Postagem a respeito do livro em "Calmaria e Tempestade"
O Supersentido!
Há algumas semanas comprei o livro de Bruce Hood, “Supersentido”, da editora Novo Conceito:
Supersentido
Autor: Bruce M. Hood
ISBN: 978-85-632
Ano: 2010
Edição: 1
Este livro, se não me engano, é o primeiro livro, traduzido para o Português, tratando daquilo que se convencionou chamar de ciências cognitivas da religião.
Hood é Diretor do Centro de Desenvolvimento Cognitivo de Bristol, no departamento de Psicologia Experimental da Universidade de Bristol, na Inglaterra. Neste livro o autor introduz sua tese de que possuímos um “senso sobrenaturalista” intrínseco, embebido em nossos módulos cognitivos que, ao nos desenvolvermos, nos impele a aceitar com mais facilidade, ou mesmo assumir inconscientemente, a “factualidade” de agentes cognitivos desincorporados, além de outras instâncias de manifestação, supostamente, sobrenaturais.
Esta propensão (ou viés emocional-cognitivo) estaria na base das religiões e de nossa busca por transcendência; assim como, de muitas dos nossas intuições e tendenciosidades de raciocínio do dia a dia.
Então, vou experimentar uma coisa ligeiramente diferente do que tenho feito. Pretendo, em breve, blogar minha leitura deste livro, capítulo por capítulo, comentando também sobre o trabalho de outros pesquisadores destas área de estudo e sobre as hipóteses científicas que eles têm levantado e investigado sobre a origem, evolução e dinâmica da religiosidade e deste, putativo, “supersentido” em, nós, seres humanos.
Vários autores como Pascal Boyer, Scott Atran, Justin Barret, Stewart Elliott Guthrie, Ilkka Pyysiäinen, juntamente com Mark Hauser (além do próprio Hood) têm proposto novas abordagens para explicar as bases da religiosidade humana, do sentimento numinoso (associado busca por aspectos transcendentais da realidade) e de nossa propensão em atribuir agência cognitiva externa e intencionalidade aos mais variados fenômenos, mesmo aqueles sem a presença ou envolvimento óbvio (ou, pelo menos, provável) de seres humanos ou animais.
Estes autores investigam a possibilidade de que nossa espécie possua, entre seus módulos cognitivos, um “dispositivo hiperativo de detecção de agentes” (HADD) ou, pelo menos, um conjunto de módulos mais genéricos que ao interagirem durante nosso desenvolvimento psicobiológico produzam um efeito análogo, ou seja, hipersensibilidade a detecção de supostos agentes, porém, enviesada na direção de falsos positivos, ou seja, “detectar” agência mesmo em sua ausência. Esta predisposição aos falsos positivos, inclusive, poderia ser justificada adaptativamente, pelo menos assim pensam alguns dos cientistas que propõe este modelo. Esta justificativa pode ser compreendida ao pensarmos na possibilidade de que para nossos antepassados, ao ouvir um farfalhar próximo (ou um movimento em arbustos próximos), seria mais vantajoso – em termos de sobrevivência e conseqüentemente reprodução – atribuir como causa desse evento a um predador à espreita ou mesmo a um inimigo de outra tribo. Isso seria vantajoso mesmo quando o movimento ou o barulho fosse produzido pelo vento (ou por outro processo sem envolvimento intencional) do que, simplesmente, deixar de inferir a presença de agente intencional, por trás deste evento, quando realmente algum ser deste tipo estivesse envolvido. Como não se espera a perfeição de nenhum sistema biológico, um ajuste na direção dos falsos positivos em comparação aos falso negativos seria uma solução evolutiva muito adequada.
Estes sistemas (ou conseqüências funcionais de sistemas mais básicos e gerais operando em consonância, resultando neste viés) sub-ótimos de detecção-motivação-ação, mas ainda assim satisfatórios do ponto de vista evolutivo, teriam sido mais tarde co-optados por certos processos sócio-culturais, culminando nas religiões e, de modo mais amplo, na nossa naturalidade em projetar mentes e intencionalidade à natureza. Esta tese é completamente compatível com alguns fenômenos e idéias a eles associados (por exemplo, pelo filósofo Thomas Metzinger e pelos cientistas cognitivos Al Cheyne e Girard) já comentadas anteriormente, envolvendo a formação de nossa auto-imagem e do senso de identidade motora e corporal relacionada a perspectiva visuo-sensorial egocêntrica espacial que nos é característica. Os fenômenos envolvidos nas experiências autoscópicas e alucinações vestíbulo-motoras reforçariam as teses sobrenaturalistas e dualistas (que estão na base de muitas religiões), facilitando a aceitação de agentes cognitivos desincorporados, bem como o hiper-dimensionamento destes agentes para figuras divinas cada vez mais abstratas, como inferências plausíveis, pelo menos, a princípio.
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Barrett JL. Exploring the natural foundations of religion. Trends Cogn Sci. 2000 Jan;4(1):29-34. PubMed PMID: 10637620.
Chalupa, A. Religion from the Perspective of Cognitive Sciences>: An Evolutionary Adaptation, By-Product or Noise?
Pyysiäinen I, Hauser M. The origins of religion: evolved adaptation or by-product? Trends Cogn Sci. 2010 Mar;14(3):104-9. Epub 2010 Feb 9. PubMed PMID: 20149715.
