O meu post terá alguns spoilers. Se não viu Fale com ela, recomendo que deixe para ler isso aqui depois, ok? Não tem como eu colocar tudo na tag spoiler porque "quebra" o ritmo do texto. Mas sou legal e tô avisando.
Gosto de O sétimo selo. É um bom filme. Jogar xadrez com a morte é algo que fazemos todos os dias das nossas vidas. A dança com a morte é algo que ficou marcado para sempre em quem quer que tenha visto o filme, etc. Bergman fez um ótimo trabalho. E quando se fala em filme da década de 50, dou a Bergman o que é de Bergman. Até coloquei O sétimo selo na minha listinha do Consenso. Mas, quando se trata de uma disputa baseada na pergunta "qual é o melhor filme de drama?", acho Fale com ela infinitamente superior.
Tudo sobre minha mãe era o meu Almodóvar preferido. Acho o filme de bom tom, não comedido, mas vívido. Sinto a presença do desespero, e da denúncia, em cada take do filme. Quando o Agrado explica o porquê da escolha desse nome, sinto um nó na garganta. E acho belíssima a inserção de Um Bonde Chamado Desejo no filme. Peça foda (não vou falar do filme foda, porque me recuso a falar o nome do filme em Português
)
Mas, como eu disse, Tudo sobre minha mãe ERA o meu Almodóvar preferido, até que veio Fale com ela e ocupou o lugar. Gosto do roteiro, gosto da direção (oh! really, putinha do Almodóvar?), gosto da montagem, gosto da fotografia, piro nos enquadramentos MÁGICOS, adoro os atores, etc. O filme é de uma sensibilidade ímpar. Vi no Cinema, e chorei, chorei, chorei mais do que todas as personagens que choram no filme juntas. Chorei porque era preciso, chorei porque foi o meu jeito de falar com o filme como ele falou comigo. Não vou falar do clássico curta que abrilhanta o filme com contornos surrealistas. Não vou falar sobre como a metalinguagem é algo fascinante se usada devidamente (a clara influência de Fritz Lang, D.W, Griffith e F. W.Murnau, no curta, de sete [?] minutos, feito pelo Almodóvar, é algo digno de palmas. Aliás, palmas, também, para essa linda homenagem ao cinema mudo, que foi Amante Minguante, né? E sobre como o curta se encaixa perfeitamente ao propósito do filme, não é? Ele não se trata apenas do desejo do homem de entrar no corpo da mulher, de estar todo dentro dela, mas aborda, sutil e perversamente, o momento em que Benigno "estupra" Alice OPA! Eu disse que não falaria sobre o curta!).
Não vou falar sobre como o Caetano não fez merda no filme (e conseguiu me emocionar). Mas falarei sobre a necessidade de dizer algo e a impossibilidade de fazê-lo. Porque o filme, como bem disse o Almodóvar, é sobre a solidão e a comunicação. E bem no estilo Almodóvar de fazer filmes, percebemos a busca por um ponto em que os papéis femininos e masculinos sejam redefinidos. Engana-se quem pensa que há alguma estabilidade no filme. Nada fica parado no filme, tudo está, tal qual a câmera, em movimento. Uma das personagens é toureira (uma profissão tipicamente masculina). Um dos personagens é enfermeiro. E eu gosto bastante é que, geralmente, mulheres são descritas, apresentadas como pessoas que falam absurdamente. As mulheres, neste filme, não falam, são faladas, nas e pelas imagens. Os homens falam loucamente, mas falam para quem? Sobre quem? Sobre as mulheres inertes e em coma (Alicia e Lydia)? Sobre o amor que sentem por elas? Ou falam sobre eles próprios?
Os espetáculos inseridos no filme não estão lá aleatoriamente. O belíssimo Café Müller, de Pina Bausch é como uma cortina que se abre para a exibição do filme sugere a própria condição das mulheres do filme, que se encontram em um estado de não vida (com os olhos fechados, e suas almas lacradas pelo sofrimento). E o fim do filme, com Musarca Fogo, é o fechar das cortinas depois do brilhante espetáculo. É como o fechar das cortinas da vida. Todos morremos sozinhos, mas não precisamos viver sozinhos. Quando você acorda, a vida está falando com você. Fale com ela. Quando você se levanta, a vida está falando com você. Fale com ela. Quando você lê um livro, a vida está falando com você. Fale com ela. Quando você vê um filme e gosta muito, a vida está falando com você, fale com ela. Quando você ouve uma música, e se lembra da clássica frase "sem a música, a vida seria um erro", a vida está falando com você. Fale com ela. Quando você tem pessoas as quais pode chamar de amigas, a vida está falando com você. Fale com ela. Se você tem pessoas pelas quais nutre um sentimento imenso, mas não tem coragem de dizer-lhes, FALE COM ELAS.