Nelson Falcão Rodrigues
(Nelson Falcão Rodrigues - 23/09/1912, Recife - Pernambuco).
Eis o prodigioso escritor dramaturgo brasileiro.
Do contrário ao que esperava, por sua escrita forte, violenta, obscena, muitos comentários a cerca de Nelson ser de origem humilde e retratar sua realidade brotavam em cantos e locais de toda parte, porém, deparamo-nos com a contrariedade.
É certo que usufruía de uma vida com facilidades, filho de pai Deputado e Jornalista, o reconhecido Mário Rodrigues e sua mãe, Maria Esther Falcão, sendo o quarto filho de um total de quatorze irmãos, são eles: ainda no Recife, Milton, Roberto, Mário Filho, Stella e Joffre. A partir de seus 4 anos a família mudou-se de Recife - PE para Copacabana – RJ. No Rio de Janeiro nasceram os outros 8 irmãos: Maria Clara, Augustinho, Irene, Paulo, Helena, Dorinha, Elsinha e Dulcinha.
Aos sete anos pediu a sua mãe que o matriculasse na escola perto de sua casa, com muita facilidade começou a ler e escrever.
Um fato que o próprio autor classifica como importante em sua vida (ainda quando pequeno) foi um concurso de redação com tema livre. Quando a professora leu sua história teve um choque, uma escrita bem elaborada para a idade, com certeza, mas o surpreendente (ou chocante) foi o tema escolhido por ele, adultério (tinha seus 8 anos). De fato a redação teria de ser premiada, pois era a melhor, mas em hipótese alguma poderia ser lida a turma, sendo assim, foi considerado empate e leu apenas a outra redação.
Nesse mesmo período suas leituras tornavam-se mais pesadas, por exemplo, algumas obras de Ponson Du Terrail, Michel Zevaco, aos treze anos leu seu primeiro livro de Dostoievisk – Crime e Castigo - dando exceção a algumas obras, a questão resumia-se à temática: “a morte punindo o sexo, ou o sexo punindo a morte”.
O livro biografia de Nelson Rodrigues por fim o imortalizou com o nome O anjo pornográfico.
Sobre sua infância, nas palavras de Nelson “Cada um de nós tem uma lembrança carnal da nossa infância. Eu me apaixonei por todas as minhas professoras”.
Pouco tempo depois deixou a escola, por várias vezes discutia com os professores, geralmente por questões de português e história. Sempre defendia suas opiniões perante os professores, assumindo uma postura contrária a estes, o que acabou por levá-lo a sair da escola. Já nesta idade trabalhava como jornalista no Jornal A Manhã, o qual fora fundado por seu pai, Mário Rodrigues.
Uma vida de jornalista precoce, e assim continuou. Sua vida como jornalista perambulou por quase tudo em uma redação: policia, futebol, crítica, crônica, conto, folhetim, romance, e por mais extraordinário e inacreditável que possa ser, trabalhou também na seção “consultório astrológico”. Não apenas Nelson passou a trabalhar com o pai, tornou-se um negócio de família, seu irmão Milton era o secretário, Roberto responsável por ilustrar algumas reportagens, Mário Filho passou á página de esportes. Pouco tempo depois, sucumbindo às dívidas mal administrada, Antônio Faustino Porto torna-se sócio majoritário, em pouco tempo a família retira-se do jornal.
Mais uma vez Mário Rodrigues abre um jornal Crítica, e novamente temos o ramo da família. A passagem de Nelson por este jornal jamais seria esquecida, sendo ali o cenário da tragédia da família, a mesma tragédia que repercutiria nas futuras obras do autor: a morte de seu irmão, Roberto Rodrigues, 1929.
Abalada, a família mudou-se da casa antiga, e apenas 67 dias após a morte do filho, Mário Rodrigues morre de trombose cerebral. As expectativas mudam quando Mário Filho é convidado a assumir um cargo no jornal O Globo, e acabou por levar seus irmãos para trabalhar junto.
Aos seus 21 anos Nelson é diagnosticado com sintomas de tuberculose, arrancou todos seus dentes e pôs uma dentadura na tentativa de “debelar a febre que insistia em não ir embora”.
Ainda em 1934, é mandado a Campos do Jordão – SP, onde passa 14 meses no sanatório.
No sanatório, um veio do drama que o acompanharia pelo resto de sua carreira literária tem início. Um doente pede a Nelson que escreva uma pequena comédia para que façam um teatrinho, a plateia logo nas primeiras cenas começa a gargalhar, as risadas tornam-se graves tosses que quase trouxeram vítimas. A primeira experiência dramática de Nelson no teatro.
