Cada livro tem seus encantos, características próprias a qual nos afeiçoamos, em uns livros a estória impera, em outros o cenário e nos ditos alta literatura é a mestria de autor sobre palavra. Nos que priorizo a estória espero que a escrita seja apenas adequada, alguns vícios ou extrema pobreza de linguagem atrapalham, achei o Harry Potter em português melhor que em inglês, a tradução melhorou o livro, à exceção de alguns termos como “muggle”, traduzido como “trouxa”, muda a conotação da palavra. JK Rowling é má escritora, mas pegou o folclore estereotipado sobre bruxas como base de uma sociedade paralela mágica no estilo dos mundos das trevas iniciados pela Anne Rice e aperfeiçoado pelo Mark Rein•Hagen nas páginas da antiga White Wolf. Juntou o estereótipo fantástico (dragões, Trolls) e criou alguns monstros interessantes como os dementadores, baseados na patologia da depressão. O herói é meio tapado, vai com a corrente, mas a junção de tudo fica divertido. Posso estar enganado, mas antes de 2000 fantasia normalmente tinha protagonistas adultos e não era exatamente leitura infantil, pelo menos na maioria dos livros que li.
A trilogia do Stieg Larson foi um dos livros que mais gostei nos último dez anos, pegou o gênero policial, juntou sua experiência como jornalista e criou um romance interessante oferecendo ar fresco no gênero policial e ousaria dizer espionagem que ficou meio difícil com o fim da guerra fria e internet. Não tenho capacidade de ler o Larson no original, mas a linguagem jornalística, normalmente pobre para literatura ficou bem em um livro protagonizado por um jornalista, não é grande literatura, mas foi muito divertido, e mesmo traduzido, “jornalistiquês” soa bem, pois tem este estilo difuso e sem caráter e amalgama todos os escritos de jornal.
Quando partimos para alta literatura é que a coisa complica, pois a linguagem é de suprema importância, muitos livros nem tem estória que o valha, mas o jeito de escrever encanta. É tão própria que não permite tradução. Hemingway traduzido perde toda graça, sua força consiste no poder de concisão da língua inglesa, em português o texto perde todo impacto. Fitzgerald é outro, este trecho em português fica prolixo e de certa maneira caricato:
Agora vejam em Inglês:
Tem um ritmo, uma fluência lírica que deixa a versão portuguesa com cara de caricatura barata. Fitzgerald só pode ser Fitzgerald em Inglês.
Eu espero do escritor de português mestria como do escritor anglo em sua língua, como o fez Pessoa, mesmo fora da poesia. Acredito ser o português língua muito mais selvagem a domar, se escrever é juntar palavras, em nossa língua temos mais possibilidades, o que torna a escolha mais difícil, muitíssimo mais complicada, uma língua mais desafiadora.
Abraço,
Alex
A trilogia do Stieg Larson foi um dos livros que mais gostei nos último dez anos, pegou o gênero policial, juntou sua experiência como jornalista e criou um romance interessante oferecendo ar fresco no gênero policial e ousaria dizer espionagem que ficou meio difícil com o fim da guerra fria e internet. Não tenho capacidade de ler o Larson no original, mas a linguagem jornalística, normalmente pobre para literatura ficou bem em um livro protagonizado por um jornalista, não é grande literatura, mas foi muito divertido, e mesmo traduzido, “jornalistiquês” soa bem, pois tem este estilo difuso e sem caráter e amalgama todos os escritos de jornal.
Quando partimos para alta literatura é que a coisa complica, pois a linguagem é de suprema importância, muitos livros nem tem estória que o valha, mas o jeito de escrever encanta. É tão própria que não permite tradução. Hemingway traduzido perde toda graça, sua força consiste no poder de concisão da língua inglesa, em português o texto perde todo impacto. Fitzgerald é outro, este trecho em português fica prolixo e de certa maneira caricato:
"Sorriu compreensivamente - muito mais do que compreensivamente. Era um desses sorrisos raros que têm em si algo de segurança eterna, um desses sorrisos com que a gente talvez depare quatro ou cinco vezes na vida. Um sorriso que, por um momento, encarava - ou parecia encarar - todo o mundo eterno, e que depois se concentrava na gente com irresistível expressão de parcialidade a nosso favor. Um sorriso que compreendia a gente até o ponto em que a gente queria ser compreendido, que acreditava na gente como a gente gostaria de acreditar, assegurando-nos que tinha da gente exatamente a impressão que a gente, na melhor das hipóteses, esperava causar." - O Grande Gatsby.
Agora vejam em Inglês:
“He smiled understandingly--much more than understandingly. It was
one of those rare smiles with a quality of eternal reassurance
in it, that you may come across four or five times in life. It faced—or seemed to face--the whole external world for an instant, and then
concentrated on YOU with an irresistible prejudice in your favor. It
understood you just so far as you wanted to be understood, believed in
you as you would like to believe in yourself and assured you that it
had precisely the impression of you that, at your best, you hoped to
convey.” - The Great Gatsby
Tem um ritmo, uma fluência lírica que deixa a versão portuguesa com cara de caricatura barata. Fitzgerald só pode ser Fitzgerald em Inglês.
Eu espero do escritor de português mestria como do escritor anglo em sua língua, como o fez Pessoa, mesmo fora da poesia. Acredito ser o português língua muito mais selvagem a domar, se escrever é juntar palavras, em nossa língua temos mais possibilidades, o que torna a escolha mais difícil, muitíssimo mais complicada, uma língua mais desafiadora.
Abraço,
Alex