você aparentemente supõe que sim, e eu acho que não e tentei mostrar o porquê.
Aliás, não entendi a última frase, afinal eu também estou sujeito a causalidade e nem por isso deixo de ser temporal.
quando afirmo que a primeira causa tem uma origem de natureza atemporal eu estou afirmando que esta força não está sujeita ao nosso tempo, ela sempre existiu e sempre existirá, eu estou afirmando que esta força não habita o nosso plano, ela existe em seu próprio plano antes mesmo do nosso vir a existir. De fato esta força está fora da cadeia de causas e efeitos, pois não precisa de uma causa para existir, ao contrário de tudo o que existe em nosso plano, então é racional concluir que em uma existência onde todo efeito pede uma causa, a causa original veio de algo que não é regido por esta lei.
Aqui já acho necessário deixar claros dois conceitos que estão implícitos aí.
Primeiramente é o conceito de força. Uma força pode sim ser atemporal, por exemplo, a força gravitacional, explicada pela lei da gravitação de Newton (ignorando aqui toda física moderna). Ela não muda com o que quer que seja, ela não é um evento para estar aqui ou acolá, ter vindo a surgir ou a perecer. Por isso mesmo ela não aparece no universo diretamente ("veja só, quem eu encontrei aqui.... a gravidade!... que tal destruí-la agora mesmo, e livrar o universo de sua influência?"). O que você encontra no universo físico, espacial e temporal, são eventos que são explanados por aquela força. A atração gravitacional de um planeta pode vir a não existir se o planeta de repente sumisse, nem por isso a gravidade em si sofreria alguma mudança, o que mudam são eventos. Causa/efeito são nomes dados a conjuntos de eventos (estes sim espaciais e temporais), assim como tio/sobrinho são nomes dados a duas pessoas com uma relação em especial. A causa da queda de uma maça é a proximidade com a terra, causa essa ligada ao efeito justamente por meio da força da gravidade, mas a força em si não é uma causa, pelo contrário, ela é necessária para a explanação da causa, ela justifica que tal efeito tenha uma tal causa e não outra causa qualquer.
Então nessa sua fala parece haver dois conceitos um tanto quanto misturados. O primeiro é um evento especial, que não precisaria de uma causa. O segundo é uma força especial, chama de Deus, de força milagrosa, ou de o que quer que seja que não seja prevista pela física. Nenhum necessita logicamente do outro. Poderia existir um evento "incausado", sem a necessidade de forças divinas, ou mesmo poderia haver forças divinas, sem a necessidade de um primeiro evento incausado.
O que você defende aqui, porém, me parece ser ainda mais confuso, pois você quer que uma força misteriosa, seja uma causa. E, ainda por cima, da causa primeira, daquela justamente que não precisaria por sua vez de causa nenhuma. Ou trata-se de uma força, que prescinde o espaço e tempo, ou é um evento situado no espaço e no tempo. Mesmo que esse evento não tenha uma causa, mas tão só um efeito, essa ligação causa-efeito já é suficiente para garantir que ele também seja localizado no espaço e no tempo, pois a partir do momento que ele seja causa (de novo, mesmo que ele próprio não tenha uma causa) ele já torna-se empiricamente constatável e já é matéria de ciência, não podendo ser assim metafísico.
Ela não é "falsa", é inviável, sem um ponto de origem nós não poderiamos existir hoje no que seria algum ponto da linha do tempo, sem inicio não teria meio nem fim
Qual a diferença de ser (logicamente) falso e inviável? Se tu acha que é inviável apenas pensando e lidando com o próprio conceito, sem buscar no universo informações circunstanciais, é tanto falso logicamente quanto inviável.
E por que "sem um ponto de origem nós não poderiamos existir hoje no que seria algum ponto da linha do tempo, sem inicio não teria meio nem fim"? Você só diz com outras palavras o que era pressuposto que justificasse. O conceito de passado e de futuro depende de um observador, de um sujeito, que separa um ponto especial como presente. E, do ponto de vista dele, é tanto possível que exista um passado infinito quanto um futuro infinito. Ou mesmo um espaço infinito. Não quer dizer que ele ou qualquer um tenha que ter vivido esse passado, ou que "um tempo infinito precisou ter sido vivido". Esse passado infinito simplesmente poderia existir e ser ocupado de eventos. Não é como se um Deus pessoal ou qualquer outro ser tivesse que ter esperado a passagem infinita do tempo para depois chegar ao presente (espera que seria inútil). Ou como se alguém estivesse localizado na coordenada "-oo = menos infinito segundos", e ficasse preso eternamente lá, pois entre esse "ponto" temporal e qualquer outro haveria uma quantidade infinda de tempo.
como é possivel algo existir sem ter iniciado sua existência? É o mesmo que aceitar a existência de uma pessoa que nunca nasceu.
Oi? A possibilidade de não haver uma causa primeira não implica que haja eventos sem causa (na verdade a outra possibilidade que implica isso). Logo não vejo sentido em comparar a idéia com um homem não causado (ou nascido). Já o universo como um todo (espaço e tempo) não precisa ter início temporal, afinal de contas início, meio e fim só faz sentido pressuposta já a existência do tempo, logo de uma estrutura básica do universo. Dessa forma, apesar da falsa aparência de paradoxo, o tempo existe atemporalmente, não requer início. O que existe temporalmente são eventos NO tempo.
