Fables
Texto: Bill Willingham
Lápis: Lan Medina
Arte-Final: Steve Leialoha e Craig Hamilton
Cores: Sherilyn van Valkenburgh
Selo: Vertigo
Publicação Nacional: Devir
Formato: Encadernado de luxo (128 páginas)
Preço: Os olhos da sua cara
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Esse encadernado já foi lançado aqui há um tempo, mas eu não me lembro de ter visto tópico sobre ele. Trata-se de uma compilação dos 5 primeiros números de uma das séries da Vertigo de maior sucesso atualmente.
Como é uma publicação da Devir, algumas coisas já são esperadas: acabamento luxuoso (tem orelhas e o escambau), preço obscenamente estratosférico (algo em torno de 40 Reais) e tradução burocrática (no caso, um apêndice ou mesmo algumas notas de rodapé fariam uma boa diferença).
Mas por hora vamos nos concentrar no conteúdo: Fábulas é bem divertido, até certo ponto intrigante, e ocasionalmente utiliza alguma referência de forma bastante inteligente. A arte é ótima, as capas são excelentes e o conceito geral é bem interessante.
Porém, esse primeiro arco (premiado com vários Eisners) não chegou nem perto de explorar de forma realmente brilhante as possibilidades que a premissa oferece.
Trata-se da velha idéia de dar uma abordagem cínica e contemporânea a algo tradicionalmente ingênuo e idealizado. Dessa vez, as vítimas são protagonistas de contos-de-fada: Branca de Neve, João (aquele do pé-de-feijão), Lobo Mau, Príncipe Encantado, Barba Azul, Bela e Fera, etc.
Toda essa galera foi exilada do Mundo das Fábulas quando este foi dominado por uma entidade maligna à qual os personagens se referem apenas como "O Adversário". Passando a existir no mundo real, disfarçados de humanos, as fábulas agora vivem em Nova York, junto com os humanos normais, mas pertencem a uma comunidade oculta, com suas próprias leis e regras.
A história começa quando a irmã da Branca de Neve, Rosa Vermelha, misteriosamente desaparece, deixando para trás um apartamento todo destruído e cheio de sangue. Cabe ao Lobo Mau, que age como o detetive da comunidade das fábulas, resolver o crime.
A administradora da comunidade é a Branca de Neve, que se comporta como uma empresária arrogante, e ela acompanha o Lobo Mau (que tem a aparência do típico detetive desleixado) durante a investigação, o que dá margem a várias discussões divertidas entre os dois.
Além dos protagonistas, nós somos apresentados a vários personagens clássicos, modificados de maneira similar. Nada é muito aprofundado, no entanto, visto que a história se concentra na investigação.
Quem fala inglês logo percebe os problemas que a tradução apresentou, e como pelo menos algumas notas eram necessárias: no original, a porta do escritório do Lobo Mau dizia "B. Wolf", que obviamente é uma abreviação de "Big Bad Wolf". Isso foi uma boa sacada do Willingham, pois "Wolf" é um sobrenome comum nos EUA. A edição nacional traduziu o letreiro da porta para "B. Lobo", o que não faz o menor sentido. Talvez manter no original e explicar a referência em uma nota de rodapé fosse mais adequado.
Além disso, os personagens frequentemente se referem ao Lobo como "Bigby", que é uma contração de "Big Bad" - isso foi mantido na edição nacional, mas não há nenhuma nota explicando (eu desconfio que os tradutores não entenderam a piada até agora).
Problema semelhante ocorre com a Branca de Neve: no original, na plaqueta da mesa de seu escritório lê-se "S. White" (Snow White). "White" também é um sobrenome bem comum nos EUA, novamente uma boa idéia do criador da série. Na edição nacional a plaqueta diz "B. Neve", que apesar de, ao contrário de "B. Lobo", fazer sentido, ainda me incomodou um pouco, no sentido de que "Neve" e "Lobo" não são sobrenomes assim tão comuns.
A série ainda tem alguns outros detalhes interessantes, como a comunidade afastada da cidade onde vivem as fábulas que não conseguem assumir forma humana, chamada pelos personagens de "A Fazenda". Um dos três porquinhos vive fugindo de lá pra ir dormir no apartamento do Bigby (dando a desculpa de uma suposta dívida por este ter destruído a sua casa - na verdade ele só gosta da cidade).
Para quem está se perguntando como fábulas "más" e "boas" convivem juntas, há uma explicação para tudo. Ao vir para o mundo real, todos adquiriram personalidades humanas, e agora não são nem bons, nem maus. Seus atos cometidos no Mundo das Fábulas foram todos perdoados, e a única coisa que ainda é levada em conta são títulos de realeza (que são tecnicamente inúteis, e só voltariam a ter algum valor caso o Mundo das Fábulas fosse reconquistado).
Esse primeiro arco é uma ótima leitura, e o capricho da edição faz a compra valer à pena (apesar dos tropeços da tradução). Mas quando a coisa acaba fica aquela vontade de saber o que vai acontecer a seguir, e, digo, vai saber quando (ou se) a Devir vai publicar uma continuação.