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Porque não escrever

JLM

mata o branquelo detta walker
PORQUE NÃO ESCREVER
Por Jefferson Luiz Maleski



Depois de uma semana supercorrida e sem tempo nem imaginação para escrever algo novo, resolvi desenterrar uma tradução que fiz há cerca de três anos. Afinal, muitos dizem que a tradução é em si um trabalho de escrita, em que o tradutor muitas vezes precisa ser melhor que o escritor para poder verter não só a língua, mas os sentimentos e pensamentos estrangeiros de maneira que sejam assimilados mais facilmente. O texto é de uma carta do escritor norte-americano Morgan Robertson, escrita na noite anterior à sua morte e que levanta a pergunta se ele teria cometido suicídio. Como alguns indícios no texto indicam, motivos ele tinha de sobra. O texto e as imagens da carta original foram retirados de www.morganrobertson.com/final_letter.htm.

***


[São duas páginas amareladas que trazem no topo o logotipo do Alamac Hotel]

Atlantic City, 23 de março de 1915.

Este é o meu último texto. Será melhor para a humanidade que eu pare de escrever, embora a escrita seja para mim, além de um prazer, uma necessidade vital. Sei que muitos me procuram há anos, desde o fatídico ocorrido, a maioria por curiosidade, mas alguns vão além e me acusam de ser o responsável pela morte de centenas de pessoas. É justamente para me explicar e para saberem que
[veja Nota do Tradutor #1] e assim poderei ficar em paz.

Tudo começou com uma brincadeira. Aliás, para um escritor, tudo sempre começa com uma brincadeira. No inverno de 1897 eu passava alguns dias na casa de Mark. Apesar da companhia agradável e estimulante, nunca senti tanto frio quanto naqueles dias, pois o aquecedor de Mark insistia em não funcionar. Certa noite, pensei que fosse morrer de tanto que a minha cama tremia, e hoje sei que foi naquela noite que surgiu a ideia de escrever uma cena em que alguém morria de frio. Aquele fato foi a inspiração para o meu conto mais comentado, o Futility.

Com a cena fixa e se desenvolvendo em minha mente, primeiro pesquisei livros e médicos sobre os efeitos que o frio extremo causa no corpo humano. Todos me indicaram começar por uma palavra: hipotermia. É o nome da condição quando o corpo humano cai abaixo dos 98 ºF e traz consequências catastróficas para o corpo. Também li e ouvi relatos de pessoas que haviam passado por esta desagradável experiência, principalmente alpinistas e exploradores dos árticos. Com uma boa quantidade de material sobre o assunto, esbocei a cena que já há semanas não saia da minha mente, em que um homem passava frio até morrer. Percebi, por exemplo, que se encaixaria melhor ele estar em um ambiente inóspito e que os efeitos da hipotermia são acelerados na água. Assim, depois de algumas variações, acabei concluindo que o melhor ambiente para reunir estas condições seria o naufrágio de um navio próximo ao ártico. E o náufrago escolhido para a morte gelada seria Smith, o capitão do navio.


[final da primeira página]

Porém, a cena em que as sensações da hipotermia vão sendo descritas, ora pelo narrador-onisciente, ora pelo capitão Smith, com o navio afundando enquanto os sobreviventes boiam em águas geladas, os tremores, a mudança da cor da pele para um tom acinzentado, o sono, as alterações na memória e na fala, a rigidez e imobilidade muscular até, por fim, o conjunto todo conduzir a uma morte lancinante, bem, esta cena não existe no conto. Depois de toda a história escrita, aquela cena passou a destoar do restante por ser muito forte, e resolvi cortá-la da versão final. Assim, a ideia original foi a que ficou fora do conto.

Catorze anos depois da publicação de Futility, uma estranha coincidência: um navio com características semelhantes às do navio do meu conto afunda. Ambos bateram em um iceberg, na rota London-New York, no Atlântico Norte, a cerca de 23 nós de velocidade e exatas 400 milhas de Terra Nova. Ambos tinham perto de 20 botes salva-vidas,menos da metade dos necessários para salvar os 3.000 passageiros e tripulantes. Em ambos morreram mais de 2.200 pessoas em meados do mês de abril. Um navio se chamava Titan e o outro Titanic. Fui eu quem escreveu que o Titan era “impossível de afundar”
[NT #2], frase que depois foi usada para o Titanic. E, por fim, o nome do náufrago da cena original que fora cortada, que narrei morrendo tão terrivelmente, o capitão do navio Titan, era o mesmo nome do capitão do Titanic, Smith.

