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Divagação sobre poesias.

abylos

USS Voyager - NCC-74656 - Classe Intrepid
Usuário Premium
Coloquei o texto aqui por ser sobre poesias mas, se estiver errado, por favor, coloquem no lugar certo ^^'

Escrevi esse texto sbre poesias e queria saber o que voces acham. Se concordam, se discordam, qual a visão de voces do assunto, etc

Estava pensando com meus botões (as vozes da minha cabeça, meu eu interior ou o nome que achar mais bonitinho, como costuma dizer um amigo meu) sobre poesias. E cheguei a algumas conclusões que gostaria de compartilhar com outros amantes da literatura.

Considero que a habilidade de traduzir em palavras o que se sente em determinado momento ou situação, é um recurso que nem todas as pessoas possuem, mas que, mesmo de forma um tanto restrita, está razoavelmente distribuído pelos exemplares da raça humana, sendo encontrado com facilidade e, às vezes, sem procurarmos. Muitas vezes esses exemplares são meros mortais como nós (por mortais entenda escritores amadores sem trabalhos publicados), outras são autores consagrados da literatura mundial. Mesmo uma pessoa que não escreve, não coloca em papel (ou HD, pen-drive, etc), mas desabafa algo pra alguém, seja um ombro amigo, um psicólogo ou a coitada da caixa do supermercado que não tem nada a ver com a história, está exercitando essa habilidade, o que me levou a conclusão do inicio do parágrafo. Portanto, classifico o desenvolvimento dessa habilidade algo de nível médio de dificuldade, dentro de uma escala geral. Vale ressaltar que não estou considerando a qualidade ou beleza do resultado dessas transcrições, apenas a capacidade de fazê-lo de forma inteligível.

Por outro lado, temos a habilidade de escrever de forma esteticamente organizada, com rimas, estrofes, etc. Essa já é uma habilidade menos vista, mesmo sendo uma que, em teoria, pode ser aprendida por qualquer um. Decoram-se as regras de um soneto e pronto, podemos escrever um, dois, vários sonetos até, desde que não esqueçamos as regras definidas que caracterizam esse tipo de poesia. Porém, por ser uma técnica dirigida, pode apresentar um nível de dificuldade maior, dependendo do vocabulário conhecido pelo individuo que desenvolve a empreitada de produzir tal peça literária. Isso somado ao fato que não é uma habilidade inata e que precisa de instrução alheia para ser desenvolvida (mesmo que essa instrução seja uma pagina na internet sobre o tema) me faz colocar essa habilidade como mais difícil do que a anterior, embora não creia que deveria sair da esfera do nível médio... Talvez um médio-alto. Mais uma vez coloco que não estou levando em conta a qualidade ou beleza da obra final desenvolvida e faço questão de ressaltar isso, pois é um conceito fundamental para final da minha explanação.

Agora entramos na parte até então ignorada por mm. A habilidade de escrever algo belo ou de qualidade. Um texto que seja agradável quer pelas palavras bem colocadas, quer pela historia bem desenvolvida ou pelas emoções devidamente descritas ali. Já não se trata apenas de escrever, da mesma forma que a escrita estética. Trata-se de criar algo com a escrita que possa ser chamado belo, ou agradável para quem leia, ou pelo menos uma maioria. A habilidade de transformar um sentimento não apenas em palavras, mas em palavras que emocionem quem lê, que fiquem bonitas ou aprazíveis ao leitor. Essa habilidade é mais difícil de ser atingida, principalmente porque beleza é um conceito abstrato e subjetivo e o que é belo para um pode não ser para outro. Sendo assim, considero que atingir tal coisa é algo de nível difícil e, pessoalmente, quando consigo isso, fico satisfeito com o texto que fiz, assumindo que a idéia seja passar um sentimento, uma história e assim por diante.