(Cômico, não? Ele queria uma comédia, mas naturalmente tornou a ser um drama).
Num salto para os seus 28 anos, agora com sua esposa Elza, já grávida, o aperto financeiro e o salário sem perspectivas de melhora o fazem tomar a decisão para o teatro, desta decisão em diante, suas obras passaram a ter o foco de que recordamos: o teatro. Nelson pegou o estilo, reforçou com seu caráter para o drama, a obscenidade e as gírias da época - e voilá - um revolucionário mal interpretado por muitos anos, e justamente essa sua característica forma de retratar um RJ como o era verdadeiramente o consagrou como um gênio literata brasileiro.
Curiosidades:
* Nelson Rodrigues também atuou em uma de suas obras, “Perdoa-me se me traíres”, sendo o personagem Tio Raul, ‘um dos pilares para o desenvolvimento da trama’. LEIA MAIS
* A atriz Fernanda Montenegro encomendou a Nelson Rodrigues uma peça a qual ela estrelaria com o marido, a obra foi chamada de “Beijo no Asfalto”. Incessantemente, durante 8 meses, ela ligou para conseguir ser atendida por Nelson. LEIA MAIS
* A família Rodrigues também conheceu a ‘fome’, um ano após a morte de seu irmão, durante o Governo de Getúlio Vargas, houve uma ordem para que “Crítica”, jornal criado por seu pai, Mário Rodrigues, fosse fechado, vinham anos difíceis para a família.
Por muitos leitores, Nelson foi acusado de falar sobre ‘pobreza’, sem ter a autoridade para falar de tal assunto, pois muitos desconhecem esse período de sua vida. (Nem sempre foram flores, meu filho!) LEIA MAIS
* Nelson Rodrigues era parcialmente cego e tinha dificuldade para ver da tribuna do Maracanã o que acontecia dentro de campo. Era tricolor roxo, mas às vezes torcia por engano para o Flamengo. Se perguntavam sua opinião sobre o jogo, pedia ajuda ao amigo Armando Nogueira: "E aí, Armando, o que nós achamos do jogo?" LEIA MAIS
* Apesar de com os anos adquirir a notória possibilidade de escrever em casa e mais tarde poder mandar seus textos para a redação, negava-se a fazê-lo. Amava a redação. Escrevia como um louco, chegava geralmente atrasado ele em poucos minutos produzia os folhetins que ruborizavam as donas de casa nas décadas de 40 e 50. Frequentou a redação até um mês antes de sua morte. LEIA MAIS
* A revolucionária peça “Vestido de noiva, 1943” foi escrita em apenas seis dias, Nelson a máquina, porém, depois do sucesso de suas obra no teatro, passou a mentir sobre o tempo que levava na criação de seus textos, talvez porque o chamariam de mentiroso e não acreditariam. LEIA MAIS
* Nelson esteve envolvido com Plágio! Em um acerto com a Editora Record, ele assinaria obras como tradutor e receberia como tal, apenas pela possibilidade da Editora em usar seu nome para chamar público. Não foi um fato isolado, a ação se repetiu por muitas obras. LEIA MAIS
Em uma declaração da filha do autor, Sonia Rodrigues, sobre tal situação:
“Aparentemente, a Record pagou ao meu pai para usar a imagem dele para referendar o texto de um autor norte-americano. Ninguém sabe se pagou apenas o direito de imagem ou se meu pai leu o texto traduzido e mexeu no texto, não é mesmo? Não tenho informações se os livros continuam sendo publicados e se os direitos de tradução estão sendo remunerados.”
Ruy Castro em “O anjo pornográfico” fala a seguinte frase:
“A ideia fora de [Alfredo] Machado, para ajudar Nelson a faturar um dinheirinho fácil. Mas era também muito conveniente para sua editora: ao ler "Tradução de Nelson Rodrigues" com destaque na capa de livros de Harold Robbins, como "Os insaciáveis", "Os libertinos" e "Escândalo na sociedade", o comprador via naquilo uma garantia. Sabia que era literatura "pesada". Como poderia imaginar que Nelson era o mais acabado monoglota da língua portuguesa...?”
A morte de Nelson Rodrigues
Nelson Rodrigues faleceu em 21 de dezembro de 1980 aos 68 anos. E após 30 anos de sua morte, o Brasil ainda reflete-se em suas obras, em suas palavras, em seus dramas embebidos de toda vitalidade brasileira.
"Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura, é realmente, minha ótica ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico."
