• Caro Visitante, por que não gastar alguns segundos e criar uma Conta no Fórum Valinor? Desta forma, além de não ver este aviso novamente, poderá participar de nossa comunidade, inserir suas opiniões e sugestões, fazendo parte deste que é um maiores Fóruns de Discussão do Brasil! Aproveite e cadastre-se já!

Os Lusíadas (Camões)

-Jorge-

mississippi queen
[align=justify]Os Lusíadas é uma obra poética do escritor Luís Vaz de Camões, considerada a epopeia portuguesa por excelência. Provavelmente concluída em 1556, foi publicada pela primeira vez em 1572 no período literário do Classicismo, três anos após o regresso do autor do Oriente.

A obra é composta de dez cantos, 1102 estrofes que são oitavas decassílabas, sujeitas ao esquema rímico fixo AB AB AB CC – oitava rima camoniana. A ação central é a descoberta do caminho marítimo para a Índia por Vasco da Gama, à volta da qual se vão descrevendo outros episódios da história de Portugal, glorificando o povo português.[/align]
Fonte: Wikipédia.

[align=justify]Não tem tópico? =S

Bom faz algum tempo que li Os Lusíadas mas como não tinha tópico resolvi criar ele. Já ouvi descreverem o livro (de forma humorada) como "propaganda nacionalista" e é isso mesmo: o livro é perfeito para aprender história de Portugal. (História oficial, claro, de batalhas, heróis e grandes nomes, desde a fundação do país até as Grandes Navegações) Mas também não é só isso.

Alguém tem alguma passagem preferida? Gosta? Desgosta? Está pensando em ler? [/align]
 
RE: Os Lusíadas

Bem... Não tenho o que falar sobre o livro, pois cairia em redundância, então vou falar da edição:

Que tenho aqui é a comentada pelo professor Francisco Bueno que, a meu ver, é a edição mais completa que tem, exceto do ponto de vista filológico, donde ouvi dizer tratar-se da do professor Epifânio Dias. Falo isso pelo número e pela clareza das notas, que são um verdadeiro primor! Tenho outra edição comentada aqui também, mas, desculpem-me, não sei de cor quem é o comentarista. As notas são boas, mas são inferiores em número às do Francisco Bueno; no entanto, ela apresenta alguns aspectos filológicos para o aluno de Ensino Médio, como explicitado em sua Advertência, além de ser claramente baseada na do Epifânio.

P.S.: Epifânio foi um dos maiores linguistas de nossa língua, equivalente a Said Ali, segundo Evanildo Bechara.
 
[align=justify]Sim, isso foi algo que pensei em sugerir: ler edições com notas, quanto mais melhor, e com grafia atualizada, né? que já é difícil o suficiente ler assim sem ser "As armas, & os barões aßinalados..."

Não conhecia essas outras edições, mas uma das minhas tem notas, é a edição da L&PM e até que não é má, embora algumas redundâncias exageradas nas notas.[/align]
 
O texto do Epifânio é o mesmo texto da edição do comentarista que não lembro o nome (que lapso lamentável esse meu!), com uma grafia mais arcaica.

A do Francisco não tenho certeza de qual é... Mas creio ser uma edição "mais recente" em comparação com as duas acima.

Isso tudo depende do enfoque da edição. Como as duas primeiras deste meu post são de caráter filológico, é normal que elas apliquem uma ortografia camonesca original...
 
Daria um puta filme, né não?

Como todo épico, ele é de exaltação dos valores e de reprimenda de outros, mas o vejo como mais consciente que épicos como Ilíada ou Odisséia. Camões teve muitas sacadas geniais e, pra mim, é a maior obra da Literatura de Língua Portuguesa sem dúvida. Insuperável em técnica e afins.

Mesmo se tratando da história de Portugal e sua glorificação, acho que tem pouco destaque fora dos países de Língua Portuguesa. Por mais que Dante tenha sido genial com A Divina Comédia, Camões, acredito, levou a poesia épica a outro nível, talvez o último possível, na verdade. Eu tenho preferência pel'A Divina Comédia porque curto esses lances espirituais e tudo o mais, mas Camões, em termos técnicos, foi sublime e bem melhor que Dante. Não é todo mundo que, depois de escrever um livro, tem uma métrica que leva o seu nome.

Meu episódio favorito é o do Velho do Restelo. Todo o nacionalismo da obra se ajoelha perante a esse senhor marinheiro que escracha com Portugal. A suruba na ilha também é bacana e o Adamastor é fera demais.
 
