Gerbur Forja-Quente
Defensor do Povo de Durin
O looping da História: Denethor
Uma das passagens que mais gosto n’O Retorno do Rei é o relacionamento do Lorde Denethor e seu filho Faramir. Os filmes também capricharam para mostrar bem essa dinâmica dos dois. É interessante o momento em que Denethor manda Faramir retornar com seus poucos homens para reconquistar a cidade perdida de Osgiliath, pouco tempo depois que Faramir a perdeu para os orcs. A cidade é muito importante estrategicamente, pois ela é o último obstáculo que separa Mordor de Minas Tirith, mas para Denethor ela é ainda mais importante porque foi seu filho amado, Boromir, que a tinha conquistado dos orcs. Quando Boromir parte para Valfenda para decifrar um sonho enigmático, fica a encargo de Faramir defender a cidade, e ele a perde.
O diálogo de pai e filho nessa hora é extraordinário, no seu término, Faramir ousadamente questiona na frente de todos: “Você gostaria de nossos lugares tivessem sido trocados. Que eu tivesse morrido e Boromir vivesse?” e mais audaciosa ainda é a resposta que Denethor da a seu último filho: “Sim, realmente gostaria”.
Numa outra conversa, num Conselho, sobre as estratégias de guerra, Denethor alfineta: “Não entregarei o Rio e o Pelennor sem lutar – não se houver aqui um capitão com coragem de fazer a vontade de seu senhor.” Todos os capitães ficam em silêncio, pois a trata-se de uma missão impossível, sem a mais remota possibilidade de vitória. E com toda a classe de um nobre, Faramir diz: “Não me oponho à sua vontade, pai. Uma vez que Boromir lhe foi roubado, farei o que puder no lugar dele – se o senhor assim ordenar”. Denethor sumariamente responde: “Assim ordeno”. Faramir continua: “Então adeus, mas se eu retornar, faça melhor juízo de mim”. E Denethor termina a conversa: “Isso depende de como você vai retornar”, como quem diz: “morra se for preciso, mas não retorne derrotado”. Quando Faramir aceita a missão de reconquistar Osgiliath ele sabe que essa é uma missão perdida. Ele sabe que caminha para a morte certa, e como o pai prefere Boromir a ele, agora é sua vez de morrer. Esse é o peso desse diálogo.
É tão claro que a missão está destinada ao fracasso que todos na cidade sabem disso. O filme mostra essa cena brilhantemente, pois mostra as mulheres, irmãs e filhas dos soldados jogando flores por onde os soldados de Faramir estão passando, como quem vai visitar os entes queridos mortos no cemitério e deixa flores para eles. Está claro então, que toda a cidade sabe que aqueles soldados já são homens mortos.
Gandalf, tenta dar um último conselho desesperado a Faramir: “Não jogue fora sua vida temerariamente ou movido pela mágoa...seu pai o ama, Faramir, e ele se lembrará disso antes do fim”. Olha que bonito esse trecho: “Seu pai o ama.” Isso deveria confortar não é? Mas Gandalf é verdadeiro e ele continua a frase: “e ele se lembrará disso antes do fim”, ora, se Denethor vai se lembrar é porque já esqueceu, não é mesmo? Essa é uma fala consoladora, mas com o peso da verdade, como as falas do mago costumam ser, o que muitas vezes gera ressentimento a quem escuta e também alguns novos apelidos ao peregrino cinzento, como “corvo da tempestade”, que ele ganhou em Rohan.
Mas voltando a Denethor, porque será que esse velho é tão amargo? Tão terrível? A morte de um filho querido justifica condenar a morte o outro que ainda vive? Bem, fazendo um exercício que gosto muito, que é abrir o livro aleatoriamente e ler a página que abriu, penso que encontrei uma hipótese que justifique o temperamento do regente de Gondor no fim de sua vida. Pois cai na página 342 do Retorno do Rei. E esse trecho conta um pouco mais da vida de Denethor antes dele se tornar o regente.
Na época, o regente de Gondor era seu pai, Lorde Ecthelion, que já se preparava para a guerra contra Mordor encorajando todos os homens de valor a entrar para o exército, mas um deles se destacava dos demais, um homem que não tinha nome, nem passado, sabiam que ele tinha servido o Rei Thengel de Rohan, mas não era um dos rohirrim, ao homem misterioso, chamavam Thorongil, Águia da Estrela, por ser ágil e usar uma estrela sobre a capa. Espere. Um grande guerreiro que usa uma estrela? Onde já vimos isso? Aragorn. Sim, é o próprio e mais um de seus muitos nomes.