Agora, imaginem que alguém consiga passar um sentimento para um texto e que esse texto fique bonito, emocionante de se ler, e ainda esteja organizado em forma esteticamente definida. Aí, creio eu, chegamos à genialidade. Pois, além de traduzir primariamente em sua mente o sentimento para palavras ainda cruas, o autor elabora mais a obra, para obter algo que não só transmita, mas inflija no leitor as emoções contidas e, como se isso não fosse suficiente, adéqua tais palavras à regras de estética rígidas, sem que essa obra perca sua qualidade, beleza ou autenticidade em relação às emoções que dispararam o processo criativo. Quando alguém consegue tal feito, esse alguém transcende os limites do comum e entra no excepcional, a meu ver, pois está modificando a expressão de parte de si sem permitir que essa parte seja contaminada, diminuída ou corrompida pela estética a que foi submetida.

Creio ser esse feito algo excepcional por considerar que, para atingi-lo, o autor deve ter em igualmente altos níveis o conhecimento das palavras em geral, das regras que definem a estética escolhida para a obra e de si mesmo, sendo esse ultimo, por mais paradoxal que pareça, o mais difícil de todos. Acredito que quando nos expressamos através de palavras familiares a nós, preenchemos, de certa forma, possíveis lacunas de autoconhecimento com expressões habituais que já trazem em si autoconhecimento subconsciente latente. Quando somos forçados(ou nos forçamos) a colocar a mesma idéia ou sentimento em outras palavras, de forma a encaixar o texto dentro da estética, se não nos conhecemos o suficiente, corremos o risco de nos perdermos no caminho, causando uma deterioração do significado inicial do que foi concebido em nossa mente. Também a falta de vocabulário pode fazer com que desistamos da tentativa, por saber que as palavras que conhecemos não podem expressar de forma esteticamente organizada o que pensamos e sentimos. Por fim, a falta de domínio da técnica em si pode produzir um trabalho falho do ponto de vista estético sem que percebamos. Por isso, reafirmo: produzir uma poesia esteticamente correta, com sentimentos verdadeiros sem perder a essência e a beleza de tais sentimentos é um feito que fica reservado apenas aos gênios da poesia.

Pelo meu conhecimento pequeno de poesia, não me recordo de ter lido um poema que se encaixe nesses parâmetros até hoje. Espero que, no futuro eu leia não um, mas vários, pois tenho certeza que cada um deles será uma viagem fantástica e uma experiência sublime.
 
Eu só não entendi o que você quis dizer, no final, com um poema que se encaixe nesses parâmetros até hoje, visto que os parâmetros que você apresentou são parâmetros que se encontra em toda poesia, visto que a poesia é, de forma geral, quando o artista busca perscrutar as áreas de sua individualidade de forma que o leitor também possa se inserir, quando no ato da leitura, nesse indivíduo poético cristalizado.

De resto, só não gostei muito da afirmação de que a poesia verdadeira seria uma tarefa para os gênios, dando a entender que eles são assinalados ou coisa do tipo: na verdade, eles se tornaram assinalados em decorrência de seu esforço de compreensão, preocupados em escrever não simplesmente poesia que comunique o que ele tem dentro de si, mas o que todo ser humano tem dentro de si e que até então jamais foi compreendido (de modo que, se não se pode dar uma definição universalizada para esse transcendentalismo, que se escreva de modo que cada ser humano descubra esse universo).

Usando a fórmula pessoana, que se pense o que se está sentindo, de modo que o raciocínio possa comunicar com maior força, eternidade e infinitude o que o poeta quer transmitir.
 
Então, mas dos poucos poemas que lia té hoje, os que eu tenho certeza que se encaixam totalmente em alguma metrica padrão de poesia(só consigo lembrar de sonetos, mas tem outras que não sei o nome), não são tão agradaveis de se ler :P

Eu não entendi bem o que seria assinalado.
Só sei que não consigo conceber a ideia de encaixar algo que exprime meus sentimentos em uma metrica poetica...

Pra mim, quem consegue fazer isso e manter a poesia com a mesma intensidade de sentimentos e agradavel se ser lida, tem algo de genio, entende?
 
Ah, sim, consegui compreender melhor agora. No caso vai depender de que poeta você leu, visto que a métrica é tão antiga como a poesia... Escrever poemas em metro livre só começou a ser feito de fato na segunda metade do século XIX pra cá, com a revolução de Walt Whitman.