O Supersentido!
Há algumas semanas comprei o livro de Bruce Hood, “Supersentido”, da editora Novo Conceito:
Supersentido
Autor: Bruce M. Hood
ISBN: 978-85-632
Ano: 2010
Edição: 1
Este livro, se não me engano, é o primeiro livro, traduzido para o Português, tratando daquilo que se convencionou chamar de ciências cognitivas da religião.
Hood é Diretor do Centro de Desenvolvimento Cognitivo de Bristol, no departamento de Psicologia Experimental da Universidade de Bristol, na Inglaterra. Neste livro o autor introduz sua tese de que possuímos um “senso sobrenaturalista” intrínseco, embebido em nossos módulos cognitivos que, ao nos desenvolvermos, nos impele a aceitar com mais facilidade, ou mesmo assumir inconscientemente, a “factualidade” de agentes cognitivos desincorporados, além de outras instâncias de manifestação, supostamente, sobrenaturais.
Esta propensão (ou viés emocional-cognitivo) estaria na base das religiões e de nossa busca por transcendência; assim como, de muitas dos nossas intuições e tendenciosidades de raciocínio do dia a dia.
Então, vou experimentar uma coisa ligeiramente diferente do que tenho feito. Pretendo, em breve, blogar minha leitura deste livro, capítulo por capítulo, comentando também sobre o trabalho de outros pesquisadores destas área de estudo e sobre as hipóteses científicas que eles têm levantado e investigado sobre a origem, evolução e dinâmica da religiosidade e deste, putativo, “supersentido” em, nós, seres humanos.
Vários autores como Pascal Boyer, Scott Atran, Justin Barret, Stewart Elliott Guthrie, Ilkka Pyysiäinen, juntamente com Mark Hauser (além do próprio Hood) têm proposto novas abordagens para explicar as bases da religiosidade humana, do sentimento numinoso (associado busca por aspectos transcendentais da realidade) e de nossa propensão em atribuir agência cognitiva externa e intencionalidade aos mais variados fenômenos, mesmo aqueles sem a presença ou envolvimento óbvio (ou, pelo menos, provável) de seres humanos ou animais.
Estes autores investigam a possibilidade de que nossa espécie possua, entre seus módulos cognitivos, um “dispositivo hiperativo de detecção de agentes” (HADD) ou, pelo menos, um conjunto de módulos mais genéricos que ao interagirem durante nosso desenvolvimento psicobiológico produzam um efeito análogo, ou seja, hipersensibilidade a detecção de supostos agentes, porém, enviesada na direção de falsos positivos, ou seja, “detectar” agência mesmo em sua ausência. Esta predisposição aos falsos positivos, inclusive, poderia ser justificada adaptativamente, pelo menos assim pensam alguns dos cientistas que propõe este modelo. Esta justificativa pode ser compreendida ao pensarmos na possibilidade de que para nossos antepassados, ao ouvir um farfalhar próximo (ou um movimento em arbustos próximos), seria mais vantajoso – em termos de sobrevivência e conseqüentemente reprodução – atribuir como causa desse evento a um predador à espreita ou mesmo a um inimigo de outra tribo. Isso seria vantajoso mesmo quando o movimento ou o barulho fosse produzido pelo vento (ou por outro processo sem envolvimento intencional) do que, simplesmente, deixar de inferir a presença de agente intencional, por trás deste evento, quando realmente algum ser deste tipo estivesse envolvido. Como não se espera a perfeição de nenhum sistema biológico, um ajuste na direção dos falsos positivos em comparação aos falso negativos seria uma solução evolutiva muito adequada.
Estes sistemas (ou conseqüências funcionais de sistemas mais básicos e gerais operando em consonância, resultando neste viés) sub-ótimos de detecção-motivação-ação, mas ainda assim satisfatórios do ponto de vista evolutivo, teriam sido mais tarde co-optados por certos processos sócio-culturais, culminando nas religiões e, de modo mais amplo, na nossa naturalidade em projetar mentes e intencionalidade à natureza. Esta tese é completamente compatível com alguns fenômenos e idéias a eles associados (por exemplo, pelo filósofo Thomas Metzinger e pelos cientistas cognitivos Al Cheyne e Girard) já comentadas anteriormente, envolvendo a formação de nossa auto-imagem e do senso de identidade motora e corporal relacionada a perspectiva visuo-sensorial egocêntrica espacial que nos é característica. Os fenômenos envolvidos nas experiências autoscópicas e alucinações vestíbulo-motoras reforçariam as teses sobrenaturalistas e dualistas (que estão na base de muitas religiões), facilitando a aceitação de agentes cognitivos desincorporados, bem como o hiper-dimensionamento destes agentes para figuras divinas cada vez mais abstratas, como inferências plausíveis, pelo menos, a princípio.
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Barrett JL. Exploring the natural foundations of religion. Trends Cogn Sci. 2000 Jan;4(1):29-34. PubMed PMID: 10637620.
Chalupa, A. Religion from the Perspective of Cognitive Sciences>: An Evolutionary Adaptation, By-Product or Noise?
Pyysiäinen I, Hauser M. The origins of religion: evolved adaptation or by-product? Trends Cogn Sci. 2010 Mar;14(3):104-9. Epub 2010 Feb 9. PubMed PMID: 20149715.