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Notícias O adeus de Leia...

Fúria da cidade

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A princesa que inspirou gerações de meninas se despede de Star Wars, mas deixa herdeiras na saga

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NATALIA ENGLER

Leia Organa chegou aos cinemas em 1977 já mostrando a que veio. Primeira do trio de protagonistas a aparecer em "Episódio IV - Uma Nova Esperança", em poucos minutos de filme ela entregou a mensagem fundamental a R2-D2 ("Ajude-me, Obi-Wan Kenobi, você é minha única esperança"), empunhou uma arma e enfrentou de igual para igual o maior vilão de toda a saga, Darth Vader.

Não é à toa que esta coadjuvante tornou-se uma das personagens mais marcantes da cultura pop.

Naquela época, heroínas de ação ou ficção-científica ainda eram raras no cinema (a Barbarella de Jane Fonda, em 1968, talvez seja um dos únicos outros exemplos). E foi nessa circunstância que a personagem de Carrie Fisher --e também a atriz, que morreu em dezembro do ano passado-- conquistou fãs em todo o mundo com uma princesa que nada tinha em comum com seus pares da Disney:

Estrategista, com uma mira afiada e mais corajosa do que muito marmanjo.


Uma pioneira


Mais de 40 anos depois, sua popularidade talvez seja superada apenas pela Mulher-Maravilha, criada 36 anos antes. Nas convenções de cultura pop pelo mundo, a presença de princesas Leia é sempre tão (ou mais) numerosa do que a de Luke Skywalker.

Explicando o sucesso do primeiro filme em uma entrevista pouco depois do lançamento, Fisher, então com apenas 20 anos, já mostrava entender a importância da personagem. "[O diretor George Lucas] fez uma personagem muito particular --muito boa, acho, porque ela não é uma vítima, a princesa. Ela é muito forte. O que é bom, porque não há muitas mulheres fortes nos filmes atualmente".

Ela tinha razão: a tenente Ripley (Sigourney Weaver) de "Alien" só apareceu dois anos depois, em 1979, e foi preciso mais cinco anos para surgir outro ícone do tipo, a Sarah Connor de "O Exterminador do Futuro" (1984).

Mas o caminho já estava aberto e não apenas para novas heroínas em um gênero de filmes dominado por homens, mas também para muitas fãs que queriam abandonar os vestidos cheios de frufru e se inspirar em um outro tipo de mulher.

A liderança de Leia à frente da Rebelião se tornou um símbolo para uma legião de garotas fãs de "Star Wars" que, no fim dos anos 1970, ainda lidavam com um mundo que limitava as possibilidades do que uma mulher podia fazer ou não. Com sua história, aliada ao carisma e personalidade de Carrie Fisher, Leia mostrou para as meninas que elas podiam --e deviam-- tomar as rédeas da própria vida.

Mesmo quando obrigada a se render ao olhar masculino, quando foi obrigada a vestir o famoso biquíni dourado em "O Retorno de Jedi" (1983), ela subverteu o papel de donzela em perigo e estrangulou seu captor, o monstrengo Jabba, o Hutt, com a mesma corrente que ele usou para aprisioná-la.


Uma inspiração


"'Star Wars' foi um dos primeiros filmes que assisti inteiro, lá nos anos 1980, quando fui com a minha mãe ver 'O Retorno de Jedi'", lembra Marcelle Mello Suazquita, 40. "Como eu era criança, o que me chamou a atenção foram os Ewoks, o Chewbacca, os bichinhos. Mas uma coisa me marcou: eu estava acostumada a ver filmes com homens heróis, e em 'Star Wars' foi a primeira vez em que eu vi uma mulher fazendo isso. Saí do cinema querendo um blaster, queria lutar igual a ela".

A atriz Gwendoline Christie, 39, que hoje interpreta a vilã Capitã Phasma na nova trilogia lançada em 2015, teve uma experiência parecida com a de Marcelle, na mesma época. "Eu assisti 'Uma Nova Esperança' pela primeira vez aos seis anos e lembro de pensar: 'Uau! Essa personagem é muito diferente'. Eu assistia a filmes obsessivamente desde muito cedo, mas ela ficou guardada na minha memória durante meus anos de formação", contou ela durante conversa com jornalistas para o lançamento de "Star Wars: O Último Jedi", da qual o UOL participou.

"Ela era muito interessante. Muito inteligente, engraçada, corajosa, atrevida. Não se importava com o que os outros pensavam e não aceitava que dissessem o que deveria fazer. Não tinha a mesma aparência homogeneizada de mulher que estávamos acostumadas a ver. Foi fundamental para alguém como eu, que sentia que não se encaixava nessa visão. Era inspirador, você podia ser um indivíduo, celebrar a si mesma e ser bem-sucedida sem se entregar, sem ter que fazer enormes concessões", relatou a estrela britânica, que também interpreta uma personagem forte em "Game of Thrones", a guerreira Brienne de Tarth.

E a mágica de Leia continuou forte mesmo para quem só teve contato com a saga muitos anos depois do lançamento. "Pela maior parte da minha vida, a princesa Leia foi a única personagem feminina marcante da saga", diz Alex Aino, 34, que assistiu a "Star Wars" já nos anos 1990, no relançamento de 20 anos da franquia. E completa:

Apesar de ela ser a princesa salva lá no primeiro filme, quem faz a fuga é ela. Eu fiquei super-impressionada com como uma personagem feminina podia participar da ação mesmo sendo uma princesa.


