Apenas
O Hobbit e Roverandom foram escritos com os filhos em mente (o primeiro para todos os filhos, o segundo especificamente para Michael Tolkien, que havia perdido um cãozinho de brinquedo numa praia). Contudo, posteriormente Tolkien, conforme o próprio relata em uma carta, se arrependeu do tom adotado no
Hobbit justamente por ser excessivamente condescendente para com as próprias crianças.
Farmer Giles é uma sátira e, apesar do aparente tom mais leve, não é infantil. É uma obra recheada de trocadilhos lingüísticos, que obviamente se perdem aos trambolhões na tradução.
Tolkien não é um escritor de literatura infantil ou infanto-juvenil. O fato de ter escrito dois livros com esse público mente (embora tenha se arrependido depois sobre um) não o tornam esse tipo de escritor. Todas as suas outras obras são "adultas" (rótulos medonhos esses).
Essa classificação da obra de Tolkien como "literatura infantil" sempre provém de acadêmicos esnobes que não admitem que alguém possa se interessar em elaborar um mundo imaginário para contar suas histórias em vez de usar o "mundo real" da forma mais realista possível. Como se o mundo que os escritores ditos realistas usam em suas obras de fato retratasse o "mundo real": o simples fato de tal mundo se encontrar dentro de uma obra de
ficção torna óbvio que tal representação da realidade nada mais são que o construto que o
próprio autor faz dessa dita realidade e, por conseguinte, é tão "imaginário" quanto a Terra-média de Tolkien
neste aspecto.
Isso é simplesmente de uma estupidez tremenda que advém principalmente da incapacidade de tais críticos de compreender realmente a obra de Tolkien, visto que as inspirações e referências da mesma se encontram no âmbito da literatura medieval e clássica - coisa basicamente desconhecida dos e vista como "inferior" pelos críticos pós-modernos. Há críticas literárias competentes de Tolkien, feitas por estudiosos que são da área dos estudos medievais e clássicos - e mesmo de outras áreas, mas que sabem reconhecer as influências e como analisar as obras tolkienianas; um exemplo disso é o jornal acadêmico anual
Tolkien Studies, que terá sua quinta edição publicada este ano. Basta dar uma lida em um volume do jornal para se perceber que o âmbito da obra de Tolkien é completamente outro daquele rotulado pelos críticos de plantão.
A visão geral desses críticos é que o grande "pecado" de Tolkien foi ter nascido no final do séc. XIX e ter decidido escrever narrativas "medievais" em vez de romances "realistas", recusando-se a seguir a moda vigente. Visão essa que é, repito, de uma estupidez tremenda.