São fatos que podem perturbar a mente de qualquer homem. Inicialmente pensei em uma série de coincidências bizarras. Mas há medida em que mais fatos eram trazidos à tona pela imprensa e pelos sobreviventes, mais foi aumentando o interesse do público pelo meu conto, e mais fui me sentindo mal por ter escrito o conto. Passei a ser perseguido, importunado e visto com desconfiança. Mas o pior foram as perguntas que passei a me fazer. Será que, de alguma forma, eu tivera uma visão profética do futuro? Poderia ocorrer novamente? Passei por diversas crises de saúde e hoje só consigo dormir depois de tomar doses cada vez maiores de proto-iodeto. Eu, que só queria escrever estórias de ficção que agradassem ao público e rendessem algum dinheiro, agora tenho medo de fazê-lo. Penso, várias vezes ao dia, que eu não suportaria se outros de meus contos se tornassem tão reais quanto o Futility. Imagino e tremo, de medo e não de frio, se daqui há alguns anos o Beyond the Spectrum se tornar realidade.
[NT #3] Ao menos sei de algo que posso predizer com certeza que escrevi e vai acontecer: este será o meu último texto.

M. Robertson



Notas do Tradutor
#1 – Trecho ilegível, as três linhas seguintes foram rabiscadas pelo escritor.
#2 – Unsinkable, no original.
#3 – Beyond the Spectrum, apesar de publicado em 1914, continua inédito no Brasil, e conta a história em que os Estados Unidos entram em guerra contra o Japão, em represália a um ataque surpresa destes, e no final os EUA vencem usando uma nova arma capaz de gerar calor intenso que cega e queima muitos japoneses.
 
Uau! Isso é verdade JLM?!!!
Porque se for, estou embasbacada... me impressionou muito essa história, principalmente a do ataque japonês!
 
Acabei de ver na Wikipedia (o link que você colocou não funciona, Jefferson) que a primeira publicação de "Futility" foi em 1898 e o desastre do Titanic ocorreu em 1912!
Em 1905 ele escreveu "The Submarine Destroyer" em que descreve um protótipo do Periscópio, oficialmente "inventado" anos depois.

Nossa, tô impressionada! :susto:
Vou já procurar os textos do homem!
 
clara, eu ñ traduzi nada (por isso do link estar quebrado, foi proposital), só construí um texto fictício em cima de fatos e livros reais.

mas a história real do robertson é interessante mesmo. eu só dei a minha contribuição em divulgá-la.
 
Lana Lane disse:
Clara V. disse:
Uau! Isso é verdade JLM?!!!
Porque se for, estou embasbacada... me impressionou muito essa história, principalmente a do ataque japonês!
Né?! Choquei! :susto:

Não encontrei nada do homem publicado aqui. ¬¬
Só livros em inglês na livraria Cultura, custam os olhos da cara e precisam ser encomendados.
Não é revoltante?
Bom, mas em compensação, aqui em Pindorama, temos recentes traduções de "Orgulho e Preconceito e Zumbis" e "O Vampiro não está tão a fim de você" !! Eita! :dente:
 
Me enganou direitinho. :sim:
Ficou perfeito! Bem que eu devia ter desconfiado quando tu falou em "sem imaginação". Isso NON EXCISTE em se tratando de Jeff. :)
 
JLM disse:
clara, eu ñ traduzi nada (por isso do link estar quebrado, foi proposital), só construí um texto fictício em cima de fatos e livros reais.

Pois você me enganou! :timido:
Mas é uma história tão incrivel que bem podia ser capaz de o cara ter se matado por isso (já pensou se estivesse vivo na década de 1940?).

Quando lia aquelas histórias do Julio Verne (e ele escreveu várias coisas que foram meio que "premonições") sempre pensei: e se o cara tivesse previsto uma tragédia ou coisa assim? Como ia ficar a cabeça dele?
Eu ficaria meio pirada, acho.

Então ele não escreveu a carta de "despedida"?
Mas vi que ele morreu sim no hotel Alamac, e de overdose de proto-iodeto.
 
Clara V. disse:
Então ele não escreveu a carta de "despedida"?
Mas vi que ele morreu sim no hotel Alamac, e de overdose de proto-iodeto.

ñ, a carta ñ existe, mas usei elementos reais da vida dele pra escrever ela.
 
Oi, JML.

Eu vim aqui impelido pelo seu post na discussão sobre O Pêndulo de Foucault. E quero dizer que achei muito interessante.

