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Por que Alan Moore foi tão importante para as HQs

Loveless

J'ai une âme solitaire
Autor britânico, que está se aposentando, começou sua carreira nos anos 80 e revolucionou os quadrinhos do mundo todo com sagas violentas, distópicas e permeadas por questionamentos filosóficos e morais

Alan-Moore

Através do jornal The Guardian, Alan Moore anunciou, em 18 de julho de 2019, que vai se aposentar dos quadrinhos. Não é a primeira vez que ele se afasta desse mercado, mas tudo indica que agora é definitivo.

O autor britânico terminou seus compromissos com a última edição da HQ “A Liga Extraordinária” e decidiu deixar o formato que o consagrou.

Das fanzines ao mainstream

Natural de Northampton, na Inglaterra, Moore começou sua carreira no mercado editorial em 1978, escrevendo para publicações underground como as fanzines Anon e Back Street Bugle.

Em 1980, Moore começou a trabalhar para editoras maiores, escrevendo para as revistas Marvel U.K. e 2.000 AD, duas das mais importantes à época no Reino Unido.

A obra de Moore na 2.000 AD chamou a atenção dos executivos da DC Comics, uma das maiores editoras dos EUA, que o contrataram para escrever a HQ “A Saga do Monstro do Pântano”, publicada entre 1983 e 1987.

Na época, os quadrinhos americanos, que eram consumidos majoritariamente por crianças e adolescentes, viviam à sombra do Comics Code Authority, uma iniciativa reguladora da Associação Americana de Revistas em Quadrinhos. As HQs tinham que cumprir uma série de requisitos definidos pelo código para receberem um selo indicativo da Associação, que garantia que aquela obra poderia ser consumida pelo seu público-alvo.

Moore recebeu carta-branca da DC para reimaginar o Monstro do Pântano, personagem criado em 1972. O roteirista então criou uma história adulta e violenta, diferente de todos os outros títulos da editora.

O sucesso de “A Saga do Monstro do Pântano” foi essencial para a chamada “invasão britânica” nos quadrinhos, uma onda discutida pelo autor Chris Knowles no livro “Our Gods Wear Spandex” [em tradução livre, “Nossos deuses usam collant”], que investiga a trajetória do mercado de HQs nos EUA. Com isso, nomes como Neil Gaiman (“Sandman”), Grant Morrison (“Os invisíveis”) e Jamie Delano (“Hellblazer”) saíram do underground no Reino Unido e chegaram ao mainstream americano.

Os três clássicos

Com o sucesso de “Monstro do Pântano”, Moore ganhou ainda mais renome no mercado, se tornando um autor cada vez mais prolífico, a ponto de produzir, durante a década de 80, três obras que se tornaram seminais para os quadrinhos: “Watchmen”, “A Piada Mortal” e “V de Vingança”.

Moore começou a publicar “V de Vingança” em 1982, na revista britânica Warrior. Seu sucesso nos EUA fez com que a DC Comics se interessasse pelo título, comprando-o e passando a ser a responsável por suas reimpressões até os dias de hoje.

Na história, Moore cria um universo distópico inspirado em sua visão extremamente crítica de Margaret Thatcher, que foi a primeira-ministra britânica de 1979 e 1990 e conduziu um intenso processo de liberalização no Reino Unido. Nela, ele extrapola a conjuntura política do país e apresenta uma sociedade governada por um regime autoritário e totalitário, que vigia constantemente seus cidadãos.

Nesse cenário, surge V, um anarquista que traça um plano para assassinar membros do governo e explodir o Parlamento britânico. Na época, o escritor foi acusado de fazer proselitismo ideológico e apologia ao crime com a HQ. Ele negou todas as afirmações.

“Eu não acho certo matar pessoas. E por isso eu deixei tudo moralmente ambíguo. A questão central dessa história é ‘esse cara está certo?’. O que o leitor pensa sobre isso? É uma solução anarquista. Eu não queria dizer às pessoas o que pensar. Eu só queria dizer para elas pensarem" Entrevista de Alan Moore à revista Giant, em 2005

“V de Vingança” se tornou uma obra clássica dos quadrinhos, e um de seus principais impactos pode ser visto ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Nos protestos de junho de 2013, era comum ver manifestantes usando a máscara do protagonista.

‘O que aconteceu com o sonho americano?’

Originalmente lançada em uma minissérie de 12 partes, “Watchmen” foi recebida em 1986 com aplausos ao redor do mundo, sendo integrada à lista de 100 melhores livros em língua inglesa de todos os tempos da revista Time.

Na HQ, Moore subverte o conceito do super-herói clássico, que representa a moral e a justiça, e concebe narrativas que imaginam os impactos sociopolíticos da existência de um superser.

O superser em questão é o Dr. Manhattan, figura onipotente e onisciente que muda os rumos da Guerra do Vietnã, garantindo a vitória dos EUA. Moore então imagina como o mundo seria caso os EUA efetivamente tivessem saído vitoriosos do conflito, que durou de 1959 a 1975 e é considerado um dos maiores fracassos militares da história americana.

