Hugo
Hail to the Thief
A Banda:
Fernada Takai (voz, violao e guitarra)
Fernanda é amapaense da Serra Do Navio (hemisfério norte!), tem olhos meio puxados porque seus avós paternos são japoneses e sotaque indefinível porque já morou num monte de estados e cidades diferentes. Aprendeu com Suzanne Vega e Tracey Thorn que o legal é cantar baixinho e perto do microfone. Ao vivo toca guitarra, violão e canta com voz normal e de monstro.
John (guitarras, violoes, voz, teclado e programaçoes)
João Daniel Ulhoa tem esse apelido - John - por ter nascido em Paracatu, Texas. Bobagem, John era skatista nos anos 80, tocava na lendária banda Sexo Explícito e nem se lembra mais quando comecaram a chamá-lo assim. Canta em algumas músicas, mas prefere imensamente compor, tocar guitarra e programar seus japoneses (Roland) e americanos (Macintosh).
Ricardo Koctus (baixo e voz)
Esse fã de Elvis Presley nasceu em Belo Horizonte, trabalhou num monte de empregos diferentes até ir parar como vendedor na Guitar Shop Instrumentos Musicais. Lá encontrou companhia para tentar viver de música, e não mais dos músicos que gastavam seu sustento por lá. Sabe tocar um bocado de canções de outros artistas, o que lhe dá uma boa vantagem nas jam-sessions.
Xande Tamietti (bateria)
Alexandre Tamietti toca horrores, dá medo vê-lo tocar. Quase nunca erra, e quando erra, conserta o erro fazendo algo ainda mais complicado. Sua formação é jazzística, o que explica uma parte das cabeludagens que faz. Também é de BH, foi o último a entrar na banda e mesmo assim só entrou porque foi o único baterista que conseguiu acompanhar as programações esquisitas dos primeiros discos.
Biografia:
No Pato Fu, o John toca guitarra e canta, a Fernanda toca violão e canta, o Ricardo toca baixo e canta, 128 japoneses fazem o resto e quem programa os tais japs é o John." Assim começou a história dessa banda mineira sincera e bem humorada. O inusitado nome Pato Fu, foi inspirado em uma tira do Garfield, que lutava "gato fu". O ano era 1993 quando o primeiro disco Rotomusic de Liquidificapum foi lançando pelo selo independente Cogumelo. O som experimental era bem diferente para ouvidos conservadores, as letras beiravam o sarcasmo, e a forma de cantar não era algo muito "normal". "Hoji" (com "i" mesmo), a releitura de "Sítio do Pica-pau Amarelo", de Gilberto Gil, e "O mundo ainda não está pronto", são alguns exemplos desse estranho universo que estava surgindo.
O DESCOBRIMENTO DO PATO FU
O bom trabalho da banda despertou a atenção da gravadora BMG, e no ano seguinte 94, o Pato Fu foi contratado. O primeiro produto dessa nova parceria chama-se Gol de Quem?, o grande clássico Fu. O disco tem sonoridade ainda experimental, porém, mais consistente. É por meio desse segundo trabalho que aparece os primeiros hits dos mineiros, com as músicas "Sobre o Tempo" e "Qualquer Bobagem". "Sobre o Tempo" é uma balada fácil de pegar, sem soar fútil. Com essa canção, o Pato Fu conquistou o prêmio de revelação na MTV em 1995. Nesse mesmo ano o baterista Xande Tamietti entrou na banda. "Gol de Quem?", não se limita a esses hits apenas. Todas as canções do disco estão entre as coisas mais criativas que os patos já fizeram. "Onofle", "Vida Imbecil" e "Spoc", são bons exemplos disso.
Em Tem Mas Acabou, de 96, o quarteto Pato Fu varia radicalmente entre a engraçada "Pinga", a lírica "O peso das Coisas". O peso de "Capetão 66,6 FM" contrasta totalmente com a new bossa nova "Nuvens". É sem dúvida o trabalho mais diversificado, mas a suposta falta de um conceito definido confunde o mercado e o disco não vende como deveria. Contudo, o Pato Fu já tinha se especializado em uma arma poderosa chamada "shows". As músicas do terceiro disco crescem quando tocadas ao vivo.
O RECONHECIMENTO E O CAMINHO DAS RÁDIOS
A banda amadurece muito ao longo do caminho. Era chegada a hora de definir melhor os papéis. Dessa forma, em 1998, no Pato Fu, Fernanda Takai canta e toca violão, John toca guitarra e faz as programações, Ricardo Kóctus toca o baixo e Xande, a bateria. Trabalhando na forma "cada um com sua parte", conceberam Televisão de Cachorro, com a produção do ex-Skank, Dudu Marote. O disco é bem acessível ao mercado, e produziu três hits: "Antes de seja tarde", "Eu Sei" (da Legião Urbana), e "Canção para você viver mais". Com um trabalho bem resolvido, o Pato Fu vendeu pouco mais de cem cópias e ganhou o primeiro disco de ouro da carreira.
A parceria com Dudu foi tão positiva, que ela é repetida em "Isopor", o mais recente álbum. Quando era esperado mais um disco para rádio, os patos surpreendem novamente. Isopor recupera o conceito rotomusic usando tecnologia de ponta. O resultado só poderia ser bem sucedido. A mistura dos sons distribuídos entre as canções são da melhor qualidade. Tudo começa com o pop nipônico "película" e termina na valsa "Quase". No recheio encontramos o primeiro ska fu "Morto", o bom rock está representado em "O Prato do Dia". Há reviravoltas ao estilo jovem guarda com "Imperfeito" e, como não poderia faltar, a filha predileta das rádios "Depois". O resultado são quase 200 mil cópias em pouco mais de três meses do lançamento e o segundo disco de ouro.
AMADURECIMENTO ROSA
Após a turnê Isopor, o Pato Fu começou a se dedicar no novo projeto. John montou um estúdio em casa onde começou a "fabricar" os ruídos do disco seguinte. A auto-suficiência permitiu que Ruído Rosa, o sexto CD, fosse para o estúdio do produtor Dudu Marote com o disco praticamente pronto. Ruído Rosa foi mixado em Londres/ Inglaterra. O ruído resultante é totalmente rotomusic de liquidificapum, o gênero musical, ou simplesmente: Pato Fu. O disco dosa baladas de letras poéticas (E o Vento Levou, Ruído Rosa), rocks de primeira (2 malucos, Deus) e ainda uma made in Caribe/África chamada "Day After Day", que traz a participação dos Mulheres Negras, André Abujamra e Maurício Pereira. Há uma surpreendente "Tribunal de Causas Realmente Pequenas". O curioso é que ao contrário das baladas dos trabalhos anteriores, as de Ruído Rosa dificilmente irão para as rádios. As músicas "chicletes" dessa vez são os rocks "Eu" (Graforréia Xilarmônica), "Sorria, Você Está Sendo Filmado" e "Menti pra você, mas foi sem querer". O disco traz ainda regravações da Mutante "Ando Meio Desligado", feita para uma novela da Rede Globo, e "Tolices" do Ira!.
O QUE O ELEFANTE BU ACHA DISSO TUDO
O Pato Fu era uma banda cult que tinha, e tem, um público muito fiel. Porém, algumas pessoas podem condenar a aparição de bandas desse tipo em programas populares e em rádios comerciais. O Elefante Bu acha que isso não deve ser considerado de forma alguma, como "uma venda ao mercado". O que importa, acima de tudo, é a obra. A Legião Urbana, por exemplo, é prova disso, e não foi por acaso que se tornou o ícone do rock nacional. As canções do Pato Fu, mesmo as "fáceis extremamente fáceis", são de boa qualidade. E não é raro que muitas delas são bem superiores as demais que estão no mercado atualmente.
Por isso tudo, é gratificante acompanhar a evolução e o amadurecimento do quarteto mineiro. O que eles fazem com a música, poucos da década de 80 e 90 se arriscaram a fazer. Os patos não pouparam criatividade nem quando fizeram músicas em japonês, italiano, francês, espanhol ou inglês. É interessante ouvir todos os discos em ordem cronológica. Além de se divertir muito pode-se compreender a progressão dessa, que é a melhor banda dos anos 90 (e quem sabe do novo milênio), que apareceu por essa terra chamada Brasil.
Vida longa ao Pato Fu!
