Dante Aqueronte
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Esse é um texto que eu li há muitos anos, mas só agora consegui reencontrar. Ele é dedicado a todo mundo que já recebeu um olhar torto quando disse para alguém que era nerd, ou que já foi chamado disso, como se fosse um xingamento.
Eu já me vi várias vezes em situações como esta, felizmente nunca por parte dos meus pais. E, felizmente, sempre por parte de pessoas que não fizeram a menor diferença na minha vida. ^^v
Não sei se precisa botar a fonte, porque é um daqueles textos que aparecem em vários sites. Mas peguei ele no http://anapedretti.blog.uol.com.br/
Eu já me vi várias vezes em situações como esta, felizmente nunca por parte dos meus pais. E, felizmente, sempre por parte de pessoas que não fizeram a menor diferença na minha vida. ^^v
MÃE: Calma, Astolfo. Isso tudo pode ser um grande engano.
PAI: Vc sabe que não, Helena.
Entra o filho na sala.
FILHO: Pai, mãe, e aew.. Que tem pro jantar?
Os pais ficam mudos. A mãe, aflita. O pai, cara amarrada, sentado no sofá. Ambos olhando pro filho.
FILHO: Credo, que caras são essas?
PAI: Jorge Eduardo, um amigo seu ligou. Era o "Tarrasque", ou algo assim.
O filho arregala os olhos.
PAI: Ele disse pra vc levar "coca-cola de 2 litros e cheetos extras" hoje à noite, que "a coisa vai durar".
FILHO: Ah, sim, pois é... o Tarrasque ligou, né? E ele disse.. isso... Sabe o que é pai, a gente vai numa noitada na Continental hoje e..
PAI, irônico: E vão levar coca de 2 litros e cheetos?
MÃE: Calma, Astolfo.[tomando a palavra] Jorginho, seu pai entrou no seu quarto e mexeu nas suas coisas. Ele achou isto.
A mãe joga um objeto pequeno na mesa. Um cubo. Numerado. Azul.
MÃE, continuando: Eu disse pra ele que era do Luquinhas, que era do Banco Imobiliario dele, ou algo assim. E é isso mesmo, não, filho? Esse dado é do Luquinhas, não?
FILHO, respirando fundo: Não, mãe. Esse dado é meu. Eu tô com um monte desses na minha mochila, agora.
MÃE: E pra que vc usa dados, filho?
FILHO: Pra jogar RPG.
Silêncio. Tensão.
PAI: O que? Mais o que foi que você disse, rapaz? Anda, responde, Jorge Eduardo!
FILHO, com medo: Isso que o senhor ouviu, pai. Eu sou RPGista.
MÃE: Meu filho! Desde quando? Des-de quan-do voce sai com essas pessoas, o tal do Tarrasque, pra fazer essas coias?
FILHO: Desde a 8a serie.
PAI: Jorge Eduardo, preste atenção. Outro dia eu liguei pro seu colégio. Estava preocupado porque vc ficava muito em casa. Sabe o q eles disseram? Que você tira as melhores notas da sala, mas que as vezes eh meio "recluso".
MÃE: Ouça seu pai, filho. Nos te demos um Tempra 4 portas pra você sair por aí, com aquelas garotas fáceis, ir em boates caras da moda, cheirar cocaina, viver uma adolescencia sem sentido nem massa encefálica, como um jovem normal. E como é que você nos retribui isso? Passando as noites de sexta em casa, se divertindo aprendendo Álgebra, saindo todo sábado pra jogar RPG e dizendo que ia ficar com a Aninha.
FILHO, voz tremula: Mas eu estava com a Aninha. Ela tbm joga. Faz uma clériga meio-elfa level 16.
PAI: O que, a Aninha? Olha o que você esta falando, rapaz! A Aninha é filha do Vitor, meu colega na Aeronáutica. Tenente Vitor. Conheço o pai dela desde o Colégio Militar. Um homem de pura integridade.
MÃE: Você sai praqueles.. pra-que-les.. lugares de Nerd?
