Sua objeção é bastante consistente, caro Galahan, mas creio que não podemos ignorar um importante detalhe : até que ponto podemos dizer que o comportamento dos Grados nos campos de Lis era semelhante àquele apresentado pelos hobbits do Condado? Certamente as condições políticas não eram as mesmas: enquanto o Condado era um lugar pacífico, protegido por guardiões e sem nenhuma ameaça séria em suas fronteiras, na juventude de Sméagol o vale do Anduin era uma região tumultuada, com um Sauron recém-desperto em Dol Guldur. Minas Ithil havia caído 400 anos antes e o declínio de Gondor tornavasse mais acentuado, com a perda dos territórios ao norte e no oriente. Se a postura alienada dos hobbits do Condado encontra uma desculpa, a mesma postura por parte dos Grados seria, no mínimo, temerária. Por uma questão de sobrevivência, eles não poderiam ignorar o que acontecia fora de suas fronteiras. Ademais, não podemos desconsiderar as peculiaridades dos Grados. Eles eram descritos como curiosos e, dentre todos os hobbits, os menos fechados a contatos com os homens, o que é muito relevante para nossa discussão. Além disso, demonstravam bastante coragem e ousadia, não temendo os rios, por exemplo. E, embora os hobbits não demonstrassem interesse por coisas novas, havia entre eles elementos excêntricos, que apreciavam histórias e as tradições orais de suas famílias. Sméagol parece ser um destes.
E, acima de tudo, eles não habitavam uma região periférica, estando próximos de uma das principais rotas de comunicação da Terra Média. Não é improvável que tenham tido contato com viajantes (até mesmo Gandalf) que contavam histórias sobre os dias antigos. Tais histórias passaram a fazer parte das tradições orais de todo o povo.
Mas você diz que o conto da queda de Sauron não era de conhecimento geral em seus detalhes. Realmente, devo confessar que esta é a parte mais frágil de minha argumentação. Boromir e toda Gondor certamente ignoravam que Isildur havia tomado o anel para SI. Mas será que isso significa que ele não sabia como o anel foi tomado de Sauron? Será que nunca tal história foi contada em Minas Tirith? Isildur passou um ano em Minas Anor, instruindo seu sobrinho. Será que em nenhum momento ele mencionou o anel? Considero que o próprio manuscrito deixado por ele fornece a resposta: o texto seria uma garantia de que a memória daqueles acontecimentos seria mantida. É bem provável que a tomada do anel fosse de conhecimento geral em Gondor sim, em seus anos de apogeu. Acredito que tinha o caráter de uma "lenda nacional". Imagine a magnitude do fato. Isildur, ancestral dos reis, tomou o Anel da mão do próprio inimigo, amputando-lhe o dedo!! Acho inconcebível que os reis desprezassem o poder de uma propaganda como esta. Quanto ao DESTINO imposto ao anel, deve ter ficado menos claro. A maioria talvez pensasse que ele havia sido destruído. Daí a surpresa de Boromir no conselho de Elrond. E quanto a isso ser repassado aos Grados, por algum viajante de Gondor, acho perfeitamente possível, dado o orgulho que tal povo tinha das realizações de seus antepassados. Gollum descreve o reino de Gondor, fala de Minas Ithil, de suas torres altas e brancas, menciona até mesmo a árvore branca. Diz que costumava ouvir histórias do sul, em sua juventude. Quem contava tais histórias? Quem, senão alguém que conhecia bem Gondor e suas lendas?
Posso mencionar outras possíveis fontes de conhecimento aos Grados : algum guardião do norte, onde a história era muito melhor conhecida, e o anel era chamado "A ruína de Isildur", ou mesmo elfos. Há várias possibilidades. Gollum pode até ter descoberto por si só. Ele era um ser viajado. Escutava conversas, prestava atenção nos boatos. Descreve com exatidão a foz do Anduin, Harad e Umbar, e até seus habitantes. Que conversas esta criatura não ouviu? Que segredos ele deve ter descoberto? Não acho tão improvável que ele soubesse da tomada do anel, com todos os detalhes.
Edited by - Celebrimbor on 21 February 2002 16:10:16