[thrain][Domingo, à mesa]
Lá vai( ):
Domingo, à mesa
Todo domingo, minha família – eu, meus pais, meu irmão e minha irmã caçula – se reúne à mesa da cozinha e “conversa”.
A idéia surgiu, há muito tempo do meu pai; foi uma tentativa, um tanto quanto patética e desesperada, de aproximar a família e estabelecer um diálogo constante; mas, atualmente, funciona somente para comunicados, avisos gerais, convocações, memorandos e discussões generalizadas que levam, invariavelmente, a nada.
Domingo passado parecia um domingo qualquer, e, como num domingo qualquer, eu não tinha nada para fazer e só esperava dar a hora de me juntar aos outros à mesa.
Deram-se as infelizes oito da noite, meus pais saíram da frente da televisão e nos chamaram, eu e meus irmãos, para a mesa.
Em casa, a falta de diálogo é total. Meus pais vivem para o trabalho e, quando estão em casa, nem ligam um para o outro. Meu irmão é todo voltado para seu mundinho, um perfeito altista, enquanto que minha irmã é uma pré-adolescente, semigótica, revoltada que não se sujeitaria a se dirigir a alguém diretamente nem que sua vida dependesse disso. E eu? Não sei, só não gosto muito de conversar.
À mesa, tudo é, ou deveria ser, falado. A “conversa” se inicia com um tom formal e termina, geralmente, com cabeças quentes ou indiretas frias.
Mas não, naquele domingo não foi assim. A “conversa” começou normalmente. Relatório sobre as notas da escola de cada um, anúncio do término do castigo da mais nova e do início do castigo do mais velho; o de sempre.
Foi então que meu pai disse uma coisa que não esperávamos, e que, por sinal, nem mamãe esperava:
– Tio Arnaldo vem passar alguns dias aqui conosco; ele chega amanhã e é muito importante que vocês se comportem, ele é de muita estima para mim.
Confusão geral. Tio Arnaldo era o meio irmão de meu pai e o conhecido bicão da família. Ninguém gostava realmente dele e todos achavam que meu pai era o que mais o odiava, embora ele nunca o tivesse demonstrado em público. Aparentemente estávamos todos errados quanto a isso.
Minha irmã retrucou veemente, ela odeia profundamente o Arnaldo. Foi logo repreendida e devidamente castigada. Meu irmão só não disse nada, pois ainda não havia assimilado a idéia, ele demora a fazer isso às vezes.
A surpresa maior foi ver meu pai defendendo o meio irmão dele da mamãe.Ver os dois discutindo foi, no mínimo, interessante, mesmo que não tenha durado muito.
Passado o choque inicial, todos vimos que não adiantava espernear. Ele vinha e ponto. Como em todas as situações terminadas em “ponto” paterno, essa foi deixada de lado.
Parecia tudo calmo novamente, e achávamos que a reunião havia terminado por falta de assuntos em pauta.Nos preparávamos para levantar, quando minha mãe nos segurou à mesa. Ela tinha um último comunicado a fazer:
– Fui ao Dr. Joarez sexta pela manhã, e acho que vocês deveriam saber o quanto antes. O doutor me disse que tenho câncer de colo. Não é desesperador, mas é bem grave – os olhos de mamãe começaram a ficar vermelhos e os de papai a arregalar – Eu vou estar passando por um longo tratamento e vou precisar do apoio de todos vocês.
Ficamos sem saber o que dizer. Papai estava pálido, enquanto nós três nos olhávamos com tristeza. Ninguém dizia nada. Mamãe baixou a cabeça; ela chorava baixinho.
Depois de um tempo razoavelmente longo de silêncio embaraçoso, nós três nos levantamos e, ainda sem dizer nada, fomos abraçar a mamãe, que nos abraçou e chorou forte.
Papai juntou-se a nós num grande e quente, no entanto triste e silencioso, abraço em família. Ficamos assim por um tempo, e fomos todos dormir. Mamãe não gosta que durmamos tarde.
*********************************************************
Por favor digam o q acharam, por mais infeliz que seja o comentário!!!!!
