Adaptado de
Balrogs
O centro do debate está em A Sociedade do Anel, vol. II, cap. 5, A Ponte de Khazad-dûm. Este capítulo foi montado em torno do desastroso encontro da comitiva com o Balrog, conhecido apenas como Ruína de Dúrin, a mesma criatura que tinha expulsado os Anões de sua antiga casa séculos antes. Em especial, duas referências dão origem à discussão. O primeiro descreve o Balrog do ponto de vista de Gandalf:
(1)“His enemy halted again, facing him, and the shadow about it reached out like two vast wings.”
The Fellowship of the Ring II 5 The Bridge of Khazad-dûm
(1)“O inimigo parou outra vez, enfrentando-o, e a sombra à sua volta se espalhou como duas grandes asas.”
A Sociedade do Anel, vol. II, cap. 5, A ponte de Khazad-dûn
Por si só, não é particularmente controverso. A “sombra” do Balrog assumiu uma forma que parece, pelo menos, um pouco com asas. O fato é que "como asas" não pode significar literalmente asas reais. Os problemas começam, porém, com outra referência que aparece logo adiante:
(2) “...suddenly it drew itself up to a great height, and its wings were spread from wall to wall...”
The Fellowship of the Ring II 5 The Bridge of Khazad-dûm
(2) "... de repente ele saltou a uma enorme altura, e suas asas se abriram de parede a parede”
A Sociedade do Anel, vol. II, cap. 5, A ponte de Khazad-dûn
Estas são, muito provavelmente, as mais fervorosamente discutidas passagens já escritas por Tolkien. Isso parece estranho à primeira vista, porque, de fato, a maioria das pessoas concorda que o significado não é ambíguo, que é bastante óbvio o que as afirmações significam. A disputa começa, porém, com um fato curioso: como uma ilusão de ótica, essas citações têm duas interpretações óbvias. Seja qual for o significado que você interprete, e não importa quanta certeza você tenha, há muitas pessoas que as interpretam de uma maneira diferente da sua (e eventualmente com a mesma certeza).
Para um grupo de leitores, “suas asas se abriram de parede a parede” (2) refere-se à passagem anterior “a sombra à sua volta se espalhou como duas grandes asas” (1). Para eles, isso só reforça a afirmação anterior, e não diz nada sobre qualquer outra espécie de asas. No lado oposto do debate, “suas asas se abriram de parede a parede” (2) não está de todo relacionado com a passagem anterior (1). Em vez disso, é uma clara referência às reais asas do Balrog (asas físicas, não de sombra).
O debate gira em torno de argumentos sobre qual destas duas interpretações óbvias seria a correta. É provável, porém, que nenhuma seja explicitamente correta: como você lê a passagem depende do que você já presumia a respeito da aparência de um Balrog. Não tentamos tirar quaisquer conclusões definitivas por enquanto, só mostramos que a estrutura das passagens comporta qualquer daquelas duas interpretações. Uma maneira de fazer isso é substituir o termo contestado "asas" com um termo menos controverso.
Vamos começar usando "braços" em vez de "asas". Não há absolutamente nenhuma dúvida de que havia braços de Balrogs - é tão evidente que parece estranho questionar isso. Agora, imagine que Tolkien tivesse escrito “e a sombra à sua volta se espalhou como dois grandes braços.” Isso é obviamente uma figura de linguagem (símile), como no texto original (1). Se pouco depois viesse a passagem “e seus braços se abriram de parede a parede”, parece natural que se leia esta segunda referência como uma referência aos seus verdadeiros braços, não à sua sombra em forma de braços, apesar de logo antes nós termos lido sobre a sombra em forma de braços. Este é o modo como a facção pró-asas vê o texto, porque supõe que os Balrogs têm asas reais, tão incontestavelmente reais como os verdadeiros braços.
(obs: na verdade esta interpretação das passagens só pode conferir asas a este Balrog em particular, extrapolar para outros Balrogs dependeria de informações adicionais que não foram discutidas).
Podemos simular a visão alternativa com "tentáculos". Não há absolutamente nenhuma evidência de tentáculos em Balrogs, e é seguro presumir que eles não fazem parte da sua anatomia. Mais uma vez, “e a sombra à sua volta se espalhou como dois grandes tentáculos” é lida sem problemas, como uma figura de linguagem (símile). Agora, porém, quando a seguir lermos “e seus tentáculos se abriram de parede a parede”, a interpretação natural seria um pouco diferente. Temos certeza de que não existem tentáculos reais no Balrog, por isso a passagem é lida facilmente como uma referência à figura de linguagem anterior (a figura de linguagem estaria dada nesta passagem de maneira implícita, pois foi dada de maneira explícita pouco antes): devem ser novamente os "tentáculos de sombra" e não tentáculos reais. Este é a posição dos anti-asas: porque eles supõem que os Balrogs não têm asas reais, é natural entender "suas asas", como uma extensão da passagem anterior.