Discografia Completa:
Mtv Ao Vivo No Museu De Arte Da Pampulha - 2002
Review: A diferença entre bons e grandes artistas aparece nessas horas. Quando tudo indicava que o Pato Fu iria escorregar, surge um trabalho surpreendente. Quem torceu o nariz quando soube que o grupo gravaria um disco ao vivo com a chancela da MTV, hoje já deve ter furado o cd de tanto ouvi-lo. Dotado da inspiração que o acompanhou durante dez anos de carreira, o quarteto mineiro rearranjou todos os seus hits na nova empreitada, contrariando a máxima dos discos ao vivo. Alguns sucessos até ficaram de fora para que canções injustiçadas ("Imperfeito", "Um Dia, Um Ladrão") e quatro inéditas aparecessem.
Praticamente irretocável, o MTV Ao Vivo Pato Fu No Museu De Arte Da Pampulha teve repertório definido em cima de listinhas pessoais. "Cada um fez uma e aí a gente achou as músicas que se repetiam nelas. Com as que não se repetiam, ficávamos tentando convencer um ao outro de que elas deveriam entrar", revela Fernanda Takai. Não houve comprometimento com o número de faixas a ser retirado de cada um dos seis álbuns de estúdio. "A gente chegou a pensar nisso, mas vimos que faríamos um disco pior se fôssemos por aí (...) Montamos um espetáculo especial para ser gravado e filmado. O melhor show possível, com os ‘hermetos pascoais’ que chamamos para bagunçar o negócio" define John, que chama de "hermetos" o tecladista Lulu Camargo (ex-Karnak) e a dupla gaúcha (ou melhor, sborniana) Hique Gomez e Nico Nicolaiewsky, do espetáculo Tangos & Tragédias. "Tentamos pensar assim: 'se fosse a primeira vez que fossemos gravar 'Sobre O Tempo', como seria?'. Era essa a linha de raciocínio. E tem muito arranjo que só ficou do jeito que ficou pela presença desses convidados pitorescos. A gente não faria o "Eu" Belém-do-Pará-tango sem os caras". John inspirou-se no guitarrista Chimbinha, considerado o Joe Satriani do Norte-nordeste, no arranjo citado.
A escolha do Museu da Pampulha ajudou a dar a cara intimista ao trabalho. "A gente aproveitou o espaço em si: 150 pessoas, um lugar pequeno, o público muito próximo, só fãs. Numa boate, o cara vai, toma uma, paquera a menina. Se rola uma música delicada, só com a voz da Fernanda, o cara já começa 'toca Raul, me dá uma palheta'", zomba o baixista Ricardo Koctus. Em muitos momentos é possível esquecer que a gravação foi feita ao vivo. "Com as adaptações técnicas que fizemos, a acústica do lugar ficou boa. O disco soa como um de estúdio", acredita o baterista Xande Tamietti. "Parece um estúdio com uma porrada de gente dentro", conclui John.
A preocupação do grupo com a qualidade do registro impressiona. Fernanda evitou chamar palmas ou pedir o corinho dos presentes na maioria do tempo. John pensa que "a sonoridade do povão é legal quando você está lá. No cd, isso não é muito musical. É mais uma ode à própria banda, troféu jóinha". Na mixagem, as manifestações do público possíveis de serem tiradas foram tiradas. Mas em "Imperfeito", que perdeu o backing vocal eletrônico para ficar menos Jovem Guarda e mais punk, é possível ouvir a platéia fazendo os "uuuuuuus" do refrão. "A gente ficou pensando 'o que esses caras estão fazendo?'", brinca o guitarrista, que usou um macete para manipular seu instrumento em estúdio. "A linha da guitarra foi gravada sequinha, porque aí o timbre podia ser mudado no (programa de computador) Pro-Tools. A gente usou filtro de voz também. Tratamos os efeitos das músicas como se fossem efeitos de estúdio, só que com captação ao vivo", entrega Fernanda.
Também dá para notar que há pouca comunicação entre banda e espectadores. A economia foi adotada para que coubessem mais músicas no cd, que saiu com 19, quase batendo no tempo máximo de uma bolachinha. Quem levar o dvd ganha a ordem exata do show, que abre com "Tribunal de Causas Realmente Pequenas" colada com "Licitação" (ausentes no cd, bem como "Um Ponto Oito"), além de extras que incluem cifras, making of, entrevistas, projeções da turnê do Ruído Rosa e até uma área escondida.
"Você viu que o disco não tem direção artística?" A pergunta de Fernanda explica muito da singularidade encontrada no projeto. "A gente fez o disco sozinho. A gravadora o ouviu pronto. Não porque a gente é legal demais. É que eu acho que eles estavam preocupados com outras coisas, como a carreira solo do Alexandre Pires. Ficamos órfãos e foi bom, fizemos o disco que quisemos." A BMG, mesmo sem querer, ajuda a consagrá-los mais uma vez. ---Por José Flávio Júnior
Ruído Rosa - 2001
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Isopor - 1999
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Televisão de Cachorro - 1998
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Tem Mas Acabou - 1996
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por André Abujamra
Gol de Quem? - 1995
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Carlos Savalla
Rotomusic de Liquidificapum - 1993
Gravadora: Cogumelo Records
Curiosidades:
· Pato Fu é uma "luta marcial" entre patos. O grupo escolheu esse nome, porque, além de gostar do nome, em português, faz uma referência ao oriente, e não remete a nenhum estilo musical.
· Antes de cantar no Pato Fu, Fernanda Takai fazia parte da banda "Data Venia", de 1988 à 1992. Também cantou na "Sustados por 1 Gesto", em 1991, que mais tarde seria o embrião do Pato Fu.
· Fernanda Takai é formada em Comunicação pela UFMG. Ela fundou a empresa DMJ de comunicação visual, responsável pelas capas dos dois primeiros CDs da banda, "Rotomusic De Liquidificapum" e "Gol De Quem?", mas se desligou dos negócios em 1994 para se dedicar somente à música.
· O primeiro video clip da banda, ao contrário do que muitos pensam, foi O Amor em Carne e Osso - uma raridade que não chegou a ser veiculada na mídia, porque continha cenas de desenhos da Disney e que não foram liberadas...
· O Pato Fu venceu na categoria Melhor Artista/Banda Revelação no 1º MTV Video Music Awards Brasil/95, com a música "Sobre o Tempo".
· Começando pelo próprio nome tirado das tiras do Garfield, a banda identifica-se muito com o mundo das histórias em quadrinhos.
· Cada integrante tem seu desenho preferido...a Fernanda por exemplo adora Pinky e Cérebro. John é fã de Calvin e Hobbes.
· Outra diversão do Pato FU: nas horas vagas eles adoram um vídeo game ou um jogo de computador.
· Fernanda adora Mário Bross & sua turma.
· John é fera no GP do seu computer...
· O bicho de estimação da Fernanda é o cachorrinho Totó.
Frases:
- Ela é sempre super simpática com a gente, e a recíproca é verdadeira, é uma pessoa muito bacana..." (John, do Pato Fu, sobre a Rita Lee)
- Ah, a mídia não é um mal em si...É um meio, é necessário saber usá-la pra não ser usado por ela...O fato é que sem ela, uma banda não sustenta seus membros, ninguém pode largar seu emprego e viver de sua música se não toca pelo menos um pouquinho no rádio ou na TV, não aparece nos jornais...Foi assim que vocês ficaram nos conhecendo, não?" (John)
- "Nos shows do Pato Fu você vê desde cabeludos batendo cabeça lá na frente até um pessoal mais velho. " (John)
- "É um episódio muito triste , não há como medir a perda de um artista assim. Apesar de atitudes como não querer dar entrevistas ou mesmo fazer shows , Renato Russo era adorado pelos fãs , para eles , suas palavras valem ouro." (Fernanda Takai)
Entrevista com a Banda:
Pergunta: Como a banda concebeu esse show para o primeiro CD ao vivo do Pato Fu?
John: Este CD será um ao vivo de uma turnê que não existe. Não é um show "normal" este do Museu da Pampulha. Não dá pra ficar pulando pra todo lado, porque quando você faz isso e vai ouvir depois a guitarra, cara, estará toda balançada. Vamos fazer tudo para tocar certo e para que o disco seja ao vivo mesmo, porque a coisa mais fácil do mundo é refazer as música na pós-produção. Não é isso que queremos. Então, tem que ter disciplina de ensaio. Se a banda estivesse com a turnê já na estrada, toda ensaiada, seria mais fácil.
Pergunta: Por que no Museu da Pampulha, em BH?