A princesa que inspirou gerações
"Os Últimos Jedi".


E mesmo que em "O Despertar da Força" apenas a protagonista Rey tivesse grande destaque (Leia e a pirata Maz Kanata tinham papéis menores), as fãs já estavam comemorando.

"Fiquei muito feliz quando soube que a personagem principal seria uma mulher, e uma mulher tão forte", diz a estudante Ivy Capeletto, 18. "É muito importante para as crianças de hoje terem essa figura como um exemplo para ser forte. Quando eu era criança não tinha isso. Fico feliz de hoje ter mais exemplos, como a Rey".

"Não sei se é influência do mercado, de as pautas das minorias estarem em alta, mas o importante é que está acontecendo e a gente finalmente pode ter uma voz", acredita Paula Joanes Santos Esteves, 23. Alex Aino concorda: "A Disney faz muito bem em colocar mais mulheres em evidência e dar mais diversidade para esse universo".

A atriz Gwendoline Christie faz coro com elas. "Fiquei encantada com o fato de que algo tão lendário quanto 'Star Wars' tenha decidido ser moderno e refletir a nossa sociedade mais da maneira que ela realmente é", diz. "Vocês podem ver mulheres que não são fortes só porque estão agindo como homens. Elas estão fazendo outra coisa", completa a intérprete da Capitã Phasma.

Mas nem mesmo a nova protagonista tinha ideia da repercussão que sua escalação teria. "Quando me envolvi [na produção], eu sabia que era algo importante, mas a resposta foi tão maior do que qualquer coisa que eu pudesse imaginar. Só depois que eu percebi. Não é que eu não tenha levado a sério, mas a reação foi muito gigantesca", conta Daisy Ridley, a Rey.

Para a cosplayer Ana Carolina Hernandes, 20, Leia poderia ter sido mais parecida com essas mulheres que quebram tudo se não tivesse sido criada em uma época mais machista.

Eu acho que os anos 1970 limitaram muito a personagem, o que poderia ser a mais. E a Rey está aí para isso, para mostrar o que poderia ter sido.

Mas tem algo que todas concordam: "As protagonistas que temos hoje, a Rey, a Jyn Erso [de 'Rogue One'], só vieram porque a Leia veio antes", diz, categórica, a estudante Bárbara Fontanezi, 23.


O legado segue em frente

caso que a atriz e o ator Harrison Ford tiveram no set de "Uma Nova Esperança", revelado pouco antes da morte de Fisher. Outra é o modo como a pessoa real também inspirou muita gente, tanto quanto sua personagem, ao lidar com fama, problemas com drogas e o transtorno bipolar de forma pública. E sem perder o bom humor.

"O que eu acho incrível da Carrie é que ela tinha todos os defeitos do mundo, mas ela não se levava a sério. Ela lutou contra o vício, contra os problemas mentais que teve, e não perdeu o humor, não perdeu a garra. Eu acho que ela é um exemplo por causa disso", acredita Marcelle Mello Suazquita, que fez uma tatuagem de Leia pouco depois da morte da atriz.

O sentimento reverbera também entre o elenco que conviveu com Fisher no ser de "O Despertar da Força" e de "Os Últimos Jedi".

"Sempre tivemos Carrie, não apenas Leia", concorda Laura Dern, 50, que se junta ao "Episódio VIII" como uma aliada de Leia, a Vice-Almirante Holdo. "A gente fala de pessoas corajosas ou destemidas e, por sorte, conheci quem se encaixasse nessa descrição, mas não que conseguissem fazer isso sem se envergonhar. E é o que me emocionou mais sobre o ícone que ela nos deu, tanto a personagem quanto a atriz. Que é: se apresentar de maneira tão transparente e fazer isso sem vergonha, e dividir sua história. E esperar nada menos do que isso de todas nós".

"Tem tantas memórias que é difícil dizer que exista uma que sobressai", revelou ao UOL Adam Driver, 34, o novo vilão Kylo Ren --e filho de Leia e Han Solo. "Apenas quem ela era como pessoa, e como lidou com esse trabalho com um forte senso de ironia e personalidade. É algo raro, especialmente em pessoas da minha geração. Isso te lembra de não levar as coisas tão a sério".

"Algo da Carrie que realmente me inspira, e que é algo que só percebi recentemente, é quanta coragem é necessário para ser você mesma quando você ocupa uma posição pública", completa Kelly Marie Tran. "Ela fazia isso sem remorso, e de forma tão aberta, e é algo que estou tentando fazer, e é difícil. Acho que ela sempre será um ícone como Leia, mas também como Carrie. Eu tive muita sorte de conhecê-la, e acho que ela vai viver mesmo para sempre".

Mesmo que a imagem de Fisher continue gravada na memória das fãs por muitas gerações, com a morte da atriz é difícil imaginar como os produtores e cineastas vão resolver o desfecho da general Leia. Ela havia finalizado as filmagens do "Episódio VIII" e o diretor Rian Johnson decidiu não modificar a história, mas ainda falta um filme para concluir a trilogia, e a chefona da Lucasfilm, Kathleen Kennedy, já anunciou que Leia não voltará.

Sem muitos spoilers: a presença de Fisher é uma das melhores coisas de "Os Últimos Jedi", e ela com certeza fará muita falta no "Episódio IX". Mas, ao que parece, o futuro das mulheres de "Star Wars" está em boas mãos.

Carrie Fisher, 1956-2016
 

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