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um trem

Luciano R. M.

vira-latas
Pensava no que as pessoas diriam. As pessoas sempre têm uma opinião a respeito de tudo aquilo que não deveria lhes importar, as pessoas sempre pensam algo sobre a vida alheia. Ela tinha uma bela família: um marido dedicado e amoroso e duas filhas pequenas, adoráveis. Uma promissora carreira como advogada, e agora também como professora da universidade.
Isso poderia fazê-la feliz. Talvez isso devesse fazê-la feliz. Mas não impedia que ela se sentisse vazia. Não a impediria de terminar tudo. A suposta felicidade, como tudo mais, não impedia coisa alguma.
Foi por isso que dirigiu até ali. Era por isso que estava tão longe de casa, era por isso que tinha uma expectativa tão singular.
Não, a discussão com o marido, que tivera no dia anterior, em nada a afetara. É certo que saíram de casa sem se falarem, mas isso foi logo esquecido- as pequenas ofensas diárias eram sempre esquecidas em nome de coisas maiores e mais bonitas. Mas igualmente banais.
Naquela mesma tarde recebeu a ligação do reitor da universidade, oferecendo-lhe o cargo de professora titular da disciplina de direito internacional. Ao chegar em casa, seu marido não só lhe pediu desculpas como a levou para jantar, em comemoração ao seu novo emprego. Ao voltarem para casa colocaram as duas menininhas para dormir e deitaram-se, sempre como se fosse a primeira noite juntos.
Mas tudo isso era nada. Tudo isso era feliz e belo, mas soava banal. Nada disso a preenchia. Ela queria poder ir embora, mudar de país, mudar de nome, trocar a cor do cabelo, não ser mais judia, não ser mais quem era. Queria poder descansar de si mesma.
Sabia, no entanto, que isso era impossível. É o tipo de fantasia idiota que só acontece na literatura ou no cinema. Na vida real ela só podia continuar levando sua vida aparentemente feliz, mas que era vazia de sentido. Afinal, ela nunca quis nada disso.
Lembrou-se, então, que certa vez sua filha mais nova, Eszter, lhe contou ter visto uma estrela cadente. A menina também lhe perguntou se alguma estrela já havia lhe concedido algum de seus desejos.?
Desejos. Não, ela nunca tivera nenhum deles satisfeitos por uma estrela. Sua vida era perfeita, talvez. Mas ela nunca quis isso. Ela nunca quis nada com força suficiente para que pudesse ver uma estrela cadente, para que pudesse formular um desejo. Sua vida tinha sido sempre uma sucessão automática de fatos que lhe favoreciam- talvez o nome disso fosse sorte, mas para ela era indiferente.
Tocada por esse vazio imenso, que vinha de dentro para fora, ela nunca se sentira tão desprotegida, tão infeliz. Por isso estava ali. Por isso esperava, deitada.
Do outro lado da rua, um homem gritava algo, que ela simplesmente resolveu ignorar. Talvez o condutor nem sequer a visse. Sentia os trilhos tremendo, chacoalhando e machucando seu corpo. Mas era isso que tinha lhe acontecido a vida inteira, o mundo chacoalhava e a machucava.
Ao contrário do que esperava não viu sua vida passar diante de seus olhos em segundos. Na verdade, durante o que pareceu uma eternidade, viu apenas o escuro e escutou um som ensurdecedor. Chorava. Ela simplesmente não tinha e nunca tivera desejo algum, ela era simplesmente um envelope de tristeza embalada em felicidade e nada que pudesse fazer iria um dia mudar isso.
Viu, então, o céu. O Sol ainda brilhava, indiferente ao que quer que ela pensasse, o mundo continuava seu movimento contínuo ignorando-a e as pessoas continuavam tendo suas opiniões sobre o que quer que fosse- especialmente se não lhes dissesse respeito. Levantou-se, limpou as lágrimas e foi para casa.
 
Estrelas cadentes... sabia que se você apontar seu dedo para uma estrela você ganha uma verruga?

O mundo para o suicida poderia ser um mundo cheio de arrependimento por ter perdido uma de suas boas almas, de opiniões próprias sobre si mesmas. Ou apenas um mundo que continua girando com ou sem vidas humanas, com o indivíduo tendendo ao insignificante na contagem da taxa vegetativa da população.

E uma tentativa frustrada de suicídio poderia ser apenas um segredo despercebido. Se não houvesse alguém para imaginá-la.
 
a única decisão q ela tomou capaz de trazer-lhe uma mudança foi aquela q ela ñ conseguiu manter até o fim. tá explicado o motivo da depressão: falta de coragem. a vida dela nunca irá mudar.

belo & reflexivo texto. ainda na onda judish.
 

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