E, de certo modo, o uso da métrica poética por poetas não muito acostumados com ela acaba não resultando em bons efeitos, visto que eles se utilizam ou de acréscimos desnecessários, como interjeições ou os "pois", ou então o abuso de hipérbatos e figuras de linguagem (além de outros). É normal. Poesia metrificada tem de todo tipo, e, caso queira um exemplo de um poeta que era mestre nessa matéria, lhe cito o Guilherme de Almeida em duas fases:

O pequenino livro, em que me atrevo
a mudar numa trêmula cantiga
todo o nosso romance, ó minha amiga,
será, mais tarde, nosso eterno enlevo.

Tudo o que fui, tudo o que foste eu devo
dizer-te: e tu consentirás que o diga,
que te relembre a nossa vida antiga,
nos dolorosos versos que te escrevo.

Quando, velhos e tristes, na memória
rebuscarmos a triste e velha história
dos nossos pobres corações defuntos,

que estes versos, nas horas de saudade,
prolonguem numa doce eternidade
os poucos meses que vivemos juntos.

Trata-se do primeiro soneto do livro "Nós", de linguagem simplificada e cotidiana que propõe um contato mais direto com o leitor, onde nós temos um soneto pronto para o consumo e com uma linguagem que não é difícil e nem abusa de inversões sintáticas e derivados...

O mesmo o Guilherme não faz nos sonetos da "Camoniana", com linguagem, como o título diz, renascentista tanto na escolha das palavras, na escolha da pessoa, nos contornos sintáticos, na disposição dialética do argumento...:

Tristes versos que a pena entristecida
Foi, por o gosto de penar, traçando,
Sem saber que me estava retalhando,
A alma, o peito, a razão, o sonho, a vida:

Em quais terras da terra será lida
A confidência que ides confiando?
E, bem mais e melhor que lida, quando,
Em qual tempo dos tempos, entendida?

Às terras, e ainda aos tempos mais diversos,
Ide, sem pressa aqui, ali sem pausa,
Pois só por o partir foi que partistes.

Qual glória heis de esperar, meus tristes versos,
Se já vos falta aquela vossa causa
De serdes versos e de serdes tristes?

É claro que o Guilherme foi um dos maiores artistas do verso de nossa língua, o "mais-que-perfeito" nos dizeres do Manuel Bandeira, e isso lhe permitiu unir um conhecimento formal com naturalidade de expressão, visto que a métrica nada mais é que um dispositivo para se alcançar a naturalidade e a agradabilidade da elocução (falei bonito, né?). Não é, como diria um modernista iconoclasta, algo pra se tornar o poema "difícil": na verdade, a métrica é uma mão na roda, pois ela dá ritmo ao poema. Por exemplo, o famosíssimo ritmo anapéstico de Gonçalves Dias:

No meio das tabas de amenos verdores,
Cercadas de troncos - cobertos de flores,
Alteiam-se os tetos d’altiva nação;
São muitos seus filhos, nos ânimos fortes,
Temíveis na guerra, que em densas coortes
Assombram das matas a imensa extensão.

(...)

Onde você tem um ritmo que imita com perfeição o batuque de um tambor...

Se você quiser saber pra que de fato a métrica serve, eu aconselharia você ler teatro em versos, pois o texto teatral, que busca em sua estrutura a maior clareza possível pra ajudar também o mais possível o ator, ao se utilizar da métrica encontra uma forma de gerar ritmo e potencializar a expressão da personagem, como nessa fala da peça Romeo and Juliet de Shakespeare:

ROMEO

Come hither, man. I see that thou art poor:
Hold, there is forty ducats: let me have
A dram of poison, such soon-speeding gear
As will disperse itself through all the veins
That the life-weary taker may fall dead
And that the trunk may be discharged of breath
As violently as hasty powder fired
Doth hurry from the fatal cannon's womb.

