Agora o bicho vai pegar daqui pra frente
O vilarejo de Bri estava em polvorosa, há muitos anos não se via uma movimentação tão intensa de anões para o Pônei Saltitante. Rumores diziam que o dono da estalagem, o senhor Urzal, estava bancando a festa e que dezenas de barris de seu estoque particular da melhor cerveja de Dorwinion foram abertas. Uma cerimônia era celebrada pelo anfitrião a um jovem hobbit que havia chegado hoje de manhã, acompanhado por um casal muito arredio. Algum dos anões mais hábeis que trabalhavam no Pônei chamaram alguns de seus parentes para transformarem a taverna em um grande salão para festas.
A noite chegara, a música e a cerveja embalavam tanto o velho Urzal, quanto o seu sobrinho, o jovem Michel Montês. A face de ambos estava avermelhada. Abraços e felicitações eram dados ao seu afilhado pelos anões, assim como muitas outras gentilezas eram declamadas para a cerveja de Extremo Leste. O senhor Delgo e a Senhora Aurora eram cumprimentados por todos que passavam pela mesa onde estavam, a hobbit estava radiante com tudo aquilo, imaginado uma nova vida para sua família longe de SempreCalmo e com festas, muitas festas. O senhor Delgo era a emoção em pessoa. Lágrimas escorriam sobre sua face vermelha para disputar corrida com a cerveja entornada em cada brinde. E não foram poucos.
Todos os convidados cantavam e urravam em brinde para o jovem Michel. Apenas num canto afastado a alegria não ousava se aproximar. As semanas já eram um tormento sem fim para Brandal sem a companhia de Ormal, agora, com a chegada inesperada de seus pais e do empolado Michel Montês-fabricante-de-queijo, o mundo desmoronara de vez. A situação ficou ainda pior com o pedido súbito e público de Michel para casar-se com ela. E diante de seus pais e de seu tio! Urzal, muito rapidamente, providenciou todos os preparativos para a celebração do noivado. Sua mãe Aurora, não permitiu que Brandal reclamasse em momento algum. Seus amigos, Valmir e Zim, acompanhavam o drama da hobbit com curiosidade. Que poderiam eles fazer para evitar a trama bem orquestrada por sua mãe e Michel?
Enquanto era vestida e escovada por sua mãe nos aposentos superiores, seu futuro tio Urzal depachava vários pedidos aos alfaiates, ourives e mercadores das proximidades. Com muito custo, Brandal saiu do quarto ao cair da noite e entrou no de Zim. Lá dentro, ela e Valmir discutiam calorosomante, não em solidariedade à hobbit, e sim, por causa do vestido que a navegadora teimava em quere utilizar na festa. A roupa foi confeccionada pela atendente anã e, apesar de ter sido feito na numeração maior dos anões, o vestuário comprimia e acentuava as pernas e bustos de modo escandaloso. Além de ficar um palmo abaixo das nádegas. Zim somente retrucava, dizendo que era pura implicância do médico para com a atendente que estava interessada nele. E assim, desceram os três para receber os convidados. Um impasse constrangedor fora criado. Ninguém sabia para que olhar, à noiva ou para a deslumbrante visitante que deixava todos os anões boquiabertos com o seu... porte avantajado. Aurora não parava de beliscar Delgo.
Não demorou para que as confusões iniciarem. Um anão mais saidinho apresentou-se para ser o par de Zimraphel quando a música começou. Um outro não gostou e sugeriu que ele colocasse suas mãos de volta na caneca de onde jamais deveria ter tirado. O anão assanhado respondeu dizendo que suas mãos iriam socar um narigão intrometido se ele não apontasse para outro lado. E a briga aconteceu; e o salão dividiu-se entre os parentes e partidários do assanhado e do narigudo. Urzal não gostou nenhum pouco daquela cena. Brincadeira de anão tinha hora e lugar, mas não em sua estalagem! O dono do Pônei aproximou-se por trás e chamou pelo anão narigudo, que se virou para ver quem estava interrompendo a luta. Distração fatal, o murro deferido pelo assanhado fez o narigudo sair rodopiando pelo salão e cair próximo de Zim. Num ato de reflexo incosciente, o narigudo agarrou o vestido da navegadora antes de desabar. Os xingamentos, tapas e socos pararam instantaneamente e os rostos dos anões congelaram numa expressão coletiva de "Oooooooohhhhh....". Alguns esfregavam os olhos repetidas vezes, só poderia ser sonho! E Urzal não se conteve e soltou um sonoro "Urratouro!!!" O cérebro de Zim levou alguns segundos eternos para espantar o susto e cobrir com os braços seus seios. Brandal colocou uma toalha de mesa sobre a amiga e as duas subiram para os aposentos, seguidas por um furioso Valmir que sussurrava entredentes: "Eu te avisei!!!"
A festa, aos poucos, foi retornando. Graças ao providencial reforço de cerveja liberado por Urzal. A animosidades e desentendimentos foram esquecidos. Ninguém lembrava ou sequer falava da briga que ocorrera instantes atrás. Cada um, à seu modo só lembrava de uma cena maravilhosa. A estranha elfa em todo o seu esplendor... e que esplendores!!!
Naquela noite, nada poderia desmanchar o sorriso de dezenas de anões. A não ser a tragédia que se aproximava com olhos vermelhos de ira.