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Motor City: de orgulho à decadência

Elessar Hyarmen

Senhor de Bri
A cidade do automóvel chegou ao fundo do poço, bairros inteiros desapareceram. Será que ainda há esperança nessas outrora ruas cheias de orgulho?

Se você não soubesse o que realmente aconteceu aqui, pensaria que se trata do que restou de uma guerra nuclear. Indo em direção oeste nesse clima frio, partindo do centro de Detroit sobre a neve na Avenida Michigan, passando pela fábrica de River Rouge da Ford, encontra-se quarteirões e quarteirões de lojas fechadas, cujas chances de reabrirem são zero, basta olhar para as calçadas desertas e as casas ao redor, onde moravam seus clientes, hoje vazias e abandonadas, queimadas ou simplesmente demolidas. Estamos a apenas 11 minutos do centro da 11ª cidade dos EUA, mas nada aqui indica isso, não se parece com o 1º mundo, mas sim, com o fim do mundo.

Em 1967, John Lee Hoocker gravou a música Motor City´s Burning, inspirado nas tensões raciais ocorridas em sua adotada cidade natal. Alguns dizem que o declínio de Detroit veio bem depois, mas se acentuou na crise da indústria automobilística desde 2008. Com cerca de 1/3 dessa indústria, o Estado de Michigan sofreu as consequências, enquanto assistia ao fechamento de 230 mil postos de trabalho nos últimos três anos. Os executivos da indústria que estavam na abertura do Salão de Detroit em janeiro mostravam otimismo na recuperação da indústria americana e orgulho na criação de novos empregos. Mas poucos se arriscariam a um passeio longe da área dos hotéis de luxo e do Cobo Hall, onde acontece o Salão. Ali havia policiamento ostensivo e transporte exclusivo até o hotel. Eles não devem ter visto a devastação que a indústria do automóvel aplacou sobre a cidade que nos deu a GM, Ford e Chrysler; o modelo T e os ‘muscle cars’, aviões e veículos militares e munições que venceram a II Guerra Mundial e a gravadora Motown. Mas eles não teriam que ir longe para ver os resultados da ‘praga’, como se costuma dizer em Detroit, que consumiu a cidade, transformando seus edifícios e teatros em estacionamentos.

A cidade do automóvel não está em chamas, mas está naufragando e as estatísticas mostram isso. Detroit perdeu mais da metade de sua população em relação ao pico demográfico assinalado no pós-guerra. Um terço de suas casas estão vazias ou demolidas. Metade das crianças vive na pobreza e o preço de uma casa de padrão médio está em torno dos R$ 12 mil. Outro dado merece nota. O novo prefeito, o ex-astro de basquete Dave Bing vai fechar um terço da cidade. Administrando um déficit de 300 milhões de dólares, a prefeitura simplesmente não tem como manter bairros abandonados por seus moradores. Portanto, se você mora em Detroit, ainda este ano receberá uma carta explicando tecnicamente o que você já está vendo na prática: policiamento, limpeza, manutenção e socorro não estarão mais à disposição em sua área e que a única solução é mudar-se para um dos bairros que serão mantidos pela prefeitura.
“Estou aprendendo como me tornar autosuficiente em captação de água, mas espero não precisar fazê-lo. Se estão realmente pensando em nos riscar do mapa, não nos avisaram ainda”, alega Mark Covington, que mora na Georgia Street, não muito longe da enorme fábrica de Hamtramck da GM. É um lugar perturbador de se estar, mesmo ao lado de um morador local. É – ou era – uma área residencial, mas as ruas estão completamente desertas. A maioria das casas ou foi demolida, ou permanecem como esqueletos inertes. Portas, janelas, fios e encanamento foram retirados e vendidos como sucata. Matilhas de cachorros famintos e abandonados por seus donos vagam pelo local. Pegadas recentes estão na neve a nossos pés.
“Viramos atração turística”, brinca Mark. “Vejo casas que conheci quando era criança, tombando sozinhas. A maioria das pessoas daqui trabalhavam ou em Hamtramck ou na fábrica da Ford, mas hoje isso é raro. Quando a crise se instalou as coisas já não estavam fáceis, mas tudo piorou. Há pessoas por aqui morando sem aquecimento e eletricidade. O lixo foi se acumulando nas ruas e acabou entupindo toda rede fluvial e de esgoto. Não é assim que eu gostaria de lembrar do meu bairro, é difícil, muito triste, machuca. Então, decidi fazer alguma coisa”.

osso gentil entrevistado de 38 anos, que perdeu seu emprego em 2008, decidiu morar na Georgia Street com sua mãe e com sua avó na casa em que nasceu - uma das poucas ainda em pé. Achou que plantando hortas nos terrenos baldios, desencorajaria as pessoas a jogar lixo ali, além de fornecer alimentos de qualidade aos vizinhos que não podem pagar por eles no mercado; apesar de que o mais próximo está a quilômetros de distância.
Parece que funcionou. Mark e seus voluntários já colhem 36 diferentes tipos de frutas e vegetais em vários terrenos abandonados; eles têm uma cabra e algumas galinhas. Compraram uma velha loja por 1 dólar, onde fazem festas infantis e assistem a filmes a noite, além de repartir alimentos e agasalhos. Fazendas urbanas como a de Mark é um dos negócios que mais crescem hoje em Detroit, uma tendência contrária ao crescimento urbano atual das cidades.

