Eu não pesquisei a etimologia e a história da palavra, mas também acredito que "branch" remeta essencialmente a galhos de árvores e coisas do tipo. Mas o que seria essencial aqui tem mais a ver com o formato e geometria do que com o processo de crescimento do galho. Quer dizer, tem mais a ver com espaço do que com tempo. Até porque, por exemplo, uma árvore eterna como Yggdrasil tem seus ramos também. O uso de termos como árvore da vida (na biologia), árvore genealógica, etc. remeteria à semelhança geométrica entre os ramos de árvores e as representações gráficas de processos genealógicos, evolutivos, etc. Ainda que essas representações usem, em geral, o eixo tempo, não é o tempo que está na raiz do conceito de "ramo", e não é necessário que seja este o eixo usado.
Por isso não vejo sinto estranheza alguma em, por exemplo, falar de ramos de espécies mesmo em um cenário em que as espécies são criadas por Deus todas de uma vez. O parentesco ou semelhança entre as espécies teria mais a ver com o ideal, e não com o temporal. Tanto é que, por exemplo, temos na própria obra os "irmãos na mente de Ilúvatar" (Manwë e Melkor, por exemplo), e os elfos e homens como "filhos de Ilúvatar". É um processo afim ao processo genealógico, mas diferentemente deste, não é temporal. Com espécies e raças poderia acontecer a mesma coisa: do mesmo jeito que Deus poderia ter criado várias espécies de equinos, ou várias raças de cavalos, Eru poderia ter criado duas espécies ou duas raças de humanóides, a sua imagem e semelhança. E é o que ocorre em textos do autor. O texto que postei anteriormente é do Comentário sobre o Diálogo de Finrod e Andreth, datado sem tanta precisão entre 1955 e 60.
The existence of Elves: that is of a race of beings closely akin to Men, so closely indeed that they must be regarded as physically (or biologically) simply branches of the same race.
De 1954, há uma carta com conteúdo bastante afim (#153):
Elves and Men are evidently in biological terms one race, or they could not breed and produce fertile offspring – even as a rare event.
Tolkien não está rementendo a teorias bizarras e rascunhadas como a de elfos mortais (onde isso aparece mesmo?), mas sim descrevendo seu legendário como "evidentemente" vemos em O Senhor dos Anéis.
Dispensável dizer que Tolkien não usa o termo "raça" com um sentido rigoroso. "Raça" pra ele é um agrupamento que pode ser desde meramente os descendentes de Elros...
Elros chose to be a King and 'longaevus' but mortal, so all his descendants are mortal, and of a specially noble race, but with dwindling longevity (...)
...passando por tão somente homens...
(....) entering into Men of the Elven-strain is indeed represented as part of a Divine Plan for the
ennoblement of the Human Race, (...)
...e até, por fim, pela raça dos eruhíni, de "Elves and Men" (nesse caso, decerto ele está se referindo ao que chamamos, cientificamente, de "espécie").
E os três trechos se dão na mesma carta... Então, se nem para "raça" Tolkien usa um termo de significado relativamente rigoroso, para "branch", termo usado em textos com variadas datações e contextos, também não vejo motivo pra pensar que haja um sentido mais rigoroso, e a partir daí teorizar, inclusive apelando para teorias como a de elfos mortais...
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Quanto à evolução biológica de homens, dentro do legendário de Tolkien, agora vejo que, além da falta de evidências diretas, não me parece uma possibilidade lá muito plausível - mesmo num cenário em que os homens despertem logo após os elfos, há um intervalo de tempo de cerca de (apenas) 70 mil anos para os homens evoluirem e chegarem ao ponto em que estão em Beleriand.
[1] Tolkien muda um pouco as datas entre um texto e outro (por exemplo, no capítulo 6 de A Natureza da Terra-Média, ele coloca os elfos despertando em 1000 A.V. e os homens em 1075 A.V.), mas a ordem de grandeza é a mesma (naquele caso, o próprio Tolkien dá o valor exato de 64.534 anos). Isso é suficiente para explicar certa variedade cultural, mas não me parece plausível que haja uma evolução biológica tão acentuada a ponto de embarcar a diferença entre homens e hobbits, por exemplo.
