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[Ravelion][Contos de Phakzan][L]

Chuck Norris

Usuário
Aproveitando o tópico de muito tempo atrás, vim renovar um pouco as coisas. Embora ainda salvos, não pretendo utilizar os escritos que havia postado aqui. Comecei tudo de novo e, caso alguém se interesse pela estória, gostaria de uma opinião crítica como leitor - sei que há muito o que melhorar, e para isso, nada melhor que ouvir boas opiniões.



No Vale

Em meio a nuvens cinzentas, o sol se erguia lentamente. Seu brilho era ofuscado pelo cume da montanha, permitindo aos moradores do vilarejo mais alguns minutos de sono. Esta, alta e imponente, se estendia ao longo de todo o vale até morrer nas pradarias do norte: e ali nada mais vivia senão uma fina relva verde-esmeralda. Alguns velhos contadores de estórias diziam que depois vinha o mar pelo qual Äl-Phakzan e Äl-Dargoreth chegaram, exilados da Ilha dos Anciões; mas o fato é que ninguém jamais se aventurara para além das pradarias e o que havia adiante permanecia um mistério. De fato, poucos foram aqueles que sequer atravessaram a montanha.
O vilarejo de Bryt era rodeado por uma muralha de madeira. O formato cilíndrico aliado ao pequeno intervalo entre os pilares não escondia a pouca ciência empregada na construção: tratava-se de grandes troncos cuidadosamente enfileirados, lado a lado. A base larga ia se afunilando na direção superior, dando-lhes o formato de grandes espetos. Embora não fosse alta - e tampouco bela-, sua resistência era inquestionável. Já estava gasta pelo tempo e pelos repetidos ataques das bestas que saíam do vale nas noites de inverno, e agora que este se aproximava do fim, os vilões já começavam a se preparar para alguns reparos e pequenos reforços. Todos estavam agitados. A primavera era, sem dúvidas, uma estação muito esperada por eles. O clima ficava mais ameno e as crianças saíam para brincar nas árvores e nadar no rio, pois as bestas desapareciam dali e todos podiam dormir tranqüilos. Recentemente, o efeito dessa proximidade já era sentido pela população, que havia deixado de lado a costumeira aparência apática para sair de suas casas, animando-se com os dias vindouros. É importante ressaltar, contudo, que essa visão não era unânime em Bryt, já que acima de qualquer outro lugar o vilarejo contava com caçadores valorosos, conhecidos em toda a região; e estes se entristeciam profundamente, pois o resto do ano seria tedioso e suas caças voltariam a ser cervos e outros animais cuja resistência seria mínima.
O centro era marcado por uma arena oval razoavelmente grande, semelhante a um coliseu em miniatura. Era cercada por um muro baixo, feito de madeira. Ao invés da arquibancada grandiosa, banquinhos de aparência nova e agradável estavam dispostos ao longo de seu perímetro. Ao redor disso havia ainda uma bela praça, recheada de arbustos, flores e mais alguns bancos espalhados aleatoriamente. Ali, o pavimento da rua se constituía de pedras cinzentas toscamente agrupadas. Uma larga circunferência, marcada por casas altas e pitorescas, delimitava a área onde a maioria dos moradores se concentrava durante o dia, ora fossem os velhos em suas intermináveis prosas, ora fossem os caçadores duelando na arena. Os caminhos que conduziam ao restante da cidade tinham origem nos extremos dessa circunferência, arrastando-se até os pesados portões de aço que davam para fora do vilarejo. Eram quatro, e com exceção da saída sul – que dava para a montanha – todos os outros conduziam ao vale.
Escassa, a neve agora se limitava apenas ao sopé e pouquíssimos outros pontos da montanha onde os raios solares não alcançavam. Imediatamente após a muralha de Bryt, junto à íngreme encosta, começava o vale profundo e denso. Sombrio, até mesmo. A fina nascente que brotava nos picos enevoados agora se revelava um caudaloso rio, cuja água cristalina reluzia em meio ao breu. Com grande dificuldade a luz penetrava por entre os galhos das árvores grandes e frondosas, tão antigas quanto a própria montanha e tudo mais que se conhecia. Havia qualquer coisa de estranho ou, no mínimo, levemente misterioso nelas. Talvez pelos animais moribundos que se refugiassem em suas fendas, ou mesmo pelo próprio formato do tronco, que muitas vezes dava a impressão de as árvores estarem observando tudo à sua volta, desconfiadas. Quem sabe fosse simplesmente o fato de estarem lá desde o início dos tempos... Ninguém saberia dizer. Uma delas, em especial, se destacava por sua magnitude. O tronco, notavelmente mais alto que os outros, contava com uma casca grossa repleta de rachaduras largas e profundas, nas quais de quando em vez emergiam sons semelhantes a gritos estridentes - que não se propagavam muito, diga-se de passagem, pois eram sufocados pelo silêncio mortal que reinava no vale. A aparência medonha afugentava até mesmo os animais, e ao seu redor o mato não ousava crescer, gerando um pequeno descampado. Muitos consideravam aquela árvore agourenta (como assim a denominavam) um símbolo do mal, atribuindo a ela toda e qualquer desgraça que ocorresse na região. A maioria das pessoas, porém, acreditavam exatamente no contrário: viam-na como uma benção para o vilarejo. Independentemente disso, parecia ser amais antiga. Sábia e silenciosa, provavelmente fora a primeira a nascer.