Detroit está encolhendo e sendo tomada pelo mato alto. Parece estranho este cenário pós-holocausto, mas está acontecendo. “Muitos bairros estão piores que este”, afirma Mark. “Uns dois quilômetros para frente na Georgia Street e você verá quarteirões inteiros sem uma pessoa ou casa sequer”.

Parece um supermercado normal. As pessoas parecem fazer compras normalmente, a diferença é que não há preços nas prateleiras nem caixas na saída, apenas uma tabela em escala para o peso de seu carrinho. Ano passado houve nessa parte de Michigan, uma distribuição de 13.500 toneladas de alimentos em função da crise, a maioria na forma de sopas feitas em cozinhas improvisadas ou em caixas de alimentos pré-preparados. Uma das formas mais dignas adotadas foi a da ‘ONG’ Fishes and Loaves Food Pantry. Depois de cadastrado, você se dirigia a eles, na parte oeste da cidade, onde retirava a quantidade de alimento para suas necessidades, que vinha acondicionada em sacolas do Walmart, para disfarçar perante seus vizinhos.

“O local era território Ford”, explica Chuck Vella, um dos voluntários participantes do Fishes and Loaves. “Havia milhares de pessoas trabalhando na Ford, seus fornecedores ou na sua cadeia de suprimentos. Esses empregos não existem mais e não voltarão. Tivemos engenheiros e gerentes com salários anuais de seis dígitos cadastrados para retirar alimentos. Mas a coisa vai mais longe. O que a mídia não entende, é que não foram apenas milhares de pessoas que perderam seus empregos, mas as que restaram, tiveram seus salários, horas de trabalho e benefícios radicalmente cortados. Assim, muitos, mesmo empregados, perderam a capacidade de honrar seus compromissos e prover suas famílias”.

Chuck administrou sua própria loja por 25 anos antes de se aposentar e é extremamente orgulhoso pela iniciativa. Não há nada igual por aqui. “Começamos a planejar o Fishes and Loaves antes disso (a crise) acontecer, uns dois anos e meio antes. Já tínhamos trabalho de sobra. Trabalhamos com agendamento, se não fosse assim, conviveríamos com filas intermináveis”.
Com a GM e a Ford contratando novamente, será que ele vê esperança? “De vez em quando alguém me diz: ‘consegui um emprego, não voltarei mais aqui’. Mas são poucos”.

Mas eles ainda estão demitindo. A cidade de Ypsilanti com seus 52 mil habitantes está a 50 km do centro de Detroit e é um mundo à parte, suburbano, onde as pessoas se cumprimentam de seus carros. No ano passado a GM fechou sua grande fábrica Willow Run por lá, que chegou a ter 14 mil funcionários montando Chevys e transmissões. A cidade girava em torno da fábrica e agora, Ypsilanti teme seguir o mesmo caminho de Georgia Street. As autoridades locais já diminuíram os efetivos da polícia e dos bombeiros, além de demolir 17 casas abandonadas. Nunca é fácil, sem manutenção, a água congela e rompe tubulações, causando vários vazamentos.

“Não vamos ficar igual a Little Detroit ou Flint”, de acordo com Brenda Stumbo, prefeita da cidade. “Estamos tentando manter os padrões até a volta dos empregos”, diz, enquanto nos mostra a colossal planta de Willow Run. A GM investiu U$ 600 milhões aqui em 2003. Ela está moderna e perfeitamente mantida, porém, assim como as ruas de Detroit, vazia. É terça-feira, mas não há ninguém próximo aos prédios da administração. Nos desculpamos com Brenda por fazê-la se expor ao frio em nossa breve visita.
“Ficaria feliz em contrair uma pneumonia em troca de alguns empregos de volta”, ela brinca. “Temos que agir rápido, ainda estou atordoada por termos sido preteridos. Quer ver o que temos aqui? 23 acres de terreno limpo, verde e pronto para usar. Quando as pessoas lerem sua matéria, verão nosso potencial aqui e saberão que estamos à espera. Tanto faz que seja um fabricante de outro país. Se a própria GM quiser voltar e nos pedir incentivo fiscal, daremos! O que queremos são nossos empregos de volta. As pessoas dizem que a indústria automobilística morreu por aqui, mas me recuso a aceitar isso. Outros dizem que os americanos não querem trabalhar, isso simplesmente não é verdade. Trabalharemos a 10 ou 15 dólares/hora, sem problema”.