Fernanda: Tem muita gente que vem sempre aqui andar de bicicleta e nunca entrou no museu. O pessoal toma uma água-de-coco, chupa um picolé e vai embora. O que vai ser legal para quem assistir essa gravação, além da possibilidade de vir até Belo Horizonte, será conhecer o museu. Acho que as pessoas vão se surpreender como ele é pequeno, bonito, especial.
Ricardo: A gente não queria aquele barulho excessivo da galera, por isso optamos por um lugar menor.
John: A sonoridade que estamos propondo para esse disco não caberia fazer num Palace, porque tem coisas muito minúsculas. A gente adora que cada música tenha uma idéia e não seja simplesmente uma repetição do que a banda já vem tocando. O único jeito de fazermos isso seria mudando os arranjos todos e fazendo um show pequeno, em que pudéssemos contar com o silêncio em algumas músicas. O que não queríamos nesse disco ao vivo era perder a inventividade de um disco de estúdio.
Pergunta: John, você compôs uma das novas canções do MTV ao Vivo, "Me Explica", inspirado na história recente do Herbert Vianna. Como criou essa homenagem?
John: A gente nem mostrou para ele ainda. Lembro de ter lido no jornal uma notinha que era muito comovente. Pô, a primeira frase que ele (Herbert) disse ao acordar (depois do acidente de helicóptero em 2001) era: 'Me explica'. Pensei: Putz, é de cortar o coração. Aí fiz a música, do modo mais respeitoso possível. Como toda música pop, ela pode ser interpretada de mil maneiras. Pode ser ouvida, por exemplo, como uma canção romântica escrita para alguém que está longe. Não sei se quem ouvir no rádio vai fazer essa associação com o Herbert.
Pergunta: No início do ensaio geral, a Fernanda comentou que todas as caras que estavam na platéia eram conhecidas. Isso, num lugar pequeno como o museu, ajudou ou atrapalhou?
Fernanda: A primeira pessoa que eu vi quando entrei foi minha mãe. Para mim foi terrível (risos)! Por exemplo, sei que ela detesta o "Capetão"! Então, quando vou cantar, já sei que minha mãe vai estar pensando: 'Que pena que ela está cantando essa música, o show estava tão bonito…'. Tem aquela coisa de você saber o que as pessoas estão pensando, isso influencia.
Pergunta: Dessa relação próxima com os fãs, dá pra saber quem é, afinal, o público do Pato Fu?
John: No início, acho que o público do Pato Fu já era bastante variado. Continua sendo. Tem pessoas que gostam das músicas de bater cabeça, mais metaleiro, um pessoal que gosta das letras, outros que gostam da parte eletrônica e uns que curtem uma banda com esse monte de coisas juntas. Depois, quando começamos a fazer um pouco mais de sucesso, apareceu aquele tipo de fã da música de trabalho. Mas esses vão e vem. Em algumas épocas, ficamos meio longe da mídia e, quando vamos fazer shows em lugares distantes, ainda assim tem gente que canta os "lados B" dos discos. Temos também um público que envelheceu com a gente. Mas o grande público de toda banda de pop rock é mesmo formado por adolescentes e "adultos jovens".
Pergunta: Qual é a idéia da dupla Nico e Hique no show?
Fernanda: Eles estão inseridos neste show como instrumentistas e cantores, não como atores. Apesar de não serem da música pop e sim do teatro musical, são músicos muito versáteis. Não são estranhos à música da banda. Eles estão juntos há 18 anos, mas fora do espetáculo têm carreiras solos, gravaram discos e fizeram shows sozinhos.
Pergunta: E o Lulu Camargo (tecladista)?
Fernanda: O Lulu é um excelente músico, super caladinho, inteligente. É o tipo de cara que pesquisa muito, está sempre comprando disco, baixando música, querendo módulos novos de som, é meio como o John.
John: Se não fosse o Lulu, acho que não chamaria nenhum outro tecladista. O que ele faz daria para a gente seqüenciar… Mas, quando ele toca, vai muito além do seqüencer, é um cara que acrescenta muito.
Pergunta: E vai todo mundo para a turnê do MTV ao Vivo?
Fernanda: Não dá pra levar todos, mas o Lulu acho que sim. Estamos pensanso em levar o Nico e o Hique só para as capitais, porque eles já têm uma agenda de espetáculos cheia. Mas foi uma turminha boa que formamos para o show. A gente não sabia como seria a execução, mas depois dos ensaios e, mais ainda, depois da pós-produção, vai chegar na maçaroca sonora que a gente queria.
Pergunta: Nesse balanço de dez anos de carreira, dá pra dizer o que era desafio para o Pato Fu quando ainda era uma banda independente? Como foi gravar o primeiro álbum?
John: O Pato Fu sempre foi uma banda que trabalhou de maneira muito independente, seja dentro de uma gravadora grande, seja num selo pequeno. Sempre tentamos fazer nossa própria produção e ter nossos próprios contatos. Mesmo num esquema de grande gravadora, a gente faria o mesmo para o primeiro disco; era o que sabíamos fazer naquele momento. Por isso, acho bom ver selos pequenos funcionando e lançando pessoas que podem virar estrelas ou não, mas que, pelo menos, vão poder ter uma carreira sustentável, com turnês e shows, para que poder largar seus "outros empregos". Porque quase todo mundo que mexe com música aqui no Brasil e tem banda pequena precisa ter outro emprego para se sustentar. E saber largar é um momento fundamental para uma banda. Quando você ouvir: 'Meu, larga tudo e fica tocando guitarra!', meu conselho é: não, cara, fica no teu emprego e continua tocando. Porque, bicho, lá fora é uma selva. Tua mãe não vai te aturar, ninguém vai pagar pra você ficar tocando guitarra o dia inteiro. Não que música não seja um esporte sério. É, sim. Mas é bem possível você ter um emprego e continuar ralando de tocar.
Pergunta: No caso de vocês, quando foi que rolou esse momento?
Ricardo: No meu caso, eu trabalhava com o John (Ricardo era vendedor na loja de John, a Guitar Shop, em BH). No lançamento do primeiro disco, a gente estava com o show engatilhado, mas não havia uma pessoa para produzir nem um empresário. Chega um momento numa banda que alguém tem que tomar a dianteira para preparar o terreno até os outros possam largar seus trabalhos. O John tinha uma empresa, a Fernanda tinha um emprego (numa agência de publicidade) e eu não tinha nada além do Pato Fu. Então, no início, eu virei o empresário da banda. Não que eu gostasse
Pergunta: Foi por necessidade que você tomou essa decisão?
Ricardo: Foi, porque eu acreditava que a banda tinha potencial. Parei de estudar na oitava série e toquei durante cinco anos em bar. Tudo o que eu sempre quis foi ser músico, nem que fosse para tocar em bar o resto da minha vida. Entre o John e a Fernanda, que tinham empregos que dariam para salvar a pátria se algo desse errado, fui eu quem tive de assumir o outro lado. Mas eu também falei: vocês vão ter que me ajudar. Então, cada showzinho que eu fechava, coisa de 100 reais na época, 15% era meu.
Fernanda: Muitas bandas da nossa geração ficaram em Belo Horizonte, não tentaram ira para Rio-São Paulo, e sobrevivem legal. O John já teve uma banda, a Sexo Explícito, que ficou um ano em São Paulo, em 99. Acontece que todo mundo larga o emprego e vai morar junto na mesma casa, passando dificuldade. Aí você fica ansioso, a cabeça rodando, sem fazer dinheiro ou show. A banda simplesmente implode. Por exemplo, o Sul tem um circuito musical forte, que te permite fazer show praticamente todo dia. Mesmo assim, tem bandas de Porto Alegre que resolveram ir para São Paulo na dificuldade. O Video Hits era uma das minhas bandas gaúchas favoritas e acabou logo depois de ter ido para SP. Então, não dá pra jogar tudo para o alto e dizer "agora é tudo ou nada", porque a cabeça fica muito maluca.
Pergunta: As preocupações no início eram muito diferentes das de hoje?
John: Quando a gente montou o Pato Fu, a idéia era ter uma "banda de fim-de-semana". Ou seja, termos nossos respectivos empregos e uma banda para nos divertimos, nos ensaios e shows. Só que ela deu certo muito rapidamente. Com a primeira demo do Pato Fu, as pessoas já diziam 'Ah, é muito legal!'. Mas era um "legal" que eu nunca tinha ouvido antes! O que estava acontecendo?, a gente pensava. Você nunca pode contar que sua banda vá tocar no rádio, na televisão, que vá ter música na novela ou vender disco, nada disso. Agora, você pode contar que sua banda vá fazer shows. Isso é o básico. Então, o Pato Fu foi montado com a idéia de se ter um show bacana, independente de ter hits. Na verdade, é com isso que uma banda nova pode contar.