Ecthelion contava então com os conselhos de Thorongil e de seu filho, Denethor, que nas palavras do professor: “Denethor II era um homem orgulhoso, alto, valente, e mais majestoso que aparecera em Gondor por muitas vidas de homens; também era sábio, enxergava longe, além de ser versado nas tradições.” Percebemos então, que o regente Ecthelion estava bem servido, pois os grandes estavam ao seu lado. Mas qual a relação desses dois homens? Como o regente e o povo viam ambos? Tolkien continua: “De fato, [Denethor] era semelhante à Thorongil como se fosse um parente próximo, apesar disso sempre ficava em posição inferior ao estranho nos corações dos homens e na estima do pai”. A relação entre ambos era então de rivalidade, não por que Thorongil quis assim, mas porque Ecthelion e o povo comparavam ambos e Denethor perdia, levando-o a considerar Thorongil como um rival.
Outro fato importante que Tolkien ressalta é que, apesar dessa rivalidade velada, apenas em uma coisa ambos divergiam nos conselhos dado a Ecthelion: Thorongil aconselhava o regente a não depositar confiança no mago Saruman, mas preferir Gandalf. Denethor, por sua vez, não nutria muita amizade pelo peregrino cinzento: “Mais tarde... muitos acreditaram que Denethor, que tinha uma mente mais perspicaz e enxergava mais longe que os homens de seu tempo, descobrira quem na verdade era aquele forasteiro de nome Thorongil e suspeitara que ele e Mithrandir pretendiam suplantá-lo”.
Isso é muito interessante, pois não mostra Denethor como um velho amargurado e louco (como o filme pode sugerir), mas como uma pessoa que tinha pensamentos compatíveis aos pensamentos de Thorongil (Aragorn), à exceção de um. Isso nos mostra então um Denethor absolutamente do bem e inteligente. Além disso, ele já era conhecido por sua habilidade de “enxergar mais longe que os homens de seu tempo”, isso muito antes de usar o palantír. Dessa forma ele é definido com a principal característica do maior inimigo da Terra-Média: Sauron. Ora, se a Sombra e a maldade têm na figura de líder um Grande Olho que tudo vê no alto de sua torre, os Povos Livres podem contar também com Denethor que “enxerga” além de seu tempo também do alto de sua torre branca. Veja que é Denethor, e não Thorongil, que dessa forma, rivaliza com Sauron, o Inimigo do Mundo. Nessa época, antes da angústia e do desespero, ele é a esperança, se Sauron é o Olho do mal, Denethor enxerga pelo bem.
Voltando à linha do tempo: pouco antes da morte de Ecthelion, o misterioso guerreiro foi embora deixando para trás as homenagens que lhe eram devidas e desapareceu tão inesperadamente quanto surgiu tempos atrás.
Olhem que interessante: Denethor e Thorongil eram semelhantes “como parentes próximos” e, de certa forma, competiam pelo amor do “pai” Ecthelion. Eram então, como irmãos. Se formos pensar nessa dinâmica pelo lado psicológico, podemos supor que eles viviam uma rivalidade fraternal, eram como se fossem irmãos rivais. No final, Denethor vence, mas não por ser considerado o melhor e sim porque Thorongil desistiu de sua vitória e desapareceu, deixando para Denethor apenas os quatro últimos anos de vida do pai.
Quando Denethor assume a regência e se torna “o pai”, ele acaba, inconscientemente, repetindo a história de sua família original. Sua esposa, Finduilas, morreu cedo, ficando apenas o pai e os filhos (na sua família original sua mãe não é relatada, talvez também morrera cedo e a dinâmica da família gira entorno do relacionamento do pai e dos filhos, no caso Ecthelion [pai] e Denethor e Thorongil [irmãos]): Faramir e Boromir.
Pode-se pensar, que apesar da grande semelhança dos irmãos-rivais, na família original de Denethor, havia uma diferença entre eles que talvez pudessem definir melhor ambos aos olhos do “pai” Ecthelion: Denethor era o sábio, esse é o seu principal papel, enquanto Thorongil, apesar de ser também muito inteligente, pode ser melhor definido como o guerreiro, esse papel Thorongil assumiu e Denethor, não.
Na família posterior de Denethor encontramos a mesma conjuntura: Faramir é o sábio e Boromir é o guerreiro. Alguém pode dizer que Faramir também era guerreiro e lutou em batalhas e isso é verdade. Mas não é isso que o define. O papel de sábio lhe cai muito melhor, enquanto o papel de guerreiro cai bem melhor em Boromir. Quando Faramir encontra Frodo, Sam e Gollum, isso fica muito evidente. Faramir conversa atentamente com Frodo, mede suas palavras, lê seu coração e depois que obtêm muitas das respostas que queria pondera sobre qual caminho seguir, qual deve ser sua decisão.
