Nos instantes finais, Parte de trasncrição do CVR
Fonte: Correio Braziliense
Gravação dos diálogos contidos na caixa-preta do Boeing da Gol, que caiu no Mato Grosso em setembro, revela que piloto e co-piloto tentaram retomar o controle da aeronave, depois da colisão com o jatinho
O comandante Decio Chaves Jr. e o co-piloto Thiago Jordão Cruso, responsáveis pelo vôo 1907 da Gol, tentaram recuperar o controle do avião antes de perderem a consciência. Logo depois de colidirem com o Legacy N600LX da ExcelAire Service, usaram todos os procedimentos preconizados para retirar o avião do parafuso. As gravações, segundo fontes da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), constam do voice recorder do Boeing e explicariam o trem de pouso abaixado e travado nos destroços do acidente.
De acordo com autoridades que ouviram os diálogos, as ordens foram gritadas e rápidas. Mostram que os dois tripulantes não souberam que tinham sofrido uma colisão com o jato executivo, o que comprovaria a tese de que foram atingidos por baixo. Os diálogos duram poucos segundos e causam impressão de pânico. Algumas das frases ditas pelos pilotos foram: “Perdemos o controle”; “O que houve?”; “Acione os flaps”; “Reduza a manete”; e “Ele não responde”. O diálogo, travado pela tripulação enquanto o jato caía, mostra a tentativa de ambos reduzir a velocidade do avião, antes de manejar o leme vertical e os ailerons para sair do parafuso.
Depois de atingido pela ponta da asa e pelo leme horizontal esquerdo do jato executivo, o Boeing 737-800 começou a se desintegrar no ar. Os destroços foram espalhados por uma área de 20 quilômetros quadrados de selva densa e de difícil acesso, causando a morte de 154 passageiros. Não houve incêndio. Apenas os dois corpos que se encontravam sob a asa apresentavam sinais de queimadura.
Dados do data recorder do Legacy, que registra os parâmetros de vôo do aparelho, mostram que o avião norte-americano estava com o transponder inoperante e sem comunicações. Os pilotos Joseph Lepore e Jan Paul Paladino voavam surdos e mudos e chegaram a fazer cinco tentativas de contato com o 1º Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo (Cindacta 1), em Brasília, antes do acidente.
Os controladores brasileiros também tentaram se comunicar com o avião executivo seis vezes, a última delas em freqüência aberta e pedindo ajuda a outras aeronaves que se encontrassem na área. Na última comunicação bem-sucedida com o Legacy, o Cindacta 1 apenas pediu que o avião acionasse o dispositivo de identificação e avisou que a aeronave estava sob supervisão radar.
Lepore e Paladino mantiveram-se a 37 mil pés, última altitude de vôo, até se chocar com o avião da Gol. Esse procedimento segue a norma adotada pela Administração Federal de Aviação dos Estados Unidos (FAA), válidas para o território norte-americano e canadense. Dentro da regras adotadas pela Organização Internacional de Aviação Civil (Oaci), seguidas pelo resto do mundo, eles deveriam ter cumprido rigidamente o plano de vôo, que previa duas mudanças de altitude: 36 mil pés entre Brasília e Teres (ponto localizado a 450km da capital federal) e 38 mil pés entre Teres e Manaus.
Investigação
A comissão militar que atua na investigação sobre as causas da queda do vôo 1907 esteve ontem no Cindacta 1 para verificar os dados armazenados no sistema de controle. Hoje, estará em Manaus para realizar um trabalho semelhante no Cindacta 4. Segundo nota divulgada pelo Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (Cecomsaer), o objetivo do trabalho é levantar os fatores operacionais do acidente, “relacionados ao ser humano e o ambiente operacional com a aeronave e seus sistemas.”
Representantes acreditados dos EUA e do Canadá participam da investigação conduzida pelas autoridades brasileiras. O trabalho busca identificar os fatores que contribuíram para a ocorrência do acidente com o objetivo de formular recomendações para a segurança de vôo mundial.
A comissão quer precisar o que determinou para a colisão entre as duas aeronaves. E tem duas áreas de investigação: fator humano — abordagem da segurança de vôo que se refere ao complexo biológico do ser humano, nos aspectos fisiológicos e psicológicos que possam ter refletido nas ações da tripulação e demais pessoas envolvidas no acidente, servindo para clarificar a seqüência de acontecimentos — e o fator material, que busca abordar aspectos da segurança de vôo. Isso se refere às aeronaves nos seus aspectos de projeto, fabricação e de manuseio de material. O jato Legacy é fabricado pela empresa Embraer. O Boeing adquirido pela Gol é de origem americana e estava em operação há menos de um mês.