Pergunta: E hoje, vocês se preocupam mais com as vendas dos discos?
John: Existem talentos específicos. Não somos as pessoas certas para aplicar formulinhas de sucesso. Se a gente tem algum talento, é para fazer o que a gente sabe. Se houver um estouro de uma das nossas músicas, aí tudo bem. Mas estamos dentro de uma gravadora multinacional com centenas de funcionários para vender. Eles que se preocupam com isso (vendas). A gente procura fazer um bom material, de que a gente tenha orgulho.
Ricardo: A idéia desse disco ao vivo é vender bem. Mas fodemos tudo porque mudamos todas as músicas! (risos)
John: Se a gente não fizesse isso, seria como enganar nosso eleitorado. Nosso público está acostumado a ter uma surpresa a cada disco. A gente nunca vai dar mais do mesmo para as pessoas. Por isso, este é um disco ao vivo em que a gente não está tocando as músicas como elas são em exaltação ao sucesso. Por exemplo, "Eu", que foi uma música muito executada em rádio, um hit do 'Ruído Rosa', com clipe e tudo mais: a gente transformou num tango com com guitarra!
Pergunta: Como é a relação de vocês com as bandas que estão surgindo agora?
Fernanda: As bandas que procuram a gente perguntam coisas do tipo: 'E ai, vocês acham legal mesmo pegar um adiantamento da gravadora e assinar por não sei quantos discos?'. Perguntam sobre equipamento, contrato ou se é legal ou não ter escritório próprio. Isso é bacana. E somos uma banda que tem uma disposição para falar com esse pessoal que está começando porque todo mundo aqui deu muita cabeçada no início.
John: A gente responde muita coisa na Internet. Eu adoro responder os e-mails mais "técnicos", perguntando de modelos de guitarra e tal.
Pergunta: E o Xande, como começou no Pato Fu, vindo da experiência de jazz?
John: Ele foi o único que conseguiu tocar com "os japoneses".
Xande: Vocês lembram um show que a gente fez junto, Pato Fu com a Dib Six (antiga banda do baterista)? Foi a primeira vez que toquei com a banda.
John: Ele já tinha feito uns "testes" antes disso, só não tinha sido "efetivado"
Fernanda: Na verdade, o Xande já tocou todos os estilos musicais.
Ricardo: Nossa, ele já tocou com a Brigitte (banda dos anos 80), lembra?
Xande: Larguei meus estudos aqui em Belo Horizonte, fui morar dois anos no Rio e não deu em nada. Aí voltei. Fui prestar vestibular para Direito e, no meio, rolou a Dib Six. Daí eu chutei a lata de novo. A Dib estava super bem
Ricardo (interferindo): Pô, no terceiro show, eles tocaram no Hollywood Rock!
Xande: Mas eu saí e fui tocar com o Pato Fu, que também estava num momento legal.
Fernanda: O Xande tem aquela carteira azul dos músicos desde os 16 anos!
Pergunta: E como foi a história de se sair bem com "os japoneses"?
Xande: Na época, quando me convidaram pra fazer o teste, só conhecia o John e a Fernanda de "oi" e "tchau". Eles tinham ido num show da Dib. Era uma banda com estilo completamente diferente, com uma pegada mais rock e o lance do sequencer. Por sso, já tinha uma experiência de trabalhar com base sequencial, da mesma forma que o Pato Fu. Nossos equipamentos eram toscos, mas o John tinha equipamentos "top". Quando vi os aparelhos na casa dele, falei: "Ah, é aqui que eu quero ficar".
John: A primeira música que a gente pedia para (o "candidato") tocar era "Rotomusic", super complicada.
Xande: Era "a" prova. A segunda era "Okay, Allright". Pronto, se o cara conseguisse tocar essas, o resto era questão de ensaio. Na época dos dois primeiros discos, "Rotomusic Liquidificapum" e "Gol de Quem?", o show do Pato Fu era mais porrada. As músicas mais calminhas eram "Ring My Bell" e "Sobre o Tempo".
Fernanda: A gente extraiu o máximo da bateria eletrônica. Depois, adicionou um baterista ao som da banda, mas não abolimos a parte eletrônica.
Xande: A diferença é que passou a ter mais uma cabeça pensando e o som ficou mais orgânico.
Pergunta: Fernanda, existe uma preparação vocal sua para fazer os shows?
Fernanda: Na verdade não, por falta de hábito. Nunca fiz aula de técnica vocal. Fiz um curso de férias de três dias, quando tinha 16 anos, porque ficava rouca. Descobri que cantava no tom errado, muito mais grave. Depois disso, nunca mais estudei canto. Não sou contra, mas tenho aprendido muito na estrada. Me escuto cantar, ouço bastante tudo o que a gente grava e tento corrigir. Quando a gente decidiu gravar o disco ao vivo, eu também me perguntei: 'Pô, será que vou dar conta?'.
John: Tem momentos deste show que é só a voz da Fernanda. "Canção Para Você Viver Mais", por exemplo, ela acaba sozinha, sem acompanhamento.
Fernanda: Para este show especificamente nós estamos evitando álcool antes de gravar (risos).
Pergunta: Mas vocês precisam de uma bebidinha para entrar no palco?
Fernanda: Não antes de uma gravação. Mas eu bebo. Não de cair, claro, só de vez em quando só. A gente pega leve. Somos uma banda que, por tocar com coisas eletrônicas, se a gente entrar no palco chapado, o show vai todo errado.
Pergunta: Segundo o site do Pato Fu, você aprendeu que o legal era cantar baixinho ouvindo a Suzanne Vega e a Tracey Thorn. Já tentou cantar em tons diferentes?
Fernanda: Só sei cantar desse jeito. Canto de outros jeitos só de brincadeira (como no "Capetão") ou na época que eu gravava jingles de publicidade. Acho que todo mundo que canta pra fora demais fica muito parecido, a ponto de você ouvir e perguntar quem é. E eu não gosto e não sei fazer isso direiro, a não ser brincando. Das cantoras brasileiras, ouvi muito duas delas: uma não tem nada a ver comigo, que é a Clara Nunes, e a outra é a Nara Leão, que tem esse estilo de cantar baixinho também. Acho que personaliza mais a voz.
Pergunta: Além da Tracey Thorn e da Suzanne Vega, tem outra referência vocal de cantoras estrangeiras pra você?
Fernanda: Gosto muito da Björk, mas não tenho um estilo de cantar parecido. Ela canta totalmente pra fora, mas é outra coisa. Acho que os fonemas lá do islandês ajudam, fica diferente. Gosto muito da Andréa, do Aterciopelados, e também da cantora do Pizzicato Five.
Pergunta: Já fez dublagem?
Fernanda: Estou fazendo agora para A Ilha Rá-Tim-Bum, no papel de um passarinho, que aparece em todos os episódios, como narrador das aventuras da Ilha. Depois, vai ter o longa, que vou participar também.
Pergunta: A indicação do Pato Fu como uma 10 das melhores bandas fora dos Estados Unidos pela revista Time teve um impacto forte em vocês?
John: Parece que alguém da revista viu a gente no Rock In Rio 3. Foi uma grande vitrine, apesar de muitas bandas brasileiras terem pulado fora.
Fernanda: A gente nem sabia que estavam fazendo essa lista até vê-la. É um bom sinal para o rock brasileiro em geral. E uma resposta principalmente para quem acha que o rock brasileiro é subproduto, que as bandas daqui são piada lá fora. Para mim, isso foi uma prova de força da nossa geração. A gente ficou ao lado de U2, Radiohead e Aterciopelados, da Colômbia. Não existe mais esse negócio de fazer rock puro. As bandas fazem música com idéias de seu país de origem, mas numa linguagem mundial. Muita gente falou que era idiota o Pato Fu estar lá. Mas, para a gente, o que importa é que o mesmo cara que votou no U2 também votou em nós. E, o que é melhor, cantando em português.