Nelson em si, esperava a morte, não lhe corroia a alma, não lhe era indiferente, sempre soube que estava ali, apenas esperando o momento de tragar sua existência. Escrevera um conto, que per se mostra como via a morte nosso querido autor.
A morte - segundo Nelson Rodrigues
A morte é anterior a si mesma. Começa antes, muito antes. É todo um lento, suave, maravilhoso processo. O sujeito já começou a morrer e não sabe.
Morrer significa, em última análise, um pouco de vocação. Há vivos tão pouco militantes que temos vontade de lhes enviar coroas ou de lhes atirar na cara a última pá de cal.
Esses, sim, têm a vocação da morte.
Há, em qualquer infância, uma antologia de mortos.
Na hora de morrer, e quando sabe que está morrendo, todo homem tem um olhar de contínuo.
Há na morte por intoxicação alimentar um inevitável toque humorístico, que humilha o cadáver e compromete o velório.
Para mim, qualquer morta tem mais densidade do que qualquer morto.
A morte natural é própria dos medíocres. O medíocre tem de fazer uma força tremenda para morrer tragicamente. Ele morre de gripe, de pneumonia oun da empada que matou o guarda.
Já o grande homem sempre morre tragicamente.
Veja o caso de Lincoln, de Gandhy, de Kennedy.
Há uma inteligência da morte, assim como há uma bondade da morte. O que vai morrer já olha as coisas, as pessoas, com a doçura do último olhar.
Eu diria que é a saudade antes do adeus.
O sujeito procura esquecer que o homem é também o seu próprio cadáver. E ele, queira ou não, não destruirá jamais a sua vocação para a morte.
Nada mais falso do que o medo de morrer, e eu diria que nós fazemos tudo para morrer o mais depressa possível.
Os nossos hábitos, os nossos usos, os nossos vícios, as nossas irritações mal disfarçam a vontade, a urgência, a fome da morte.
Chegou às redações a notícia da minha morte. E os bons colegas trataram de fazer a notícia. Se é verdade o que de mim disseram os necrológios, com a generosa abundância de todos os necrológios, sou de fato um bom sujeito.
A morte é um grande despertar.
(CASTRO, Ruy. Flor da Obsessão, Reunião das 1000 melhores frases de Nelson Rodrigues. Cia das Letras: São Paulo, 1997, P. 110)
Obras do Autor:
Teatro:
Mulher sem Pecado (1941)
Vestido de Noiva (1943)
Álbum de Família (1945)
Anjo Negro (1946)
Dorotéia (1947)
Valsa Número Seis (1951)
A Falecida (1953)
Senhora dos Afogados (1954)
Perdoa-me por me Traíres (1957)
Os Sete Gatinhos (1958)
Boca de Ouro (1959)
Beijo no Asfalto (1960)
Bonitinhas mas Ordinárias (1961)
Toda Nudez Será Castigada (1965)
O Anti-Nélson Rodrigues (1974)
A Serpente (1979)
Romances
Meu destino é pecar - 1944
Escravas do amor - 1944
Minha vida - 1944
Núpcias de fogo - 1948
A mulher que amou demais - 1949
O homem proibido - 1959
A mentira - 1953
Asfalto Selvagem: Engraçadinha, Seus Pecados e Seus Amores - 1959
O casamento - 1966
Contos
Cem contos escolhidos - A vida como ela é... - 1972
Elas gostam de apanhar - 1974
A vida como ela é — O homem fiel e outros contos - 1992
A dama ão e outros contos e crônicas - 1992
A coroa de orquídeas - 1992
Crônicas
Memórias de Nélson Rodrigues - 1967
O óbvio ululante: primeiras confissões - 1968
A cabra vadia - 1970
O reacionário: memórias e confissões - 1977
Fla-Flu...e as multidões despertaram - 1987
O remador de Ben-Hur - 1992
A cabra vadia - Novas confissões - 1992
A pátria sem chuteiras - Novas Crônicas de Futebol - 1992
A menina sem estrela - memórias - 1992
À sombra das chuteiras imortais - Crônicas de Futebol - 1992
A mulher do próximo - 1992
Nélson Rodrigues, o Profeta Tricolor - 2002
O Berro impresso nas Manchetes - 2007
O quadrúpede de vinte e oito patas
Telenovelas
Baseadas na obra de Nélson Rodrigues
A morta sem espelho - TV Rio - 1963
Sonho de amor - TV Rio - 1964
O desconhecido - TV Rio - 1964
O homem proibido - TV Globo - 1982
Meu Destino É Pecar - TV Globo - 1984
Engraçadinha... Seus Amores e Seus Pecados - TV Globo - 1995
A Vida Como Ela É - TV Globo - 1996
Nelson e o Futebol
‘Se o Fluminense jogasse no céu, eu morreria para vê-lo jogar’
Eu poderia falar de Nelson, o cronista, romancista, contista; Nelson, o Eclético!, mas, bem vale relembrar à memória que antes de escritor, Nelson era paixão; paixão às verdades da vida e ao seu time do coração.
