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[L] [Melkor, o inimigo da luz] [Em Ipanema, uma galeria]

Melkor- o inimigo da luz

Senhor de todas as coisas
[Melkor, o inimigo da luz] [Em Ipanema, uma galeria]

Férias no Rio me inspiram.



Pedro andava distraído pela rua Ataulfo de Paiva, no Rio de Janeiro, enquanto olhava de um lado para o outro procurando uma certa galeria. No telefone, seu primo havia dito que ficava lá pelas bandas de Ipanema, alguns quarteirões depois do canal. Nada podia dar errado, mas deu.


Comprou uma coca cola num café e continuou seu caminho no seu gingado carioca inconfundível. Parou num cruzamento quando seus olhos castanhos se levantaram e encontraram a luz vermelha do semáforo dizendo: pare, não ande! Só havia ele para atravessar, a rua estava vazia.
A luz ficou verde. Pedro deu um riso mudo, colocou seu pé direito no asfalto e começou a andar. Olhou para o lado – só para checar se não tinha nenhum carro vindo em sua direção – e se espantou quando viu um táxi sem ninguém na cadeira do motorista. De repente, o tal táxi acelerou e quase o atropelou.
Como se não bastasse, dobrou à direita devagarinho, abriu a janela imunda de insulfilm e, agora não mais invisível, a caveira deu sua gargalhada cadavérica com seus dentes brancos tremelicando. Pedro arregalou bem os olhos, soltou duas tentativas de falar e foi cuidadosamente até a mesa do bar da esquina.


Pelo que parecia, ninguém tinha visto o táxi nem o motorista fantasma. Pedro estava apavorado, meio incrédulo; não que não acreditasse no que vira, não acreditava era em si mesmo. Pediu uma coca, bebeu, criou coragem e continuou andando.
Atravessou o canal, a rua mudou de nome e entrou em Ipanema. Continuava procurando a galeria, agora devia estar perto. Ele queria comprar algumas revistas em quadrinho, nem havia tanta urgência. Entretanto, tendo andado desde as bandas do Leblon até ali, parecia que seria um insulto às suas próprias pernas e suas entranhas simplesmente voltar. Além disso, estava preenchido de Coca Cola, as sombras da tarde já eram longas...
O mais difícil seria achar a loja dentre tantas lojas em tantas galerias tão parecidas. Foi entrando em uma a uma, procurando, subindo e descendo. Pelo que se lembrava, a loja ficava no terceiro andar; mas, mesmo que não houvesse um terceiro andar, ele procurava esperançoso.


Algumas das galerias eram dignas de boa parte do seu tempo. Ele entrava, andava, vagava... Observava cada loja, até sinais de reforma para ver se – porque não? – a que ele procurava não havia se mudado dali. Algumas das galerias tinham três andares, escadas rolantes antigas como seu primo lhe havia descrito... Até mesmo um aquário na entrada (mas quem havia falado de aquários mesmo?). Mas nunca era a galeria que ele queria achar.
Cansou de procurar, determinada hora. Pegou seu celular, ligou para a casa de sua tia e perguntou: Qual o número do lugar, primo? O primo lhe respondeu: 207. Pedro desligou o celular, respirou fundo e, quando olhou para frente, viu que o número 207 era ali mesmo.
Deu de ombros. A galeria estava bem vazia, na verdade, completamente vazia. As paredes pretas, o chão sujo, a escada rolante velha que gritava... Tudo sugeria um cenário underground que lhe empolgava e preocupava. Queria que fosse uma loja normal naquelas alturas do campeonato.


Subiu a primeira escada. Deu uma volta e não achou o que procurava. Começou a subir para o segundo andar quando se perguntou onde estava a escada pela qual subira e a escada pela qual teria que descer. Bah, de qualquer forma, haveria de encontrar um modo.
O segundo andar – se fosse possível – era mais dark e mais aterrorizante que o primeiro. O piso tinha cheiro de urina e todas as lojas estavam vazias, abandonadas ou em reforma por tempo indeterminado.
O terceiro piso, então, era pior. Só tinha uma porta no andar inteiro, nenhum anúncio de loja de gibis. E também nada de escada para descer, só aquela porcaria que rangia pela qual havia subido.
Já que estava ali, bateu na porta. Ouviu um barulho de tiritar vindo lá de dentro, mas nenhuma ordem para entrar ou esperar. Abriu a porta e viu uma caveira sentada em uma cadeira de balanço, a cabeça apoiada na mão, aparentemente cansada. Ela virou-se para Pedro, arregalou a cavidade ocular e riu uma só vez.


Pedro perguntou-lhe “como posso descer daqui?”. Ela respondeu “não pode” e voltou a rir, agora descontrolada. Seus ossos até se lhe caíram, de tão espalhafatosa. “Não pode, não pode!”, ela repetiu.
Irritado e assustado, Pedro bateu a porta e foi para a escada rolante que subia, ia descer mesmo assim. Mas por mais que tenha tentado, não conseguiu. Só ficou exausto a ponto de sentar-se nos degraus e esperar que eles o levassem de volta para cima. Quando chegou mais uma vez no terceiro andar, a caveira estava fora de sua sala, encostada no batente da porta acendendo um cigarro velho e meio quebrado.
“Não pode, eu disse! Você vai ter que subir, sempre subir. Subir até morrer! Por mais que desça, vai subir. Hahahaha”. Pedro ficou apavorado e tentou descer de novo, sem êxito. “Suba, suba!” a caveira gritava e ria, fumando seu cigarrinho. “Suba!”.
 
Nãoconsigo mais subir uma escada rolante num shopping sem pensar na caveira com um cigarrinho e falando "suba, suba". :lol:
 

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