Reportagem: Bia Rangel, Nícolas Vargas e equipe da Revista MTV
Entrevista feita no dia 29 de abril, horas antes da gravação do MTV ao Vivo
Fernada Takai (voz, violao e guitarra)
Fernanda é amapaense da Serra Do Navio (hemisfério norte!), tem olhos meio puxados porque seus avós paternos são japoneses e sotaque indefinível porque já morou num monte de estados e cidades diferentes. Aprendeu com Suzanne Vega e Tracey Thorn que o legal é cantar baixinho e perto do microfone. Ao vivo toca guitarra, violão e canta com voz normal e de monstro.
John (guitarras, violoes, voz, teclado e programaçoes)
João Daniel Ulhoa tem esse apelido - John - por ter nascido em Paracatu, Texas. Bobagem, John era skatista nos anos 80, tocava na lendária banda Sexo Explícito e nem se lembra mais quando comecaram a chamá-lo assim. Canta em algumas músicas, mas prefere imensamente compor, tocar guitarra e programar seus japoneses (Roland) e americanos (Macintosh).
Ricardo Koctus (baixo e voz)
Esse fã de Elvis Presley nasceu em Belo Horizonte, trabalhou num monte de empregos diferentes até ir parar como vendedor na Guitar Shop Instrumentos Musicais. Lá encontrou companhia para tentar viver de música, e não mais dos músicos que gastavam seu sustento por lá. Sabe tocar um bocado de canções de outros artistas, o que lhe dá uma boa vantagem nas jam-sessions.
Xande Tamietti (bateria)
Alexandre Tamietti toca horrores, dá medo vê-lo tocar. Quase nunca erra, e quando erra, conserta o erro fazendo algo ainda mais complicado. Sua formação é jazzística, o que explica uma parte das cabeludagens que faz. Também é de BH, foi o último a entrar na banda e mesmo assim só entrou porque foi o único baterista que conseguiu acompanhar as programações esquisitas dos primeiros discos.
Biografia:
No Pato Fu, o John toca guitarra e canta, a Fernanda toca violão e canta, o Ricardo toca baixo e canta, 128 japoneses fazem o resto e quem programa os tais japs é o John." Assim começou a história dessa banda mineira sincera e bem humorada. O inusitado nome Pato Fu, foi inspirado em uma tira do Garfield, que lutava "gato fu". O ano era 1993 quando o primeiro disco Rotomusic de Liquidificapum foi lançando pelo selo independente Cogumelo. O som experimental era bem diferente para ouvidos conservadores, as letras beiravam o sarcasmo, e a forma de cantar não era algo muito "normal". "Hoji" (com "i" mesmo), a releitura de "Sítio do Pica-pau Amarelo", de Gilberto Gil, e "O mundo ainda não está pronto", são alguns exemplos desse estranho universo que estava surgindo.
O DESCOBRIMENTO DO PATO FU
O bom trabalho da banda despertou a atenção da gravadora BMG, e no ano seguinte 94, o Pato Fu foi contratado. O primeiro produto dessa nova parceria chama-se Gol de Quem?, o grande clássico Fu. O disco tem sonoridade ainda experimental, porém, mais consistente. É por meio desse segundo trabalho que aparece os primeiros hits dos mineiros, com as músicas "Sobre o Tempo" e "Qualquer Bobagem". "Sobre o Tempo" é uma balada fácil de pegar, sem soar fútil. Com essa canção, o Pato Fu conquistou o prêmio de revelação na MTV em 1995. Nesse mesmo ano o baterista Xande Tamietti entrou na banda. "Gol de Quem?", não se limita a esses hits apenas. Todas as canções do disco estão entre as coisas mais criativas que os patos já fizeram. "Onofle", "Vida Imbecil" e "Spoc", são bons exemplos disso.
Em Tem Mas Acabou, de 96, o quarteto Pato Fu varia radicalmente entre a engraçada "Pinga", a lírica "O peso das Coisas". O peso de "Capetão 66,6 FM" contrasta totalmente com a new bossa nova "Nuvens". É sem dúvida o trabalho mais diversificado, mas a suposta falta de um conceito definido confunde o mercado e o disco não vende como deveria. Contudo, o Pato Fu já tinha se especializado em uma arma poderosa chamada "shows". As músicas do terceiro disco crescem quando tocadas ao vivo.
O RECONHECIMENTO E O CAMINHO DAS RÁDIOS
A banda amadurece muito ao longo do caminho. Era chegada a hora de definir melhor os papéis. Dessa forma, em 1998, no Pato Fu, Fernanda Takai canta e toca violão, John toca guitarra e faz as programações, Ricardo Kóctus toca o baixo e Xande, a bateria. Trabalhando na forma "cada um com sua parte", conceberam Televisão de Cachorro, com a produção do ex-Skank, Dudu Marote. O disco é bem acessível ao mercado, e produziu três hits: "Antes de seja tarde", "Eu Sei" (da Legião Urbana), e "Canção para você viver mais". Com um trabalho bem resolvido, o Pato Fu vendeu pouco mais de cem cópias e ganhou o primeiro disco de ouro da carreira.
A parceria com Dudu foi tão positiva, que ela é repetida em "Isopor", o mais recente álbum. Quando era esperado mais um disco para rádio, os patos surpreendem novamente. Isopor recupera o conceito rotomusic usando tecnologia de ponta. O resultado só poderia ser bem sucedido. A mistura dos sons distribuídos entre as canções são da melhor qualidade. Tudo começa com o pop nipônico "película" e termina na valsa "Quase". No recheio encontramos o primeiro ska fu "Morto", o bom rock está representado em "O Prato do Dia". Há reviravoltas ao estilo jovem guarda com "Imperfeito" e, como não poderia faltar, a filha predileta das rádios "Depois". O resultado são quase 200 mil cópias em pouco mais de três meses do lançamento e o segundo disco de ouro.
AMADURECIMENTO ROSA
Após a turnê Isopor, o Pato Fu começou a se dedicar no novo projeto. John montou um estúdio em casa onde começou a "fabricar" os ruídos do disco seguinte. A auto-suficiência permitiu que Ruído Rosa, o sexto CD, fosse para o estúdio do produtor Dudu Marote com o disco praticamente pronto. Ruído Rosa foi mixado em Londres/ Inglaterra. O ruído resultante é totalmente rotomusic de liquidificapum, o gênero musical, ou simplesmente: Pato Fu. O disco dosa baladas de letras poéticas (E o Vento Levou, Ruído Rosa), rocks de primeira (2 malucos, Deus) e ainda uma made in Caribe/África chamada "Day After Day", que traz a participação dos Mulheres Negras, André Abujamra e Maurício Pereira. Há uma surpreendente "Tribunal de Causas Realmente Pequenas". O curioso é que ao contrário das baladas dos trabalhos anteriores, as de Ruído Rosa dificilmente irão para as rádios. As músicas "chicletes" dessa vez são os rocks "Eu" (Graforréia Xilarmônica), "Sorria, Você Está Sendo Filmado" e "Menti pra você, mas foi sem querer". O disco traz ainda regravações da Mutante "Ando Meio Desligado", feita para uma novela da Rede Globo, e "Tolices" do Ira!.
O QUE O ELEFANTE BU ACHA DISSO TUDO
O Pato Fu era uma banda cult que tinha, e tem, um público muito fiel. Porém, algumas pessoas podem condenar a aparição de bandas desse tipo em programas populares e em rádios comerciais. O Elefante Bu acha que isso não deve ser considerado de forma alguma, como "uma venda ao mercado". O que importa, acima de tudo, é a obra. A Legião Urbana, por exemplo, é prova disso, e não foi por acaso que se tornou o ícone do rock nacional. As canções do Pato Fu, mesmo as "fáceis extremamente fáceis", são de boa qualidade. E não é raro que muitas delas são bem superiores as demais que estão no mercado atualmente.
Por isso tudo, é gratificante acompanhar a evolução e o amadurecimento do quarteto mineiro. O que eles fazem com a música, poucos da década de 80 e 90 se arriscaram a fazer. Os patos não pouparam criatividade nem quando fizeram músicas em japonês, italiano, francês, espanhol ou inglês. É interessante ouvir todos os discos em ordem cronológica. Além de se divertir muito pode-se compreender a progressão dessa, que é a melhor banda dos anos 90 (e quem sabe do novo milênio), que apareceu por essa terra chamada Brasil.
Vida longa ao Pato Fu!
