Ok, eu tentei, com o julgamento mais imparcial possível, ler esse livro, e apesar de não ter passado do capítulo 6, foi o suficiente pra ter me desistimulado a continuar (e dando umas olhadas adiante a coisa não parece melhorar).
As personagens são tão profundos como uma folha de papel bíblia é grossa. Não sou da opinião de que um escritor deva sempre mostrar ao invés de contar uma história, mas aqui o Itamar parece realmente querer que sua narrativa seja sensorial (como na cena de abertura), mas ele basicamente só diz "fulana fez isso", "eu fiquei surpresa", "ciclana fedia a x", sem dar nenhum detalhe a mais das cenas para que elas fiquem impregnadas na nossa memória; acaba sendo tudo esquecível; é um texto morto, vago...
Dá pra perceber que ele parece ter arquitetado um arco bem amarrado para o romance, e com alguém enchendo a coisa com mais imaginação é possível pensar que ficaria um filme (ou minissérie da globo) bem feito, nas mãos de um Luiz Fernando Carvalho por exemplo.
Não é caso do autor ter deixado para os leitores trabalharem, muito pelo contrário, a sutileza passa longe aqui. Só nesses primeiros capítulos a narradora menciona umas trocentas vezes, de forma diferente, o fato de que a tal da faca mudou a vida das meninas, e que ela é misteriosa, e que pode ter tido um passado doloroso etc... como se o evento em si não tivesse sido marcante, como se precisássemos ser lembrados a cada novo capítulo...
Falando nisso, para uma crítica mais micro... a escolha de palavras... que coisa fraca e inconsistente. Logo no início "a faca da
mala de roupas", "pouco antes daquele
evento [o corte da língua]", "não hesitei em
caminhar em direção ao quarto"... Quem fala assim? Caminhar a gente pensa mais no ato em si, como um passeio... evento fica muito impessoal... mala de roupas, sério? Se se pudesse justificar estas escolhas pensando que a narradora tem baixa escolaridade, mas aí logo depois: "para que essa
simbiose ocorresse [a conexão entre as duas meninas, uma interpretando pra outra]" WTF?
EDIT: dando uma olhada na tradução inglesa, eles "consertaram" esse iniciozinho: "When I opened the
suitcase", "I decided I'd
tiptoe over to her room"; "evento", na primeira página, é suprimido, e, depois, no capítulo 3, traduzido como "
accident".
Aí também uma escolha besta de deixar em aberto na primeira parte qual das meninas foi a que teve a língua cortada - e claro, lembrando o leitor desse "suspense" de novo e de novo... "uma de nós levaria a notícia para casa".
E quando você pensa que era só introdução, que depois ia melhorar, chegam as gêmeas, uma dela possuída (se só de raiva ou por alguma entidade, não sei) e toda a situação poderia ter sido mostrada mais vividamente... ao invés disso apenas somos informados de que a moça fazia um barulho à noite que assustava as crianças, e logo depois ela fica "curada"...
Enfim, TL;DR: é tudo vago, simplista, manipulador, esquecível, quando poderia ser o contrário...
Há pouco li o primeiro romance de Ishiguro e como, mesmo ali, ele já sabia criar personagens e cenas tão memoráveis a ponto delas deixarem uma marca na mente do leitor, e fazê-lo querer devorar as páginas... cada livro é um livro, com seu próprio método, claro, mas esse Torto Arado não parece ter sangue nas veias para sustentar sua ambição...
Como anedota, li recentemente um comentário curto sobre outro livro brasileiro, que não li, Tudo É Rio, comparando-o ao TA como um surto coletivo... e realmente...
TL;DR
2:
[LOL imagina se tivesse lido o livro inteiro, o tamanho que esse post poderia tomar
]