E seus eleitores, estão chateados com a má administração da GM que a obrigou a fechar a fábrica onde se formou a cidade em volta? “Acho que sim, penso que estão chateados. É como perder um ente querido. Primeiro vem o choque inicial da notícia e você só percebe a gravidade quando acontece com você. Este lugar simbolizava a esperança para muita gente. Eles deixaram suas casas no sul para vir trabalhar aqui, como meus pais fizeram. A indústria nos deu uma vida melhor. Dá para imaginar o orgulho de poder enviar seus filhos à faculdade, quando você não conseguiu ir? Agora os jovens estão deixando a cidade. As coisas que tínhamos já não existem mais. Estamos sufocando aos poucos. Mas estamos lutando com vontade e vamos virar esse jogo”.

De volta à Georgia Street, digo a Mark que este verdadeiro câncer que atingiu Detroit e vem corroendo suas entranhas parece estar em estágio avançado. Portanto, por que não admitir a derrota e partir? Mas Mark enxerga alguma coisa através das casas queimadas e abandonadas que não consigo ver: “Fui criado aqui, não por meu pai e mãe. Meu pai estava preso e acabei levando um tiro por causa da violência e um vizinho disse a meu pai que eu era um bandido. Fomos embora, mas no ano passado muita gente voltou, estão reconstruindo a comunidade. Junho passado um garoto que cresceu comigo foi assassinado. Ouvi que a mãe dele não tinha dinheiro para o funeral. Em dois dias arrecadamos R$ 4 mil para ela. Foi muito triste”.

A indústria automotiva americana se reinventou, à custa de Detroit. Detroit, do Prefeito até Mark, planeja fazer o mesmo. Talvez lute para se chamar Motown; alguns empregos voltarão. Nesse quarteirão pelo menos, o senso de comunidade existe. Mark espera que o Prefeito não risque Georgia Street do mapa. Enquanto falamos, por coincidência, um amigo de seu filho Pete sai de uma casa e começa a limpar a neve da calçada onde ninguém passará, mas o faz com orgulho.

Fonte: http://carmagazine.uol.com.br/curiosidades/detroit-de-orgulho-a-decadencia

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:lol:

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A cidade tinha mais de 2 milhões de habitantes, hoje são menos de 900 mil 8-O
 
É um cenário muito sombrio e triste pra uma cidade que já foi uma das mais prósperas dos EUA e sempre lembro com saudade das vitórias do Ayrton Senna ganhando GP de F1 nessa cidade que tinha um circuito de rua muito bonito na época.

Uma cidade que sempre respirou automobolismo e o grande problema é que por ter uma ligação tão forte com isso, se essa industria entra em crise a cidade literalmente adoece junto.

Por isso que durante um bom tempo se temeu que algo semelhante acontecesse aqui no Brasil em especial em São Bernardo e São Caetano em SP que cresceram muito em função da industria automobilistica, mas ambas felizmente aprenderam a não ficar totalmente dependente delas, apesar que elas continuam ainda sendo bastante importantes pra economia.

Quanto a Detroit o futuro realmente é algo incerto. Precisa criar urgente algum meio para se revitalizar.
 
Engraçado que quando li "Heróis do Olimpo: Herói Perdido" achei estranho Rick Riordan comentar por alto no livro o estado em que a cidade estava. Mas eu estranhei, primeiro achei que o cenário fosse imaginário por ser útil à história, depois pensei há quanto tempo isso vinha acontecendo... E, no final das contas, ele colocou na série essa pequena informação totalmente real e recente 8-O

Puxa, que triste mesmo!!!
 
E vale lembrar que durante décadas e décadas Detroit liderava o ranking da cidade mais violenta dos EUA. E ainda continua liderando esta triste marca.

O índice de assassinatos por lá é algo assustador, a criminalidade rola solta e as autoridades não conseguem lidar com isso por lá.

Acho que Detroit realmente precisa de um Robocop :lol:
 
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Estive lá em 2010 e posso garantir que as fotos não mentem. Triste destino da cidade que deu ao mundo a Motown, os Stooges e o MC5...

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Acho que Detroit realmente precisa de um Robocop :lol:

Bem lembrado e acho que nem a pessoa que idealizou o filme Robocop por mais pessimista que fosse imaginaria com tanta precisão um cenário tão decadente pra uma Detroit do "futuro". No final tá ficando tão igual e podendo ficar até pior do que a Detroit que vimos naquele primeiro filme.
 

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