O próprio Tolkien compara os irmãos e deixa claros os papéis de ambos, em suas palavras: “Boromir... assemelhava-se com o rei Eärnur de antigamente, recusando-se a casar e divertindo-se principalmente com armas, forte e destemido, preocupava-se pouco com estudos e tradição, exceto histórias antigas de batalhas. Faramir... tinha uma mente diferente. Decifrava o coração dos homens com a mesma perspicácia do pai... era um amante da tradição e da música; portanto, muitos naquela época o julgavam menos corajoso que o irmão... Acolheu Gandalf todas as vezes que este visitou a cidade, e aprendeu tudo o que pôde da sabedoria do mago; nesse e em muitos outros pontos desagradou o pai”.
Pode-se pensar que também havia uma rivalidade fraternal entre esses dois irmãos. Apesar de se darem bem, Faramir sentia que Boromir era mais amado, na competição pelo amor do pai, assim como Denethor (filho), ele sempre perdeu para o irmão.
Mas olhem que interessante: quem se parece mais com Denethor (pai) é Faramir e não Boromir. Faramir é o sábio, como Denethor sempre foi. Porque então Denethor preferia Boromir? Na minha opinião, porque Denethor repetiu sua própria história. O pai (Ecthelion) amava mais o filho guerreiro (Thorongil) em detrimento do filho sábio (Denethor). Exatamente por isso, o pai (Denethor) amou mais o filho guerreiro (Boromir) em detrimento do filho sábio (Faramir). Interessante, não? Os pais da fantasia, assim como os da realidade, muitas vezes acabam consumindo a si próprios e aos filhos em suas neuroses pessoais, sem jamais desconfiar do que de fato está ocorrendo. A História (como um todo, não a de Tolkien) nem sempre é criativa e acaba dando loopings, acaba se repetindo, mudam os nomes dos personagens, mas seus papéis, muitas vezes permanecem.
Espero que os corajosos que chegaram até o final do post tenham apreciado a leitura. Obrigado.
Obs: Os trechos citados foram retirados das páginas 76, 81, 342 e 343 d’O Retorno do Rei.
Uma das passagens que mais gosto n’O Retorno do Rei é o relacionamento do Lorde Denethor e seu filho Faramir. Os filmes também capricharam para mostrar bem essa dinâmica dos dois. É interessante o momento em que Denethor manda Faramir retornar com seus poucos homens para reconquistar a cidade perdida de Osgiliath, pouco tempo depois que Faramir a perdeu para os orcs. A cidade é muito importante estrategicamente, pois ela é o último obstáculo que separa Mordor de Minas Tirith, mas para Denethor ela é ainda mais importante porque foi seu filho amado, Boromir, que a tinha conquistado dos orcs. Quando Boromir parte para Valfenda para decifrar um sonho enigmático, fica a encargo de Faramir defender a cidade, e ele a perde.
O diálogo de pai e filho nessa hora é extraordinário, no seu término, Faramir ousadamente questiona na frente de todos: “Você gostaria de nossos lugares tivessem sido trocados. Que eu tivesse morrido e Boromir vivesse?” e mais audaciosa ainda é a resposta que Denethor da a seu último filho: “Sim, realmente gostaria”.
Numa outra conversa, num Conselho, sobre as estratégias de guerra, Denethor alfineta: “Não entregarei o Rio e o Pelennor sem lutar – não se houver aqui um capitão com coragem de fazer a vontade de seu senhor.” Todos os capitães ficam em silêncio, pois a trata-se de uma missão impossível, sem a mais remota possibilidade de vitória. E com toda a classe de um nobre, Faramir diz: “Não me oponho à sua vontade, pai. Uma vez que Boromir lhe foi roubado, farei o que puder no lugar dele – se o senhor assim ordenar”. Denethor sumariamente responde: “Assim ordeno”. Faramir continua: “Então adeus, mas se eu retornar, faça melhor juízo de mim”. E Denethor termina a conversa: “Isso depende de como você vai retornar”, como quem diz: “morra se for preciso, mas não retorne derrotado”. Quando Faramir aceita a missão de reconquistar Osgiliath ele sabe que essa é uma missão perdida. Ele sabe que caminha para a morte certa, e como o pai prefere Boromir a ele, agora é sua vez de morrer. Esse é o peso desse diálogo.