Ravelion descansava, recostado em seu tronco. Sentia-se inexplicavelmente bem perto dela, como se não houvesse lugar mais seguro no mundo. O usual silêncio fúnebre chegava a ser inquietante, quebrado periodicamente apenas pelo farfalhar dos galhos. A criança franzina devia ter não mais que dez anos de idade. Seus olhos cinzentos eram extremamente vivos: vigiavam tudo ao redor minuciosamente, como um animal pronto para se desvencilhar do ataque que não tardaria a vir. Ele estava envolvido por um espesso casaco de couro marrom, bastante surrado e muito maior que seu corpo. Sob esse havia ainda um suéter de lã branco enfiado por baixo das calças. Ravelion brincava com uma adaga fina, cujo gume prateado contrastava com o cabo azul cobalto ricamente adornado de duas volumosas pedras de rubi, uma na extremidade inferior e a outra na parte central. A lâmina, que já era fina, se afunilava ainda mais até finalizar em uma ponta quase imperceptível, como um alfinete. Resistente e incrivelmente afiada, a pequena arma tinha uma beleza hipnotizante, parecia reluzir perante os olhos de seu portador. Ao empunhá-la, Ravelion se sentia quase que invencível, como um experiente guerreiro brandindo a mais temível e letal das armas já feitas, em meio a um bando de soldados amadores. Sempre se sentira atraído por ela. Costumava passar horas cobiçando o objeto enquanto seu avô a segurava e contava sobre seus feitos e como ela o havia salvado mais de uma vez. Hoje ele se aproveitara do descuido do velho, que por um instante se ausentara e esquecera a adaga por sobre a mesa de cabeceira. Era de valor inestimável para ele e Ravelion tinha consciência disso, bem como das conseqüências que sofreria mais tarde por tê-la pego sem permissão. Mas não se importava. Há muito esperava pela oportunidade possuí-la, nem que por pouco tempo.
O menino deslizava o dedo cuidadosamente pela superfície cortante quando se aprumou num salto. Hesitante, segurou a adaga com força e num movimento rápido levou-a para frente do corpo, na altura dos olhos. Ele estava certo de que ouvira algo se mexer nos arbustos atrás da árvore. Imóvel, observou o lugar com atenção ainda maior que a habitual, buscando apurar ao máximo sua audição na esperança de ouvir alguma coisa novamente. O silêncio pareceu ter ficado ainda mais intenso do que antes. Nada. Segundos se transformaram em minutos, que continuaram a se arrastar lentamente enquanto Ravelion, inerte, ainda olhava fixamente para o mesmo ponto. Já pensava em baixar a guarda quando um vulto negro saltou dos arbustos, vindo veloz em sua direção. O pânico tomou conta de seu corpo, mas o menino aprendera bem a reprimir tal sentimento: fixou seu olhar no oponente e manteve-se firme na posição em que estava. Quando a colisão parecia eminente, ele saltou para o lado, desvencilhando-se da investida e, contudo, antes que pudesse fazer qualquer outro movimento, uma dor flamejante atingiu-lhe na nuca. Cambaleou e caiu alguns passos à frente, estirado no chão. Com o pouco de força que lhe restava, olhou por cima dos ombros e viu que o oponente aparecera por trás, como se tivesse transportado-se mentalmente.
Ravelion não pôde identificar nem mesmo se a criatura era humana, mas foi sensato o suficiente para não ficar e tentar descobrir. Com dificuldade assombrosa para uma ação tão simples, assoviou, e, quase que instantaneamente, um belo cavalo castanho surgiu no descampado e galopou em sua direção numa velocidade surpreendente. Ainda atordoado, na fração de segundos que tinha antes de sua montaria chegar, o menino tentou entender o que se passava. O ser encapuzado parecia atônito, talvez assustado por um menino magricela como aquele ter resistido ao golpe. Com grande ajuda do animal, cuja inteligência era surpreendente para um cavalo, Ravelion conseguiu montar e, sem que precisasse dar qualquer sinal, o quadrúpede imediatamente procurou o caminho mais seguro para sair dali. Cavalgaram freneticamente para fora da campina, perseguidos pela criatura que praguejava furiosa em uma língua desconhecida. Ele estremeceu só de ouvir.
Depois de terem avançado por um tempo, agilmente desviando-se das árvores pela conhecida trilha, Ravelion finalmente acreditou ter despistado o inimigo. Respirou aliviado, mas nem por isso permitiu ao animal reduzir a velocidade. Mais alguns minutos e estariam novamente a salvo dentro dos domínios de Bryt. Depois de esconder a adaga dentro das vestes, ele levou a mão na nuca, que latejava com a dor fulminante da pancada. Ainda estava tonto e respirava com dificuldade, mas agora já podia enxergar um pouco mais de luz, e ao longe as velhas muralhas de madeira. Massageou o local, numa tentativa em vão de aliviar a dor.
Continuaram seguindo a trilha rapidamente, até que tudo pareceu se tornar mais nítido. A luz ficava mais e mais perceptível e as árvores, antes numerosas, agora já começavam a se extinguir. Foi nesse exato momento que o cavalo subitamente empinou assustado, relinchando. Ravelion sentiu um baque ensurdecedor e tão dolorido quanto o golpe contra a nuca, mas dessa vez em seu face. Nada pôde ver senão um velho cajado se afastar de sua testa enquanto o chão rodopiava lentamente e a visão escurecia.
 
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