Mesmo porque existe um debate acerca se a Divina Comédia é um épico ou não... Vejo ela como sendo uma obra expositiva-enciclopédica (expositiva em suas duas acepções: a de expor algo já conhecido, a de expor algo novo), sem caráter épico, muito menos nacionalista.

Concordo plenamente quando você diz que Camões elevou a poesia épica a um nível diferente. Das poesias épicas "filhas de Virgílio", digamos, é a única que de fato pode ser equiparada com a do mantuano... E olhe que é um cargo pesado, onde outros livros de igual peso não creio que lá cheguem, como o Paradise Lost do John Milton (que foi influenciado inclusive por Camões em sua edição definitiva) ou o Gerusalemme Liberata do Tasso (igualmente influenciado, dedica até mesmo um soneto)

E não sei se concordo que Camões foi maior que Dante... Camões é equiparável a Dante tanto no sentido enciclopédico tanto no técnico, mas não creio que um seja maior que o outro. A terza rima só não tem o nome do Dante pois, se não me engano, foi o próprio Dante que a nomeou assim. Mesmo porque a oitava rima não foi inventada por Camões; Ariosto e Boiardo a utilizaram em seus Orlandos (textos que Camões consumiu, inclusive, e que são de alto nível igualmente).

Agora é claro que foi Camões que a elevou (a oitava rima) a um nível mais alto que seus antepassados, digamos.

P.S.: Obras como A Divina Comédia e Os Lusíadas só me fazem reforçar uma ideia: Virgílio é, de fato, o cânone ocidental. Não tem como negar.
 
Maior em termos técnicos, sim, mas maior pra Literatura como um todo não (aí Dante leva, acredito). Acho bastante dificil fazer o que Camões fez, inclusive com trechos remetendo a coisas que só os Simbolistas fariam. Esse caolho foi genial em diversos quesitos.

Eu não vejo problemas com a Divina sendo um épico. Pode não ser nacionalista, mas até aí Milton também não o é, né? Se pensarmos que o épico move o mundo e geralmente é uma ode a alguma coisa, Dante entra nessa roda também com a questão cristã.

Tu se refere a Virgílio e não a Homero por quê?
 
É aquilo que você disse de "mais consciente". A épica homérica é mais épica, mais poderosa, digo até mesmo mais impactante que a virgiliana. Mas ela não cruza os sentimentos dum povo; cruza basicamente apenas a mente homérica. Isso sem contar no domínio linguístico e estilístico de Virgílio, que era maior que o de Homero. E tem também o fator histórico. Virgílio é quem guia Dante em 2/3 da Divina Comédia (considero ele mais importante que Beatriz -- esta seria uma espécie de Virgília [não de Brás Cubas]), é quem nitidamente influencia Camões (Os Lusíadas começa com uma recriação do primeiro hemístiquo da Eneida...), Boiardo, Tasso, Ariosto, Milton...

Os grandes foram influenciados por Virgílio. Por mais que Homero tenha respeito (poeta sovranno, Dante diz -- Marco Lucchesi inclusive, acertadamente, vejo, diz que Dante considerava Homero maior que Virgilio), ele não é tão amado quanto Virgilio. É porque este é mais instigante, interessante, tenro, amável. Você chora com a morte de Dido, se aterroriza com a descida ao inferno, sente a brisa com seus pastores, aprende a laborar com seus ensinamentos. Virgílio é mais canônico pois ele ensina, pois ele tem o espírito de professor que Homero não tem...

Tem inclusive várias passagens dOs Lusíadas que são paráfrases (é esse o termo?) da Eneida. Arma virumque cano e As armas e os barões assinalados são clássicos; depois dou uma checada na minha edição e procuro outros...

(tem os efeitos também que são muito trasladados. Por exemplo, "As asas ao sereno e sossegado" do Canto Quinto onde você tem um grande aglomerado de sibilantes simulando uma brisa -- o que foi utilizado por Virgilio nas Bucólicas [só não sei exatamente qual e nem onde; necessita-se pesquisa])
 
Ah sim, entendi então.

Eu não nego a grandiosidade de Virgílio, mas eu o enxergo mais como uma ponte necessária entre Homero e os demais do que o cânone realmente falando.

Vamos dizer que, se Homero é o funil, Virgílio é o filtro necessário. Analogia horrível, não sei se consegui me expressar.
 
