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"Viver o personagem"

Lu Eire

Usuário
Eu tenho pensando bastante a respeito da relação que as pessoas têm ou criam com o que consomem de cultura, e mais especificamente quando isso meio que vira uma coisa um pouco doentia.

É possível tirar dos livros, dos filmes, das artes plásticas, das peças teatrais, etc, verdadeiras lições de vida que revolucionam nosso jeito de pensar e de agir. Mas será mesmo que isso sempre é para o melhor?

Eu li recentemente O Apanhador no Campo de Centeio (concordei muito com algumas reflexões do Holden), e uma parte que muito me impactou foi quando o personagem principal mencionava pessoas que "falavam de coisas inteligentes" e faziam cara de blasé só para se afirmarem quando na verdade eram ocas por dentro.

Parece que hoje em dia "tristeza", "depressão", "confusão", "crise existencial" são sinônimos de "profundidade", "conhecimento", "cultura".

Vocês também percebem isso?
 
Lu Eire disse:
Eu tenho pensando bastante a respeito da relação que as pessoas têm ou criam com o que consomem de cultura, e mais especificamente quando isso meio que vira uma coisa um pouco doentia.

É possível tirar dos livros, dos filmes, das artes plásticas, das peças teatrais, etc, verdadeiras lições de vida que revolucionam nosso jeito de pensar e de agir. Mas será mesmo que isso sempre é para o melhor?

Olá Lu Eire!


Complicado isso, pois os juízos “melhor” e “pior” também são moldados e condicionados através de experiências. O fato é que experiências (no caso culturais) se fundem com fatores biológicos, sociais e diria até que aleatórios para formação do caráter (pensar e agir) somando isso tudo ao conhecimento prévio do sujeito, tem-se a relação do sujeito frente a nova experiência.
Acredito que nenhum desses fatores (isolados) seja imperativo na formação do individuo....enfim, tema interessante!
 
Lu Eire disse:
Parece que hoje em dia "tristeza", "depressão", "confusão", "crise existencial" são sinônimos de "profundidade", "conhecimento", "cultura".

Vocês também percebem isso?

Lu, por vezes tenho essa sensação também, mas é a primeira vez que penso sobre isso (ou seja, não espere muito refinamento no comentário).

Quando penso em algo "profundo", penso logo em algo que seja extremamente elucidante, revelador, que descortine a pergunta "informulável" que está latejando na minha mente e que resulte numa enxurrada de perguntas, insights e incertezas. Muito possivelmente algo profundo pra mim há que esbarrar no existencialismo ou na teologia. [size=xx-small]Engraçado, quando penso em "conhecimento", o pensamento imediato é relacionado ao ensino escolar/universitário. Que pobreza!
[/size] Enfim, acho que temas mais depressivos me fazem andar mais facilmente por esse caminho do que leituras mais alegres.

Na verdade, acho que a alegria anda muito mal explorada, até porque ela é bem, mas bem mais difícil de ser transcendida do lugar comum. Daí a abundância de maus exemplos acaba fazendo a gnt pensar que quem se deixa seduzir por ela não tem profundidade ou é um "bobo alegre", rs.

(...) pessoas que "falavam de coisas inteligentes" e faziam cara de blasé só para se afirmarem quando na verdade eram ocas por dentro.

Desculpa, Lu, mas não consegui ver encadeamento no seu fluxo de raciocínio entre os parágrafos, e tb não li O Apanhador - pode ser por isso que não saquei mt bem o elo entre esse quote e a pergunta antecedente "mas será que isso é sempre pra melhor?"

Fato é que todos os excessos são prejudiciais e podem descambar para esse lado doentio, e a arte, mesmo sendo algo louvável, desejável e positivo, não foge disso. Andei lendo um livro do C.S.Lewis e ele fez uma consideração interessante sobre o êxtase provocado pela fruição artística:

Ah, queremos muito mais — algo com que pouco se ocupam os livros de estética. Mas os poetas e as mitologias conhecem-no muito bem. Não queremos a mera contemplação da beleza, embora, Deus o sabe, isso já constitua grande privilégio. O que queremos dificilmente seria dito em palavras — ser integrados à beleza que vemos, queremos ser como ela, tê-la em nós, mergulhar nela, fazer parte dela. Por isso povoamos os ares, a terra e a água de deuses, e ninfas, e gnomos — para que, embora não possamos nós, possam essas projeções gozar a beleza, a graça e o poder de que a natureza é imagem. É por isso que os poetas contam-nos mentiras tão adoráveis. Falam como se as mais leves brisas pudessem de fato penetrar na alma humana; mas não podem. Dizem-nos que "a beleza nascida de um murmúrio" pode tomar a forma de um rosto; mas não pode. Pelo menos por enquanto.
(grifos meus)