É tão claro que a missão está destinada ao fracasso que todos na cidade sabem disso. O filme mostra essa cena brilhantemente, pois mostra as mulheres, irmãs e filhas dos soldados jogando flores por onde os soldados de Faramir estão passando, como quem vai visitar os entes queridos mortos no cemitério e deixa flores para eles. Está claro então, que toda a cidade sabe que aqueles soldados já são homens mortos.
Gandalf, tenta dar um último conselho desesperado a Faramir: “Não jogue fora sua vida temerariamente ou movido pela mágoa...seu pai o ama, Faramir, e ele se lembrará disso antes do fim”. Olha que bonito esse trecho: “Seu pai o ama.” Isso deveria confortar não é? Mas Gandalf é verdadeiro e ele continua a frase: “e ele se lembrará disso antes do fim”, ora, se Denethor vai se lembrar é porque já esqueceu, não é mesmo? Essa é uma fala consoladora, mas com o peso da verdade, como as falas do mago costumam ser, o que muitas vezes gera ressentimento a quem escuta e também alguns novos apelidos ao peregrino cinzento, como “corvo da tempestade”, que ele ganhou em Rohan.
Mas voltando a Denethor, porque será que esse velho é tão amargo? Tão terrível? A morte de um filho querido justifica condenar a morte o outro que ainda vive? Bem, fazendo um exercício que gosto muito, que é abrir o livro aleatoriamente e ler a página que abriu, penso que encontrei uma hipótese que justifique o temperamento do regente de Gondor no fim de sua vida. Pois cai na página 342 do Retorno do Rei. E esse trecho conta um pouco mais da vida de Denethor antes dele se tornar o regente.
Na época, o regente de Gondor era seu pai, Lorde Ecthelion, que já se preparava para a guerra contra Mordor encorajando todos os homens de valor a entrar para o exército, mas um deles se destacava dos demais, um homem que não tinha nome, nem passado, sabiam que ele tinha servido o Rei Thengel de Rohan, mas não era um dos rohirrim, ao homem misterioso, chamavam Thorongil, Águia da Estrela, por ser ágil e usar uma estrela sobre a capa. Espere. Um grande guerreiro que usa uma estrela? Onde já vimos isso? Aragorn. Sim, é o próprio e mais um de seus muitos nomes.
Ecthelion contava então com os conselhos de Thorongil e de seu filho, Denethor, que nas palavras do professor: “Denethor II era um homem orgulhoso, alto, valente, e mais majestoso que aparecera em Gondor por muitas vidas de homens; também era sábio, enxergava longe, além de ser versado nas tradições.” Percebemos então, que o regente Ecthelion estava bem servido, pois os grandes estavam ao seu lado. Mas qual a relação desses dois homens? Como o regente e o povo viam ambos? Tolkien continua: “De fato, [Denethor] era semelhante à Thorongil como se fosse um parente próximo, apesar disso sempre ficava em posição inferior ao estranho nos corações dos homens e na estima do pai”. A relação entre ambos era então de rivalidade, não por que Thorongil quis assim, mas porque Ecthelion e o povo comparavam ambos e Denethor perdia, levando-o a considerar Thorongil como um rival.
Outro fato importante que Tolkien ressalta é que, apesar dessa rivalidade velada, apenas em uma coisa ambos divergiam nos conselhos dado a Ecthelion: Thorongil aconselhava o regente a não depositar confiança no mago Saruman, mas preferir Gandalf. Denethor, por sua vez, não nutria muita amizade pelo peregrino cinzento: “Mais tarde... muitos acreditaram que Denethor, que tinha uma mente mais perspicaz e enxergava mais longe que os homens de seu tempo, descobrira quem na verdade era aquele forasteiro de nome Thorongil e suspeitara que ele e Mithrandir pretendiam suplantá-lo”.
Isso é muito interessante, pois não mostra Denethor como um velho amargurado e louco (como o filme pode sugerir), mas como uma pessoa que tinha pensamentos compatíveis aos pensamentos de Thorongil (Aragorn), à exceção de um. Isso nos mostra então um Denethor absolutamente do bem e inteligente. Além disso, ele já era conhecido por sua habilidade de “enxergar mais longe que os homens de seu tempo”, isso muito antes de usar o palantír. Dessa forma ele é definido com a principal característica do maior inimigo da Terra-Média: Sauron. Ora, se a Sombra e a maldade têm na figura de líder um Grande Olho que tudo vê no alto de sua torre, os Povos Livres podem contar também com Denethor que “enxerga” além de seu tempo também do alto de sua torre branca. Veja que é Denethor, e não Thorongil, que dessa forma, rivaliza com Sauron, o Inimigo do Mundo. Nessa época, antes da angústia e do desespero, ele é a esperança, se Sauron é o Olho do mal, Denethor enxerga pelo bem.