Vejo muito de Homero em Camões também. Os lusíadas são mais próximos da belicosidade dos gregos-troianos do que do simples fatum do Eneias...

Aliás, será que existe alguma espécie de análise dOs Lusíadas tendo como base a Ilíada ou a Odisseia? Não seria algo primário; mas não julgo ser errado pensar nisso... Será que Camões sabia grego? Dante, por exemplo, não sabia grego, ao que muitos dizem (conhecia Homero apenas por referências). Vou dar uma pesquisada e ver se acho algo a respeito disso...

P.S.: Uma edição crítica da editora Landy diz possuir comentários de Hennio Morgan Birchal, onde este compara a Iliada, Odisseia e a Eneida com o épico português. Quem sabe compre e dê uma olhada nesses comentários...
 
Com certeza existem trabalhos nesse sentido de comparar os épicos. Não que seja primário, mas, ao ver, Lusíadas, a referência à Ilíada é gritante (pelo menos no título). Já ao restante, vejo a Odisséia pode ser mais referente por conta da expedição marítima e os perigos enfrentados no mar.

Acho que não há a necessidade de Camões saber grego, já bastava o Latim, visto que existiam traduções, desde a época de Virgílio, aliás. Os dois épicos eram ensinados nas escolas romanas e tal.

Entretanto, como ele chegou até as obras não faz diferença. As referências existem.
 
Sim; mas essas referências também se encontram na Eneida, que é inclusive intrínseca à Iliada e à Odisseia em seus "hemístiquos". Refiro-me a uma análise que aborde os aspectos da Iliada ou da Odisseia que não foram abordados na Eneida (logo, exclusivos do texto homérico), como a sanguinolência, a força e a vivacidade das batalhas, o caráter mitológico ou imaginativo em contraposição o relato verídico, a relação paternas, as relações matrimoniais, temas mais humanísticos e isolados como a traição, a perseverança ou simplesmente a saudade (mas não numa ótica generalizada como ocorre com o saudosismo de Eneias com sua Troia devastada).

Em outras palavras, talvez generalizadoras, talvez não, analisar Os Lusíadas a partir de sua dimensão humanística e não do fatum, do destino dos lusíadas em descobrir as Índias -- como, por exemplo, um Aquiles enfurecido e protelador ou um Ulisses fiel (e procurador de conhecimento em Dante), mas não um Aquiles filho dos deuses e baluarte da guerra ou um Ulisses como esperança da dignidade familiar ou algo do tipo...
 
Eu não creio que seja de todo impossível. A sanguinolência e a vivacidade nas batalhas eu consigo ver bem nitidamente, bastando observar os contra-ataques dos portugueses para com os mouros (na primeira vez que li cheguei até mesmo a me perguntar: necessitava-se disso tudo?). O caráter mitológico não suscita muitas dúvidas: temos deuses pagãos numa época onde o cristianismo estava bem consolidado... Esses deuses atuam sobre a vida dos lusíadas da mesma forma que atuavam sobre os eneiadas; mas é essa diferença histórica que faz do relato dos Lusíadas tão próximo da Iliada ou da Odisseia.

O caráter humanístico eu não julgo de fato existir: os lusíadas estão mais próximos dos eneiadas do que dos gregos ou dos troianos... O destino dos lusíadas, o fardo que eles carregam nas costas, é maior que o dos companheiros de Eneias. Este sente saudade de sua Troia e, em dado momento da Eneida, chega até mesmo a fundar uma cidade e viver nela julgando estar na "terra prometida". Os portugueses, em contrapartida, são como se fossem meros bonecos ou fantoches dos deuses; são mais honrosos, sob certa ótica, pois provavelmente não parariam numa ilha qualquer e achariam que esta é a terra obstinada. Estão mais próximos dos valores heroicos da Iliada que dos valores da Eneida, que são mais humanos: Vasco não choraria se porventura tivesse que abandonar sua esposa ou seu filho assim como Eneias chorou...

Camões quis engrandecer o homem português e Virgílio quis simplesmente engrandecer o homem. A diferença é que esse homem virgiliano é mais palpável e mais próximo de nós que o homem camoniano que se aproxima do homem homérico, em seus valores e idealizações. O homem camoniano, o homem homérico é um heroi, um mártir. O homem virgiliano, por mais que tente, não consegue alcançar um nível de desconfiguração tão grande.

