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[Paganus] Monte Meru [M]

  • Criador do tópico Paganus
  • Data de Criação
P

Paganus

Visitante
Não sei se firo as regras do clube criando um tópico para registrar minhas tentativas infantis de poesia, mas em todo caso, se as firo peço que um moderador me alerte.

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O Monte Meru, segundo consta na mitologia hindu e nos relatos dos Pûranas, é a montanha cósmica, ao redor da qual orbitam Surya (o Sol) e todos os outros planetas. É o centro do Universo manifestado, e onde o Espírito habita, o lar do Senhor Brahma e de todos os deuses celestiais (deva), e um suporte de meditação ióguica tradicional. O Monte é um símbolo de todo o cosmo, de toda a vida e do espírito que impele a vida à além-vida, é o Centro, o Axis-Mundi, como a Árvore da Vida, Yggdrasill na tradição nórdica, a própria Árvore Invertida, cujos ramos se projetam na terra e raízes no céu, como a indicar a direção da manifestação e o caminho para a moksha. Árvore Sephirótica, na Kaballah etc.

Disso se seguem dois pontos:

1-Axis-Mundi: o Monte simboliza o cosmo, em seu aspecto natural de alteração, de nascimento, vida, morte e renascimento eterno, análogo ao próprio processo de nascimento, vida, morte e renascimento do homem. A árvore é o macrocosmo, o homem o microcosmo. Monte Meru e Purusha, o macrantropo. É a vida que pulsa nos seus aspectos mais fecundantes e mais terríveis, vida e morte, eterna sucessão angustiante e esperançosa, a dualidade da vida em si mesma.

2-Centro Primordial: enquanto Centro, é de Meru que se origina, como de um princípio metafísico único, toda a sacralidade do mundo, desde os seus aspectos vitais mais orgânicos até toda energia espiritual, desde a autoridade bramânica até a realeza xátria, da dimensão metafísica do sexo e da guerra até a teologia monárquica, da metafísica aristocrática à metafísica ascética, ióguica. É o suporte central de meditação do iogue e de amparação política e sacral do Imperium.

Em tudo isso, se encontra que, sendo centro, de onde o Brahman se manifestou em Purusha (espírito) e Prakrti (matéria), é para esse centro que a mesma manifestação tende. Conforme os ciclos se sucedem, as Quedas e a decadência espiritual e metafísica do homem juntamente com o cosmo, tudo se torna mais bruto e material, mais caótico e distante de Meru. Não há mais centro claramente visível, mas até os piores séculos do Kali Yuga o Monte Meru. Em outras palavras, sempre haverá oportunidade de se ascender ascética e regiamente ao Topo, parlamentar com os deuses, adorar Brahman e nele se libertar do samsara.

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Isso ilustra bem o que a poesia é para mim. O fazer poético sempre vi como algo mais que tessitura de belos quadros para quadros vazios e mais que apologias a certas ideias e comportamentos. A poesia sempre me apareceu e me impactou como uma cosmovisão mais profunda e orgânica que a mitologia mais ancestral, da qual se alimenta, conscientemente ou não. A poesia é muito mais que qualquer ideologia ou filosofia mesmo que assim se apresente, há algo de espiritual na alma que se desnuda, ascetiza para se expressar em formas belas e com uma força, uma intensidade poderosíssima, é uma forma de se ver o mundo que é capaz de 'espiritualizar' as ideologias mais grosseiras pela própria tessitura poética, pelo desnudamento e derramamento até à morte exacerbante da personalidade. O poeta se despersonaliza para se universalizar, ele atinge aquela impessoalidade dos maiores estados místicos e iniciáticos por esse regime ascético da poesia e pelo fazer que, de fato, 'imanentiza o schaton', torna o Fim ontologicamente próximo do contingente. Toda poesia é uma busca, mais ou menos orgânica e bem-sucedida, do Monte Meru.

Bom, chega de filosofice que importa muito pouco ou nada, o que importa é sentir, sentir a cousa mesma e por ela se chegar ao nada verdadeiro, ao tudo em tudo.

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os diabos na câmara escura e brilhante

Assim como te via, brilhando ao luar como te via, sem brilho e nem luar,
via eu o sol dançando pelos teus cabelos, as ninfas a cantar, e rodopiar e gozar
da eternidade sonhada e refletida no teu olhar
sem sol nem luar, sem nada eterno nem mítico
só o meu pensamento a rodar, e a cismar
e... assim... vejo como um cego a sonhar
teu sorriso belo e branco, cheio de dentes
a me humilhar.

Queria não pensar tanto, não lembrar sequer de ti,
nem é tu o problema, amor, maior que a vida,
que coroei dona do meu coração desde anos pueris mais distantes.
Mas tem algo que me trazes e que é maior que teus olhos pretos e lindos, muito vivos;
algo que me faz cismar.
Um quê de pensamento e emoção, que obscurece a sensação,
direcionado pelo meu gozo, desviado pelo gosto, afirmado pela saudade.

Será isso o quê, quimera de Satã?
O que me fazes sonhar, tremer, temer, balouçar,
no inferno do desalento cair, no nada insistir,
tristeza me engolir, o vazio fitar?