E repare que esses números já são na cosmogonia mais experimental de Tolkien (na cosmogonia que os homens despertam bastante cedo e que o Sol existe desde há muito). Na cosmogonia mais "canônica", os homens despertam e chegam a Beleriand em cerca de 300 anos. Quer dizer, a hipótose da evolução biológica de homens dependeria, antes de tudo, desse grande "se". Há não muito tempo eu acreditava que dava pra jogar o despertar dos homens para um passado remoto sem apelar para uma grande reformulação dos mitos, mas (1) Tolkien parece não ter conjecturado esse caminho, (2) não parece funcionar mesmo como headcanon: colocar os homens como vivendo por milhares de anos na escuridão é um tanto quanto bizarro (ainda mais se quisermos que eles evoluam darwinianamente), e sacrifica vários elementos simbólicos do legendário (por exemplo, elfos como o "povo das estrelas").
[2][3]
Por isso tenho preferido a cosmogonia mais tradicional mesmo, de O Silmarillion. Nem o fato dos edain terem existido por apenas 300 anos me causa tanto incômodo. Na Grécia, de períodos semilendários para períodos históricos, o intervalo é de cerca de cinco, seis séculos. Em Roma, menos ainda... Não vejo tanta dificuldade de, entre a semilendária queda do conto de Adanel e o estado histórico que vemos em O Silmarillion, termos 300 anos, já que os edain eram sociologicamente muito mais simples do que romanos e gregos em seus períodos históricos. Claro, isso tudo assumindo que eles despertem, como os quendi, relativamente civilizados e já com diferenças étnicas. E teriam que despertar mais numerosos.
Aliás, quem deu uma passada de olho em A Natureza, verá que o próprio editor, ao final do livro, separa trechos em que Tolkien parece abrir caminho para uma evolução (tanto cosmogônica quanto biológica) mais palatável às crenças modernas. Mas, ainda assim, essas ideias não se estendem aos Filhos, nem que fosse para jogar o despertar num passado mais remoto e permitir o surgimento de raças a partir de um povo "adâmico" original, ou até mesmo ir mais longe e fazer com que os corpos dos homens surgissem de "matéria orgânica pré-existente" situada na árvore da vida. Tolkien poderia muito bem ter tomado algum caminho desse tipo, mas não o fez... Isso tudo porque, imagino, a história de evolução dos hominídeos (diferentemente do heliocentrismo ou da cosmogonia moderna) é ainda uma pedra no sapato do catolicismo e de católicos estritos como Tolkien, daí ele não teria feito questão de integrá-la em seu legendário.
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Sobre numenorianos, aqui já acho que fugimos do assunto de evolução biológica, pois, independentemente de como queira descrever, os numenorianos se estabeleceram enquanto agrupamento de forma relativamente rápida, e não uma mudança lenta, com o passar de gerações.... Seja como for, há um fato interessente que é fácil deixar passar batido: investigando a respeito, vemos que as características numenorianas não estavam (fundamentalmente ou essencialmente) assentadas em herança biológica.
O que é muito interessante, pois ajuda a afastar a noção desagradável de numenorianos como uma raça biologicamente superior. Teria mais a ver com uma "benção espiritual" ou "efeito mágico" que incide sobre determinados povos e determinadas famílias - tanto é que ela não diminui em ritmo mais acelerado com o aumento da miscigenação, e ela parece repentinamente aumentar quando os personagens se tornam mais virtuosos (por exemplo, longevidade de Aragorn), mesmo depois de gerações que há muito pareciam ter perdido essa benção ou pareciam tê-la diminuído consideravelmente. Em A Natureza da Terra-Média, a própria altura é vista como uma "benção" desse tipo:
O decréscimo na estatura dos Dúnedain não era uma tendência normal, compartilhada por povos cujo lar normal era a Terra-média; mas era decorrente da perda de sua antiga terra, no longínquo Oeste, de todas as terras mortais a mais próxima do “Reino Imortal”. Tanto em Arnor como em Gondor, fora a mistura de raças, os Númenóreanos apresentavam uma diminuição de altura e longevidade na Terra-média que se tornou mais evidente conforme a Terceira Era passava.
Até a longevidade dos numenorianos não é uma característica inerentemente biológica, ainda mais se termos em mente que elfos e homens são uma mesma espécie e (arrisco dizer) a própria mortalidade (do corpo) dos homens não é uma característica inerentemente biológica: se os homens são mortais de corpo, é um acidente que incidiu sobre eles, por causa do Pecado Original, acidente que pode ser mitigado - quer medicamente, quer "magicamente" (sejam "magias" legítimas, como aquela que incidiu nos numenorianos, ou ilegítimas, como via anéis de poder). E, sob condições excepcionais, talvez pudesse até ser revertido totalmente - por exemplo, no caso da virgem Maria (mencionado por Tolkien em texto dissertativo sobre seu universo), ou no caso de Tuor.
[4][5]