(Spoilers, possivelmente)
É perfeitamente previsível a decepção que muita gente está tendo. A Vila foi divulgado como um filme de terror apavorante com um final inesperado e impactante, e não é bem isso. O povo vai esperando uma coisa e se depara com uma bem diferente.
Particulamente, eu me assustei muito pouco. Eu acredito que o fato de eu ter ido ao cinema já sabendo do final contribuiu para isso, mas o interessante: isso chegou a ser irrelevante, simplesmente porque o mérito do filme não está no terror. Tem uma atmosfera bem construída e muitos momentos de pura tensão, sim, mas esses pontos estão longe de serem a qualidade principal, como muitos esperavam.
Pra mim, acima de tudo, é um drama que tem algo a dizer. O lance dos monstros pode até ser considerado um plano de fundo que funciona como o desencadeador do que realmente importa, que são os personagens e conseqüentemente uma curiosa exploração de uma parte da natureza humana.
Por um momento eu esqueci dos mistérios da floresta ao redor da vila e me envolvi somente com os dramas pessoais dos habitantes. O que tinha tudo para se transformar numa pura novela de amor e ciúmes acaba sendo altamente envolvente por estar dentro de um contexto peculiar. A idéia de estarem isolados do mundo, obrigados a conviver com um número determinado e limitado de pessoas causa a sensação de que as coisas devem dar certo, pois elas não têm muitas escolhas dentro daquele estilo de vida. E isso faz com que a gente fique atento aos resultados das ações de cada um.
Outra questão apontada pelo diretor é o que diz respeito à facilidade de manipular qualquer indivíduo quando exposto a uma situação de medo. Implantar o temor nos cidadãos permite os elders manter a permanência dos primeiros dentro da vila, uma vez que eles não ousam enfrentar as "terríveis" criaturas que tanto os assombram. É difícil lutar contra os nossos medos, e por isso muitos preferem escolher o caminho que passa longe deles. Em outras palavras, o ser humano tem o costume de aceitar as ordens sem questioná-las, se isso significa a garantia de sua sobrevivência. E as coisas funcionam assim. Políticos às vezes usam a estratégia de espantar a população para que eles a manipulem facilmente utilizando discursos que visam a proteção, nem que para isso seja necessária a criação de um inimigo inexistente, como os monstros da floresta.
Dá para buscar outras comparações também. Por exemplo, conceitos como ter medo de uma cor e acreditar na existência de bicho-papões na mata podem soar ridículos, mas nós somos assim. Acreditamos nas coisas a que somos apresentados e nas histórias que ouvimos, e levando isso em consideração não é de se admirar que há tanta gente com crença em coisas que não vão levá-las a lugar algum. Não que isso seja ruim, o problema é quando ela nos impede de dar um passo à frente. O fato é que somos o que vemos, o que nos remete ao conto da caverna, de Platão. A História comprova isso.
Mas o mais interessante é a abordagem da corrupção causada pelo avanço. Ainda que este tenha um lado positivo, não se pode ignorar os males que ele traz junto. Estou falando de ambições, egoísmo, etc. A atitude dos elders em formar uma sociedade atrasada e presa no tempo é um tapa na cara da pretensão predominante atualmente, já que eles consideram mais vantajosa uma povoação isolada do resto do mundo a um mundo cheio de tecnologia mas tão prepotente e desrespeitoso.
Anyway, voltando ao filme... o final é realmente tenso. A cena em que a Ivy encontra na floresta o "monstro" é cool por não ser esperada. Como já disseram, Shyamalan dá o pulo do gato justamente quando esperamos que as coisas se acalmem. Isso me fez lembrar do final de Sinais. Esse rapaz está ficando esperto nessa tática.
Em suma, é um filme muito envolvente e inteligente. Fui esperando uma bomba (depois de tantas críticas negativas) e me deparei com um dos melhores filmes do ano. Tem um ritmo lento, mas longe de ser cansativo, tanto que já assisti duas vezes e se me chamarem vejo a terceira tranqüilamente. Algumas cenas são memoráveis, como a em que Lucuis Hunt pega a mão da Ivy e a leva ao porão, em câmera lenta; ou a que Edward Walker conversa com os outros dirigentes, questionando se eles iam viver para sempre. As atuações estão ótimas, acho que nem preciso comentar a respeito da Bryce Howard. =P Respondendo ao Gandalf, acho que ela vai ficar genial em Maderlay, o novo filme do Lars Von Trier.
E só para finalizar... vocês repararam nos créditos? Mostra fotos de momentos não presentes no filme, retratando o trabalho e dia-a-dia dos habitantes. Muito foda.