Tanto a teoria da causa primeira, aliás, suporta essa idéia, pois a causa primeira não causaria o tempo, o espaço, causaria sim os eventos posteriores.
Eu gostaria de saber qual argumento lhe dá base para pensar que é possivel não existir uma causa primeira.
Não é necessário nenhum argumento. Tudo é possível de existir ou de não existir até que fique provado de alguma forma o contrário (isto é, a necessidade de existir ou de não existir). Quem defende a tese de que a causa primeira existe ou que não existe (ou mesmo que seja mais provável empiricamente) é o responsável por justificá-la, seja cientificamente ou por pura lógica. O que afirmo é que nenhuma tem prevalência lógica, as duas são iguais nesse sentido.
Aliás, para falar a verdade, acho que a teoria de que não tenha havido uma causa primeira mais logicamente natural, pois a idéia de causa primeira precisa ser justificada, não é algo que vemos na natureza - o que vemos naturalmente são eventos precedidos de causas. Ora, se alguém inventa um evento diferente, que não é precedido de causa, é preciso justificar logicamente, do contrário usa-se a navalha de Occam. Nesse sentido não são iguais sequer logicamente, porque a existência de uma causa especial (isto é, incausada) ainda é possível, mas é uma hipótese supérflua.
Pelo dicionário esta é a definição de Deus:
s.m. Ente infinito e existente por si mesmo; a causa necessária e fim último de tudo que existe.
Ao meu ver, esta definição se encaixa na descrição.
Pegar uma palavra simplesmente do dicionário e aplicá-la em uma discussão do tipo é complicado, né? Pois sabemos que a palavra Deus embarca muitos conceitos filosóficos e religiosos que não cabem em meia duzia de linhas.
Mas mesmo nessa definição do dicionário o ente que você descreve não se encaixa perfeitamente, pois como você pode definir infinitude de um ser não espacial nem temporal? Como uma causa ou uma força pode ser finita ou infinita? Como a causa primeira pode ser o fim último? (Aliás, o que é "fim último" que esse dicionário quer dizer?)
Insisto na afirmação que crer em uma causa primeira, seja qual for ela, não implica em acreditar em Deus. No dia-a-dia, e mesmo em escritos filosóficos e teológicos, estes não são conceitos intercambiáveis. O conceito de Deus excede em muito o conceito de causa primeira, e pode inclusive dispensá-lo. Isso mesmo na teologia cristã, que usa o conceito de causa primeira (Aquino), mas como algo acidental e não intrínseco a Deus – Deus poderia não criar o mundo e ainda assim ser Deus.
De forma oposta, pode-se acreditar em uma primeira causa sem implicar qualquer aspecto divino, na medida em que se reconhece que essa primeira causa é tão natural quanto as demais. Ora, digamos que a ciência crie um modelo que aponte um primeiro evento de tal forma que esse primeiro evento não prescinda de nenhum outro. A ciência seria teísta? Não né...
Eu acredito ter usado um pensamento racional tendo por base algumas verdades que é comum a todos, como causalidade, qual seria a principal discrepância entre definições de causalidade que me impediria de usá-la em um pensamento lógico?
Do meu conhecimento eu poderia citar duas. A primeira é que a causalidade definida através da Relatividade Restrita requer que os eventos ligados pela causalidade estejam em uma “distância” mínima (ou máxima, dependendo da definição). “Distância” num sentido mais lato sensu, isto é, espaço-temporal (embora seja medida em unidades de comprimento, como metro) - a “distância” entre dois eventos é diferente dependendo do intervalo de tempo entre eles. Se você fala porém de uma relação de causalidade provindo de fora do espaço e do tempo, percebe-se que você já se separou totalmente dessa definição científica. Outro ponto, mais clichê, é a questão da mecânica quântica ser probabilística, o que já destrói um pouco o conceito de causalidade no sentido filosófico e intuitivo, pois dois experimentos podem fornecer resultados distintos, logo esse resultado, ou aquela medida não foi inteiramente causado pelo evento anterior, e sim apenas as probabilidades da medida em questão ocorrer (poderia, porém, ter ocorrido outra medida, nesse caso a medida em si não está ligada por relação de causa e efeito ao evento passado, pois tais termos denotam a idéia de necessidade).
Isso sem falar de teorias bem mais modernas que desconheço completamente. Mas a questão não é você adequar seus "puros raciocínios" à ciência, e sim, como disse, ou abdicar do conhecimento científico e seguir num ramo de conhecimento completamente outro, ou aceitar que a questão é matéria de ciência e atacá-la cientificamente (o que obviamente não é fácil ou acessível e requer anos de estudos). Não há meio termo - quem tentou se inteirar de resultados científicos e depois resolveu filosofar, se viu em poucos anos obsoleto, pois a ciência é transitória. Nesse caso em especial, ou em todo assunto que tem repercussão empírica, a ciência é decerto a melhor opção – historicamente já dera cabo de matérias bem mais arraigadas na mente humana do que essa que estamos tratando.