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Sobre a emoção fácil - Uma entrevista com João Cabral de Melo Neto

Haleth

Sweet dreams
Olá, povo da pena! =P

Queria compartilhar com vcs uma entrevista que eu li há muito tempo, mas que foi um marco na minha forma de pensar a escrita literária. Fala especificamente sobre poesia, entretanto, acredito ser aplicável também à prosa. Deixo aqui alguns trechos selecionados, recomendando que leiam a entrevista inteira, que está nesse link.

JOÃO CABRAL DE MELO NETO

UMA AULA DO POETA QUE COMBATIA A "EMOÇÃO FÁCIL" NA POESIA

Por que o senhor tem tanta prevenção contra a subjetividade? Há um conceito mais ou menos generalizado de que a poesia é uma manifestação extremada da subjetividade…

João Cabral: “Há uma diferença. Tenho aversão à subjetividade. Em primeiro lugar, tenho a impressão de que nenhum homem é tão interessante para se dar em espetáculo aos outros permanentemente. Em segundo lugar, tenho a impressão de que a poesia é uma linguagem para a sensibilidade, sobretudo. Uma palavra concreta, portanto, tem mais força poética do que a palavra abstrata. As palavras pedra ou faca ou maçã, palavras concretas, são bem mais fortes, poeticamente, do que tristeza, melancolia ou saudade. Mas é impossível não expressar a subjetividade. Então, a obrigação do poeta é expressar a subjetividade mas não diretamente. Ele não tem que dizer “eu estou triste”. Ele tem é que encontrar uma imagem que dê idéia de tristeza ou do estado de espírito - seja ele qual for - por meio de palavras concretas e não simplesmente se confessando na base do “eu estou triste”.

O senhor sempre diz que não gosta de fazer poesia dada a emoções porque o que se chama comumente de emoção é algo feito à base de um sentimentalismo fácil e barato. O senhor diz, pelo contrário, que “emoção é outra coisa”. Mas nunca ficou exatamente clara a definição que o senhor tem de “emoção”. Dá para explicar - de uma vez por todas?


João Cabral: “Minha definição de emoção não é nada de especial. É o que todos chamam de “emoção”. O que acontece é que me recuso a explorar essa coisa diretamente. O interesse do poeta não é descrever suas emoções e criar emoções, é criar um objeto - se é poeta, um poema; se é pintor, um quadro - que provoque - emoções no espectador. Mas não explorar nem descrever a própria emoção. Quando digo que sou contra emoção é exatamente neste sentido: o de usar a minha emoção para fazer com ela uma obra, descrevê-Ia primariamente e construir, com ela, um poema”.

Quer dizer, afinal, que o senhor não é exatamente contra a emoção: é contra a exploração da emoção…

João Cabral: “Exatamente! (Faz ar de alívio, como se a charada estivesse resol- vida). Quanto a esse descrever da emoção e da sentimentalidade, a grande maioria da poesia que se escreve no mundo é assim. A obrigação do poeta, repito, é criar um objeto, um poema, que seja capaz de provocar emoção no leitor”.

O que é que o senhor chama de “emoção intelectual”? Já vi o senhor usando esta expressão..:

João Cabral: “Um grande crítico americano uma vez disse o seguinte de uma poetisa americana, Edna Miller: que ele não gostava da poesia que ela fazia porque não tinha interesse intelectual. É nesse sentido que eu digo. Você pode ver perfeitamente quais são os escritores que têm um interesse intelectual e quais são os que não têm. Confesso que o escritor que não tem interesse intelectual não me interessa.

O que vcs pensam sobre isso?
 
João Cabral é um negócio difícil de ler, mais difícil ainda de entender. Sobretudo porque estamos (estou) tão acostumado com esse sentimentalismo barato que ele cita.

Gosto da sua poesia seca, ríspida. Acho que todo mundo precisa ler pra pelo menos equilibrar a cabeça. Muito amor e paixão e viagens e loucuras faz mal, também.
 
João Cabral de Melo Neto é meu poeta preferido. (E isso me causa problemas homéricos, porque as pessoas assumem que, por eu ser mineira, meu poeta preferido seja Drummond). E a lucidez de JCMN sempre me deixou fascinada. Eu não sou centrada como ele era, eu não consigo ser objetiva, como ele era. Talvez seja por isso que eu goste tanto da obra dele.

O que acontece é que me recuso a explorar essa coisa diretamente. O interesse do poeta não é descrever suas emoções e criar emoções, é criar um objeto - se é poeta, um poema; se é pintor, um quadro - que provoque - emoções no espectador.

Como diria Mallarmé, a palavra tem de significar apenas 1/4, 3/4 é sugestão.

A obrigação do poeta, repito, é criar um objeto, um poema, que seja capaz de provocar emoção no leitor.

Eu choro oceanos sempre que releio Morte e Vida Severina, O cão sem plumas, A palo seco, Psicologia da Composição, etc.
 
JCMN é a contaposição do sentimentalismo e por isso talvez não seja muito bem aceito por uma grande leva de leitores( por ser difícil compreender a sua arte, sua escrita.)Mas sempre é bom ter escritos que fogem um pouco do padrão romÂntico.Prefiro os poetas marginais :sim:
 
Eu gosto de ambos, tanto do sentimentalismo escancarado quanto do referenciado. Inclusive, às vezes, a aparente falta de sentimentos... Tudo depende do momento.
 
Este excesso de subjetividade cansa, fica caricato, é gostoso ver um mestre que não precisa de sentimentalismo gratuito ou mistificação barata, o traço de sábio de João Cabral está justamente na intelectualidade concreta de sua poesia, cria imagem poderosa em forma cuidada, nos desfia a descobrir a lógica de cada poema, sem recorrer nunca ao mesmo expediente. Gosto das obras escritas depois de Serial, a partir daí que junta forma e função de maneira brilhante.

Aos outros poetas Cabral alcunha-os bissextos, muitos adeptos de uma escrita automática como a do espiritismo. A ele o poema é trabalhado, talhado e aperfeiçoado, nada de criações de momento, muito trabalho.

Abraço,
Alex
 

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