Discografia Completa:
Mtv Ao Vivo No Museu De Arte Da Pampulha - 2002
Review: A diferença entre bons e grandes artistas aparece nessas horas. Quando tudo indicava que o Pato Fu iria escorregar, surge um trabalho surpreendente. Quem torceu o nariz quando soube que o grupo gravaria um disco ao vivo com a chancela da MTV, hoje já deve ter furado o cd de tanto ouvi-lo. Dotado da inspiração que o acompanhou durante dez anos de carreira, o quarteto mineiro rearranjou todos os seus hits na nova empreitada, contrariando a máxima dos discos ao vivo. Alguns sucessos até ficaram de fora para que canções injustiçadas ("Imperfeito", "Um Dia, Um Ladrão") e quatro inéditas aparecessem.
Praticamente irretocável, o MTV Ao Vivo Pato Fu No Museu De Arte Da Pampulha teve repertório definido em cima de listinhas pessoais. "Cada um fez uma e aí a gente achou as músicas que se repetiam nelas. Com as que não se repetiam, ficávamos tentando convencer um ao outro de que elas deveriam entrar", revela Fernanda Takai. Não houve comprometimento com o número de faixas a ser retirado de cada um dos seis álbuns de estúdio. "A gente chegou a pensar nisso, mas vimos que faríamos um disco pior se fôssemos por aí (...) Montamos um espetáculo especial para ser gravado e filmado. O melhor show possível, com os ‘hermetos pascoais’ que chamamos para bagunçar o negócio" define John, que chama de "hermetos" o tecladista Lulu Camargo (ex-Karnak) e a dupla gaúcha (ou melhor, sborniana) Hique Gomez e Nico Nicolaiewsky, do espetáculo Tangos & Tragédias. "Tentamos pensar assim: 'se fosse a primeira vez que fossemos gravar 'Sobre O Tempo', como seria?'. Era essa a linha de raciocínio. E tem muito arranjo que só ficou do jeito que ficou pela presença desses convidados pitorescos. A gente não faria o "Eu" Belém-do-Pará-tango sem os caras". John inspirou-se no guitarrista Chimbinha, considerado o Joe Satriani do Norte-nordeste, no arranjo citado.
A escolha do Museu da Pampulha ajudou a dar a cara intimista ao trabalho. "A gente aproveitou o espaço em si: 150 pessoas, um lugar pequeno, o público muito próximo, só fãs. Numa boate, o cara vai, toma uma, paquera a menina. Se rola uma música delicada, só com a voz da Fernanda, o cara já começa 'toca Raul, me dá uma palheta'", zomba o baixista Ricardo Koctus. Em muitos momentos é possível esquecer que a gravação foi feita ao vivo. "Com as adaptações técnicas que fizemos, a acústica do lugar ficou boa. O disco soa como um de estúdio", acredita o baterista Xande Tamietti. "Parece um estúdio com uma porrada de gente dentro", conclui John.
A preocupação do grupo com a qualidade do registro impressiona. Fernanda evitou chamar palmas ou pedir o corinho dos presentes na maioria do tempo. John pensa que "a sonoridade do povão é legal quando você está lá. No cd, isso não é muito musical. É mais uma ode à própria banda, troféu jóinha". Na mixagem, as manifestações do público possíveis de serem tiradas foram tiradas. Mas em "Imperfeito", que perdeu o backing vocal eletrônico para ficar menos Jovem Guarda e mais punk, é possível ouvir a platéia fazendo os "uuuuuuus" do refrão. "A gente ficou pensando 'o que esses caras estão fazendo?'", brinca o guitarrista, que usou um macete para manipular seu instrumento em estúdio. "A linha da guitarra foi gravada sequinha, porque aí o timbre podia ser mudado no (programa de computador) Pro-Tools. A gente usou filtro de voz também. Tratamos os efeitos das músicas como se fossem efeitos de estúdio, só que com captação ao vivo", entrega Fernanda.
Também dá para notar que há pouca comunicação entre banda e espectadores. A economia foi adotada para que coubessem mais músicas no cd, que saiu com 19, quase batendo no tempo máximo de uma bolachinha. Quem levar o dvd ganha a ordem exata do show, que abre com "Tribunal de Causas Realmente Pequenas" colada com "Licitação" (ausentes no cd, bem como "Um Ponto Oito"), além de extras que incluem cifras, making of, entrevistas, projeções da turnê do Ruído Rosa e até uma área escondida.
"Você viu que o disco não tem direção artística?" A pergunta de Fernanda explica muito da singularidade encontrada no projeto. "A gente fez o disco sozinho. A gravadora o ouviu pronto. Não porque a gente é legal demais. É que eu acho que eles estavam preocupados com outras coisas, como a carreira solo do Alexandre Pires. Ficamos órfãos e foi bom, fizemos o disco que quisemos." A BMG, mesmo sem querer, ajuda a consagrá-los mais uma vez. ---Por José Flávio Júnior
Ruído Rosa - 2001
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Isopor - 1999
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Televisão de Cachorro - 1998
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Dudu Marote
Tem Mas Acabou - 1996
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por André Abujamra
Gol de Quem? - 1995
Gravadora: Plug/BMG
Produzido por Carlos Savalla
Rotomusic de Liquidificapum - 1993
Gravadora: Cogumelo Records
Curiosidades:
· Pato Fu é uma "luta marcial" entre patos. O grupo escolheu esse nome, porque, além de gostar do nome, em português, faz uma referência ao oriente, e não remete a nenhum estilo musical.
· Antes de cantar no Pato Fu, Fernanda Takai fazia parte da banda "Data Venia", de 1988 à 1992. Também cantou na "Sustados por 1 Gesto", em 1991, que mais tarde seria o embrião do Pato Fu.
· Fernanda Takai é formada em Comunicação pela UFMG. Ela fundou a empresa DMJ de comunicação visual, responsável pelas capas dos dois primeiros CDs da banda, "Rotomusic De Liquidificapum" e "Gol De Quem?", mas se desligou dos negócios em 1994 para se dedicar somente à música.
· O primeiro video clip da banda, ao contrário do que muitos pensam, foi O Amor em Carne e Osso - uma raridade que não chegou a ser veiculada na mídia, porque continha cenas de desenhos da Disney e que não foram liberadas...
· O Pato Fu venceu na categoria Melhor Artista/Banda Revelação no 1º MTV Video Music Awards Brasil/95, com a música "Sobre o Tempo".
· Começando pelo próprio nome tirado das tiras do Garfield, a banda identifica-se muito com o mundo das histórias em quadrinhos.
· Cada integrante tem seu desenho preferido...a Fernanda por exemplo adora Pinky e Cérebro. John é fã de Calvin e Hobbes.
· Outra diversão do Pato FU: nas horas vagas eles adoram um vídeo game ou um jogo de computador.
· Fernanda adora Mário Bross & sua turma.
· John é fera no GP do seu computer...
· O bicho de estimação da Fernanda é o cachorrinho Totó.
Frases:
- Ela é sempre super simpática com a gente, e a recíproca é verdadeira, é uma pessoa muito bacana..." (John, do Pato Fu, sobre a Rita Lee)
- Ah, a mídia não é um mal em si...É um meio, é necessário saber usá-la pra não ser usado por ela...O fato é que sem ela, uma banda não sustenta seus membros, ninguém pode largar seu emprego e viver de sua música se não toca pelo menos um pouquinho no rádio ou na TV, não aparece nos jornais...Foi assim que vocês ficaram nos conhecendo, não?" (John)
- "Nos shows do Pato Fu você vê desde cabeludos batendo cabeça lá na frente até um pessoal mais velho. " (John)
- "É um episódio muito triste , não há como medir a perda de um artista assim. Apesar de atitudes como não querer dar entrevistas ou mesmo fazer shows , Renato Russo era adorado pelos fãs , para eles , suas palavras valem ouro." (Fernanda Takai)
Entrevista com a Banda:
Pergunta: Como a banda concebeu esse show para o primeiro CD ao vivo do Pato Fu?
John: Este CD será um ao vivo de uma turnê que não existe. Não é um show "normal" este do Museu da Pampulha. Não dá pra ficar pulando pra todo lado, porque quando você faz isso e vai ouvir depois a guitarra, cara, estará toda balançada. Vamos fazer tudo para tocar certo e para que o disco seja ao vivo mesmo, porque a coisa mais fácil do mundo é refazer as música na pós-produção. Não é isso que queremos. Então, tem que ter disciplina de ensaio. Se a banda estivesse com a turnê já na estrada, toda ensaiada, seria mais fácil.
Pergunta: Por que no Museu da Pampulha, em BH?
