Re: Tropa de Elite (Brasil, 2007)
primula disse:
Com o adiantamento da estréia, espero que não tirem de cartaz antes de meados de novembro
E pq não?
Porque quero assistir de novo com o Mayoros, meu morzinho. É o tipo de filme romântico que gosto de assistir com ele. Lembra-me 1996 ou 1995 quando saímos pela primeira vez para assistir mortal combat a meu pedido.
Menekupo disse:
- E ai maconherinho, beleza? Cigarro inocente né? Então seu dinheiro mata 10 por dia na favela.
Cuidado Mene. Não use uma figura de linguagem tão restritiva.
A seguir leia somente se viu o filme. Não quero usar spoiler porque encheu a paciência lá no tópico do Naruto e brocha na hora da discussão.
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A palavra que ficou durante todo o filme foi SISTEMA.
Mas o que me chamou a atenção foi a abordagem tão bem colocada e estruturada ao longo do filme em mostrar que a polícia ficou desse jeito por causa do sistema e o sistema reclama que a polícia é assim.
A polícia basicamente está a serviço de "uns neguinhos folgados". E se vamos para a sala de aula do professor de Filosofia "imparcial"(vide comentário abaixo), esses mesmos neguinhos folgados reclamam da truculência da polícia, truculência não dirigida aos folgadinhos mas para proteger os folgadinhos.
Aqui cabe uma justiça poética, quando Nascimento pega o playboy (adorei não usarem maurícinho
) e enfia a cara do FDP no buraco do estatística gritando que quem matou o homem não foi o Bope, mas toda a sociedade. De certa forma, sim ele foi truculento e engraçado que ele foi truculento justo com o playboy!
E a sociedade-sistema corrompe porque somos culturalmente assim. Somos compreensivos demais, tolerantes demais com o errado (coitado, deixa ele), mas não somos tolerantes com o certo (ihhhh mané, trouxa).
Partindo do menino de rua, temos pena a seguir do pedinte, que temos pena do trabalhador humilde mas que faz coisas questionáveis, depois para o menino rico que andou em más companhias e se desencaminhou, compreendendo a pressão e angústia de pai ocupado que não teve tempo de educar o filho e estragou o garoto com brinquedos caros, passando a mão na cabeça do compadre que perdeu de pouco a eleição por "difamação, indo para o Renan que na cara dura nos dá um tapa merecido por termos chegado a este ponto.
Porque ao mesmo tempo, logo depois de ter pena (míseros 10 anos) transformam um menino em homem, um desencaminhado em ladrão compulsivo, um corrupto leve em assassino e por aí vai.
Aí todo mundo que antes era tão compreensivo pede redução penal, pena de morte, etc..
Mas o pior de tudo é que as pessoas não querem tomar o fardo da responsabilidade. A culpa é toda da truculência da polícia. E realmente eles são truculentos e não sou simpática à corrupção deles porque recebem baixos salários. Se fosse assim, professores dão a vida para formar cidadãos e todos eles recebem propina para deixar passar algum aluno mau preparado para a vida? E os professores de periferia que colocam em risco suas vidas, porque eles não se corromperam? (mas endurecem)
Por fim, o que mais me deixou eufórica não foi a vingança, mas o tapa na cara de que este tipo de cultura da corrupção é traiçoeira. Tava achando que tava levando vantagem, mermão? Mas se todo mundo leva, quem tá no prejuízo?
A ONG estava na favela porque era "amiga" do traficante. Mas que aliança mais frágil... quando surge uma mísera suspeita o amigão se torna um monstro.
O policial corrupto é passado para trás pelo superior direto. Tudo amizade. Que amigos, heim?
Por mais errada que seja o Bope, e ela também tem grandes chances de estar maculada pela nódoa da corrupção agora de acordo com o autor, vemos que um ambiente sem corrupção gera amizades de verdade. Não vou entrar nos méritos e nas merdas do Bope. Estou falando de mostrar o que significa ter amigos de verdade, de não ficar se iludindo achando que compra segurança. Segurança frágil e falsa da corrupção.
Manfred von Richtoffen tão seguro de sua segurança comprada com dinheiro desviado da DERSA. Quem diria que sua filhinha querida quem os mataria? Mas mesmo se não fosse ela... Ives Otta não morreu nas mãos do segurança de seu pai?
O que importa é mostrar não apenas a pouca vergonha, mas mostrar que não vale a pena porque não é verdadeira a riqueza e a boa vida. Tem de ficar esperto senão te apagam, cara. Não que os caras do Bope não morram. Morrem. Mas quando morrem a perda é sentida de forma real.
E não apenas luto forçado para mostrar a força do NOVO chefão (que afinal acaba ganhando com a morte do antigo traficante chefão). Grandes amigos, né?
E fica ainda mais evidente a imagem, quando realçamos o contraste. Daí a importância de mostrar o protagonista com uma certa dose de recompensa. Perdeu a mulher? (grande coisa eu também não gostei daquele chuchu aguado) Não pode ver o filho? Tudo bem, mas ainda assim ele teve mais do que tem o corrupto que acha que está abafando (cade a família dele? só pode ficar nas boates e azarando prostitutas?), mas na verdade precisava mesmo é ficar esperto e atento o tempo todo para não se foder. E ficar em tensão o tempo todo por conta de fogo amigo é foda.
*A aula de Filosofia do Direito ilustra bem a mentalidade novo-burguês medíocre de nossa "intelectuária", a mesma que forma um monte de administradores de empresa que não conhecem chão de fábrica, que se bota a opinar sem nem ao mesmo conhecer mais que um ângulo de um fato.
Falei "imparcial", porque é o que acontece com vários professores "esclarecidos": eles só querem ouvir aquilo que ele acha certo. E o certo não é ficar do lado da polícia. Mas também não devia ser certo ficar do lado do traficante.
Repetindo a analogia do contraste da imagem, aquela classe toda "cheia de razão, revoltada com a truculência", e não deixando o Matias falar é o máximo da tragicomédia: liberdade de expressão tão somente para quem tiver a mesma opinião. Essa cena fica ainda mais forte quando no enterro de Neto, a menina chega para Matias e ele pergunta "o que você veio fazer aqui?"
Ela responde na defensiva "Eu não vim aqui discutir", mas a réplica foi ainda melhor "eu não estou discutindo, eu perguntei o que você veio fazer aqui?"
Pode haver algo mais tapa de pelica? Repensando a frase de James Watson, que de neutra todo mundo interpretou de forma racista, é a mesma coisa. A malícia está normlamente nos ouvidos e não necessariamente na boca. Aqui, a intolerância não estava na figura da polícia (Matias) mas da sociedade. Afinal é a sociedade que tem pena do menino de rua, também pede redução da maioridade penal e pena de morte. Não é coerente como a polícia: ela é apenas truculenta e não tem pena de "gente safada".