António José Saraiva, alinhado às teses do marxismo, lamentou a falta de substância dos seus personagens, que para ele são mais estereótipos do que pessoas reais, não são heróis de carne e osso, e carecem de robustez e vigor. (Wikipedia)

O que pode ser contestado, visto que o homem o qual José Saraiva se refere é provavelmente o homem moderno, o homem virgiliano; ao passo que o homem camoniano/homérico é feito em moldes clássicos...

Hegel, embora elogiando várias qualidades d' Os Lusíadas, criticou a incongruência entre o tema nacionalista e o uso de modelos formais clássicos e italianos, além de apontar uma presença excessiva da voz pessoal do poeta, em várias passagens em que usa a primeira pessoa do singular para tecer uma variedade de comentários, interrompendo o fluxo da ação épica. (Wikipedia)

A justificativa disso, pra mim, se encontra em:

Sérgio Buarque de Holanda disse que as cores épicas com que Camões pintou os feitos lusitanos não correspondem tanto a "uma aspiração generosa e ascendente", mas espelham antes uma retrospeção melancólica da glória extinta que mais desfigurou do que fixou a verdadeira fisionomia moral dos agentes da expansão marítima. (Wikipedia)

Coisa que concordo: Camões pintou um Portugal de seus sonhos, o que não desmerece o relato épico do nosso grande poeta, visto que o grego de Homero ou o romano de Virgílio ou a Beatriz de Dante são igualmente sonhados e idealizados... Vejo inclusive como sendo um ingrediente fundamental da poesia épica: o sonho do artista, a visão do artista.
 
Um documentariozinho português sobre "Os Lusíadas", em cinco partes.

http://www.youtube.com/watch?v=bezBEKvJXn4
http://www.youtube.com/watch?v=JDrXTZKmm-A
http://www.youtube.com/watch?v=dSTXpGmh49s
http://www.youtube.com/watch?v=m7whcfj7pq0
http://www.youtube.com/watch?v=P136_1vsJVA
 
A visão do artista é fundamental em qualquer obra, épica ou não. Se não há sonho, não há obra.

A utilização dos deuses gregos, a meu ver, é só um recurso estilístico. São utilizados pra demonstrar a grandiosidade do feito dos portugueses e dar um caráter mais mítico à obra. Assim como o cabo das tormentas personificado em Adamastor. Não os vejo como fantoches, mas, vejo mais como um destino que eles deveriam cumprir.

Na verdade, Ilíada e Odisséia também tem essa questão do destino a ser cumprido. Enquanto que um é sobre a ira de Aquiles que levou uma civilização inteira à morte, a outra trata da astúcia e orgulho dum grande guerreiro. É interessante ver que a morte de Aquiles acontece quando este ultrapassa seu métron, enquanto que Ulisses, ao ultrapassá-lo, reconhece e não se embebeda no orgulho: várias vezes ele se vangloria, mas quando percebe volta ao seu métron.

Não há, nem na Ilíada, Odisséia ou Eneida, a indagação da necessidade dos acontecimentos. Os portugueses d'Os Lusíadas não são os portugueses ideais se levarmos em consideração o episódio d'O Velho do Restelo que é o mais importante da obra. O mais importante porque se quebra todo o heroísmo e a necessidade de se fazer o que se tem feito durante a expedição.

É até possível que, assim como previu boa parte do que viria a acontecer na Literatura, Camões tenha previsto a pergunta famosa de Pessoa e já a respondido com o Velho em seu épico, mas não podemos negar uma lucidez (que sobrou n'A Eneida) a'Os Lusíadas: o questionamento é, talvez, o ponto alto e principal da obra toda. Na verdade, é o único trecho em que se vê perguntas, não afirmações.

Concordo que os valores dos homens d'Os Lusíadas são uma emulação do que aconteceu na Ilíada e na Odisséia, até vejo a questão da violência portuguesa em relação aos mouros motivada pelo mesmo motivo da ira de Aquiles contra Heitor, mas não é possível negar a lucidez do épico português.

Também não concordo que o homem de Virgílio seja mais palpável que o homem homérico. Pra mim são todos inatingíveis por serem estereótipos necessários aos acontecimentos da obra, cada um a seu jeito, claro: Enéias era o romano ideal, Aquiles o que acontecia com aquele que ultrapassasse a sua medida e Ulisses o grego ideal.
 

Valinor 2023

Total arrecadado
R$2.434,79
Termina em:
Back
Topo