ah, eu não gostei de modo algum da montagem das cenas, parece que tudo é feito às pressas e poderia fluir melhor, ter mais desenvolvimento - como a cena em que ela cobre os espelhos... Fora o que vc mesmo mencionou sobre tudo que já é mencionado ser jogado na cara dos espectadores - aquelas cenas em que a protagonista e o skarsgaard falam que se sentem caindo e daí mostram os dois literalmente caindo em aguas profundas são sofriveis, entre varias outras... E o fato de que ela vai narrando a sua historia abrindo os capítulos conforme, e somente quando, vê objetos referentes à história na casa é tão... Como se aquilo tudo tivesse acontecido por causa dos objetos que se encontram em volta - eu pensei que a isca fosse ser o fundo do poço, mas aí vem o final em que só pq ela viu uma manchinha na parede que lembra uma arma, então ta, claro, tinha uma arma no final da história e ela foi decisiva pro desfecho desta, quase me esqueci disso...
então, sei la, não desceu, fosse só uma montagem quebradiça mas com um bom desenvolvimento narrativo - incluindo o modo como foi contada a historia - e uma protagonista sólida - que irritante vê-la toda hora mudando de opinião sobre sua própria condição, uma hora, na mente dela, kicking asses sobre ser a poderosa por ter controle de seu corpo, outra hora abraçando a humildade e encarando erros e sempre mudando de opinião, parecendo que o Lars nem sabia direito o queria fazer mas queria porque queria fazer seu pornô - talvez até fosse agradável de seguir a linha de raciocínio do filme, se tivesse uma boa... Mas do jeito que foi, não me importa sua declaração de que reconhece com humor ser um pretensioso cineasta - o filme so não me passou credibilidade...nem prazer estético como em outros dele... Ideias boas jogadas fora por pressa e ambição... Que pena...
Mas acho que esse é o ponto do filme. Credibilidade.
O filme é sobre o "contar a história" e não sobre a história em si. São 2 arcos, um nosso de observador onisciente sobre a conversa entre Joe e Seligman e o outro é o contado pela Joe. A noção de se os objetos lembram passagens reais e ela está contando verdades, ou se ela está sendo um Keyser Sose e inventando seus contos a medida que conversa se baseando nos objetos é que está o tema do filme. Basicamente como o grandioso Stories We Tell da Polley em que ela encena brilhantemente alguns planos para enganar o espectador se fazendo passar por footages da vida da mãe da Polley, mas justamente no fim ela propositalmente exagera e explicita a encenação (pra causar estranheza), e poucos minutos depois desvenda todas as cenas anteriores que eram encenações. Pois ela também queria discutir mais sobre como memórias, contos e histórias são pouco confiáveis se você tem uma fonte apenas, mas que ao mesmo tempo podem trazer consequências e aprendizado reais para o contador e para o ouvinte. A cena do verdadeiro pai dela dizendo que a Polley não tinha direito de sair fazendo pesquisa de campo com amigos, estranhos, etc, pra coletar dados sobre a vida amorosa da mãe dela com ele, pois essa história pertencia a ele e a ela apenas, e só ele agora teria direito de repassá-la para outros do jeito que ele quisesse, eu achei simplesmente genial. É um baque no meu cérebro objetivista ao extremo, baseado em experimentos, anotações de dados, etc, mas é perfeitamente coerente nesse cenário.
Voltando da digressão, falando especificamente desse filme, pelo que sabemos objetivamente dela, não há um contador tão pouco confiável quanto a Joe.
Não é por acaso a personagem insistir em dizer ao Seligman (que é mostrado pra nós como um homem racional, talvez até demais) pra não se deixar levar pelos detalhes, por procurar furos nos relatos dela, etc. Ao mesmo tempo é a Joe se defendendo previamente do Seligman diante das mentiras inseridas na história dela, quanto também é o Trier dizendo pro espectador que ele tem noção desses detalhes que muitos vão ficar criticando e caindo em cima, mas que ele mantém ali por um propósito.
Pra mim também não foi por acaso a escalação de uma atriz como a Stacy Martin pra fazer o papel da Gainsbourgh jovem. Quase uma alucinação da Joe (que me perdoe a Gainsbourgh mas ela nunca foi muito bonita, nem quando era novinha fazendo Jane Eyre) em se imaginar tão delícia quanto a Stacy Martin (ou talvez seja machismo meu isso, sei lá).
Por tudo que sabemos, a Joe podia ser apenas uma prostituta doida que apanhou de um cliente.