FILHO: Bom.. vou falar duma vez... Lembra quando eu pedia uma grana pra ir pro Shopping Beira-Mar, ir comer MacTrashes na praça de intoxicação? Eu na verdade ia pra Dragon's House, jogar RPG com meu grupo. Pô, entendam, é uma campanha que ja faz 2 anos que...
PAI: E todo dinheiro que eu pus na tua mão pra vc comprar roupas de grife, pagar o Jiu-Jitsu, alimentar seu PitBull, pagar a mensalidade caríssima do club, o celular digital?
FILHO: D&D 3a edição, Mago a Ascenção, GURPS Fantasy, alem dum monte de dados.
PAI: Não, não! É demais pra mim.
MÃE: Calma, Astolfo. Olha a ponte de safena. Calma.
FILHO, explodindo em lagrimas: Que droga, pessoal. Eu sou assim. Eu sou Nerd. Faz parte da minha natureza. Eu não pedi pra nascer assim. Um dia, na 6a serie, eu percebi que gostava mais de ficar estudando do que de chutar uma bola com um monte de homens suados ao redor. É algo, sei lá, meu. É minha natureza.
O pai arremesa a mão espalmada e derruba o filho com um vigoroso tapa nas fuça.
MÃE: Astolfo, não! [diz a mãe, lançando-se no filho para um abraço] Ele ainda é nosso filho.
PAI: Filho meu ele não é. Não mais. Vá pro seu quarto, moleque, enquanto você ainda tem um. E saiba que se você ainda quiser morar nesta casa, vai ter que largar essas nerdices, e começar a tirar notas baixas, ficar de recuperação, engravidar alguém, espancar caras em bares, viver como um filho meu tem que viver.
Jorge Eduardo levanta-se, cabeça baixa, e assim vai pro seu quarto, sozinho.
MÃE, virando-se pro marido: Isso é coisa da idade. Depois passa. Ele não faz nem noção do que esta fazendo.
O pai em silencio.
MÃE: Deve ser má companhia. Esse tal de Tarrasque. Má influência. Nosso filho é um bom menino, Astolfo.
PAI: Vou por ele num colégio interno na Suíça. Um lugar bem linha dura, de disciplina fodida e opressora que o ensine a ser uma máquina acéfala de obedecer ordens de superiores. Foi a melhor coisa que meu pai fez por mim e...
Nesse instante, Jorge Eduardo volta, mas irreconhecível pra seus pais, que ficam de queixos caidos. Ele usava uma camiseta de "Trevas", um boné escrito "Você sabe a derivada de integral de 'x' a quarta? Me pergunte", carregava livros de RPG misturados com romances europeus do seculo XIX e poemas de William Blake. Na mochila via-se livros escolares socados sem jeito, em meio a uma infinidade de papéis e lápis. Tênis velho, surrado, cadarços soltos, calça jeans barata, camiseta desbotada. Irreconhecível. O pai apenas senta no sofa e fica imovel, vendo aquilo.
FILHO: Pai, mãe, eu amo vocês, e espero que um dia vcs me entendam, e me aceitem como sou.
Dizendo isso, abre a porta da rua e sai. Nao foi de Tempra. Prefiriu pegar um busão.
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HELENA: Eu nunca... nunca pensei que viria a um lugar como este. Estou aqui pelo meu filho. Este é ele [mostra uma foto de Jorge Eduardo, numa festinha badalada, cercado de garotas faceis] Jorge Eduardo. Tem 16 anos e.. e.. joga RPG há 3. Ele era um menino bom. Bom [começa a chorar]
COORDENADOR: Vc esta entre amigas, Helena. Todas aqui tem filhos no RPG.
Helena olha ao redor. Todas presentes, com seus penteados caríssimos, roupas copiadas da novela das 8, jóias que não eram bijuterias, maquiagem pesada, algumas com poodles rosas a tiracolo e todas com bolsa de couro de jacaré. De repente, reconhece uma amiga, ao seu lado. Lurdes, que lhe abraça, fraternalmente. Também tinha um filho no RPG.
HELENA, em pensamentos: "Onde foi que essa vadia comprou esse casaco de Mink? Essa cadela!"
Não sei se precisa botar a fonte, porque é um daqueles textos que aparecem em vários sites. Mas peguei ele no http://anapedretti.blog.uol.com.br/