Bem, ele deu palavras à ideia que eu nunca consegui expressar. Quando a arte deixa de ser um instrumento e vira um fim em si mesma, ela nos esvazia um bocado, porque, em geral, a arte, e principalmente os livros, são uma via de mão única. Temos toda essa ânsia por nos fundirmos a ela, mas ela não é um ente relacional, não nos trata individualmente, não nos reconhece como pessoas únicas e criativas. É só um objeto que aponta para uma beleza inebriante com a qual não podemos nos fundir. Assim, na impossibilidade de unificação, acabamos por nos esvaziar de nós mesmos para tentar ridiculamente sorver o objeto que é mera representação desse algo maior intangível. E então dá nisso: fala-se de muita coisa inteligente sendo-se oco por dentro (mas tb há o fator orgulho/prepotência que não pode ser de todo ignorado). Na verdade, esse processo ocorre não só com a arte, mas com qualquer coisa que não nos reconhece como pessoas únicas, nem nos corresponde, seja ele um amor platônico ou enfim. É por isso que um bom amigo, daqueles top 5, nos enriquecem, embora não nos bastem por completo - mas pra desenvolver esse raciocínio eu teria mais mil coisas a dizer e já to achando que eu to viajando sem fim aqui, é melhor parar, hehe.
 
Mas não podemos esquecer que a tristeza hoje é quase uma doença. Sinônimo de saúde é estar feliz... Só que vemos gente que não fica triste nunca, que está sempre dizendo que dá a volta por cima, etc. Basta ver a explosão de tratamentos psicológicos e psiquiátricos para acabar com a depressão, com os chamados desvios de personalidade... E vendo isso eu tenho até medo de um futuro meio Gattaca, que antes de nascer os pais já podem decidir todas as características do filho (físicas e psicológicas). Nelson Rodrigues tem uma frase genial sobre sofrimento: "a dor que passa abre, na vida interior, imensas e lívidas sibérias."
 
Seu comentário me fez lembrar de um vídeo que assisti no TED Talk, em que o palestrante fala de felicidade artificial como algo bom e aceitável. Sempre lembro desse video por qualquer coisa, rs. É bem interessante.

Link aqui se quiserem ver.
Ok, parei de desviar o assunto.
 
A melancolia só é bonita quando olhada pelo lado de fora.

Não sei onde li, se foi alguma coisa de Clarice ou de Hesse, mas os animais são tristes. Suportam quase tudo em silêncio. Os bois quase não mugem, e seu olhar é calmo, irracionalmente calmo. E as aranhas têm uma frieza nada dócil. Os répteis e lágrimas de crocodilo. Ainda não consigo ver tristeza em pardais nem em golfinhos, esse raciocínio sobre a tristeza dos animais é um tanto falho mesmo.

Acho que tudo isso se trata de uma inversão. Os felizes, os sorridentes, esses têm lá no fundo uma pitada de tristeza, por isso a tristeza seja algo profundo, sóbria. E pessoas deprimidas, indiferentes, apáticas... elas carregam lá no fundo uma pitada de alegria, e pra elas a alegria é algo profundo, ébria.
 
Gente, vou falar mais sobre o meu ponto de vista porque acho que não fui muito clara!

Primeiro, eu pensei nesse assunto logo depois de visitar algumas páginas pessoais no twitter. Nelas, eu tinha percebido muitos comentários de seus respectivos donos mostrando certa "melancolia" a respeito de problemas pessoais (e sim, eles foram e são bem transparentes quanto aos problemas no que escreveram e escrevem). Mas a julgar pelos problemas mostrados, e ainda pela frequência com que aparecem, eu fico achando que isso é mais um meio achado para se afirmar do que uma real preocupação com os problemas, entendem?

É lógico que isso é muito mais presente em páginas pessoais de adolescentes, e trata-se disso mesmo nos casos que vi. E os comentários estão quase sempre associados a frases de livros, de filmes, por exemplo. Não estou dizendo que quem escreva esse tipo de coisa em seu perfil na internet seja necessariamente um "pseudo-cult" (sim, esse termo existe, por mais que isso seja triste), mas acredito que tenha muita gente levando essas coisas para o lado errado...

Feynman disse:
Complicado isso, pois os juízos “melhor” e “pior” também são moldados e condicionados através de experiências.

Concordo com o que você disse a respeito das experiências individuais! Mas parece que hoje em dia as pessoas gostam de ter problemas, se é que me entende. Parece que é legal ser confuso, ser triste, ser depressivo, para poder escrever isso no seu blog/twitter! E eu fico um pouco brava com isso porque arte não é para emocionar, entende?