Você de utilizou do tópico criado na realidade de que suicidas sempre deixam cartas, do tópico de possível suicida do personagem que você escolheu e encontrou uma motivação interessantíssima para o provável suicídio. Esse seu conto é muito interessante nesse encadeamentos de possibilidades da realidade.

O único problema (e remetendo ao tópico do Pêndulo) é o anúncio do seu Conto como Tradução. Apesar de o espaço prosa (aqui no site - me parece) ser um espaço destinado aos textos ficcionais (não tenho total certeza - ainda não explorei esse pedaço), os leitores entraram em confrontação entre o espaço e a instrução do autor. Porque ninguém imaginou, num primeiro momento, que o parágrafo no qual você afirma ser o texto a seguir uma tradução, fazia parte do conto. Assim, você ficou preso numa forma de leitura "problemática", já que muitos encararam o texto ficcional como verdade.

E tem outra coisa interessante: você se coloca como personagem. Quer criar confusão na cabeça do leitor e deixá-lo em dúvida sobre a ficcionalidade do texto, basta o autor se colocar como personagem.

Mas, isso depende. Talvez, não seja um problema, pois isso poderia ser o que você esperava do seus leitores; da mesma forma que o criador do Atividade Paranormal, esperava aumentar o impacto do seu filme ao não informar que aquilo era invenção dele.

É uma possibilidade interessante e ao mesmo tempo um problema. Mas, vai de acordo ao movimento de descoberta dos limites entre os textos literário e não-literário.

O textual é interessante e o extra-textual aumenta esse interesse. Parabéns.
 
O único problema (e remetendo ao tópico do Pêndulo) é o anúncio do seu Conto como Tradução. Apesar de o espaço prosa (aqui no site - me parece) ser um espaço destinado aos textos ficcionais (não tenho total certeza - ainda não explorei esse pedaço), os leitores entraram em confrontação entre o espaço e a instrução do autor. Porque ninguém imaginou, num primeiro momento, que o parágrafo no qual você afirma ser o texto a seguir uma tradução, fazia parte do conto. Assim, você ficou preso numa forma de leitura "problemática", já que muitos encararam o texto ficcional como verdade.

E tem outra coisa interessante: você se coloca como personagem. Quer criar confusão na cabeça do leitor e deixá-lo em dúvida sobre a ficcionalidade do texto, basta o autor se colocar como personagem.
aí é q + uma vez discordamos, oq ñ vem a ser algo ruim:


  1. em momento algum me coloquei como personagem ou narrador. qtos textos ñ começam na 1ª pessoa e nem por isso diz-se q é o escritor quem ali fala? o fato é q, por ter iniciado em 1 tom informal, proposital, faz com q o leitor pense logo d cara q o 1º § é algo separado do restante qdo é parte integrante & essencial. qtos livros ñ usam esse mesmo subterfúgio no apêndice, dizendo q o q vai ser narrado a seguir é 1 documento antigo encontrado, ou q fora contado por outra pessoa.
  2. e mesmo q eu dissesse q o narrador se chama JLM, ainda assim há q se separar o JLM-escritor do JLM-narrador. ou ñ posso criar 1 personagem fictício com o mesmo nome e características q as penso ter, mas fazendo coisas q eu ñ faço, como traduções?
  3. todo escritor precisa saber mentir bem. posso ñ ser bom escritor mas mentiroso sou desde os 3 aninhos. o texto está na seção prosa pq é inteiramente ficcional, então acho q ta certo né?
 
em momento algum me coloquei como personagem ou narrador. qtos textos ñ começam na 1ª pessoa e nem por isso diz-se q é o escritor quem ali fala?

Você pode não ter pensado que se colocou como personagem, e não era, enquanto os leitores acharam que a carta era uma tradução de uma carta real de um escritor americano. Dando ao primeiro parágrafo o caráter de intervenção do tradutor. Tanto que todos os teus leitores encararam assim.

Mas, você se tornou personagem ao fazer com que o conto se inicie no parágrafo de intervenção. Quando se constrói uma voz, essa voz torna-se personagem. E a voz que você construiu adquiriu caráter de JLM quando você instrumentou o seu leitor a que ele pudesse ler o texto como resultado de uma tradução sua.

Mas, para o leitor você torna-se personagem quando informa a ele que todo o texto faz parte do conto.

o fato é q, por ter iniciado em 1 tom informal, proposital, faz com q o leitor pense logo d cara q o 1º § é algo separado do restante qdo é parte integrante & essencial. qtos livros ñ usam esse mesmo subterfúgio no apêndice, dizendo q o q vai ser narrado a seguir é 1 documento antigo encontrado, ou q fora contado por outra pessoa.

