Um trecho belíssimo do Schopenhauer a respeito desse sentimento, onde ele unifica-o com o sentimento estético:
"Essa bem-aventurança do intuir destituído de vontade é, por fim, também o que espalha um encanto tão extraordinário sobre o passado e a distância, expondo-os em luz exuberante por meio de uma auto-ilusão, pois, na medida em que tornamos presentes os perdidos dias pretéritos, longinquamente situados, na verdade a fantasia chama de volta apenas os objetos, não o sujeito do querer, que outrora carregava consigo seus sofrimentos incuráveis, como o faz agora. Mas tais sofrimentos foram esquecidos. Desde então cederam freqüentemente o seu lugar a outros. Com isso, a intuição objetiva faz efeito na recordação exatamente como faria a intuição presente, no caso de ser possível entregarmo-nos a esta livres do querer. Eis por que, sobretudo quando uma necessidade nos angustia mais do que o comum, a recordação súbita das cenas do passado distante muitas vezes paira diante de nós como um paraíso perdido. Apenas o objetivo, não o individual-subjetivo, é chamado de volta pela fantasia, figurando diante de nós aquele objetivo como se, outrora, fosse tão puro e tão pouco turvado por qualquer relação com a vontade como o é agora a sua imagem na fantasia - embora antes a relação dos objetos com o nosso querer provocasse tanto tormento quanto agora. Podemos furtar-nos ao sofrimento seja pelos objetos presentes, seja pelos objetos longínquos, desde que nos elevemos à pura consideração objetiva dos mesmos e consigamos criar a ilusão de que somente os objetos estão presentes, não nós. O resultado é que, libertos do si-mesmo sofredor, tornamo-nos, como sujeito do conhecer, inteiramente unos com os objetos; e, assim como nossa necessidade lhes é estranha, assim também, nesse instante, semelhante necessidade é estranha a nós mesmos. Resta apenas o mundo como representação; o mundo como Vontade desapareceu". (Schopenhauer)
Por meio disso podemos entender por que, por exemplo, a nostalgia ocorre não só em referência a tempos felizes, mas mesmo em tempos da nossa vida que, na época, desejávamos que logo passassem, para que seus sofrimentos fossem superados. Não é uma espécie de conhecimento privilegiado dessa época que ganhamos com o tempo, como se "fossemos felizes e não soubéssemos" (afirmação absurda, afinal ser feliz e não saber e ser triste são situações indistinguíveis), pelo contrário, com o tempo ganhamos uma visão afastada da coisa, longe das penúrias e anseios que envolviam o dia-a-dia nessas condições, permitindo idealizá-lo. Óbvio porém que essa idealização tem seus limites e não pode ocorrer com tempos realmente traumáticos, porque nesse caso aqueles eventos são ligados imediatamente com nossos sofrimentos presentes, impedindo o 'esquecimento' destes que constituiria a experiência estética.
Explica também porque a experiência nostálgica não pode ser concretizada em uma nova experiência de vida, isto é, o retorno dos hábitos e dos fazeres que nos causem nostalgia não nos causa uma experiência também nostálgica. Se eu sinto saudades de meu tempo de faculdade, pode ser que revisitando-a me venha à mente memórias e assim o sentimento de nostalgia... mas começar novamente a faculdade, mesmo que se fosse possível fazê-lo com os mesmos colegas e condições da época, ou mesmo se fosse possível voltar no tempo e viver tudo novamente, seria decepcionante, pois logo entraria em cena os anseios do querer, mesmo que fossem outros pelo fato de você estar revivendo aquilo.