Fernanda: Tem muita gente que vem sempre aqui andar de bicicleta e nunca entrou no museu. O pessoal toma uma água-de-coco, chupa um picolé e vai embora. O que vai ser legal para quem assistir essa gravação, além da possibilidade de vir até Belo Horizonte, será conhecer o museu. Acho que as pessoas vão se surpreender como ele é pequeno, bonito, especial.
Ricardo: A gente não queria aquele barulho excessivo da galera, por isso optamos por um lugar menor.
John: A sonoridade que estamos propondo para esse disco não caberia fazer num Palace, porque tem coisas muito minúsculas. A gente adora que cada música tenha uma idéia e não seja simplesmente uma repetição do que a banda já vem tocando. O único jeito de fazermos isso seria mudando os arranjos todos e fazendo um show pequeno, em que pudéssemos contar com o silêncio em algumas músicas. O que não queríamos nesse disco ao vivo era perder a inventividade de um disco de estúdio.
Pergunta: John, você compôs uma das novas canções do MTV ao Vivo, "Me Explica", inspirado na história recente do Herbert Vianna. Como criou essa homenagem?
John: A gente nem mostrou para ele ainda. Lembro de ter lido no jornal uma notinha que era muito comovente. Pô, a primeira frase que ele (Herbert) disse ao acordar (depois do acidente de helicóptero em 2001) era: 'Me explica'. Pensei: Putz, é de cortar o coração. Aí fiz a música, do modo mais respeitoso possível. Como toda música pop, ela pode ser interpretada de mil maneiras. Pode ser ouvida, por exemplo, como uma canção romântica escrita para alguém que está longe. Não sei se quem ouvir no rádio vai fazer essa associação com o Herbert.
Pergunta: No início do ensaio geral, a Fernanda comentou que todas as caras que estavam na platéia eram conhecidas. Isso, num lugar pequeno como o museu, ajudou ou atrapalhou?
Fernanda: A primeira pessoa que eu vi quando entrei foi minha mãe. Para mim foi terrível (risos)! Por exemplo, sei que ela detesta o "Capetão"! Então, quando vou cantar, já sei que minha mãe vai estar pensando: 'Que pena que ela está cantando essa música, o show estava tão bonito…'. Tem aquela coisa de você saber o que as pessoas estão pensando, isso influencia.
Pergunta: Dessa relação próxima com os fãs, dá pra saber quem é, afinal, o público do Pato Fu?
John: No início, acho que o público do Pato Fu já era bastante variado. Continua sendo. Tem pessoas que gostam das músicas de bater cabeça, mais metaleiro, um pessoal que gosta das letras, outros que gostam da parte eletrônica e uns que curtem uma banda com esse monte de coisas juntas. Depois, quando começamos a fazer um pouco mais de sucesso, apareceu aquele tipo de fã da música de trabalho. Mas esses vão e vem. Em algumas épocas, ficamos meio longe da mídia e, quando vamos fazer shows em lugares distantes, ainda assim tem gente que canta os "lados B" dos discos. Temos também um público que envelheceu com a gente. Mas o grande público de toda banda de pop rock é mesmo formado por adolescentes e "adultos jovens".
Pergunta: Qual é a idéia da dupla Nico e Hique no show?
Fernanda: Eles estão inseridos neste show como instrumentistas e cantores, não como atores. Apesar de não serem da música pop e sim do teatro musical, são músicos muito versáteis. Não são estranhos à música da banda. Eles estão juntos há 18 anos, mas fora do espetáculo têm carreiras solos, gravaram discos e fizeram shows sozinhos.
Pergunta: E o Lulu Camargo (tecladista)?
Fernanda: O Lulu é um excelente músico, super caladinho, inteligente. É o tipo de cara que pesquisa muito, está sempre comprando disco, baixando música, querendo módulos novos de som, é meio como o John.
John: Se não fosse o Lulu, acho que não chamaria nenhum outro tecladista. O que ele faz daria para a gente seqüenciar… Mas, quando ele toca, vai muito além do seqüencer, é um cara que acrescenta muito.
Pergunta: E vai todo mundo para a turnê do MTV ao Vivo?
Fernanda: Não dá pra levar todos, mas o Lulu acho que sim. Estamos pensanso em levar o Nico e o Hique só para as capitais, porque eles já têm uma agenda de espetáculos cheia. Mas foi uma turminha boa que formamos para o show. A gente não sabia como seria a execução, mas depois dos ensaios e, mais ainda, depois da pós-produção, vai chegar na maçaroca sonora que a gente queria.
Pergunta: Nesse balanço de dez anos de carreira, dá pra dizer o que era desafio para o Pato Fu quando ainda era uma banda independente? Como foi gravar o primeiro álbum?
John: O Pato Fu sempre foi uma banda que trabalhou de maneira muito independente, seja dentro de uma gravadora grande, seja num selo pequeno. Sempre tentamos fazer nossa própria produção e ter nossos próprios contatos. Mesmo num esquema de grande gravadora, a gente faria o mesmo para o primeiro disco; era o que sabíamos fazer naquele momento. Por isso, acho bom ver selos pequenos funcionando e lançando pessoas que podem virar estrelas ou não, mas que, pelo menos, vão poder ter uma carreira sustentável, com turnês e shows, para que poder largar seus "outros empregos". Porque quase todo mundo que mexe com música aqui no Brasil e tem banda pequena precisa ter outro emprego para se sustentar. E saber largar é um momento fundamental para uma banda. Quando você ouvir: 'Meu, larga tudo e fica tocando guitarra!', meu conselho é: não, cara, fica no teu emprego e continua tocando. Porque, bicho, lá fora é uma selva. Tua mãe não vai te aturar, ninguém vai pagar pra você ficar tocando guitarra o dia inteiro. Não que música não seja um esporte sério. É, sim. Mas é bem possível você ter um emprego e continuar ralando de tocar.
Pergunta: No caso de vocês, quando foi que rolou esse momento?
Ricardo: No meu caso, eu trabalhava com o John (Ricardo era vendedor na loja de John, a Guitar Shop, em BH). No lançamento do primeiro disco, a gente estava com o show engatilhado, mas não havia uma pessoa para produzir nem um empresário. Chega um momento numa banda que alguém tem que tomar a dianteira para preparar o terreno até os outros possam largar seus trabalhos. O John tinha uma empresa, a Fernanda tinha um emprego (numa agência de publicidade) e eu não tinha nada além do Pato Fu. Então, no início, eu virei o empresário da banda. Não que eu gostasse
Pergunta: Foi por necessidade que você tomou essa decisão?
Ricardo: Foi, porque eu acreditava que a banda tinha potencial. Parei de estudar na oitava série e toquei durante cinco anos em bar. Tudo o que eu sempre quis foi ser músico, nem que fosse para tocar em bar o resto da minha vida. Entre o John e a Fernanda, que tinham empregos que dariam para salvar a pátria se algo desse errado, fui eu quem tive de assumir o outro lado. Mas eu também falei: vocês vão ter que me ajudar. Então, cada showzinho que eu fechava, coisa de 100 reais na época, 15% era meu.
Fernanda: Muitas bandas da nossa geração ficaram em Belo Horizonte, não tentaram ira para Rio-São Paulo, e sobrevivem legal. O John já teve uma banda, a Sexo Explícito, que ficou um ano em São Paulo, em 99. Acontece que todo mundo larga o emprego e vai morar junto na mesma casa, passando dificuldade. Aí você fica ansioso, a cabeça rodando, sem fazer dinheiro ou show. A banda simplesmente implode. Por exemplo, o Sul tem um circuito musical forte, que te permite fazer show praticamente todo dia. Mesmo assim, tem bandas de Porto Alegre que resolveram ir para São Paulo na dificuldade. O Video Hits era uma das minhas bandas gaúchas favoritas e acabou logo depois de ter ido para SP. Então, não dá pra jogar tudo para o alto e dizer "agora é tudo ou nada", porque a cabeça fica muito maluca.
Pergunta: As preocupações no início eram muito diferentes das de hoje?
John: Quando a gente montou o Pato Fu, a idéia era ter uma "banda de fim-de-semana". Ou seja, termos nossos respectivos empregos e uma banda para nos divertimos, nos ensaios e shows. Só que ela deu certo muito rapidamente. Com a primeira demo do Pato Fu, as pessoas já diziam 'Ah, é muito legal!'. Mas era um "legal" que eu nunca tinha ouvido antes! O que estava acontecendo?, a gente pensava. Você nunca pode contar que sua banda vá tocar no rádio, na televisão, que vá ter música na novela ou vender disco, nada disso. Agora, você pode contar que sua banda vá fazer shows. Isso é o básico. Então, o Pato Fu foi montado com a idéia de se ter um show bacana, independente de ter hits. Na verdade, é com isso que uma banda nova pode contar.