Experimente ler esses versos em voz alta e você vai ver a força de expressão, o estouro com que você irá dizer "fatal cannon's womb"... É algo que, só pela sonoridade, simplesmente dispensa uma rubrica.

Talvez o que tenha acontecido com você é ou que você leu poemas metrificados de poetas inexperientes, ou que você não soube lê-los tomando como base, digamos, o "sabor" da época, como ler um poema romântico esperando ler um poema contemporâneo. Nem sempre isso é fácil, é claro; a imensa maioria da poesia trovadoresca perdeu seu sabor quase que inteiramente, ou então o teatro de um Gil Vicente que está bastante fossilizado; mas é preciso um esforço do leitor, pois, uma vez que ele pega isso, ele não empreende apenas uma viagem no tempo, mas uma viagem no espírito.

P.S.: Assinalado seria algo do tipo "agraciado por Deus".
 
Confesso que só li "poesias aleatorias de livros de portugues de colegial" :P

Mas o que voce colocou de Guilherme de Almeida é exatamente o que eu quero encontrar ao ler poesias :)

E percebi no poema de Gonçalves Dias o que voce quis dizer com tentar ler o poema de forma errada... Não achei o ritmo de tambor ainda :P

Existe algum livro ou sei la que possa me ajudar a identificar o ritmo certo de leitura de um determinado poema?
 
Esses exemplos de livros didáticos são uma droga mesmo XD

Agora quanto ao ritmo da poesia metrificada, isso você só vai conseguir mesmo com o costume de leitura. Mas eu posso te indicar cinco coisas:

1) se você puder escrever alguns poemas metrificados, acredite, isso ajuda bastante. Metendo a mão na massa, você vai aprendendo a identificar as dificuldades, as saídas e uma série de coisas que ajudarão bastante, pois vão te colocar dentro do processo de criação. Não precisa escrever pra virar escritor; escrever pra ajudar na leitura, pois acho que no caso da métrica isso ajuda bastante...
2) leia tratados de versificação, que eram escritos antigamente justamente pra se saber como eram as formas e fôrmas, como elas funcionavam, quando elas surgiram, o que elas costumam indicar... Os dois mais célebres são o do Olavo Bilac e Guimarães Passos e o do Antonio Feliciano Castilho. O do Bilac é posterior e melhor; mas ler os dois é importante, visto que foi o Castilho quem normatizou o verso mais difícil da língua: o alexandrino.
3) se puder comprar o Dicionário de Arte Poética do Geir Campos, compre, pois ele dá muitas definições de ritmos com exemplos bem didáticos e essas coisas. É um companheiro maravilhoso! Outro interessante é o Dicionário de Termos Literários do Massaud Moisés, ainda que ele seja menos específico e menos recomendado pro que você está procurando que o Geir Campos...
4) depois que tiver as noções, procure na rua ou nas frases e pedaços de frases aquelas expressões que sejam versos perfeitos, como no anúncio: "Fulano Restaurante abre as portas", que é um decassílabo heroico. Isso vai te ajudar a ver com mais naturalidade a métrica e entender que esse tipo de verso aparece constantemente em nossas vidas.
5) e, é claro, ler poetas que foram mestres na métrica em suas épocas. Citando exemplos, Dom Dinis de Portugal, Gil Vicente, Sá de Miranda, Luís de Camões, Bocage, Filíntio Elísio, Gregório de Matos, Cláudio Manoel da Costa, Basílio da Gama, Tomás Antônio Gonzaga, Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Almeida Garrett, Feliciano Castilho, Olavo Bilac, Raimundo Correia, Alberto de Oliveira (esses três últimos, parnasianistas, são fundamentais), Cruz e Souza, Alphonsus Guimaraens, Cesário Verde, Augusto dos Anjos, Antero de Quental, Florbela Espanca, Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Guilherme de Almeida, Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Sophia de Mello Breyner Andresen, Geir Campos, Vinicius de Moraes, Carlos Drummond...

E isso só pra poesia metrificada, pois poesia não metrificada usa e abusa também de cuidados formais nos versos, ao que acontece claramente com muitos poetas concretistas...
 

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