Voltando à linha do tempo: pouco antes da morte de Ecthelion, o misterioso guerreiro foi embora deixando para trás as homenagens que lhe eram devidas e desapareceu tão inesperadamente quanto surgiu tempos atrás.
Olhem que interessante: Denethor e Thorongil eram semelhantes “como parentes próximos” e, de certa forma, competiam pelo amor do “pai” Ecthelion. Eram então, como irmãos. Se formos pensar nessa dinâmica pelo lado psicológico, podemos supor que eles viviam uma rivalidade fraternal, eram como se fossem irmãos rivais. No final, Denethor vence, mas não por ser considerado o melhor e sim porque Thorongil desistiu de sua vitória e desapareceu, deixando para Denethor apenas os quatro últimos anos de vida do pai.
Quando Denethor assume a regência e se torna “o pai”, ele acaba, inconscientemente, repetindo a história de sua família original. Sua esposa, Finduilas, morreu cedo, ficando apenas o pai e os filhos (na sua família original sua mãe não é relatada, talvez também morrera cedo e a dinâmica da família gira entorno do relacionamento do pai e dos filhos, no caso Ecthelion [pai] e Denethor e Thorongil [irmãos]): Faramir e Boromir.
Pode-se pensar, que apesar da grande semelhança dos irmãos-rivais, na família original de Denethor, havia uma diferença entre eles que talvez pudessem definir melhor ambos aos olhos do “pai” Ecthelion: Denethor era o sábio, esse é o seu principal papel, enquanto Thorongil, apesar de ser também muito inteligente, pode ser melhor definido como o guerreiro, esse papel Thorongil assumiu e Denethor, não.
Na família posterior de Denethor encontramos a mesma conjuntura: Faramir é o sábio e Boromir é o guerreiro. Alguém pode dizer que Faramir também era guerreiro e lutou em batalhas e isso é verdade. Mas não é isso que o define. O papel de sábio lhe cai muito melhor, enquanto o papel de guerreiro cai bem melhor em Boromir. Quando Faramir encontra Frodo, Sam e Gollum, isso fica muito evidente. Faramir conversa atentamente com Frodo, mede suas palavras, lê seu coração e depois que obtêm muitas das respostas que queria pondera sobre qual caminho seguir, qual deve ser sua decisão.
O próprio Tolkien compara os irmãos e deixa claros os papéis de ambos, em suas palavras: “Boromir... assemelhava-se com o rei Eärnur de antigamente, recusando-se a casar e divertindo-se principalmente com armas, forte e destemido, preocupava-se pouco com estudos e tradição, exceto histórias antigas de batalhas. Faramir... tinha uma mente diferente. Decifrava o coração dos homens com a mesma perspicácia do pai... era um amante da tradição e da música; portanto, muitos naquela época o julgavam menos corajoso que o irmão... Acolheu Gandalf todas as vezes que este visitou a cidade, e aprendeu tudo o que pôde da sabedoria do mago; nesse e em muitos outros pontos desagradou o pai”.
Pode-se pensar que também havia uma rivalidade fraternal entre esses dois irmãos. Apesar de se darem bem, Faramir sentia que Boromir era mais amado, na competição pelo amor do pai, assim como Denethor (filho), ele sempre perdeu para o irmão.
Mas olhem que interessante: quem se parece mais com Denethor (pai) é Faramir e não Boromir. Faramir é o sábio, como Denethor sempre foi. Porque então Denethor preferia Boromir? Na minha opinião, porque Denethor repetiu sua própria história. O pai (Ecthelion) amava mais o filho guerreiro (Thorongil) em detrimento do filho sábio (Denethor). Exatamente por isso, o pai (Denethor) amou mais o filho guerreiro (Boromir) em detrimento do filho sábio (Faramir). Interessante, não? Os pais da fantasia, assim como os da realidade, muitas vezes acabam consumindo a si próprios e aos filhos em suas neuroses pessoais, sem jamais desconfiar do que de fato está ocorrendo. A História (como um todo, não a de Tolkien) nem sempre é criativa e acaba dando loopings, acaba se repetindo, mudam os nomes dos personagens, mas seus papéis, muitas vezes permanecem.
Espero que os corajosos que chegaram até o final do post tenham apreciado a leitura. Obrigado.
Obs: Os trechos citados foram retirados das páginas 76, 81, 342 e 343 d’O Retorno do Rei.