Um exemplo que eu consigo pensar facilmente (mas relacionado à minha própria experiência, haha) é alguém ler a contra-capa de On The Road, de Jack Kerouac, e achar que a história é só sobre uns amigos drogados que resolvem andar de carro pelos Estados Unidos, e mesmo após ter terminado de ler o livro, continuar achando que é só isso mesmo.

Parece que as pessoas lêem livros já caçando trechos para postar na internet sem nem mesmo saber do que aquilo se trata. Um trecho jogado sem estar num contexto, como acontece no twitter por exemplo, pode muitas vezes conotar o sentido errado em relação ao que o autor escreveu!

(eu não to podendo escrever mais nesse momento, mas assim que puder eu analiso os outros comentários mais profundamente, obrigada por responderem!)
 
Gente, quanto ao meu comentário de cima, o que eu quis dizer foi "arte não é para emocionar", no sentido de que o que é produzido pode ser analisado muito mais profundamente do que o senso comum muitas vezes achado na internet. Mas sei que essa é uma discussão para outro tópico, desculpem....


Manu M. disse:
Lu, por vezes tenho essa sensação também, mas é a primeira vez que penso sobre isso (ou seja, não espere muito refinamento no comentário).

Quando penso em algo "profundo", penso logo em algo que seja extremamente elucidante, revelador, que descortine a pergunta "informulável" que está latejando na minha mente e que resulte numa enxurrada de perguntas, insights e incertezas. Muito possivelmente algo profundo pra mim há que esbarrar no existencialismo ou na teologia. [size=xx-small]Engraçado, quando penso em "conhecimento", o pensamento imediato é relacionado ao ensino escolar/universitário. Que pobreza!
[/size] Enfim, acho que temas mais depressivos me fazem andar mais facilmente por esse caminho do que leituras mais alegres.

Na verdade, acho que a alegria anda muito mal explorada, até porque ela é bem, mas bem mais difícil de ser transcendida do lugar comum. Daí a abundância de maus exemplos acaba fazendo a gnt pensar que quem se deixa seduzir por ela não tem profundidade ou é um "bobo alegre", rs.

Então Manu, é a primeira vez que tento discutir também, então claro que posso acabar falando bobagens. Mas normal, estamos aqui para discutir pontos de vista :sim:

É muito mais "profundo", sim, algo que seja revelador e existencial. Achei ótima essa observação! Mas por que isso sempre tem que tender para o lado depressivo, sabe? Não seria senso comum associar profundidade com depressão?

Como você disse, é muito mais difícil explorar a Alegria. Eu tenho algumas opiniões de embasamento histórico para sustentar essa afirmação (mais especificamente sobre o fato de não haver exemplares do livro Comedia, de Aristóteles, e sim apenas o Tragédia), mas acho perigoso fazer afirmações assim, uma vez que não fui atrás do assunto direito...

Desculpa, Lu, mas não consegui ver encadeamento no seu fluxo de raciocínio entre os parágrafos, e tb não li O Apanhador - pode ser por isso que não saquei mt bem o elo entre esse quote e a pergunta antecedente "mas será que isso é sempre pra melhor?"

Fato é que todos os excessos são prejudiciais e podem descambar para esse lado doentio, e a arte, mesmo sendo algo louvável, desejável e positivo, não foge disso.

A associação que eu fiz foi entre o fato do pessoal usar arte/literatura como meio de se afirmar, tentendo a esse lado depressivo.... Pode ser que o meu texto não tenha ficado bom, pois eu estava cansada quando o escrevi! Enfim, pensei nele porque o narrador do livro faz críticas a esse tipo de comportamento entre os jovens...

Mas Manu, leia o livro, é altamente recomendável ^^

Bem, ele deu palavras à ideia que eu nunca consegui expressar. Quando a arte deixa de ser um instrumento e vira um fim em si mesma, ela nos esvazia um bocado, porque, em geral, a arte, e principalmente os livros, são uma via de mão única. Temos toda essa ânsia por nos fundirmos a ela, mas ela não é um ente relacional, não nos trata individualmente, não nos reconhece como pessoas únicas e criativas. É só um objeto que aponta para uma beleza inebriante com a qual não podemos nos fundir. Assim, na impossibilidade de unificação, acabamos por nos esvaziar de nós mesmos para tentar ridiculamente sorver o objeto que é mera representação desse algo maior intangível. E então dá nisso: fala-se de muita coisa inteligente sendo-se oco por dentro (mas tb há o fator orgulho/prepotência que não pode ser de todo ignorado). Na verdade, esse processo ocorre não só com a arte, mas com qualquer coisa que não nos reconhece como pessoas únicas, nem nos corresponde, seja ele um amor platônico ou enfim. É por isso que um bom amigo, daqueles top 5, nos enriquecem, embora não nos bastem por completo - mas pra desenvolver esse raciocínio eu teria mais mil coisas a dizer e já to achando que eu to viajando sem fim aqui, é melhor parar, hehe.