“Foi uma obra que fez com que Moore deixasse de ser uma estrela para se tornar um semideus no mundo dos quadrinhos”, escreve o biógrafo Lance Parkin no livro “Mago das Palavras: A Vida Extraordinária de Alan Moore” (Marsupial Editora, 2016).

O sucesso de “Watchmen” consolidou de uma vez por todas o status de Moore na indústria. A HQ rompeu com tudo o que tinha sido feito com super-heróis até então e ditou o tom do gênero na década seguinte, algo que o próprio autor reconhece. E detesta.

Ao longo dos anos, Alan Moore passou a ser cada vez mais direto em suas críticas aos quadrinhos e filmes de super-heróis.

“No ano em que a Grã-Bretalha votou o Brexit e em que os EUA elegeram o que parece ser um gigantesco bufão nazista e idiota, seis dos 12 filmes mais lucrativos do ano eram de super-heróis. Isso é uma má notícia para a cultura. Insistimos nessa infantilização, insistimos nessa recusa em crescer, em tomar responsabilidade em um mundo em que todos temos um papel. São fantasias de empoderamento que eu já não tinha muito apreço logo depois da minha infância, mas agora eu tenho uma aversão tóxica a tudo isso” Alan Moore no documentário “A Cabeça de Alan Moore”, de 2017

‘Apenas um dia ruim!’

Em “A Piada Mortal”, uma graphic novel do Batman, Moore imagina uma origem para o vilão Coringa e dá ao personagem um tom muito mais violento e psicótico do que o que tinha sido visto anteriormente, com cenas que envolvem tortura psicológica e uma insinuação de estupro. É uma diferença análoga a que pode ser notada, por exemplo, no Coringa encarnado no cinema por Jack Nicholson no Batman dirigido por Tim Burton, em 1989, e o personagem interpretado por Heath Ledger em “Batman: O Cavaleiro das Trevas” (2008), de Christopher Nolan.

Com essa abordagem inovadora, “A Piada Mortal” foi aplaudida por conta de seu questionamento filosófico e moral sobre a verdadeira natureza do Coringa.

Em seu artigo “Thoughts on madness and madness in thought in ‘The killing joke’”, Deneb Kozikoski Valereto, doutora em estudos comparados da literatura pela Universidade de Columbia, argumenta que Moore apresenta uma disrupção nessa graphic novel por mostrar que nem sempre um indivíduo se torna louco pelo acúmulo das suas experiências pessoais ou por influências históricas, sociais ou políticas. Na trama, a loucura é disparada por um gatilho: o vilão só se torna o que é após um dia ruim.

A graphic novel foi mais uma investida iconoclasta de Moore no gênero dos super-heróis, como aponta a biografia de Parkin.

A fase independente e os trabalhos atuais

Em 1989, Moore rompeu relações com os quadrinhos de super-heróis e as editoras tradicionais por conta de disputas judiciais acerca dos direitos autorais de suas histórias. Desde então, ele pede para não ser creditado em nenhuma adaptação de seus trabalhos mais famosos, e se recusa a autografar exemplares desses quadrinhos.

Depois disso, ele passou a investir em uma carreira independente. Alguns dos títulos dessa fase são “Um Pequeno Assassinato”, na qual um publicitário se vê num dilema existencial ao ser perseguido por uma criança misteriosa; e “Lost Girls”, HQ pornográfica protagonizada por personagens da literatura como Alice (de ‘Alice no País das Maravilhas’), Dorothy (de ‘O Mágico de Oz’) e Wendy (de ‘Peter Pan’).

“Lost Girls”, segundo o próprio Moore, foi uma tentativa de se fazer com os quadrinhos pornográficos aquilo que ele tinha feito com os super-heróis.

“Nós sentíamos que podíamos retomar e redefinir o que era a pornografia. E nós escolhemos essa palavra de propósito, não queríamos nos esconder por trás do eufemismo ‘HQ erótica’”, disse o autor em 2009, numa entrevista ao The Guardian.

Outra obra importante para a carreira de Moore foi lançada em 1999: “A Liga Extraordinária”, quadrinho no qual figuras da literatura do século 19, como o Capitão Nemo (de ‘Vinte Mil Léguas Submarinas’) e Dr. Jekyll/Sr. Hyde (de ‘O Médico e o Monstro’) se reúnem em uma superequipe feita para defender o Reino Unido.

Com projetos menores no meio tempo, Moore lançou, em 2016, o romance “Jerusalém” que, em mais de 1.200 páginas, conta a história da luta de classes em Northampton, misturando fatos históricos com elementos sobrenaturais.

No mesmo ano, anunciou que se aposentaria dos quadrinhos depois de terminar as últimas histórias da “Liga Extraordinária”, algo que só aconteceu na segunda quinzena de julho de 2019.

https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/07/21/Por-que-Alan-Moore-foi-tão-importante-para-as-HQs
 

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