Lá vai( ):
Domingo, à mesa
Todo domingo, minha família – eu, meus pais, meu irmão e minha irmã caçula – se reúne à mesa da cozinha e “conversa”.
A idéia surgiu, há muito tempo do meu pai; foi uma tentativa, um tanto quanto patética e desesperada, de aproximar a família e estabelecer um diálogo constante; mas, atualmente, funciona somente para comunicados, avisos gerais, convocações, memorandos e discussões generalizadas que levam, invariavelmente, a nada.
Domingo passado parecia um domingo qualquer, e, como num domingo qualquer, eu não tinha nada para fazer e só esperava dar a hora de me juntar aos outros à mesa.
Deram-se as infelizes oito da noite, meus pais saíram da frente da televisão e nos chamaram, eu e meus irmãos, para a mesa.
Em casa, a falta de diálogo é total. Meus pais vivem para o trabalho e, quando estão em casa, nem ligam um para o outro. Meu irmão é todo voltado para seu mundinho, um perfeito altista, enquanto que minha irmã é uma pré-adolescente, semigótica, revoltada que não se sujeitaria a se dirigir a alguém diretamente nem que sua vida dependesse disso. E eu? Não sei, só não gosto muito de conversar.
À mesa, tudo é, ou deveria ser, falado. A “conversa” se inicia com um tom formal e termina, geralmente, com cabeças quentes ou indiretas frias.
Mas não, naquele domingo não foi assim. A “conversa” começou normalmente. Relatório sobre as notas da escola de cada um, anúncio do término do castigo da mais nova e do início do castigo do mais velho; o de sempre.
Foi então que meu pai disse uma coisa que não esperávamos, e que, por sinal, nem mamãe esperava:
– Tio Arnaldo vem passar alguns dias aqui conosco; ele chega amanhã e é muito importante que vocês se comportem, ele é de muita estima para mim.
Confusão geral. Tio Arnaldo era o meio irmão de meu pai e o conhecido bicão da família. Ninguém gostava realmente dele e todos achavam que meu pai era o que mais o odiava, embora ele nunca o tivesse demonstrado em público. Aparentemente estávamos todos errados quanto a isso.
Minha irmã retrucou veemente, ela odeia profundamente o Arnaldo. Foi logo repreendida e devidamente castigada. Meu irmão só não disse nada, pois ainda não havia assimilado a idéia, ele demora a fazer isso às vezes.
A surpresa maior foi ver meu pai defendendo o meio irmão dele da mamãe.Ver os dois discutindo foi, no mínimo, interessante, mesmo que não tenha durado muito.
Passado o choque inicial, todos vimos que não adiantava espernear. Ele vinha e ponto. Como em todas as situações terminadas em “ponto” paterno, essa foi deixada de lado.
Parecia tudo calmo novamente, e achávamos que a reunião havia terminado por falta de assuntos em pauta.Nos preparávamos para levantar, quando minha mãe nos segurou à mesa. Ela tinha um último comunicado a fazer:
– Fui ao Dr. Joarez sexta pela manhã, e acho que vocês deveriam saber o quanto antes. O doutor me disse que tenho câncer de colo. Não é desesperador, mas é bem grave – os olhos de mamãe começaram a ficar vermelhos e os de papai a arregalar – Eu vou estar passando por um longo tratamento e vou precisar do apoio de todos vocês.
Ficamos sem saber o que dizer. Papai estava pálido, enquanto nós três nos olhávamos com tristeza. Ninguém dizia nada. Mamãe baixou a cabeça; ela chorava baixinho.
Depois de um tempo razoavelmente longo de silêncio embaraçoso, nós três nos levantamos e, ainda sem dizer nada, fomos abraçar a mamãe, que nos abraçou e chorou forte.
Papai juntou-se a nós num grande e quente, no entanto triste e silencioso, abraço em família. Ficamos assim por um tempo, e fomos todos dormir. Mamãe não gosta que durmamos tarde.
*********************************************************
Por favor digam o q acharam, por mais infeliz que seja o comentário!!!!!