Frodo jazia no chão com o rosto para cima e aquela criatura monstruosa se debruçava sobre ele, tão concentrada em sua vítima que não se deu conta de Sam e de seus gritos até que ele estivesse bem próximo. Quando Sam veio correndo na direção deles, viu que Frodo já estava preso por cordas passadas em torno de seu corpo, dos tornozelos até os ombros, e Laracna, com suas grandes patas dianteiras, começava a erguê-lo e arrastá-lo dali.
Perto de Frodo jazia, luzindo no chão, a espada élfica, no local onde caíra inútil de sua mão. Sam não parou para pensar no que se deveria fazer, se estava sendo corajoso ou leal, ou se estava possesso de raiva. Deu um salto à frente e gritou, agarrando a espada de seu mestre com a mão esquerda.
Então avançou. Nunca se vira um ataque tão violento no mundo selvagem dos animais, no qual uma pequena criatura, armada apenas com minúsculos dentes, é capaz de saltar sobre uma torre de chifres e carapaça que pisa sobre seu companheiro caído.
Perturbada, como se tivesse sido despertada de algum sonho de volúpia pelo pequeno grito do hobbit, lentamente voltou a malícia apavorante de seu olhar na direção dele. Mas quase antes de ela perceber que avançava sobre ela uma fúria maior do que qualquer outra provada em anos incontáveis, a espada brilhante golpeou sua pata e decepou a garra. Sam saltou para dentro dos arcos de suas pernas, e com um rápido impulso de sua outra mão desferiu um golpe contra o aglomerado de olhos na cabeça abaixada. Um grande olho escureceu.
Agora a infeliz criatura estava bem debaixo dela, no momento longe do alcance de seu ferrão e suas garras. Sua vasta barriga estava sobre Sam com sua luz pútrida, e o mau cheiro que vinha dela quase o derrubou. Mas ainda lhe restava fúria para mais um golpe, e antes que ela pudesse cair com o corpo sobre ele, sufocando-o com toda a sua pequena coragem atrevida, ele, num esforço desesperado, rasgou-lhe um talho no corpo com a reluzente espada élfica.
Mas Laracna não era como os dragões, e não tinha nenhum outro ponto frágil a não ser os olhos. Calombosa, esburacada e corrompida era a sua carapaça antiga como a eternidade, mas sua espessura era sempre alimentada de dentro para fora, formando camada sobre camada de excrescência maligna. A lâmina fez um talho horroroso, mas aquelas dobras hediondas não podiam ser perfuradas pela força humana, nem mesmo se elfos ou anões forjassem o aço, nem se a mão de Beren ou de Túrin o brandissem. Ela recuou quando golpeada, e então ergueu a enorme bolsa de sua barriga bem acima da cabeça de Sam. O veneno espumava e borbulhava do ferimento. Abrindo agora as pernas, ela fez seu enorme peso cair sobre ele outra vez. Cedo demais.
Pois Sam ainda estava de pé e, deixando cair sua própria espada, segurou com as duas mãos a espada élfica com a ponta para cima, afastando aquele teto horrível; e assim Laracna, com o impulso de sua própria disposição maligna, num esforço maior que o da mão de qualquer guerreiro, jogou-se sobre um cravo cruel. A espada foi penetrando cada vez mais fundo, enquanto Sam era lentamente prensado contra o chão.
Laracna jamais conhecera tal aflição, nem sonhara conhecer, em todo o seu vasto mundo de maldades. Nem o soldado mais valente da antiga Gondor, nem o orc mais selvagem preso numa armadilha, jamais lhe tinham resistido daquela maneira, ou enfiado uma lâmina em sua amada carne. Um tremor percorreu-lhe o corpo. Erguendo-se de novo, num repelão violento devido à dor, encolheu sob o corpo as pernas contorcidas e pulou para trás num salto convulsivo.
Sam caíra de joelhos ao lado da cabeça de Frodo, os sentidos confusos devido ao terrível fedor, as duas mãos ainda agarrando o punho da espada. Apesar da névoa diante de seus olhos, ele percebia vagamente o rosto de Frodo, e tenazmente lutava para se controlar e se libertar do desfalecimento que o ameaçava. Lentamente ergueu a cabeça e a viu, apenas a alguns passos de distância, fitando-o, a boca emporcalhada por um cuspe venenoso, e um líquido esverdeado escorrendo de seu olho ferido. Estava agachada, com a barriga trêmula estatelada sobre o chão, os grandes arcos das pernas tremendo, enquanto reunia forças para um outro salto — desta vez para esmagar e ferroar até a morte: nada de pequenas picadas venenosas para acalmar a luta de sua comida; desta vez para matar e depois estraçalhar.
No momento em que o próprio Sam se agachava, olhando para ela, enxergando sua morte naqueles olhos, um pensamento lhe ocorreu, como se alguma voz remota lhe tivesse falado, e ele tateou o peito com a mão esquerda e encontrou o que procurava: frio, duro e sólido pareceu-lhe ao tato, naquele mundo fantasmagórico de horror, o Frasco de Galadriel.
— Galadriel! — disse ele numa voz sumida, e então ouviu vozes distantes mas nítidas: o clamor dos elfos andando sob as estrelas nas amadas sombras do Condado, e a música dos elfos como lhe chegara em sonhos no Salão de Fogo da casa de Elrond.
Então sua língua se soltou e sua voz gritou numa língua desconhecida:
Gilthoniel! A Elbereth!
A Elbereth Gilthoniel
o menel palan-diriel,
le nallon si di’nguruthos!
A tiro nin, Fanuilos!
Com isso levantou-se cambaleando e outra vez era Samwise, o hobbit, filho de Hamfast.
— Agora venha, sua nojenta! — gritou ele. — Você machucou meu mestre, sua bruta, e vai pagar por isso. Nós vamos seguir em frente, mas primeiro vamos acertar as contas com você. Venha, e experimente isso de novo!
Como se o espírito indomável do hobbit tivesse colocado sua força em ação, o cristal se acendeu de repente como uma tocha branca em sua mão. Queimava como uma estrela que, saltando do firmamento, corta o ar escuro com uma luz intolerável. Nenhum terror igual vindo do céu jamais queimara no rosto de Laracna antes. Os raios daquela luz penetraram sua cabeça machucada e a cortaram com uma dor insuportável, e a terrível infecção de luz se espalhou de um olho para outro. Ela caiu para trás, golpeando o ar com as patas dianteiras, sua visão fulminada por relâmpagos internos, sua mente agonizando.
Então, virando sua cabeça mutilada, rolou no chão e começou a se arrastar, garra após garra, na direção da abertura no penhasco escuro lá atrás.