Pergunta: E hoje, vocês se preocupam mais com as vendas dos discos?
John: Existem talentos específicos. Não somos as pessoas certas para aplicar formulinhas de sucesso. Se a gente tem algum talento, é para fazer o que a gente sabe. Se houver um estouro de uma das nossas músicas, aí tudo bem. Mas estamos dentro de uma gravadora multinacional com centenas de funcionários para vender. Eles que se preocupam com isso (vendas). A gente procura fazer um bom material, de que a gente tenha orgulho.
Ricardo: A idéia desse disco ao vivo é vender bem. Mas fodemos tudo porque mudamos todas as músicas! (risos)
John: Se a gente não fizesse isso, seria como enganar nosso eleitorado. Nosso público está acostumado a ter uma surpresa a cada disco. A gente nunca vai dar mais do mesmo para as pessoas. Por isso, este é um disco ao vivo em que a gente não está tocando as músicas como elas são em exaltação ao sucesso. Por exemplo, "Eu", que foi uma música muito executada em rádio, um hit do 'Ruído Rosa', com clipe e tudo mais: a gente transformou num tango com com guitarra!
Pergunta: Como é a relação de vocês com as bandas que estão surgindo agora?
Fernanda: As bandas que procuram a gente perguntam coisas do tipo: 'E ai, vocês acham legal mesmo pegar um adiantamento da gravadora e assinar por não sei quantos discos?'. Perguntam sobre equipamento, contrato ou se é legal ou não ter escritório próprio. Isso é bacana. E somos uma banda que tem uma disposição para falar com esse pessoal que está começando porque todo mundo aqui deu muita cabeçada no início.
John: A gente responde muita coisa na Internet. Eu adoro responder os e-mails mais "técnicos", perguntando de modelos de guitarra e tal.
Pergunta: E o Xande, como começou no Pato Fu, vindo da experiência de jazz?
John: Ele foi o único que conseguiu tocar com "os japoneses".
Xande: Vocês lembram um show que a gente fez junto, Pato Fu com a Dib Six (antiga banda do baterista)? Foi a primeira vez que toquei com a banda.
John: Ele já tinha feito uns "testes" antes disso, só não tinha sido "efetivado"
Fernanda: Na verdade, o Xande já tocou todos os estilos musicais.
Ricardo: Nossa, ele já tocou com a Brigitte (banda dos anos 80), lembra?
Xande: Larguei meus estudos aqui em Belo Horizonte, fui morar dois anos no Rio e não deu em nada. Aí voltei. Fui prestar vestibular para Direito e, no meio, rolou a Dib Six. Daí eu chutei a lata de novo. A Dib estava super bem
Ricardo (interferindo): Pô, no terceiro show, eles tocaram no Hollywood Rock!
Xande: Mas eu saí e fui tocar com o Pato Fu, que também estava num momento legal.
Fernanda: O Xande tem aquela carteira azul dos músicos desde os 16 anos!
Pergunta: E como foi a história de se sair bem com "os japoneses"?
Xande: Na época, quando me convidaram pra fazer o teste, só conhecia o John e a Fernanda de "oi" e "tchau". Eles tinham ido num show da Dib. Era uma banda com estilo completamente diferente, com uma pegada mais rock e o lance do sequencer. Por sso, já tinha uma experiência de trabalhar com base sequencial, da mesma forma que o Pato Fu. Nossos equipamentos eram toscos, mas o John tinha equipamentos "top". Quando vi os aparelhos na casa dele, falei: "Ah, é aqui que eu quero ficar".
John: A primeira música que a gente pedia para (o "candidato") tocar era "Rotomusic", super complicada.
Xande: Era "a" prova. A segunda era "Okay, Allright". Pronto, se o cara conseguisse tocar essas, o resto era questão de ensaio. Na época dos dois primeiros discos, "Rotomusic Liquidificapum" e "Gol de Quem?", o show do Pato Fu era mais porrada. As músicas mais calminhas eram "Ring My Bell" e "Sobre o Tempo".
Fernanda: A gente extraiu o máximo da bateria eletrônica. Depois, adicionou um baterista ao som da banda, mas não abolimos a parte eletrônica.
Xande: A diferença é que passou a ter mais uma cabeça pensando e o som ficou mais orgânico.
Pergunta: Fernanda, existe uma preparação vocal sua para fazer os shows?
Fernanda: Na verdade não, por falta de hábito. Nunca fiz aula de técnica vocal. Fiz um curso de férias de três dias, quando tinha 16 anos, porque ficava rouca. Descobri que cantava no tom errado, muito mais grave. Depois disso, nunca mais estudei canto. Não sou contra, mas tenho aprendido muito na estrada. Me escuto cantar, ouço bastante tudo o que a gente grava e tento corrigir. Quando a gente decidiu gravar o disco ao vivo, eu também me perguntei: 'Pô, será que vou dar conta?'.
John: Tem momentos deste show que é só a voz da Fernanda. "Canção Para Você Viver Mais", por exemplo, ela acaba sozinha, sem acompanhamento.
Fernanda: Para este show especificamente nós estamos evitando álcool antes de gravar (risos).
Pergunta: Mas vocês precisam de uma bebidinha para entrar no palco?
Fernanda: Não antes de uma gravação. Mas eu bebo. Não de cair, claro, só de vez em quando só. A gente pega leve. Somos uma banda que, por tocar com coisas eletrônicas, se a gente entrar no palco chapado, o show vai todo errado.
Pergunta: Segundo o site do Pato Fu, você aprendeu que o legal era cantar baixinho ouvindo a Suzanne Vega e a Tracey Thorn. Já tentou cantar em tons diferentes?
Fernanda: Só sei cantar desse jeito. Canto de outros jeitos só de brincadeira (como no "Capetão") ou na época que eu gravava jingles de publicidade. Acho que todo mundo que canta pra fora demais fica muito parecido, a ponto de você ouvir e perguntar quem é. E eu não gosto e não sei fazer isso direiro, a não ser brincando. Das cantoras brasileiras, ouvi muito duas delas: uma não tem nada a ver comigo, que é a Clara Nunes, e a outra é a Nara Leão, que tem esse estilo de cantar baixinho também. Acho que personaliza mais a voz.
Pergunta: Além da Tracey Thorn e da Suzanne Vega, tem outra referência vocal de cantoras estrangeiras pra você?
Fernanda: Gosto muito da Björk, mas não tenho um estilo de cantar parecido. Ela canta totalmente pra fora, mas é outra coisa. Acho que os fonemas lá do islandês ajudam, fica diferente. Gosto muito da Andréa, do Aterciopelados, e também da cantora do Pizzicato Five.
Pergunta: Já fez dublagem?
Fernanda: Estou fazendo agora para A Ilha Rá-Tim-Bum, no papel de um passarinho, que aparece em todos os episódios, como narrador das aventuras da Ilha. Depois, vai ter o longa, que vou participar também.
Pergunta: A indicação do Pato Fu como uma 10 das melhores bandas fora dos Estados Unidos pela revista Time teve um impacto forte em vocês?
John: Parece que alguém da revista viu a gente no Rock In Rio 3. Foi uma grande vitrine, apesar de muitas bandas brasileiras terem pulado fora.
Fernanda: A gente nem sabia que estavam fazendo essa lista até vê-la. É um bom sinal para o rock brasileiro em geral. E uma resposta principalmente para quem acha que o rock brasileiro é subproduto, que as bandas daqui são piada lá fora. Para mim, isso foi uma prova de força da nossa geração. A gente ficou ao lado de U2, Radiohead e Aterciopelados, da Colômbia. Não existe mais esse negócio de fazer rock puro. As bandas fazem música com idéias de seu país de origem, mas numa linguagem mundial. Muita gente falou que era idiota o Pato Fu estar lá. Mas, para a gente, o que importa é que o mesmo cara que votou no U2 também votou em nós. E, o que é melhor, cantando em português.
Reportagem: Bia Rangel, Nícolas Vargas e equipe da Revista MTV
Entrevista feita no dia 29 de abril, horas antes da gravação do MTV ao Vivo