Eu queria discutir mais a respeito disso que você falou aqui! Será que você poderia desenvolver melhor? Fui eu agora que não entendi alguns links, mas achei interessante :sim:

Marc_dell disse:
Mas não podemos esquecer que a tristeza hoje é quase uma doença. Sinônimo de saúde é estar feliz... Só que vemos gente que não fica triste nunca, que está sempre dizendo que dá a volta por cima, etc. Basta ver a explosão de tratamentos psicológicos e psiquiátricos para acabar com a depressão, com os chamados desvios de personalidade... E vendo isso eu tenho até medo de um futuro meio Gattaca, que antes de nascer os pais já podem decidir todas as características do filho (físicas e psicológicas). Nelson Rodrigues tem uma frase genial sobre sofrimento: "a dor que passa abre, na vida interior, imensas e lívidas sibérias."

Eu também tenho medo desse futuro. Eu gostaria que esse tipo de "tecnologia" não existisse, sinceramente. Acredito que tenha mais chance de nos trazer coisas ruins do que boas.

Rodovalho disse:
Acho que tudo isso se trata de uma inversão. Os felizes, os sorridentes, esses têm lá no fundo uma pitada de tristeza, por isso a tristeza seja algo profundo, sóbria. E pessoas deprimidas, indiferentes, apáticas... elas carregam lá no fundo uma pitada de alegria, e pra elas a alegria é algo profundo, ébria.

Não entendi muito bem o que você quis dizer com esse comentário. Mas de certa forma, concordo que existem inversões. Muita gente que é eufórica naturalmente fica depressiva quando bebe, por exemplo, e aí solta tudo o que guardou...
 
Aliás, por favor, não pensem que estou condenando quem usa de diferentes tipos de arte para postar em seus perfis de redes sociais! Eu mesma faço isso, e acho legal. O que estou criticando é o uso abusivo disso para se afirmar como "denso, culto e complicado"... E algumas opiniões minhas ainda não estão bem formadas...
 
Lu, vou tentar ser mais claro.

Para quem é superficialmente extrovertido, a depressão é profunda.

Para quem é superficialmente melancólico, a alegria que é profunda.

Exemplo, para o cidadão médio de nosso Brasil, que nunca experimentou a fome e a guerra, a morbidez de um soldado que se sacrifica pela pátria é profundo. Agora, pense num refugiado da guerra civil em Moçambique. As pessoas morrem de fome e matam por comida lá. Então dois refugiados encontram um ônibus queimado cheio de corpos. Improvisam uma vassoura e limpam o lugar, cantando, e se surpreendem, rindo, como se fossem irmãos brincando. Alegria, nesse caso, é profundo.

E sobre a Comédia de Aristóteles não ter sobrevivido, é só você ler O Nome da Rosa. Acho que explicaria toda esse rolo de profundidade seu.
 
hmm... Acho que vc está falando de duas coisas diferentes, mas "relacionadas" por assim dizer.

Eu li recentemente O Apanhador no Campo de Centeio (concordei muito com algumas reflexões do Holden), e uma parte que muito me impactou foi quando o personagem principal mencionava pessoas que "falavam de coisas inteligentes" e faziam cara de blasé só para se afirmarem quando na verdade eram ocas por dentro.

Parece que hoje em dia "tristeza", "depressão", "confusão", "crise existencial" são sinônimos de "profundidade", "conhecimento", "cultura".

O escritor Michel Laub anda publicando no blog da Cia das Letras algumas reflexões sobre a crítica. Uma coisa interessante é o que ele chama de "Clichês da Crítica". Por exemplo, a "crítica" (estou, lógico, generalizando) entende que o realismo é superior ao fantástico.

Sob este ponto de vista, acho que, para a crítica, assuntos deprês ou que levem a uma reflexão filosófica são mais bem cotados que aqueles que consegue dar leveza a este "troço" que chamamos de vida, existência, etc.

Então, eu penso que existe uma visão da crítica que dá pouco espaço à "leveza" na arte e "prefere" que a arte seja pesada, triste, etc.

