A LEGÍTIMA DEFESA DA POSSE E O DESFORÇO IMEDIATO
Sempre que a lei assegura ao titular de uma situação jurídica a não ingerência violenta de outrem, fica ao mesmo tempo assegurado à vítima da ofensa ao bem tutelado "o emprego da força" em reação à violência do agressor. Em conseqüência essa repulsa da força própria ao agressor da regra da não-violência, "não entra no mundo jurídico como ato ilícito, desde que se contenha nos limites que a lei pressupôs" (PONTES DE MIRANDA, ob. cit., § 1.110, p. 283).
Na verdade, o art. 502 prevê duas situações de reação privada do possuidor contra aquele que lhe agride a posse:
a) A primeira é aquela em que, antes da perda da posse, a vítima repele, com força própria, o agressor. Nesse caso é que PONTES DE MIRANDA admite a configuração jurídica da legítima defesa da posse (ob. cit., § 1.110, p. 283). Corresponde apenas às hipóteses de turbação da posse.
b) A segunda é aquela em que o possuidor chega a perder a posse, e emprega força própria para recuperá-la "logo em seguida". Aqui já não se pode tecnicamente qualificar a reação como exercício de "legítima defesa", mas, sim, de desforço imediato, que pressupõe esbulho consumado (PONTES DE MIRANDA, ob. cit., § 1.111, p. 284).
Nesse sentido, o parág. único do art. 505 faz referência tanto a "atos de defesa" como a "atos de desforço".
Todos eles, porém, são legítimos e se subordinam aos mesmos requisitos ou seja: deverão a auto defesa e o desforço ser praticados "mediante emprego de meios estritamente necessários", seja para "manter-se na posse", seja para "restituir-se nela" (CC, art. 502, parág. único). Hão, pois, de conjugar-se: a) a atualidade da agressão, ou sua recente consumação; e b) a moderação da repulsa, que nunca pode ir além dos atos indispensáveis à manutenção ou restituição da posse.
"Assim sendo, se a assistência do Estado revelar-se tardia ou não puder ser oportunamente invocada, o possuidor poderá reagir para manter-se na posse molestada, evitando excessos, segundo o princípio do moderamen inculpatae tutelae, ou seja, da moderação da legítima defesa (MARIA HELENA DINIZ, CC Anotado, SP, Saraiva, 1995, p. 385).
Também, quando se trata de desforço para recuperar, de pronto o objeto esbulhado, o possuidor "deverá agir pessoalmente, embora possa receber auxílio de amigos ou serviçais, empregando meios necessários, inclusive armas, para recuperar a posse perdida. Todavia, essa reação deverá ser imediata" (MARIA HELENA DINIZ, ob. cit., loc. cit.).
A violência da repulsa ao atentado à posse, quando comportar-se dentro de aludidos padrões, elimina qualquer resquício de ilicitude na reação do possuidor. Com efeito, proclama o art. 160, I, do CC:
"Não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido".
É justamente por isso que nos pretórios prevalece a tese de que:
"Não comete infração penal, sequer em tese, a vítima de ameaça ou esbulho de sua posse que, sem exceder o indispensável à manutenção ou restituição, a recupera por sua própria força e autoridade. O "desforço imediato" e a "resistência" são formas de legítima defesa da posse, que não se limita à repulsa da violência, mas autoriza até a obtenção da restituição da posse pela própria força" (TJSP, Rec. 120.406, Rel. Des. ALVES BRAGA, RT 461/341).
http://www.amdjus.com.br/doutrina/civil/162.htm