-Isso, pobre diabo, que deverias amaldiçoar em vez de a mim caluniar
se chama, toma tento,
coração.​
 
Uma declaração de amor


Queria antes de tudo te dizer

Te dizer com a minha boca

Com a minha boca na tua

Com a minha língua proverbial na tua boca

Que te amo.


Te amo com todo o poder dos meus ombros

Com o vigor das minhas costas

Com a força dos meus quadris

Com a paixão trêmula

Extasiante

Trêbeda

Dos meus braços.


Acima de tudo, te diria tão eloquentemente sobre o amor

O meu amor por ti e o amor em geral

O amor metafísico e o amor dos anjos

Mas perdoa-me, não te diria em palavras


Em palavras, não.

Não...

N...

...


.
 
Excrescência

I

Sou parte da relva tanto quanto
Sou parte da vida que escorre pelos teus dedos finos e amarelos
Quando descobres tua flor
Desabrochas para o mundo, para mim, para o ser da relva, relva úmida, molhada do teu doce orvalho.

Lembrarias também, pequena,
Dos meus olhos lânguidos com que o sol te olhava e abrasava
Da lunar observância das regras perfuradas pelo calor das tuas reentrâncias
E da fecundação pelo orvalho, quando de ti um deus nasce

Com o sorriso da morte expulso de teu ventre pelo milagre

II

Ela visitou aqueles pastos carbonizados pela tragédia
E traçou um círculo em torno da própria vida retilínea que te tinha como centro, princípio e termo
Por mais que tentasses e te desviastes para cá e para lá, com tua canalhice e podridão
Saberia, no teu íntimo sentirias, e no teu colo se derramaria

A eterna dor e drama incessante do negro e terrível acontecimento da solidão

III

Ela lamentaria, amor meu
Tua rosa de frescor
Ter perdido antes o viço que a pureza
Pois tais rosas, te ensinaria a vida
São gozadas em seu esbagaçamento

E a contemplação à distância é coisa de maricas que não metem, ou metem mal.

IV

Eu ando pelas vielas da rua da minha infância
E estranho cada pedra solta, cada pequena destruição, cada casa abandonada
Estranho cada casa nova, cada pequena construção, cada rua asfaltada
Estranho tua ausência como estranho que cá já passaste
Passaste com esses teus pés que não são mais meus, por essas ruas que não são mais
As da nossa infância.

Passaste com pés que nunca foram teus, que o são menos agora

Quando nem em meus sonhos habitas, apenas perduras, como longínqua prenda, doce recordação.
 
Em movimento

Pela eternidade me bastaria a lembrança de hoje
Os raios do sol a banhar a tua face
E os teus braços
E os pelos dos teus braços, finos, macios, dourados pelos raios do mesmo sol que aquece meu coração no encontro com o teu
Em um veículo em movimento

Quando se move o Sol à roda da Terra que é imóvel nos teus braços que tocam os meus
Nas espáduas que se unem ao meu peito
Em um veículo em movimento

O sol que bate nos teus olhos, grandes, desconfiados, quentes
Que ilumina teu rosto encovado, nem feio nem bonito
Que mescla as tuas cores, em formas tão nítidas
Com as cores do meu pensamento, pelo sol iluminado
Em um veículo em movimento

Meu pensamento purificado, limpo, abrasado pelo sol da inocência
Se enamora da ardência do meu corpo, que te envolve sem tocá-lo
Vive o desejo de te consumir, te arder no meu fogo próprio, tão meu quanto teu
Em um veículo parante

Meus sentidos se nublam diante da imprevista consequência
Do toque de suas pernas no meu colo
Revirando e virando as trocas de fluxos de energia de desejo
Em um veículo parado

Quando tu te afastas de mim em direção a um destino
Posto que cruel, posto que distante de mim
Penso na tristeza, no acontecimento, nas tuas faces, vermelhas, indefesas

Em um veículo do qual partes, que torna a se mover.
 
Nesga de sol

O sol nasce por cima dos teus ombros, com uma luz fulgurante através da nossa janela
Ele doura de luz molhada os teus ombros salgados
Sobe pelas tuas costas que vejo com minhas mãos
Com o vento que desce pelos teus cabelos, que, esvoaçantes, entram na minha boca
Aberta e fechada, aberta e fechada
Sempre-movente, moventes os carros meu e teu, um carro só, unidos sempiternamente

Nessa lama sem rosto, nessa água com o teu cheiro
 
Trilha

Eu te olho
Você me olha
Olhos que se desencontram
Você me olha
O volume da minha calça sobe
Eu te olho
Sobe mais
Você desvia o olhar
Ele abaixa
Sobe
Te olho
Viro o corpo de lado
Sobe o teu peito
Desce o teu peito
Remexes nos cabelos longos, lisos, castanhos
Endureço as pernas duras, estremeço
Sobe
Desce
Sobe
Me enervo, te olho
Tu me olhas
Encontro de olhares
Abaixo o olhar
Olho tuas pernas, roliças, lisas, brônzeas
Olhas meu peito, meu pescoço, minha face de barba mal feita
De olhos negros e brilhantes, inflamados
Olho teus olhos, castanhos, sérios, buscantes
Sobe, desce, sobe, sobe
Olho tuas mãos, brancas, perfeitas, unhas-pintadas
Sobe
Sobe, sobe, sobe
Sobe
Caminho, aproximo-me
Alarga-me o teu peito
Não caminhas, aproxima-te, vira-te pra mim, levemente
Para ti aumenta minha mão ossuda e trêmula
Quente
Próximo
Montes elevantes
Perfume que invade meus lábios
Perfeição do teu rosto
Dureza superficial de minhas mãos
Sorris