Não é apenas a questão da informalidade, mas questão de forma. Em contos e, ainda por cima, em ambientes virtuais essa quebra não é muito comum. Qualquer um poderia encarar o parágrafo inicial como a informação do participante do blog que explica o seu conto ou que espera que as pessoas gostem. Ou seja, teus leitores seguiram a instrução que eles receberam ao pé da letra.

Além disso, quando se acredita que o autor abriu um parêntese para falar ao leitor, o leitor agirá de forma a dar credibilidade às palavras que ele acredita serem do autor. Por isso, seu conto "falha" em fazer o leitor pensar que o primeiro parágrafo é parte do texto, pois não há outra forma de fazer ele perceber isso que não seja dar essa informação ao leitor, como você fez no debate.

Falha entre aspas, pois, geralmente, o objetivo do uso dessa intervenção do autor é por em questão a crença do leitor.

ou ñ posso criar 1 personagem fictício com o mesmo nome e características q as penso ter, mas fazendo coisas q eu ñ faço, como traduções?

Foi isso o que eu pensei que você tivesse feito. Toda vez que penso nisso, imagino os romances em que o autor faz toda aquela intervenção anterior, interferindo na forma de leitura do leitor. Querendo ou não, o autor que faz isso, coloca-se como personagem, pois o romance começa ali, naquela intervenção. E é apenas nesse momento, quando o leitor recebe essa informação que ele passa a pensar que o sujeito que enuncia esse texto introdutório seja o personagem autor que direciona a leitura. Antes dessa informação, não há, para o leitor outra forma de compreender a intervenção.

todo escritor precisa saber mentir bem. posso ñ ser bom escritor mas mentiroso sou desde os 3 aninhos. o texto está na seção prosa pq é inteiramente ficcional, então acho q ta certo né?

Não obrigatoriamente.

Desculpe ter sido redundante nas respostas.

Abraço!
 
eu ñ me identificar como o narrador ñ significa q eu ñ quisesse passar a impressão dúbia no texto. ou seja, fazer com q acreditassem q era 1 comentário em uma 1ª leitura qdo na verdade era parte do texto e em uma 2ª olhada lê-lo d modo diferente, como q vendo a construção ficcional logo no começo.

oq vc vê como leitura problemática e falhas eu vejo como acertos, pois causaram justamente a reação q eu esperava. mesmo q vc discorde ou ñ entenda a oq ou como eu a quis provocar. sei q textos virtuais são diferentes por isso quis testar online a fórmula q já conhecia dos livros. pela reação dos leitores, ñ somente aqui mas nos outros sites q postei, o experimento cumpriu o seu papel p mim como escritor. se ñ cumpriu p vc como leitor e te deixou chateado, ñ posso fazer nada, é liberdade sua pensar como quiser. assim como é liberdade minha discordar da sua opinião, me baseando em todos os outros feedbacks q obtive, inclusive d escritores.

mas enfim, ñ era vc lá no post do pêndulo q defendeu o uso d personagens históricos, mesmo q confundissem a realidade? aqui dei 1 pqno exemplo d como fazer isso e usando subterfúgios modernos & virtuais p passar a impressão d verossimilhança, e justamente por isso te fiz mudar d opinião? qual é o problema em intencionalmente querer deixar o leitor sem saber oq é fato e oq é ficção no texto na 1ª leitura, já q aqueles q se interessarem irão pesquisar + a fundo?
 
JLM, eu não fiquei chateado, nem estou provocando você, eu apenas quis tornar mais claro como eu percebo a ação que você fez. Não apontar o que você fez como falha.

Por isso eu disse falha entre aspas, pois eu sei que não é uma falha, mas uma ação consciente. Na minha opinião você conseguiu fazer isso muito bem.

Eu não estou falando mal, estou elogiando seu texto.

A questão é que como leitor, eu não trabalho com as intenção do autor, eu lido com o texto efetivado. Foi isso o que eu ressaltei e o que eu gostaria de que ficasse claro. Só isso.
 
Só pra dar uma arrematada no meu pensamento: eu,também, queria demonstrar como o leitor fica nessa situação. O fato de ele ficar em suspenso é um aspecto de qualquer texto que use esse recurso.

Se eu fiz isso parecer ser responsabilidade única do seu texto, me desculpe, não era essa a intenção.
 

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