Em uma entrevista póstuma a sua morte ao Newsfut (ou seja, Sr. News, através de frases já ditas de N.R. elaborou sua entrevista. Esperto!), a expressão do amor de Nelson ao seu time:
News - Para qual time você torce?
N.R.: ‘Sou tricolor, sempre fui tricolor. Eu diria que já era Fluminense em vidas passadas, muito antes da presente encarnação’
News - Por que você escolheu torcer para o Flu?
N.R.: ‘Ser tricolor não é uma questão de gosto ou opção, mas um acontecimento de fundo metafísico, um arranjo cósmico ao qual não se pode – e nem se deseja – fugir’
News: Tricolor existe muitos. Bahia, Grêmio, São Paulo…
N.R.: ‘O Fluminense é o único time tricolor do mundo. O resto são só times de três cores’
Cá entre nós, amei ainda mais Nelson Rodrigues depois dessa frase... “o resto são só times de três cores...”
Uma coletânea muito interessante e que eu encontrei há anos na biblioteca municipal, engraçadíssimo e digno da paixão de Nelson pelo Futebol – O Berro
Impresso das Manchetes pela Editora Agir no ano de 2007, uma coleção das clássicas crônicas de Nelson Rodrigues quando ainda na “Manchete Esportiva”, da Bloch em sua primeira fase - 1955 a 1959.
Trecho do inicio:
“Corria o ano de 1911. Vejam vocês: 1911! O bigode do Kaiser estava, então em plena vigência. Mata Hari, com um seio só, ateava paixões e suicídios; e as mulheres, aqui e alhures, usavam umas ancas imensas e intransportáveis. Aliás, diga-se de passagem: é impossível não ter uma funda nostalgia dos quadris anteriores à Primeira Grande Guerra. Uma menina de 14 anos para atravessar uma porta tinha que se pôr de perfil. Convenhamos: – grande época! grande época!”
No Google Books é possível dar uma conferida. Mas, obviamente, ressalvo que tal livro é um caso para os curiosos de plantão.
Frases famosas:
Adultério - "O adultério não depende da mulher, e sim, do marido, da vocação do marido. O sujeito já nasce marido enganado."
Amor - "Todo amor é eterno e, se acaba, não era amor."
Beleza - "São incompatíveis a beleza e a felicidade. E se a mulher bonita é feliz,
estamos certos de um equívoco visual: não é bonita."
Burle Marx - "Os jardins de Burle Marx não têm flores. Têm grama e não flores. Mas, para que grama, se não somos cabras?"
Casamento - "Só o cinismo redime o casamento. É preciso muito cinismo para que um casal chegue às bodas de prata."
Críticos - "Ou o sujeito é crítico ou é inteligente."
Idade - "Aos 18 anos, o homem não sabe nem como se diz bom-dia a uma mulher. O homem devia nascer com trinta anos."
Marx - "Se me perguntassem quais seriam as minhas últimas palavras, eu diria: Que besta quadrada, o Carlos Marx!"
Ódio - "Ninguém trai o seu ódio, e repito: o homem é mais fiel ao seu ódio do que ao seu amor."
Psicanálise - "Para a mulher, a psicanálise é como se fosse um toque ginecológico, sem luva."
Sorte - "Sem sorte, não se chupa nem um chica-bom. Você pode engasgar com o palito ou ser atropelado pela carrocinha".
Bibliografia:
Releituras – Biografia Detalhada
Memorial das Artes – Nelson Dramaturgo
Nelson nas Telinhas – Escritor vira Ator em “Perdoa-me por me traíres”)
Editora Ediouro - Homenagem a Nelson Centenário
Ruy Castro - Curiosidades sobre Nelson Rodrigues
Nelson Rodrigues e o Futebol – Uma paixão na vida.
Reportagem no centenário de Nelson Rodrigues - Bom Dia Brasil
A relação de Nelson com o futebol – Nelson Tricolor
O Berro Impresso das Manchetes – Google books (Coletânea das clássicas Crônicas esportivas)
Biografia detalhada - Portal São Francisco
Entrevista póstuma – Todo amor de Nelson pelo seu time.
Tudo sobre Nelson Rodrigues (Site oficial) – Escrevendo a história.
P.S: O palco é todo seu Mavericco!