Desabo
 
Impalpabilidade

Eu gostaria do fundo do meu coração
De escrever um poema sem palavras
Um poema que fosse antes um espelho ou um microfone
Que imagens de essências celestiais

Gostaria de fazer um poema
Que fosse puro som
Que fosse essa música terna, embalante
Essa batida gostosa que faz meus pés endoidecerem
Meu peito arder
Meu corpo a dançar, a balançar

Eu queria dançar, inverbalmente, poeticamente
Queria uma composição simples, livre
Que me livrasse do peso, da responsabilidade
De ter costas e responsabilidades

Queria uma canção-poema que fosse como a tua bunda girante rebolante hipnotizante
Como o teu sorriso e teus cabelos quando ambos voam pelos ares
Queria uma poesia dos meus passos, da minha alegria
Do meu quadril

Eu só queria gravar na eternidade o instante fugaz da morte da nossa mortal insignificância
Apenas queria a imortalidade, e não qualquer imortalidade
Queria a poesia do nosso amor
Inverbal
Impalpável
Insubstancial

Eterna
 
Sorriso

O sol a se derramar pelas vielas esburacadas
Com a vida que se findava na rodovia
E as casas suburbentas do nosso bairro torpe e belo
Da nossa existência rotineira, macilenta, amorosamente tediosa
Se mantinha e me mantinha de pé
Por causa do teu sorriso

Do sorriso dos teus lábios
Do sorriso do teu colo

Do riso das tuas pernas

Inter-referencialidade


Lembrei então, como quem não quisesse quase
Dos lindos e tristes olhos meus que enxergavam tristeza e beleza
Nas formas das paisagens anti-naturais
Tentando penetrar com gozo e dor na essência íntima das coisas.

Estes olhos arranquei
Troquei-os por um colar de pérolas
Para teu colo adornar,
Ó minha tirana, minha escrava, minha rainha

Sensibilidade Imperatriz.

Puberdade


A verdade que me nego hoje a crer
A crer e a amar
Era a inocência das estrelas, a placidez
Das águas, a fúria das
Ondas
Do mar, o teu sorriso uterino-virginal-omphálico
O núcleo da minha experiência

De vida e morte.

Ressaca

Sobre dias de chuva terei ainda muito que falar
Mais teria que cantar
Prefiro porém calar

Calo-me diante das grossas gotas que castigam os vales bueirentos
Da minha cidade litoral, do meu porto de saudades
Das poças explodindo sob meus pés

Sinto apenas o beijo áspero do vento na praia, que prefiro
O roçar de suas asas gélidas pelo meu rosto
Contemplo o vôo dos guarda-chuvas, barracas, lonas diversas
Admiro a fúria de Poseidon teso, rijo, ereto no devir telúrico-aquático

Penso o quanto detesto os dias burgueses de sol
E abraço o meu irmão proletário na sua essência chuvosa e terrível
E me esqueço de todas as classes e teorias e idéias
Cheirando, vendo, sentindo Deus
Na ressaca.


Amo essa cidade.

Recreio

Teria muito de que me arrepender
Se não te amasse tanto, tanto ao ponto do desprezo
Não por alguma lição moral, ou alguma besteira assim

Simplesmente pelo fato de recrear meu coração com alguma coisa.
 
Compensações

A tristeza paralisante que sinto
Vem junto com a irritação da falta de nicotina
Da falta de esperança, da vacuidade de nossa vida política
Do meu vazio existencial
Da minha experiência da falta de Deus,
Da minha falta de vontade de buscar Deus
E creio ser isso saudade tua e mágoa pelos nossos sofrimentos
Porém passa um par de pernas brilhantes
Levanto meu olhar
E tudo está bem de novo!

Sobe,sobe, fumaça, queima e sobe ao Senhor!

Olfato

Ventos absurdos e calados remorsos enterrados
Sem serem despertos e chamados de volta, amuados
Permanecem me remoendo inconscientemente, me mastigando as carnes
Enquanto meu peito estufa

E meu sexo se inflama com esse perfume de vagabunda.

Perdão!

A minha essência, a minha consciência poética
É ser vadio
Minha tragédia é o medo
De ser livre para vadiar.
Talvez a consciência estética seja a única consciência que exista
Talvez nada mais exista além da beleza
Talvez só os artistas existam
Só os romances sejam reais
Só as pinturas revelem a essência do mundo
E as esculturas, a profundidade da verdade
Talvez só a poesia Seja

E não sejamos egoístas.
 

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