Peregrin disse:
Eu achei que ela foi desenvolvida mais do que suficiente. Aliás, a cena onde os dois conversam na varanda teve o monólogo mais sincero que eu vi em 2004 no cinema - é quase impossível transmitir sentimento quando a personagem está declarando paixão por algo que não seja outro personagem, e nesse caso trata-se de uma situação mais complexa ainda: é um flerte disfarçado de dissertação sobre vinho, ou vice-versa.
Sim, essa conversa é um dos pontos altos do filme. Chega a ser agonizante a situação dos dois...
Só que eu ainda acho pouco aproveitada a personagem. Talvez por eu tê-la achado a mais interessante do filme, queria que ela aparecesse mais, tivesse mais chance de se mostrar em tela. Ou talvez a abordagem dela não tenha sido tão boa; acabou se destacando mais do que os protagonistas.
Ok, então você ficou
querendo mais, mas isso não é necessariamente um defeito do filme, visto que o roteiro segue um ponto de vista exclusivamente masculino - observe que ela é inexistente no primeiro ato e praticamente some nos minutos finais - as personagens femininas só existem durante o
retiro dos protagonistas; não há ligação direta com a "vida real" deles, e esse é justamente o ponto (a resolução ainda reforça isso). Simplesmente não tinha mais espaço pra ela.
No geral eu discordo de você; definitivamente o filme tem "algo de mais", esp. considerando a antítese entre os comportamentos dos protagonistas: cada um está tentando se apegar desesperadamente a partes irrecuperáveis de suas vidas que são objetivamente opostas; ou seja, Jack tem medo porque o casamento iminente significa nunca mais conhecer uma pessoa pela primeira vez e se apaixonar, e Miles tem medo porque seu casamento acabou e ele não quer passar por esse processo de novo.
Mas isso é muito explícito no filme. Tão explícito que ele chega a comparar a vida dos dois personagens aos tipos de vinho, como se isso fosse necessário pra gente perceber que eles são extremos opostos de uma mesma situação. Não achei uma abordagem nada sutil, nem original, e talvez por isso mesmo o filme não tenha me parecido nada demais.
Não entendi. Você queria que fosse mais "sutil", mas isso não é exatamente justo. Não há nada de errado com uma abordagem explícita, desde que seja
honesta, ainda mais em se tratando de uma comédia. E eu não senti que os temas foram jogados na minha cara, ainda mais porque o filme é mais sobre pessoas do que sobre temas, dizendo tudo que tem que dizer em poucas cenas e deixando bastante espaço para as situações se desenvolverem.
(Anyway, seu filme preferido de 2004 não foi Kill Bill: Vol. 1? Eu dificilmente chamaria qualquer coisa naquele filme de "sutil", então o que é isso? Dois pesos, duas medidas?)
Quanto à originalidade, eu diria que isso também não é uma obrigação, mas o filme é original sim, não
extraordinariamente original, mas o suficiente pra se tornar único, esp. porque ele parece não levar seus gêneros muito a sério, apostando muitas vezes num humor
offbeat e desconstruindo o ritmo a cada instante - ele começa animado, depois dá uma relaxada geral enquanto o Jack vai esticando cada vez mais a situação e de repente os conflitos explodem todos de uma vez, levando quase instantaneamente a um epílogo extremamente taciturno.
Eu acho estranho você ter gostado tanto de, digamos,
Moça Com Brinco de Pérola, e não ter achado Sideways nada demais. Pelo menos o último está dizendo alguma coisa, e não é dolorosamente previsível.