Porém, eu também penso que tende a ir um pouco pelo humor do crítico. Talvez julguem que se a arte for "leve", o trabalho dele fica "menor", "menos importante". O que é uma bobagem. Leiam Kurt Vonnegut!!!
 
Indo ainda nesta linha que acabei de escrever, há um ensaio do escritor Luiz Bras no Rascunho (e publicado em papel no Outras Peles da editora Terracota) no qual ele tentava esboçar uma linha divisória entre a literatura infanto-juvenil e a literatura mainstream, adulta.

Ele acabou concluindo que dar "esperança" era algo restrito à literatura infanto-juvenil.

Se eu achar este artigo, eu edito e posto um link aqui mais tarde.
 
A outra coisa a que você está se referindo seria o "potencial" efeito deste tipo de literatura na cabeça de alguém que a leva a sério demais, como um modelo, vamos dizer assim.

Eu tenho pensando bastante a respeito da relação que as pessoas têm ou criam com o que consomem de cultura, e mais especificamente quando isso meio que vira uma coisa um pouco doentia.

É possível tirar dos livros, dos filmes, das artes plásticas, das peças teatrais, etc, verdadeiras lições de vida que revolucionam nosso jeito de pensar e de agir. Mas será mesmo que isso sempre é para o melhor?

Bom, acho que isto já vem sendo discutido desde o Dom Quixote. Tem também um filme "A Professora de Piano" (baseado num livro que acabou de sair por aqui) que pode ser interpretado do mesmo jeito: enquanto Dom Quixote ficou louco lendo as Aventuras de Cavalaria, a protagonista deste filme "enlouqueceu" ao acreditar nas histórias pornográficas. O que o leitor "faz" com a história acaba sendo uma loucura pessoal dele.

Por outro lado, acho que existem influências "insidiosas", daquelas que a pessoa não percebe de onde vem aquela crença, ou porque ela acredita nisso.
Parece piada, mas já conheci alguns fãs da Disney tão muquiranas quanto o Tio Patinhas. Pode ser que eles já tivessem dentro de si o gene da pão-durice mas é tentador demais supor que eles se tornaram unhas-de-fome DEPOIS do Tio Patinhas e não antes.

É interessante observar sob este ponto de vista "quadrinístico" que Carl Barks criou o Tio Patinhas mais como um "gerador" de conflito e "ponto inicial" de aventuras. Eu não sei se Carl abonava aquele comportamento obsessivo do Tio Patinhas. De certa forma, os elementos que deveriam ser "modelos" eram os sobrinhos do Donald. Ele não foi "pensado" pra dar uma lição ou promover um comportamento...
 
Concordo com os fatos que você trouxe, Lu, mas eu tento uma outra interpretação deles.

As pessoas realmente se refestelam na melancolia das artes, e não vejo nisso uma tentativa de serem profundas ou densas. Não como o Holden insinuou naquele trecho.

Particularmente acredito que o mundo hoje tende à depressão/melancolia - animador, não? :rofl:

E apesar do meu 'achismo', sei que existem psicólogos e sociólogos de maior ou menor renome que também interpretam a coisa mais ou menos por aí.

Aí que se brotam perfis em tudo quanto é canto - leia-se, redes sociais - se valendo da miséria da vida de seus donos para se manterem atualizados, parece-me muito mais a expressão de algo cultural, saca? O sentimento de perda e dúvida no mundo contemporâneo é aterrador, e de repente, apesar do vazio existencial estar batendo na sua porta, você lê um trecho fodástico dum cara que expressou exatemente, mas de forma elaborada, aquilo que você sente. 'Uau, é isso mesmo!', diz a vozinha dentro da cabeça.

Primeiro e fundamentalmente acontece essa identificação, o uso dela vem depois e em decorrência.

Claro que existe aí uma certa noção de arte, mas não acho que a maioria das pessoas pense seriamente a respeito disso quando recortam e colam trocentas citações.

Claro[2] que colocar isso num blog e agarrar a melancolia enquanto projeto passa por uma questão de auto-afirmação e tal, como criar uma identidade virtual para si e para os outros conforme manda o protocolo de marketing das redes sociais. Mas, de novo, não acho que isso seja naquele sentido que o Holden insinuou.

E, claro[3], há quem de fato use da depressão para transmitir uma profundidade - existente ou não. Mas essas pessoas existem assim como existem aquelas que fumam, usam roupas indianas, estão de óculos escuros à noite, etc, só para transpirarem sua profundidade.

Eeeenfim :timido:, não acho que os casos de pseudo-cults firmados na depressão/melancolia sejam tão característicos assim para serem apontados em meio à multidão de pseudo-cults( o que não impediria o Holden de manifestar seu característico azedume contra eles!)
 

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